Fanfic: LIÇÃO DE VIDA AYA finalizada

Capítulo VII

18 de dezembro

De vez em quando, ou melhor, pelo menos uma vez por dia, para maior precisão, Alfonso pegava a papelada do divórcio que solicitara a seu advogado que preparasse e lia aquele conjunto de palavras que desmanchariam seu casamento para sempre.

Termos frios, factuais, sem emoção, mas que colocariam um ponto final em algo que, um dia, tinha sido maravilhoso e que ele chegara a acreditar que jamais terminaria. Contudo, agora estava mesmo terminado. Não havia outra solução.

Ele e  Anahí eram muito jovens quando se apaixonaram e se casaram, embora, naquela época, nenhum dos dois pensasse assim. Em vez disso, sentiam-se prontos, preparados e ansiosos para en­frentar o mundo, ter filhos e construir uma linda família.

Sonhavam com as mesmas coisas, tinham os mesmos ideais, as mesmas ambições, e foram felicíssimos por um longo tempo. A felicidade de ambos era algo tão transparente que as pessoas costumavam observá-los e comentar, com uma ponta de inveja, o quanto era difícil ver um casal tão bem e realizado.

Alfonso e Anahí sempre se divertiam juntos, riam um do outro, elogiavam-se sem cessar. Nas festas ou eventos sociais de qualquer tipo, ele preferia a companhia da esposa, e ela a do marido.

Não eram inconvenientes, pois não davam muitas demonstra­ções do carinho físico em público, mas estavam sempre juntos, e a alegria dos dois era evidente e contagiante.

Com os filhos ainda bem pequenos eram amorosos e dividiam todas as tarefas, desde a alimentação mais básica até os cuidados com as doenças infantis mais graves. Eles saíam com as crianças, faziam piqueniques, iam a parques de diversão e viajavam com freqüência.

Em casa, também compartilhavam tarefas domésticas, e Anahí o esperava chegar do trabalho todos os dias com um sorriso no rosto e os braços abertos para recebê-lo. Uma incrível paz reinava em seu lar, e  Alfonso e Anahí se sentiam contentes, radiantes por terem encontrado sua alma gêmea na estrada da vida.

Ele tinha saudade daquilo. Sentia falta do viver harmonioso de que desfrutavam.

Sentia saudade de Anahí. Da mulher incrível e carinhosa que ela costumava ser antes de ter entrado em depressão. Não era ape­nas da parte física do casamento deles que Alfonso sentia falta, do sexo, que fora fantástico e que tinha, na prática, terminado dois anos antes, mas também, do lado emocional do relacionamento.

Fazia agora muito tempo que ele não ouvia o som rouco e de­licioso da risada de sua mulher. Muito tempo inclusive que não a via nem mesmo sorrir... pelo menos não para ele.

Sim, verdade que Anahí estava mais dócil nos últimos dias e parecia querer reconciliar-se com ele, mas mantinha uma certa postura reservada a seu lado e sorria mais para as crianças.

Entretanto, pensou Alfonso, ele também não estava lhe dando abertura para que se aproximasse. Seu grande pavor era abrir-se e alimentar uma falsa ilusão.

Eram duas horas da manhã, e Alfonso, sentado na cama do quarto de hóspedes, onde vinha dormindo pelos últimos dois anos, con­tinuava com a papelada do divórcio espalhada sobre o colo.

Pela primeira vez, desde que terminara aquela época feliz, de­sejou estar dormindo com sua esposa. Aquela constatação o atingia na alma e o estava pondo maluco.

Por que de repente voltara a sentir desejo por ela? Não encon­trou resposta. Porém, o fato era que tinha saudade dela. Como seria bom ter consigo a mulher que Anahí fora um dia, tão alegre, amá­vel, cúmplice e companheira! E, a menos que estivesse tomado pelo tolo espírito natalino, a Anahí que vira aquela noite era a mesma com a qual se casara.

"Não foi culpa minha."

“Aquela” frase parecia uma brincadeira. Alfonso vinha dizendo aquilo a  Anahí pelos últimos dois anos, e toda vez, ela respondia: "Eu sei que não foi". Todavia, naquela noite, pela primeira vez, Anahí falara a mesma frase, só que acreditando no que estava dizendo.

Alfonso enxergara isso nos olhos dela. As primeiras semanas após - eles terem perdido o bebê foram um verdadeiro pesadelo. Os dois ficaram confusos e sem rumo, cada mergulhado demais na própria tristeza para ajudarem-se mutuamente.