Fanfics Brasil - PRÓLOGO Não Conte a Ninguém...(Vondy)

Fanfic: Não Conte a Ninguém...(Vondy) | Tema: Vondy


Capítulo: PRÓLOGO

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Prólogo


 


Fevereiro de 1077,


Inglaterra, próximo da fronteira do País de Gales


 


— Ela vai me encilhar como a um cavalo.


— Meu senhor?!


Christopher Uckerman, barão de Crane, olhou para seu pri­meiro soldado e notou-lhe a expressão de curiosidade. Os dois tinham parado no topo de um promontório rochoso onde um riacho, vindo da floresta atrás, jogava as águas no gelado Wye abaixo. A noite de inverno, em sua quietude, parecia congelada. Enquanto os dois descansavam as montarias, observavam as colinas sombreadas na fron­teira do País de Gales.


Não haveria ataques de surpresa essa noite, Christopher tinha certeza. Nem o mais sanguinário se atreveria a en­frentar as garras geladas do Wye. A divisa de William, bem como as suas, estavam seguras. Pelo menos de inva­sores estrangeiros.


Ao lado dele, Randall limpou a garganta.


— Quem o encilharia?


Christopher não conteve um suspiro de desânimo.


— Minha noiva, claro.


Como Majesty já houvesse matado a sede, Christopher o ins­tigou a partir.


— Sua noiva? — o homem loiro indagou ao emparelhar a montaria à de Christopher a fim de seguirem pela trilha rochosa.


— Isso mesmo, Randall, minha noiva.


Nicholas não tinha planejado contar o motivo da via­gem à vila de Obny antes de o fato se consumar. E não sabia o que o instigara a revelar os pensamentos sombrios, mas, depois de tê-lo feito, sentia-se menos deprimi­do quanto à tarefa que havia se imposto. De qualquer forma, a visita não passava de mera formalidade, a aten­ção para com um velho amigo. Como barão, Christopher tinha o direito de escolher a noiva.


— Após ouvir o relatório de lorde Handaar, eu o infor­marei de minha decisão de me casar com sua filha.


A gargalhada de Randall ecoou no céu negro.


— Por Deus, o frio maldito deve ter congelado meus ouvidos, senhor, pois acho que o entendi mal. Parece que o ouvi dizer que pretende se casar!


As palavras de Randall feriram o orgulho de Christopher, mas ele se controlou. Se qualquer outro homem tivesse ousado rir de sua decisão, já estaria caído no chão com a ponta da espada na garganta.


— Você ouviu corretamente. De tanto me importunar, minha mãe conseguiu me convencer de que devo provi­denciar um herdeiro para o baronato.


— Bem, isso era inevitável, meu senhor. E que melhor escolha haveria a não ser a de lady Evelyn?


Nick ouviu um ruído suave seguido por o de uma rolha. Um segundo depois, Randall encostava um frasco de cou­ro em seu ombro.


— Então, um brinde à próxima baronesa de Crane.


Christopher pegou o frasco e tomou um longo gole. A bebida forte desceu pela garganta, provocando um calor aben­çoado. Devolveu o frasco a Randall que prosseguiu:


— O senhor deve se sentir aliviado por se casar com uma dama tão sua amiga como lady Evelyn. Alguns só conhecem a esposa no dia do casamento.


Christopher apenas resmungou algo.


— Os dois já conviveram bastante, têm as mesmas idéias e se dão bem. Não vejo que diferença fará se ela se tornar sua esposa. Exceto que compartilhará Hartmoore com o senhor. E sua cama, claro. Mas duvido que isso seja muito inconveniente.


Christopher manteve-se calado e Randall continuou:


— Ela é bem bonita com aqueles cabelos ondulados, pele alva. Isso sem mencionar os fartos sei...


— Chega! — Christopher protestou.


A trilha tinha alargado numa saliência arenosa de onde se via Obny logo abaixo e que encerrava seu futuro, de­sejado ou não. Ele parou a montaria a fim de observar a vila fronteiriça.


— Não existe mal algum, mental ou físico, em lady Evelyn. Ela é a companheira ideal para mim. Na verdade, eu não aceitaria outra.


O sorriso de Randall desapareceu.


— Então por que a irritação, meu senhor?


— Porque uma esposa é uma algema. Isso é culpa de meu irmão. Se Tristan não estivesse tão feliz, minha mãe teria deixado eu decidir a hora de me casar. Agora, tenho de apaziguá-la.


— Lady Haith não parece ter algemado lorde Tristan. Ele...


Christopher abanou a mão para interrompê-lo.


— Não se iluda, meu amigo. Ele está tão preso quanto qualquer animal de carga. Algemado Christopher afirmou, rindo.


De repente, desmontou Majesty, subiu um barranco íngreme e contemplou o vale sombreado pela noite. Ele, por Deus, não se deixaria algemar. Abriu os braços e gri­tou para que todos lá embaixo pudessem ouvi-lo:


— Eu, Christopher Uckerman presto contas somente a Deus e ao rei William! Mulher alguma me controlará! Juro!


As palavras ecoaram pelo vale e morreram. Christopher sentiu a alma lavada e, mais uma vez, disposto a enfren­tar a decisão tomada. O casamento não o mudaria, para melhor ou pior. Era o barão de Crane e todos em sua vasta propriedade se curvariam a sua vontade.


A passos largos, subiu o barranco e observou a testa franzida de Randall.


— Sente-se melhor agora? — o soldado lhe perguntou.


— Muito. Estou pronto a dar as boas novas a lorde Handaar, ou seja, que escolhi sua filha para ser minha esposa — Christopher respondeu ao montar Majesty e insti­gá-lo rumo à vila fronteiriça.


Christopher! E muito bom vê-lo novamente, filho — Handaar afirmou ao levantar-se da cadeira ao lado da lareira.


Curvou-se à aproximação de Christopher e, embora o sor­riso fosse sincero, o homem idoso parecia ter envelhecido muito desde a última vez em que os dois haviam se en­contrado.


Abraçaram-se como velhos amigos e, assim de perto, Christopher notou as novas rugas e os cabelos brancos mais ralos ainda.


— Assim como revê-lo, meu amigo. Como está tudo em Obny?


— Bem. A fronteira continua calma e minhas sentinelas não relataram sinais de invasões. Sente-se, por favor — Handaar convidou, apontando para a outra cadeira ao lado da lareira.


Christopher sentou-se e observou a mesinha entre os dois na qual havia uma garrafa e duas taças. A que estava perto do velho homem tinha vinho pela metade e a outra estava vazia. Christopher sabia tratar-se de um ritual em que Handaar e a filha única compartilhavam uma taça de vinho à noite enquanto conversavam sobre os eventos do dia.


Ao notar-lhe o olhar para a garrafa, Handaar serviu vinho na taça vazia e a passou a Christopher.


— Para aquecê-lo da jornada pelo vento frio.


— Obrigado — Christopher agradeceu e esvaziou a taça. Foi servido de nova dose e, antes de prová-la, comentou:


— Creio que Lady Evelyn ficará aborrecida por eu me apossar de sua cadeira e de sua taça.


Christopher pensou ter visto Handaar estremecer antes de falar.


— Evelyn não me fará companhia esta noite.


— Espero que ela não esteja doente.


— Não, esse não é o caso.


 — Ainda bem. Quero conversar com ela esta noite caso seja possível. Não mandei um mensageiro avisar minha visita porque queria surpreendê-la. Mas devia ter feito isso.


Com o olhar nas chamas da lareira, Handaar balançou a cabeça.


— Não teria adiantado. Dois dias atrás, Evelyn me fa­lou que você viria — ele explicou, ao fitar Nick.


— Ela disse? Mas como...


— Você sabe tanto quanto eu que Evelyn sempre pos­suiu o dom estranho de prever certos eventos. Assim como parece saber o que os animais pensam.


Christopher riu embora estranhasse o comportamento de Handaar. Havia algo errado na fortaleza de Obny.


— O senhor está certo. Se eu não soubesse, apostaria que Evelyn seria capaz de chamar Majesty para cá a fim de contar com minha presença também. Às vezes suspeito que ela gosta mais de minha montaria do que de mim.


— Evelyn gosta muito de você, Christopher — Handaar afirmou.


Christopher estranhou o tom sério do velho amigo, mas achou que esse era um momento tão bom quanto qualquer outro.


— Lorde Handaar, eu...


Foi interrompido pelo movimento abrupto dele ao se levantar e ir ficar de frente para a lareira.


— Como vão seu irmão e a esposa?


— Muito bem. Eles já têm uma filhinha, Isabella. Mi­nha mãe voltou recentemente de Greanly com a notícia sobre a prosperidade da vila de Tristan.


Handaar assentiu com um gesto de cabeça, mas não se virou.


— Então, a baronesa deve estar muito satisfeita.


— Sem dúvida. Linda e autoritária como sempre, não pára de me importunar.


Calado, Handaar não riu do gracejo. Christopher pôs a taça na mesinha e inclinou-se para a frente, os braços firmados nas coxas.


— A importunação de minha mãe tem relevância em minha visita a Obny esta noite. Lorde Handaar, preciso ter uma conversa séria com o senhor.


— Não, Christopher. Impaciente, Nick insistiu:


— Por favor, meu amigo, me ouça. Não é um assunto que eu trataria levianamente e acho que vai agradá-lo.


Handaar suspirou e concordou num tom de profunda tristeza:


— Então, diga o que quer.


— Desde a morte de meu pai, venho me dando conta de meus deveres. Apesar de me defender das importunações de minha mãe, sei que, para a descendência de meu pai continuar, preciso me casar, pois sou o último Uckerman.


Fez uma pausa e limpou a garganta antes de pros­seguir:


— Conheço lady Evelyn desde que ela nasceu. O senhor era como um irmão de meu pai e é um segundo pai para mim. A baronesa ama Evelyn como se fosse sua filha e eu também a amo. — Com o coração disparado, Christopher res­pirou fundo. — Como minha esposa, Evelyn não sentirá falta de nada, juro.


— Isso será impossível — Handaar afirmou numa voz grave e baixa.


Christopher esperava a objeção e estava preparado. Levantou-se.


— Sei que ela foi prometida ao convento, mas, lorde Handaar, conseguirei sua liberdade. Pagarei seu dote à abadessa para que ela possa se casar.


Como não obtivesse resposta, Christopher temeu explodir de frustração.


— O senhor não entendeu? Ela não precisa jogar a vida fora ao entrar para a ordem. Admita que detesta se se­parar de sua única filha para sempre e isso poderá ser evitado. Ela ficará perto pelo resto de seus dias e ao lado de quem o senhor alega querer como filho. Nosso casa­mento só faz sentido — Christopher declarou, confiante na lógica dos argumentos.


— Fiz um juramento a Fiona e lhe suplico, Christopher, a não tocar mais nesse assunto — Handaar pediu.


— A mãe de Evelyn está morta — Christopher disse com sua­vidade. — Não acha que se ainda vivesse e visse a união feliz que sua filha e eu faríamos, ela nos abençoaria?


— Talvez — Handaar murmurou. — Mas não importa. Como eu já disse, isso será impossível.


Como nunca antes tinha acontecido, Christopher sentiu a raiva crescer contra o velho guerreiro.


— Não é impossível. Como barão, é meu dever cuidar do bem-estar de meu povo e não permitirei que Evelyn desperdice a vida num convento se poderá viver com con­forto entre parentes e amigos.


Aproximou-se das costas de Handaar. As palavras se­guintes seriam difíceis de expressar ao velho guerreiro, mas Christopher sentia que sua autoridade tinha de ser respei­tada. Numa voz firme, disse:


— Lorde Handaar, como barão tenho o direito de esco­lher com quem me casar e não há nada que o senhor possa fazer para me forçar a mudar de idéia. — Tocou-o nos ombros curvados. — Fiona entenderia, tenho certeza. Ago­ra, vamos procurar lady Evelyn e lhe dar as boas novas.


Handaar virou-se de frente e Christopher perturbou-se ao ver as faces enrugadas marcadas por lágrimas. Numa voz for­çada, o velho guerreiro informou:


— Evelyn já se foi, Christopher.


Como se tivesse recebido um golpe físico, Christopher recuou.


— O que o senhor quer dizer?


— Ela foi para o convento dois dias atrás quando previu sua chegada — Handaar respondeu enquanto passava a mão pelo rosto.


Petrificado, Christopher voltou a sentar-se.


— Mas por que ela se foi se achava que eu viria? Não fomos sempre amigos?


— Esse é o verdadeiro motivo. Apesar de suas insinua­ções sutis, Evelyn sabia que você a pediria em casamento — Handaar respondeu e também voltou a sentar-se.


— Então... ela sabia? Preferiu o convento a mim? — Christopher perguntou, confuso.


Viu a expressão de simpatia de Handaar e sentiu que a própria era de perplexidade.


— Ela não queria se casar e lhe dar os filhos que, sabia, você haveria de querer. Evelyn assumiu o juramento que fiz a Fiona.


Christopher apertou tanto os dentes que temeu quebrá-los.


— Então, ela é egoísta e tola. Não existe razão para pensar que seu destino seria igual ao de Fiona que morreu ao dar à luz. Ela jogou fora a vida e me abandonou.


— Em seu coração, ela achava que o estava libertando.


— A mim? Com que propósito? A fim de me forçar a casar com uma estranha? A nossa seria uma união de amizade e confiança. Imperdoável ela me virar as costas. Jamais gostou de mim.


— Evelyn o ama muito, Christopher.


— Não! Impossível tratar uma pessoa a quem se alega amar dessa maneira, com decepção.


— Eu disse que ela o ama e não que está apaixonada por você. Existe uma diferença.


— Amor, paixão, o que importa?


— Talvez aí esteja o cerne de sua resolução, ou seja, dar-lhe a oportunidade de descobrir o quanto isso importa.


Christopher fitou o velho homem por vários momentos. Havia revelado a intenção de se casar com Evelyn à mãe, ao irmão e até a seu primeiro soldado. O que pensariam a seu respeito ao saberem que a moça, a quem ele conhecia desde pequenina, tinha preferido o convento em vez de aceitá-lo como marido?


Nunca havia sentido tamanha humilhação nesse lugar que lhe era tão familiar quanto sua própria casa. Como não suportasse continuar sentado ali, levantou-se.


— Muito bem então. Boa noite, lorde Handaar — des­pediu-se ao rumar para a porta.


Christopher, filho, não vamos nos separar dessa maneira rude. Passe a noite em Obny. Se me fosse possível, eu lhe pouparia essa mágoa, mas nem eu consigo suportá-la.


Ao ouvi-lo, Nick parou.


— Por favor, Christopher, não me resta mais ninguém.


A súplica o fez virar-se. Quando viu os ombros do velho guerreiro curvados sob o peso dos anos e do sofrimento, o coração de Christopher confrangeu-se. Retrocedeu e abraçou Handaar que tremia.


— Ah, Christopher, já sinto tanta falta dela.


— Perdoe minha insensibilidade, velho amigo. Jamais quis aumentar sua tristeza. Mas não posso ficar aqui onde cada pedra provoca lembranças de Evelyn.


Handaar segurou-o pelos braços e afastou-se um pouco para fitá-lo. Ao falar, foi numa voz rouca:


— É claro que o perdôo. Mas tenho esperança de que você não fique longe de Obny para sempre.


— Voltarei — Christopher prometeu.


Handaar o soltou e manteve as mãos enormes e nodosas no ar por um instante como se relutasse em deixá-lo ir. Christopher viu que tremiam.


— Boa jornada, meu filho. Vá com Deus.


Após um último abraço, Christopher foi embora, deixando Handaar com apenas os fantasmas da esposa e da filha por companhia.


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  • dulcezita Postado em 06/11/2011 - 22:06:15

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  • dulcezita Postado em 06/11/2011 - 22:06:14

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  • kmusica Postado em 06/11/2011 - 21:29:40

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