Fanfics Brasil - CAPITULO XV •■•Um Reino de Sonhos•■• D&C

Fanfic: •■•Um Reino de Sonhos•■• D&C


Capítulo: CAPITULO XV

21 visualizações Denunciar


Dul se achava a sós na ameia do castelo, olhando em direção às restingas, enquanto o vento brincava com seus cabelos. Com a esperança de que o «noivo» não fosse ao casamento, previsto para dentro de duas horas, perdeu a esperança minutos antes, quando um guarda do castelo foi lhe informar que cavaleiros se aproximavam. Cento e cinqüenta cavalheiros montados cavalgavam para a ponte levadiça, e a luz do sol poente se refletia sobre seus brilhantes escudos, transformando-os em reluzente ouro. Os estandartes com a figura do lobo ondulavam sinistros diante de seus próprios olhos.

Com a mesma ausência de emoções que experimentava há cinco dias, permaneceu onde estava observando os cavalheiros se aproximarem do portão do castelo. Observou de repente que havia mulheres entre eles, e uns poucos estandartes diferentes dos do Lobo. Haviam-lhe dito que na cerimônia dessa noite estariam presentesm alguns nobres ingleses, mas não esperava que houvesse mulheres. A contra gosto, dirigiu o olhar para o homem de ombros largos que cavalgava na frente do grupo, com a cabeça nua e sem escudo nem espada, no lombo de um grande alazão negro de abundantes crinas que só podia ter sido gerado pelo Thor. Ao lado de Christopher cavalgava Arik, também com a cabeça descoberta e sem armadura, e Dul supôs que era sua forma de indicar seu desprezo por qualquer intenção do clã Merrick de fazer uma emboscada.

À distância, Dul não distinguiu bem o rosto de Christopher Westmoreland, mas enquanto esperava que fizessem descer a ponte levadiça, quase pôde sentir sua impaciência.

Como se tivesse percebido que ela o observava, Christopher levantou de repente a cabeça, percorreu com o olhar as ameias do castelo e ela, sem ter a intenção de fazer, apertou-se contra o muro para esconder-se da sua vista. Deu-se conta com asco de que a primeira emoção que experimentava depois de cinco dias era temor. Endireitou os ombros, voltou-se e entrou no castelo.

Duas horas mais tarde, Dul se contemplou no espelho. A sensação de agradável insensibilidade que terminou nas ameias, tinha sido substituída por uma forte emoção. Mas o rosto que aparecia agora refletido no espelho não era mais que uma máscara pálida sem emoção alguma.

-Não será tão terrível como pensa Dul - disse-lhe Angel, que fazia todo o possível para lhe animar enquanto ajudava duas criadas a endireitar a cauda do vestido. -Tudo terá terminado em menos de uma hora.

-Se ao menos o matrimônio pudesse ser tão curto como as bodas - disse Dul, abatida.

-Sir Diego está lá embaixo, no salão. Eu mesma o vi. Não permitirá que o duque faça nada que lhe envergonhe. É um cavalheiro forte e honrado.

Dul se voltou e estudou o rosto de sua irmã com um sorriso triste e enigmático.

-Angel, falamos do mesmo «honrado cavalheiro» que nos seqüestrou?

-Bom -replicou Angel, na defensiva, - ao menos não tentou estabelecer nenhum contato imoral comigo, o que não pode se dizer de seu irmão.

-Isso é verdade - admitiu Dul, completamente distraída no momento de seus problemas. -Entretanto, esta noite eu não contaria com sua boa vontade. Não me resta a menor duvida de que desejará torcer o seu pescoço assim que a veja, porque agora sabe que o enganou.

-OH, mas não é assim como se sente! -exclamou Angel. -Disse-me que foi um plano muito atrevido e engenhoso o que eu empreguei para escapar. -A contra gosto acrescentou: - Só mais tarde acrescentou que desejava me torcer o pescoço por isso. Além disso, não foi a ele quem enganei e sim o seu malvado irmão.

-Já falou com Sir Diego? -perguntou Dul atônita.

Angel nunca tinha demonstrado o menor interesse por nenhum dos jovens que a tinham cortejado durante os três últimos anos; agora, entretanto, encontrava-se em segredo com o último homem do mundo com quem seu pai lhe permitiria se casar.

-Consegui falar poucas palavras com ele no salão, quando me aproximei do Christian para lhe fazer uma pergunta - confessou Angel ruborizada. A seguir pareceu concentrar toda sua atenção em endireitar a manga de seu vestido de veludo vermelho. Por fim, inclinando a cabeça, acrescentou: - Dul, agora que vai haver paz entre nossos países, talvez consiga te enviar mensagens com freqüência. E, se incluir nelas alguma para sir Diego, se encarregaria de que ele recebesse?

Dul se sentiu como se, de repente, o mundo virasse ao contrario.

-Se está convencida de que isso é o que deseja, sim farei. Devo incluir também as mensagens de sir Diego entre as que eu enviar a você? -perguntou reprimindo uma risada que se devia em parte pela histeria e em parte pela consternação, ao compreender a delicada situação em que se encontrava sua irmã.

-Sir Diego sugeriu precisamente isso - respondeu Angel, com um amplo sorriso.

-Eu... -começou a dizer Dul.

Mas a porta de seu quarto se abriu de repente e uma senhora diminuta se deteve na entrada. Vestia um vestido já fora de moda, mas encantador de cetim cinza guarnecido de pele de coelho e um antiquado tocado de gaze branca que rodeava completamente o pescoço e parte do queixo, além de um véu prateado pendurado atrás dos ombros. Tia Elinor olhou primeiro uma moça e depois à outra, sorriu, confusa.

-Sei que você é a pequena Angel - disse dirigindo-se a Angel, e depois, voltando-se para Dul acrescentou: - mas, pode ser esta linda criatura minha pequena e feia Dul?

Contemplou com assombrada admiração à noiva que estava de pé diante dela, com um vestido de veludo creme e cetim, com um decote baixo e quadrado, de cintura alta e mangas longas e cavadas, recobertas dos cotovelos aos punhos de pérolas, rubis e diamantes. Uma magnífica capa de cetim, forrada de veludo e coberta também com pérolas, estava presa nos ombros de Dul com um par de magníficos broches de ouro engastados de pérolas, rubis e diamantes. O cabelo caía sobre os ombros e reluzia como o ouro ressaltando os rubis que usava.

-Veludo de cor creme... -disse tia Elinor com um sorriso, antes de abrir os braços. -É muito pouco prático, meu amor, mas está linda. Quase tanto como você...

Dul correu ao seu encontro para abraçá-la.

-OH, tia Elinor, sinto-me tão feliz de lhe ver. Temia que não pudesse vir.

Bateram na porta, Angel abriu e se voltou para Dul. Suas palavras abafaram bruscamente a demonstração de afeto de sua meia-irmã.

-Dul, nosso pai deseja que desça agora mesmo. Os documentos já estão preparados para serem assinados.

Um terror quase incontrolável se apoderou de Dul lhe provocando náuseas e afugentando toda cor de seu rosto. Tia Elinor tomou à noiva pelo braço em um evidente esforço por distraí-la e impedir que pensasse no que lhe aguardava. Conduziu-a para a porta, enquanto não deixava de falar sobre a cena que a esperava no salão.

-Não poderá acreditar em seus olhos quando vir o quanto está cheio o salão - disse erroneamente convencida de que a presença de uma multidão diminuiria o temor de Dul em enfrentar seu futuro esposo. -Seu pai posicionou cem homens armados no lado do salão, e ele... -o tom que utilizou deixou bem às claro que «ele» não podia ser outro senão o Lobo Negro - conta com outros tantos de seus próprios cavalheiros situados do outro lado do salão vigiando nossos homens.

Dul percorreu lentamente o longo corredor, e cada passo lento que dava tinha a sensação de ser o último.

-Parece que vão celebrar uma batalha em vez de um casamento - sussurrou.

-Bom, sim, mas não é. Não exatamente. Lá embaixo há mais nobres que cavalheiros. O rei Jacob deve ter enviado metade de sua corte e também estão presentesm os chefes dos clãs próximos.

Dul continuou avançando pelo comprido e escuro corredor.

- Os vi chegar esta manhã.

-Sim, bem, o fato é que o rei Henrique quis que isto parecesse uma ocasião especial, digna de ser celebrada, pois também estão presentes todos os tipos de nobres ingleses, e uns poucos deles vieram inclusive na companhia de suas esposas. É algo maravilhoso de ver..., os escoceses e os ingleses, todos vestidos com seus melhores ornamentos de veludo e cetim, reunidos, juntos...

Dul se voltou e iniciou a curta descida dos altos degraus de pedra que conduziam ao salão.

-Tudo parece muito silencioso aí abaixo - comentou com voz tremula ao perceber vozes masculinas que pretendiam soar joviais, alguns pigarros, a risada nervosa de uma mulher..., e nada mais. -O que todos estão fazendo?

-Não fazem mais que se olharem friamente -respondeu alegremente tia Elinor, - ou fingem não se dar conta de que a outra metade do salão também está cheia de gente.

Dul se dispôs a descer pelo último lance de escadas, mas antes se deteve por um instante para preparar-se, mordeu o lábio inferior para controlar seu tremor e depois levantou a cabeça desafiante, levantou o queixo e desceu os últimos degraus.

Um murmúrio detestável se estendeu pelo salão quando Dulce apareceu diante da vista de todos os convidados, e o espetáculo que seus olhos contemplaram foi de tão mau presságio como o silêncio que reinava. As tochas acesas nas paredes jogavam sua luz sobre os espectadores, de olhares fixos e hostis. Homens armados montavam guarda junto à parede. As damas e lordes estavam de pé um ao lado do outro, os ingleses de um lado do salão e os escoceses do outro, exatamente como havia lhe dito tia Elinor.

Mas não foram os convidados que fez com que Dul começassem a tremer os joelhos, e sim a alta figura que permanecia erguida e altiva no centro do salão, observando-a com olhos abrasadores. Olhava para ela, como um espectro do mal, vestido com uma capa de cor vinho debruada de pele de Marta, e emanava dele uma ira tão poderosa que até seus próprios compatriotas procuravam se manterem afastados.

O pai de Dulce se adiantou para tomá-la pela mão, com um guarda em cada lado, mas o Lobo não se moveu de onde estava. Onipotente e depreciativo diante do seu insignificante inimigo ironizava abertamente da necessidade de se proteger diante dele. O pai de Dul fez com que ela o tomasse pelo braço e a conduziu pelo largo caminho que cruzava o grande salão separando os escoceses dos ingleses, que agora retrocediam à medida que eles avançavam. À direita de Dul estavam os escoceses, com seus rostos severos e orgulhosos, olhando-a com expressão de cólera e simpatia ao mesmo tempo; à esquerda se achavam os altivos ingleses que a olhavam com fria hostilidade. E na frente, bloqueando seu caminho, estava à sinistra figura de seu futuro esposo, com a capa arremessada para trás, sobre os largos ombros, os pés ligeiramente separados, os braços cruzados sobre o peito e olhando-a como se ela se tratasse de uma criatura repulsiva que se aproximasse arrastando-se pelo chão.

Incapaz de suportar aquele olhar, Dul centrou o seu sobre um ponto indeterminável, situado justamente por cima do ombro esquerdo de Christopher, e se perguntou, um tanto desconcertada, se ele se afastaria para o lado para deixá-los passar. O coração batia loucamente. Agarrou-se ao braço de seu pai, mas o Lobo se negou a mover um só milímetro, e obrigou deliberadamente Dul e seu pai a fazer um pequeno desvio. Dul sentiu que aquilo não representava mais que o primeiro indício do desprezo com que a trataria a partir desse momento, tanto em público como em particular, e durante o resto de sua vida.

Felizmente, dispôs de pouco tempo para pensar nisso, porque um novo horror a esperava: a assinatura do contrato matrimonial. O documento estava estendido sobre uma mesa, ladeado por dois homens, um deles o emissário da corte do rei Jacob, e o outro o emissário da corte do rei Henrique, ambos presentess para atuar como testemunhas do ato.

Ao chegar diante da mesa, o conde de Merrick se deteve e soltou a suada mão de sua filha, que tinha contado com seu apoio para manter-se em pé.

-O bárbaro já assinou - anunciou com voz bem clara e audível.

Diante daquelas palavras, a hostilidade que reinava no salão entre ingleses e escoceses pareceu aumentar por um momento. Com uma gélida expressão de desprezo, Dul contemplou o pergaminho que continha as cláusulas que estabeleciam seu dote, e que a condenavam irremediavelmente para toda a vida, para toda a eternidade, a ser a esposa e a propriedade de um homem que detestava tanto, como ele a ela. Ao pé do documento, o duque de Claymore tinha estampado sua assinatura com traços firmes; era a assinatura de seu seqüestrador, transformado agora em seu carcereiro.

Sobre a mesa, ao lado do pergaminho, havia uma pluma e um tinteiro, e embora Dul fizesse esforços em agarrar a pluma, seus trêmulos dedos se negaram a obedecer. O emissário do rei Jacob se aproximou dela e Dul o olhou com expressão de impotência e ira.

-Milady - disse-lhe com uma ligeira reverência, e com a evidente intenção de demonstrar aos ingleses presentes no salão que Lady Dulce contava com o respeito do próprio rei Jacob, - nosso soberano, o rei Jacob da Escócia, encarregou-me que lhe transmitir suas saudações, e que lhe diga que toda Escócia está em dívida com você por este sacrifício que faz em nome de nossa querida pátria. É uma honra para o grande clã Merrick, e para toda Escócia.

Dul, aturdida, acreditou sentir certa ênfase na palavra «sacrifício». Mas o emissário já tomava a pluma e a entregava.

Como se visse tudo de muito longe, observou como estendia lentamente a mão para a pluma, a pegava e depois assinava o detestável documento. Ao endireitar-se, não pôde afastar o olhar do pergaminho. Transfigurada, olhou fixamente seu próprio nome, escrito com a bela caligrafia que madre Ambrose a tinha feito praticar e aperfeiçoar. A abadia! De repente, não pôde, não quis acreditar que Deus permitisse que tudo isto acontecesse a ela. Certamente, durante todo o tempo passado na abadia de Belkirk, Deus deve ter se dado conta de que era uma mulher piedosa, obediente e devota, ou ao menos tentava ser. «Meu Deus - pediu em silêncio». Por que me fazes isto? Não vai permitir que algo assim aconteça, não é verdade?»

-Damas e cavalheiros, um brinde ao duque de Claymore e sua noiva! -ressonou a voz de Diego Westmoreland, arrancando ecos das paredes de pedra.

«Sua noiva»... Aquelas palavras reverberaram no cérebro de Dul, discordantes com as lembranças que abrigava das semanas passadas. Olhou ao redor com expressão de pânico, sem estar muito certa de saber se a alegria só tinha durado uns poucos segundos ou alguns minutos. E depois começou a rezar de novo: «Peço-lhe, senhor, não permita que isto me aconteça. » mas já era muito tarde. Olhou com assombro como as grandes portas de carvalho se abriam para permitir a entrada no salão do sacerdote que todos esperavam.

-Frei Benedict - anunciou então o conde de Merrick em voz alta, da porta, - acaba de nos anunciar que não se encontra bem.

Dul conteve a respiração por um instante.

-Assim, as bodas não poderão ser celebradas até manhã - acrescentou seu pai.

«Obrigada, Meu Deus!», pensou Dul, e tratou de recuar, de se afastar da mesa, mas o salão começou a girar e horrorizada, se deu conta de que estava a ponto de desmaiar. E a pessoa que se achava mais perto dela era Christopher Westmoreland.

De repente, tia Elinor soltou um grito ao sentir a situação em que se encontrava sua sobrinha. Aproximou-se dela, afastando a cotoveladas os homens de seu clã, e ao término de um instante Dul sentiu um quente abraço e que uma face se apertou contra a sua, uma voz dolorosamente familiar lhe sussurrava ao ouvido:

-Vamos querida, respire profundamente e se sentirá bem em um momento. Sua tia Elinor está aqui e te levará para cima.

Dul recuperou o equilíbrio, e a alegria e o alívio se apoderou dela quando seu pai, dando as costas aos ingleses, anunciou:

-Só será um atraso de um dia. Frei Benedict se encontra ligeiramente indisposto, e o bom homem promete amanhã benzer a cerimônia, por mais doente que se sinta.

Dul se voltou para abandonar o salão em companhia de sua tia, e dirigiu um rápido olhar para seu «prometido» para ver sua reação diante do atraso. Mas o Lobo Negro nem sequer parecia ter-se informado de que ela estava ali. Olhava fixamente o conde de Merrick, e embora sua expressão fosse tão inescrutável como a de uma esfinge, em seus olhos se observava um olhar frio e especulativo. Uma tormenta que tinha ameaçado cair durante todo o dia, desabou freneticamente e um raio cruzou o céu, seguido do sinistro retumbar do trovão.

-Além disso - continuou seu pai sem olhar em nenhum momento os ingleses, situados a sua direita, - a comemoração terá lugar conforme o planejado. -Entendo que o emissário do rei Henrique me disse que a maioria dos súditos dele desejam retornar para Inglaterra a imediatamente, pela manhã; temo que tenham que ficar aqui um dia a mais, visto que nossos caminhos não são adequados para que os ingleses viajem por eles quando cai uma tormenta.

Um murmúrio de vozes brotou de ambos os lados do salão. Fazendo pouco caso dos olhares que lhe dirigiam, Dul cruzou o salão, em companhia de sua tia, em direção às escadas que conduziam ao seu quarto, onde lhe aguardavam a prudência e o consolo. Aquilo significava um alívio temporário.

Uma vez que as pesadas portas de carvalho de seu dormitório se fecharam atrás dela, Dul se voltou para jogar-se nos braços de sua tia Elinor, chorando com alívio.

 -Vamos, vamos, minha pequena - disse-lhe maternalmente a senhora enquanto lhe dava uns tapinhas nas costas e lhe falava com a firmeza. -Quando cheguei não restava a menor duvida de que já tinha abandonado a idéia de que estaria a seu lado, não é verdade?

Dul fez um esforço em reprimir as lágrimas, estreitou a sua tia entre os braços e assentiu docilmente. Desde que seu pai lhe sugeriu que tia Elinor a acompanhasse a Inglaterra, Dul se concentrou nisso como a única alegria que contemplava em seu horizonte tenebroso e terrível.

Tia Elinor tomou entre as palmas das mãos o rosto sulcado de lágrimas de Dulce e prosseguiu com determinação:

-Mas agora estou aqui, e esta manhã falei com seu pai. Estou aqui e a partir de agora não me separarei de seu lado. Não se alegra em saber? Passaremos juntas momentos muito agradáveis. Embora se veja obrigada a se casar com esse inglês e a morar com ele, por pior que seja, juntas nos esqueceremos dele e faremos o que estávamos acostumadas a fazer quando seu pai me mandou para a casa de viúva em Glencarin. Não é que sinta nenhum rancor por seu pai por isso, pois falo muito, embora tenha sido ruim, já que durante muito tempo me vi privada de pessoas queridas com que falar.

Dul a olhou, um pouco confusa devido ao prolongado discurso que sua tia tinha pronunciado quase sem respirar. Sorriu e voltou a abraçar a doce senhora.

Sentada diante da longa mesa, sobre o estrado, sem prestar atenção nos trezentos convidados que comiam e bebiam ao redor, Dul olhava fixamente através do salão, sem ver ninguém. A seu lado, quase lhe roçando com o cotovelo, sentava-se o homem que, com o contrato matrimonial a tinha vinculado quase tão irrevogavelmente como faria a cerimônia formal de casamento que se celebraria no dia seguinte. Durante as duas horas transcorridas desde que se viu obrigada a sentar-se a seu lado, só em três ocasiões tinha percebido seu gélido olhar sobre ela. Era como se ele só esperasse o momento de começar a transformar sua vida em um inferno.

Diante dela se abria um futuro de agressões físicas e verbais, pois nem sequer entre os escoceses era proibido que um marido batesse em sua esposa se lhe parecesse que necessitasse de disciplina ou estímulo. Consciente disso, assim como do temperamento e a reputação do homem frio e colérico que se achava sentado a seu lado, Dul estava convencida de que tinha diante de si uma vida cheia de desgosto. O nó que tinha se formado em sua garganta estava a ponto de cortar sua respiração e, com uma atitude corajosa, tratou de pensar em algo que pudesse contemplar com alegria no tipo de vida que se veria obrigada a levar. Tia Elinor estaria a seu lado. E algum dia, provavelmente logo, tendo em conta o que sabia sobre a natureza sexual de seu marido, teria filhos para amar e cuidar. Filhos. Fechou os olhos por um instante, deixou escapar um suspiro doloroso, e sentiu que se acalmava um pouco. Um bebê para abraçar seria algo que restava esperar com ilusão. Decidiu afastar esse pensamento.

Christopher estendeu a mão para sua taça e lhe dirigiu um olhar de soslaio. Observou com olhava para uma acrobata particularmente bonita que mantinha o equilíbrio sobre as mãos apoiadas em um chão de adagas afiadas, com a saia amarrada sobre os joelhos para impedir que lhe caíssem sobre a cabeça, o que não impedia que suas bem contornadas pernas ficassem descobertas. Do outro lado extremo do salão os bufões efetuavam cambalhotas diante da mesa. Os entretenimentos oferecidos durante a festa, e a prodigalidade deste constituíam a forma que seu pai tinha encontrado de demonstrar ao odiado inglês que os Merrick tinham tanto orgulho como riqueza.

Enojada com a aberta admiração que Christopher demonstrava pela acrobata das pernas bonitas, Dul estendeu a mão para pegar sua taça e fingiu beber um gole antes que suportar as olhadas maliciosas e desdenhosas dos ingleses, que passavam a noite toda lhe dirigindo olhares maliciosos. Apoiando-se nos comentários que tinha escutado, julgavam-na totalmente inadequada.

-Note o cabelo que ela tem - disse uma mulher reprimindo a risada. -Achava que só os cavalos tinham crinas dessa cor.

-Olhem esse rosto altivo - comentou um homem no momento em que Dulce passava ao seu lado, com a cabeça bem alta e um nó no estômago. -Christopher não conseguirá dominá-la. Uma vez que a tenha em Claymore, terá que educá-la a pancadas.

Dul afastou o olhar dos bufões e voltou-se para seu pai, que estava sentado a sua esquerda. Sentiu-se atingida por uma sensação de orgulho ao estudar seu perfil aristocrático. Seu porte era tão digno e nobre... De fato, cada vez que o via sentado no grande salão, disposto a julgar os outros, enquanto prestava atenção nas disputas que surgiam periodicamente entre seu povo, não podia evitar pensar que Deus tinha que parecer-se com ele, sentado em seu trono celestial, para emitir seu julgamento sobre cada uma das almas que eram conduzidas diante da sua presença.

Essa noite, entretanto, seu pai parecia se encontrar-se com um humor estranho, sobre tudo tendo em conta as horríveis circunstâncias nas quais se encontravam. Durante toda a noite, enquanto falava e bebia com os outros chefes dos diversos clãs presentes no salão, parecia preocupado e inquieto e, no entanto, estranhamente contente, como se estivesse se sentindo satisfeito por alguma coisa. Ao notar o olhar de Dulce sobre ele, Lorde Merrick se voltou para ela e seus olhos azuis percorreram seu rosto pálido. Inclinou-se até roçar sua bochecha com a barba e com um tom de voz um pouco alto, mas não o suficiente para que ninguém mais além dela pudesse escutá-lo, disse:

-Não se atormente minha menina. Tenha coragem, que tudo sairá bem.

Para Dul aquele comentário pareceu tão absurdo que não soube se devia rir ou chorar. Ao detectar uma expressão de pânico nos olhos azuis de sua filha, que nesse preciso instante apertava a borda da mesa como se disso dependesse sua vida, o conde apoiou uma cálida mão sobre a dela e sussurrou:

-Confie em mim e tudo se arrumará pela manhã.

Dul se sentiu desconsolada. Pela manhã seria muito tarde. Ela então já estaria unida por toda vida ao homem sentado do seu outro lado, e cuja corpulência fazia que se sentisse frágil e insignificante. Dirigiu um olhar rápido e preocupado a seu prometido, para verificar tardiamente se por acaso não teria conseguido escutar de algum modo às palavras que seu pai acabava de lhe dirigir. Mas ele parecia concentrado em outra coisa. Já não observava acintosamente a linda acrobata, mas sim olhava fixamente para frente.

Com curiosidade, Dul seguiu seu olhar e viu Arik, que nesse momento acabava de entrar novamente no salão. Enquanto Dul observava, o gigante loiro assentiu lentamente com um gesto dirigido para ela, e depois outro dirigido a Christopher. Com a extremidade do olho, Dul viu que seu prometido apertava as mandíbulas e inclinava a cabeça quase imperceptivelmente, para a acrobata. Arik esperou um momento e depois se dirigiu com naturalidade para onde se encontrava Diego, que escutava com visível interesse os gaiteiros.

Dul teve a sensação de que acabavam de intercambiar entre eles algum tipo de informação, e isso fez com que se sentisse muito incomodada, sobre tudo porque as palavras de seu pai ainda ressonavam em sua mente. Estava acontecendo algo, sabia, embora desconhecesse do que podia se tratar. Pelo visto, ali estava se desenvolvendo um jogo mortalmente sério, e se perguntou se por acaso seu futuro dependeria de seu resultado.

Incapaz de suportar o ruído e a espera por mais tempo, Dul decidiu procurar a paz de seu quarto, a fim de saborear na intimidade as poucas razões que tivesse para se sentir esperançosa.

-Pai - disse rapidamente, voltando-se para ele, - solicito sua permissão para me retirar. Desejo desfrutar da paz de meu quarto.

-Certamente, querida - disse ele imediatamente. -desfrutou de muita pouca paz em sua curta vida, e isso é o que mais necessita agora, não é verdade?

Dul vacilou apenas uma fração de segundo, com a sensação de que por trás daquelas palavras talvez se escondesse um duplo significado, mas não conseguiu solucionar, assentiu com um gesto e se levantou. No instante em que ficava de pé, Christopher voltou à cabeça para ela, embora Dul tivesse jurado que em nenhum momento tivesse sentido sua presença.

-Já vai? -perguntou, levantando o insolente olhar para seu decote. Dul ficou petrificada diante da inexplicável fúria de seu olhar quando este subiu finalmente para seu rosto. -Devo lhe acompanhar até seu quarto?

Depois de realizar um autêntico esforço físico, Dul conseguiu ficar de pé e por alguns segundos experimentou o prazer de olhá-lo de acima.

-Certamente que não! -respondeu-lhe. - Minha tia me acompanhará.

-Que olhadas terríveis! -exclamou tia Elinor assim que ambas chegaram ao quarto de Dul. -A forma como esses ingleses a olhavam me faziam desejar expulsá-los do salão, algo que, juro estive a ponto de fazer. Lorde Hastings, o inglês enviado pela odiosa corte do Henrique, passou todo o jantar cochichando com o tipo sentado a sua direita, me ignorando completamente, algo que foi muito pouco educado de sua parte, embora deva admitir que eu não tivesse o menor desejo de falar com ele. Ah, querida, não pretendo aumentar sua carga, mas tem que saber que eu não gosto absolutamente de seu futuro esposo.

Dul, que tinha esquecido o costume de sua tia de falar sem parar, sorriu afetuosamente diante das palavras de desaprovação desta, mas sua mente se achava ocupada por outra questão muito diferente.

-Papai parecia estar com um estranho humor durante o jantar.

-Sempre me pareceu estranho.

-A que se refere?

-Que tem um humor muito estranho.

Dul teve que conter uma risadinha histérica, abandonando qualquer intenção de falar do ocorrido durante a velada troca de palavras, voltou-se para que sua tia a ajudasse a desatar o vestido.

-Seu pai tem a intenção de me enviar de volta a Glencarin - disse tia Elinor.

Dul olhou surpreendida para sua tia e, perguntou:

-Por que diz?

-Porque é isso que tem que ser dito.

Completamente confusa Dul se voltou e tomou sua tia firmemente pelos ombros.

-Tia Elinor, o que foi exatamente que lhe disse meu pai?

-Esta tarde, ao chegar aqui - respondeu sua tia encolhendo os estreitos ombros, - esperava vê-lo zangado por meu atraso, o que teria sido muito injusto, pois não tive culpa de que chovesse tanto. Já sabe que nesta época do ano...

-Tia Elinor... -interrompeu-a Dul com um ousado tom de advertência. -O que lhe disse meu pai?

-Sinto muito, querida. Permaneci tanto tempo sem desfrutar da companhia de outras pessoas com quem conversar... Quero dizer que parece que não consigo me deter. Em Glencarin estava acostumada a ver dois pombos que posavam no batente de minha janela, e nos três conversávamos embora, claro, os pombos tenham pouca coisa que dizer...

Mesmo que se encontrasse no pior momento de sua vida, Dul não pôde evitar sorrir. Rodeou com os braços a assombrada e pequena mulher, ao mesmo tempo em que a risada brotava de seu peito e lágrimas de temor e esgotamento enchiam seus olhos.

-Pobre menina - exclamou tia Elinor ao mesmo tempo em que dava a Dulce carinhosos tapinhas nas costas. -Encontra-se submetida a tanta tensão... E eu não faço mais que aumentá-la com meu falatório. -Fez uma pausa para refletir, e acrescentou: - Bem, vejamos, o fato é que seu pai me disse hoje, durante o jantar, que não devia fazer planos para te acompanhar, embora pudesse ficar para assistir às bodas se assim o desejasse. -Deixou cair os braços e se sentou na cama. -Eu faria qualquer coisa para não ter que retornar a Glencarin. Sinto-me tão só ali...

Dul assentiu com um gesto e pôs uma mão sobre a cabeça de sua tia. Acariciou com suavidade seus cabelos e lembrou os anos não muito longínquos, que sua tia tinha dirigido com eficiência inúmeros servos. Era mais do que injusto que a solidão forçada, sobretudo tendo em conta o avançado de sua idade, tivesse produzido uma mudança tão radical na corajosa mulher.

-Falarei com ele amanhã e verei se consigo fazê-lo mudar de opinião - disse com determinação. Suas emoções se achavam muito alteradas devido às exigências do dia, e o esgotamento começava a se apoderar dela. -Uma vez que compreenda o quanto eu desejo que permaneçam ao meu lado, certamente aceitará, - acrescentou com um suspiro, desejando de repente o consolo e a comodidade do leito.



Compartilhe este capítulo:

Autor(a): nathyneves

Este autor(a) escreve mais 4 Fanfics, você gostaria de conhecê-las?

+ Fanfics do autor(a)



Loading...

Autor(a) ainda não publicou o próximo capítulo



Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 26



Para comentar, você deve estar logado no site.

  • beel Postado em 22/02/2009 - 15:49:56

    VOLTA A POSTAAAAAAAAAAR

  • beel Postado em 13/02/2009 - 18:25:00

    Voltaa aa postaar !!
    Se vc voltar postar eu comentoo todos os dias,várias vezes !!
    Por favoooooor !!
    Continuaaaaaaaaaaaaaa

  • nathyneves Postado em 13/02/2008 - 17:26:18

    Eu irei parar de postar aquii
    http://www.orkut.com/CommMsgs.aspx?cmm=48488462&tid=25782030367557 67535&start=1

    ai em cima ta o link da web no orkut
    Beijooos

  • dull Postado em 07/02/2008 - 00:36:45

    Por favor não para de poxtar eu amo sua Web...

  • nathyneves Postado em 31/01/2008 - 00:05:54

    Vou viajar e só volto depois do carnaval... Beijoos

  • mirian Postado em 28/01/2008 - 18:47:35

    eu tbm ADORO a sua web..e vou comentar
    todo cap para vc nao parar + de postar, OK?
    BJOS...

  • deborah Postado em 27/01/2008 - 10:11:40

    leitora nova!!!!
    essa web é lindah, eu to amando de vdd!
    To muito curiosa...
    Besitos e posta quando der...

  • avinha Postado em 26/01/2008 - 00:06:56

    nhaaa naum para de postarrr! sua web eh lindaa... *-*

  • nathyneves Postado em 24/01/2008 - 01:49:49

    Okeey então amanhã eu volto a postaar

  • avinha Postado em 23/01/2008 - 21:16:43

    ahhh pleaseee naum para de postar mais naum
    eh taum linda sua web


ATENÇÃO

O ERRO DE NÃO ENVIAR EMAIL NA CONFIRMAÇÃO DO CADASTRO FOI SOLUCIONADO. QUEM NÃO RECEBEU O EMAIL, BASTA SOLICITAR NOVA SENHA NA ÁREA DE LOGIN.




Nossas redes sociais