Fanfic: LIÇÃO DE VIDA AYA finalizada

Capítulo III

Alfonso parou seu Honda Accord e permaneceu por alguns mi­nutos no assento do motorista no pequeno caminho pavimen­tado que dava acesso a sua casa, antes de reunir coragem para descer do veículo, andar alguns poucos passos e entrar.

Não tinha a menor vontade de chegar a seu lar e deparar com a cena deprimente do dia-a-dia. Sentia-se totalmente infeliz. De­testava sua vida.

Não, aquilo não era verdade, corrigiu-se em seguida. Detestava a vida que levava com sua mulher. Desprezava Anahí com todas as forças. E, como sempre, quando permitia a si mesmo pensar desse jeito, sentia-se culpado.

Quantas e quantas vezes as pessoas tinham lhe dito para dar tempo a Anahí, pois ela havia passado por uma experiência difícil, que ele deveria ser mais compreensivo? Bem, Alfonso tentara. Com todo o ardor, na realidade. Procurou entender a dor da esposa, confortá-la, dar-lhe carinho, apoio, mas nada do que fez produziu um resultado positivo.

E acabou se cansando de ser compreensivo. Afinal, ele também teve de enfrentar uma experiência traumática. Também sofreu de­mais. Claro, não era a mesma coisa para um homem, e Alfonso tinha plena consciência disso. Mas também perdeu um filho. Contudo, nem por isso mergulhou de cabeça num abismo escuro. Sabendo que a vida tinha de continuar, de um jeito ou de outro, e tendo mais três filhos saudáveis para criar, superou a dor da perda.

E tentou infinitas vezes, ajudar Anahí. Em vão. Sua mulher se recusava a melhorar, parecendo apreciar o sofrimento e ser digna de compaixão.

Respirou fundo muito frustrado. Dois anos haviam se passado desde a morte do bebê, e Anahí já deveria ter superado tudo aquilo, não deveria? No entanto, parecia cada vez pior, embriagando-se quase todos os dias para afogar as mágoas.

Não era apenas por causa da bebida que ela o incomodava tanto, embora aquilo fosse grande parte do problema. Anahí tornara-se uma mulher desleixada, descuidando por completo de sua aparência pessoal, dos cuidados do lar e dos filhos. E ficava ainda mais mi­serável após a segunda dose de alguma bebida alcoólica. Perdia a paciência com as crianças com imensa facilidade e gritava com Alfonso por qualquer coisa, sem cessar. Isso quando não sumia de casa, deixando os garotos sozinhos, correndo toda espécie de riscos.

A alegria de viver desaparecera do coração de Alfonso.

Ele não podia acreditar que a garota doce e especial com quem se casara transformara-se naquela mulher que agora era sua com­panheira. A semelhança não era nem mesmo próxima.

Deus amara-a tanto... E adorara sua vida em comum. O rela­cionamento dos dois fora tão maravilhoso que Alfonso mal via a hora de retornar a casa após um dia de trabalho duro. Anahí estaria lá, linda, de banho tomado e perfumada a sua espera, brincando com os filhos ou preparando o jantar da família, feliz por vê-lo chegar, recebendo-o de braços abertos e um sorriso sincero no rosto. Não era a perfeição, lógico, mas nada era perfeito. Todavia, Alfonso se sentira feliz completo. Eles costumavam ser felizes juntos.

Agora, a única razão que Alfonso tinha para voltar para casa era servir de apaziguador entre Anahí e seus filhos.

Ela vivia se lamentando por não suportar as brigas diárias, as quais eram causadas por culpa dela mesma. Reclamava que não agüentava mais cozinhar, nem a tarefa infinita de limpar a casa para que as crianças voltassem a sujá-la cinco minutos depois. E cobrava dele, acusando-o de não ajudá-la o suficiente.

Alfonso olhava ao redor, via as roupas usadas e todas jogadas nos mais diversos lugares, a louça do café da manhã ainda suja sobre a mesa da cozinha, as crianças nervosas e com fome, e a esposa, claro, ainda sem tomar banho, e se perguntava sobre o que ela estava dizendo. Assim como se questionava por que continuava suportando tamanha tortura. Se já estivesse divorciado, e com a guarda dos filhos, sem dúvida teria mais paz.

— Que situação terrível! — murmurou consigo mesmo, por fim abrindo a porta do automóvel e obrigando-se a descer.

Foi quando percebeu que alguém tinha varrido o caminho até a porta de entrada.