Fanfic: a marca de um cristal [Finalizada] | Tema: vondy

- Que cheiro bom, Anahí! Que perfume você esta usando?

- Deixe de besteira, Dulce. É o mesmo que o seu.

Anahí estava linda, como sempre. Linda como de propósito para humilhar Dulce.

Realmente era uma beleza casa de Tia Adelaide. O que não combinava com aquela beleza toda era a própria tia Adelaide. Recebia os convidados como se fosse ela que estivesse fazendo dezesseis anos. E o pior é que estava vestida como se fizesse mesmo dezesseis anos.

-Dulce! Há quanto tempo! Como você está crescida... Está uma mocinha perfeita!

"E a senhora não está uma mocinha perfeita!". Pensou Dulce, enquanto aceitava os beijinhos da tia.

- E essa lindeza, quem é?

-É Anahí, minha amiga. Pensei que a senhora não se importaria se...

-Oh, mas é claro que não me importo! Você fez muito bem em trazê-la. Poncho vai adorar mais uma menina bonita na festa. Mas entrem, entrem!

De fora, Dulce já podia ouvir o som ligado naquele volume "chega-de-papo". Monotonamente, o surdo da bateria reboava como se dissesse "não entre... não entre..."

Dulce apertou a mão de Anahí e arrastou a amiga atrás da dona da casa.

As dimensões do salão perdiam-se nos cantos escurecidos pela iluminação precária, cheia de clarões piscantes, destinados a excitar os espíritos. Corpos sacudiam-se ao ritmo de um som frenético, meio misturados numa massa multicor que formava um bloco único, anônimo, como a representação de um inferno alegre, alucinante... 

Tia Adelaide falava sem parar, apontava para todos os lados e ria muito, mas nenhum som humano poderia sobrepor-se aquela loucura.

- A senhora é mais ridícula do que eu esperava!- riu-se também Dulce, aproveitando-se da oportunidade de acobertar a franqueza debaixo daquele som infernal.

-Hein?

-Eu disse que a senhora é ridícula!

-Desculpa querida, mas eu não ouço nada com esta musica... Oh, veja quem vem vindo!

Mesmo sem entender direito o que estava sendo dito, Dulce voltou à cabeça para onde a tia apontava.

Da massa confusa de dançarinos, uma figura destacava-se.

Foi como se os mais ousados sonhos de Dulce tivessem tomado corpo e forma.

Corpo e forma de sonho.

O sonho dos sonhos de Dulce.

Ele se aproximou, com aquela luz maluca fazendo brilhar seus dentes e o branco dos olhos.

E que dentes!

E que olhos!

Tia Adelaide ria mais ainda e apontava o rapaz, papagueando sempre. Pouco ou nada dava para entender, por mais que a tia berrasse. Mas Dulce praticamente adivinhou, praticamente leu nos lábios da tia a palavra chave daquele discurso:

-... Alfonso...

Alfonso! Aquele era Alfonso!

Na memória de Dulce, só havia o registro distante de um primo entre tantos, talvez um daqueles moleques briguentos que só pensavam em futebol. Mas o moleque tinha se transformado.

- Como é mesmo o nome daquele deus grego? - raciocinou Dulce em voz alta, acobertada pelo som da festa. - Dionísio? Apolo? Adônis? Não importa. Vou chamá-lo "sonho"!

- Hein?

Tia Adelaide berrava para o filho e apontava as duas amigas. Poncho disse alguma coisa, bem humorado, e abraçou Anahí, apertado. Tia Adelaide sacudiu a cabeça varias vazes e indicou Dulce. O rapaz falou novamente, rindo sempre, e voltou-se par a garota certa.

Dulce sentiu-se enlaçada por aqueles braços, e o rosto do rapaz colou-se ao dela.

- Oi, prima. Como você ficou linda... - bem próximo ao ouvido de Dulce, a voz quente de Poncho a envolveu, claramente, distintamente, fazendo-a surda a qualquer outro som.

- Linda?! - sussurrou a menina, surpresa e enlevada. - Eu? Sou linda? Você disse que eu sou linda?

Mesmo colado ela, Poncho não entendeu o sussurro. E, como se fosse um confeiteiro colocando uma cereja como um toque final de gênio sobre torta mais apetitosa, o rapaz beijou o rosto de Dulce com força, fazendo estalar os lábios.

As luzes, as cores e o sangue de Dulce misturaram-se numa vertigem gostosa, e o ímpeto da menina foi fechar os olhos e colocar-se na pontinha dos pés, oferecendo os lábios a Poncho.

Mas, em vez disso, o que fez foi rir alto, dizendo qualquer coisa, como se fosse a piada mais engraçada do mundo...

- Poncho, era você que eu estive esperando  vida toda...

Como se aquilo fosse um jogo, o rapaz falava também, rindo, sem entender nada do que ouvia.

- Sonho. O meu sonho. Você é o meu sonho feito homem...

Ainda segurando os ombros de Dulce, Poncho ria muito.

- Eu nasci para amar você meu sonho...

Naquele instante, a musica chegou ao fim, e a palavra "sonho" ressoou claramente pelo salão.

- Hein? Sonho? O que você disse?

-- Nada, primo...

O acorde de uma musica lenta, romântica, iniciaram uma nova seleção, reparada para secar o suor dos dançarinos. Dulce esperou novamente o calor do abraço de Poncho, pronta a deslizar pelo salão ao seu comando, não importava para onde ele a guiasse. Ao infinito, talvez...

-E esta beleza aqui, quem é?

-Hã? É Anahí minha amiga...

-Então vamos nos apresentar, Anahí.

E foi Anny que aqueles braços envolveram e carregaram para misturar-se à nova massa que se formava, agora numa forma lenta, arfante.

Tia Adelaide já desaparecera. A musica desta vez não encobria a voz, e foi num murmúrio que Dulce falou:

- Anny, devolva meu sonho...