Fanfic: LIÇÃO DE VIDA AYA finalizada

Dulce sentou-se mais ereta e a analisou, muito atenta, um ceticismo indiscutível estampado em suas lentes de contato azuis.

— Está falando de um sonho ou de quê? Uma premonição?

— Não. Sei que é estranho e difícil compreender, mas isso tudo de fato aconteceu, e agora estou de volta. Como em De Volta Para o Futuro, só que sem o charme do filme.

 Dulce meneou a cabeça, sem desviar o olhar de Anahí .

— Você está certa. Isso é inacreditável. E não entendo por que está dizendo esses absurdos todos. — Estreitou os olhos, que agora pareciam tristes e aflitos. Decerto porque julgava que a amiga tinha enlouquecido. — Seja franca, Anahí , você ingeriu algum tipo de droga que não está querendo me dizer? Conte-me. Sabe que pode confiar em mim.

 Anahí estendeu as mãos e segurou os braços de Dulce , puxando-a para mais perto.

— Confio em você sem reservas,  Dulce , e só por isso estou lhe revelando esta história incrível. Mas não tomei nenhuma droga e não estou tendo alucinações. Digo-lhe todas essas coisas porque é tudo verdade. Olhe para mim... — murmurou, chacoalhando a amiga num gesto de súplica. — Estou lhe dizendo a verdade. A mais pura verdade.

 Dulce fitou  Anahí nos olhos como se pudesse realmente ver, dentro do coração da amiga, que aquilo tudo não era pura loucura. Então, meneou a cabeça de novo, com mais veemência.

— Queria poder acreditar em você, mas isso não faz o menor sentido. Se está de volta em seu corpo, onde está a  Anahí original?

— Aqui. Quero dizer, eu não fui a lugar nenhum. Eu sou eu, mas com todas essas terríveis lembranças.

 Dulce fechou os olhos e sorriu, parecendo ter submergido numa sensação de alívio.

— Só o que posso lhe dizer é que você teve um pesadelo real o bastante para deixá-la assim confusa.

— Não, Dulce . Eu tive uma vida, que joguei na lata do lixo, e agora retornei para consertar o estrago. Resgatar o passado. Fui presenteada com essa chance, compreende? Não sei se por Deus ou se por um anjo celestial, assim como não compreendo o moti­vo.

Porém, o que ocorre é que estou voltando para resgatar meu passado.

—  Anahí querida, isso é impossível. Coisas desse gênero só acontecem em filmes de ficção. Jamais na vida real. Se algo assim ocorresse, por que eu não poderia ser transportada de novo ao colégio, onde fui tola o bastante para me apaixonar por Christopher ? Então eu poderia muito bem sair com Xavier Rushton. Com certeza estaria muito mais feliz e realizada, hoje.

Anahí deu de ombros. Sua amiga nunca aceitaria, mas não podia culpá-la. Se estivesse no lugar dela, também seria incapaz de crer numa história tão fantástica e absurda.

O problema era que precisava convencê-la.  Dulce era a única pessoa a quem poderia confiar uma experiência divina como aquela.

— Quem sabe? Talvez se você arruinar sua vida do jeito co­mo fui capaz de fazer com a minha consiga uma nova chance de presente.

 Dulce fitou o teto, fazendo uma careta divertida.

— Ah, isso seria sensacional! Mas posso garantir que tudo não passou de um sonho.

—Nada disso, Dulce . E juro por tudo o que há de mais sagrado que não estou maluca. Juro por meus filhos, por minha família, que é o que há de mais precioso e sagrado para mim. E não sonhei com todas essas coisas horrorosas que foram meu destino. Elas aconteceram.

As duas pararam de conversar por um momento quando o gar­çom chegou à mesa com o almoço, o "prato do dia", como as duas tinham pedido. O rapaz se afastou, mas Laura nem ao menos tocou na refeição, e continuou a falar:

— Havia uma senhora doente na cama ao lado da minha, no Centro Médico, chamada Grace. Era uma mulher bondosa, falante e que, por alguma razão, parecia muito interessada em mim. Grace me perguntou se gostaria de voltar no tempo, se pudesse. Apesar de eu não ter lhe dado a mínima confiança ou incentivo para con­tinuar com aquela conversa sem nexo, Grace continuou perguntando-me a mesma coisa repetidas vezes. E aqui estou.

Anahí suspirou fundo.

— Destruí a vida de cada pessoa que eu mais amava neste mun­do, mas não tornarei a fazer isso — finalizou, com ferocidade.

Dulce estudava cada nuance do rosto de sua amiga.

— Você acredita mesmo em tudo isso, não é?

— De corpo e alma e com todo meu coração. E não pense, nem por um segundo, que não tenho consciência de que pareço louca. Não sei se teria acreditado se você viesse a mim com esse mesmo tipo de história. É bem provável que não. Mas eu tinha de contar para alguém. Precisava, entende?

 Dulce fez que sim, sem parar de analisá-la.

— Tem alguma idéia do que significa ver Afonso  vivo outra vez?

 — Anahí ajeitou os cabelos. — Tê-lo a meu lado, em carne e osso, poder tocá-lo, senti-lo jovem, bonito e forte, embora um pouco amargo e cruel.

Ela deu de ombros, como que afastando o último pensamento.

— E ter meus filhos de novo, ainda me respeitando e me aman­do? Meu Deus, não imagina que sensação maravilhosa foi reen­contrar Mia pequenina, me dando abraços e beijos e dizendo que me ama! —Anahí fez força para engolir, tentando desfazer o nó que se formava em sua garganta, ameaçando transformar-se em lágrimas.

—  Ou isso é mesmo um milagre ou você teve o sonho mais alucinante de que já ouvi falar desde que nasci — murmurou Dulce , carinhosa.

— Juro que desejaria que tudo isso não tivesse passado de um sonho. —Anahí conteve um soluço. — Se eu pudesse escolher, é claro.

Dulce esboçou um sorriso fraco.

— Então, o que tem de fazer agora? Quero dizer, você recebeu alguma instrução a respeito ou algo assim?

Anahí riu e zombou:

— Sim, Deus pronunciou cada uma das palavras em meu ou­vido.

— Abanou a mão. — Não, não recebi nenhum tipo de es­clarecimento e nem mesmo uma simples explicação do porquê de ter voltado. E não sei o que farei. Nem imagino por onde começar. Tudo o que sei é que, em oito dias, Alfonso vai passar as minhas mãos aqueles documentos do divórcio, e não posso deixar que isso aconteça. Ele não me ama mais, e por conseqüência não estou certa de poder impedir que os acontecimentos tornem a ocorrer. Eu não o via há vinte anos. Ele estava morto, lembra?

Dulce tapou a boca, num gesto que mostrava como estava horrorizada.

— Isso é muito estranho,Anahí . Eu, na verdade, começo a crer em você. Só espero que isso não me leve à loucura também.

— Não. Você só acredita em mim, porque é uma boa amiga. Uma amiga esplêndida, melhor dizendo. E talvez porque já esteja embriagada o bastante — brincou Anahí , vendo que a amiga já atacava o terceiro ou quarto Martini e também não tocara na comida.

Dulce achou graça. Então surgiu em seu belo rosto uma ex­pressão de verdadeiro espanto.

Isso significa que você não está mais bebendo?