Fanfic: Legado - Escuridão
Era bom andar por outros cômodos da casa, mesmo sendo guiada por Beth, ela estava evitando que eu esbarrasse em algo. Enquanto ela me guiava, ia me dizendo por onde passávamos. Andamos pelo corredor até chegarmos è escada. Ela me disse que a casa tinha três andares, mas nós estávamos no segundo.
Com medo de que eu tropeçasse e caísse, ela se ofereceu para me carregar escada abaixo. Eu neguei esse auxílio com vigor, ainda assim, ela não me atendeu. Pegou-me nos braços, e em segundos estávamos ao pé da escada, só consegui sentir o vento em meu rosto. Ela me colocou no chão e me guiou a uma poltrona macia, onde me sentei, e recostei-me.
- Eu vou fazer o café da manhã. Você está com fome?
- Só um pouco.
- Não importa, você vai comer de qualquer maneira. – Ela falou, com um leve tom de ironia. Escutei seus passos enquanto ela se afastava.
Fiquei atenta a cada novo barulho que escutei. Algum tempo depois escuto passos vindos da escada, provavelmente era alguém descendo. Escuto esses passos se aproximando, e ao chegar bem perto, a pessoa fala:
- Oi. – Não era nenhuma das vozes que eu conhecia, era a voz de uma mulher, uma voz suave.
- Oi. – Respondi.
- Você deve ser a Katrina. Eu sou a Júlia. Irmã do Dean.
- Sim, eu sou Katrina.
- Eu voltei do instituto ontem, terminei minha estadia lá, por isso não estive aqui antes. Ah, e o Dean passou um mês lá também. Então... Como você está?
- Bem, na medida do possível. – Falei. Logo pensando: Nossa! Como essa menina fala.
- Que bom. Espero mesmo que esteja bem. Sinto que seremos grandes amigas. Você já conheceu os meus outros irmãos? Fora o Dean é claro.
- Não...
- Tem mais dois. A Lili e o Jason. A Lili tem só quatro aninhos. O Jason tem dezessete. O Dean também tem dezessete. E eu dezesseis. O Jason e eu somos Electros. O Dean é um Spectro, ele pode se transformar em qualquer coisa que ele quiser e pode voar, é um dos melhores lutadores de sua geração. Juntamente com seus irmãos, claro. Ah! Queria eu poder voar. – Enquanto ela falava me impressionei com a fluidez de suas palavras. Impressionei-me com a rapidez que essas palavras saiam de sua boca.
- Uhum... – Respondi com um simples resmungo, tentando não dar o mínimo espaço para que ela falasse mais.
- E então. O que você vai fazer hoje? – Perguntou ela. E eu vi que minha tentativa tinha sido falha. Demorei um pouco a responder, mas eu estava sentindo que ela me encarava, esperando uma resposta.
- Acho que vou passar o dia sentada aqui. - Respondi, e a seguir um sorriso seco se formou em meu rosto. Logo ele havia desaparecido, eu não estava conseguindo sustentar sorrisos. Senti-me como se tivesse sido forçada a isso.
- Ah! Isso certamente é o que você não vai fazer.
Fiquei tão entretida com o falatório da Júlia que não escutei outros passos. Só percebi que havia mais gente ao meu redor quando começaram a falar.
- Júlia, você já está aí? Pára de falar. – Eu reconhecia essa voz, era a voz que falara comigo na noite passada.
- Ai, me deixe em paz, Dean. – Ela protestou.
- Mas ele só falou a verdade, você tem que se controlar. – Falou outra voz, dessa vez desconhecida.
- Jason...
- Cala a boca. – Falaram os dois, simultaneamente.
- Tá, ok. Sempre sou eu a que fala demais... – E enquanto falava, sua voz foi diminuindo. Até que desapareceu.
- Agora ela vai resmungar perto de outra pessoa. –Jason.
- Você pode nos agradecer por isso. – O Dean falou, rindo.
- Er... Obrigada?
- Ela estava te incomodando? – Perguntou o Jason. E em resposta eu fiz um sinal de mais ou menos com as mãos.
- Estou com fome... – Outra voz grita. Dessa vez uma voz fina, de criança, mas não era voz de criancinha chata. – Bom dia Jason, bom dia Dean.
- Bom dia tampinha. – Responde o Jason, com um sorriso na voz.
- Lili, essa é a Katrina. Katrina, essa é a Lili.
- Oi Katrina.
- Oi Lili. – Respondi, levantando a mão.
- Por que ela não olha pra mim? – Perguntou Lili a alguém, o mais baixo possível. Ainda assim escutei, mas fingi que não.
- Depois eu te explico tampinha. – Respondeu o Jason. – Fale baixo, para que ela não se incomode!
- Mas... – Não pude ouvir o fim da frase.
- Crianças, o café da manhã está na mesa.
- Oba. – Gritou Lili, enquanto eu escutei os seus pequenos saltos no piso.
- Você vai ficar aí? – Perguntou o Dean.
- Oh meu Deus! Eu estou tendo miragens! – Falou o Luca com ironia e felicidade. – Rafa, Damon, vocês estão vendo o mesmo que eu?
- Mano, acho que estou sim! Ou estão implantando memórias em nossas cabeças. Katrina, por favor, dê pelo menos um sorrisinho!
Então eu atendi seu pedido, e dei o sorriso mais forçado de minha vida. Na verdade não foi bem um sorriso, eu simplesmente mostrei os dentes.
- Acho que vamos ter de ensinar como sorrir. – Falou o Dean.
Sinto braços suspenderem meu peso. Enquanto nos movimentamos ele falou:
- Você precisa comer, e vai! – Damon falou enquanto provavelmente se direcionava a cozinha, não me dando tempo para recusas.
Como sempre, fui parcialmente forçada a comer, mas o gosto da comida compensava parte do esforço. Enquanto comia escutei a conversa em família, eles eram felizes, faziam brincadeiras, implicavam uns com os outros, riam. Enquanto isso eu e meus irmãos ficamos calados. Eu estava me sentindo deslocada, sentindo como se eu não pertencia àquele lugar, e na verdade eu não pertencia, eu era um incômodo ali. Ainda não entendi o porquê de eles me aceitarem sem me conhecerem, talvez fosse pena.
Ao terminar a refeição voltei à poltrona macia onde anteriormente estive sentada. Fiquei ali escutando o que acontecia a meu redor. Uma televisão sendo ligada, e desligada logo em seguida; passos constantes indo e vindo, barulhos na cozinha, o som da voz de Lili enquanto ela brincava com suas bonecas; uma mão passeando levemente ao piano, fazendo barulho, não música. E vozes. Vozes claras, falando sobre uma visita ao instituto LichtSpectrum.
-Katrina, estamos indo ao instituto. – Falou o Rafa.
- Fazer?
- Vamos falar com o reitor, ou seria coordenador? Não sei, só sei que é ele que manda naquela merda! O Dani é nosso amigo, e precisamos ir resolver algumas coisas com ele. Você ficará aqui.
- Quem vai com você?
- Só o Luca e o Damon. O resto do pessoal ficará aqui. Tudo bem? – Perguntou ele, esperando minha compreensão.
- E quando vocês vão?
- Agora. E acho, apenas acho que retornamos amanhã pela tarde. – Dessa vez o Luca respondeu. – Pronto? – Perguntou ele ao Rafa.
- Sim. – Ele falou, dando um beijo em minha cabeça. Um gesto que logo em seguida foi imitado pelos outros dois.
E então eu os escutei partir. Deixando-me sozinha, quero dizer, meio só. Em meio a estranhos, ou quase isso.
- E ai? O que você quer fazer? Eles me encarregaram de te manter entretida. – Falou o Dean. E eu logo me lembrei de quão rápido foi para memorizar as novas vozes.
- Talvez ficar sentada aqui.
- Quer escutar música?
- Não. Por favor, música não!
- Então vem! – Falou ele, pegando em minha mão. Eu não me movimentei um milímetro de onde estava.
- Se você não se levantar eu vou te pegar no braço!
Como sempre, ninguém me dava tempo para respostas, e quando me dei conta já estava sendo carregada. Sentindo o vento bater em meu corpo, eu estava fora da casa. Não só o vento, mas também o sol. Percebi como o sol fizera falta, como o sol não representava só luz, mas também calor. Era bom sentir o sol me esquentar de novo.
Fui colocada no chão, fechei os olhos sob os meus óculos e senti, ouvi. Pássaros cantando, o sussurrar do ar ao passar por mim, fazendo com que meus cabelos se agitassem e me fizesse cócegas.
- Tire os sapatos.
- O que?
- Tire-os!
Tirei-os, e apreciei o gramado macio, em temperatura muito agradável. Nem quente, nem frio. Senti meu braço sendo puxado, fui acompanhando na direção em que era levada.
- Venha.
- Para onde?
- Para a floresta.
- Aqui tem uma floresta?
- Sim. Eu me esqueci de que você não sabia! – Falou rindo. – Quero te mostrar umas coisas.
No meio do caminho minhas pernas pararam. Percebi que iria andar descalça por uma floresta, isso não é muito agradável.
- O que foi?
- Eu vou entrar em uma floresta sem calçado?
- Ah! Calma. Nós vamos pela trilha, que é limpa. E qualquer coisa eu te carrego. – Acrescentou, sabendo que eu não gostava de ser carregada.
- Então tá. Mas cortemos a parte do carregamento.
E com minha aceitação adentramos em meio à floresta. O chão de terra era úmido, diferentemente da grama, mas ainda assim era agradável. Andando por algum tempo percebi mais coisas; passos curtos e acelerados, provavelmente algum animal de pequeno porte. Tudo estava mais claro agora, meu tato, olfato e audição me ajudavam muito.
Andamos por algum tempo sem falar nada, até que chegamos. Não havia só terra sob meus pés, agora havia algumas pequenas pedras. O vento se tornara mais forte e denso. Barulho de ondas enraivecidas batendo em pedras.
- Então, o que parece para você? Em que tipo de lugar acha que estamos?
- Em um tipo de praia?
- Mais ou menos isso.
- Então me diga. – Ordenei.
- Estamos em um penhasco.
- Pe...Penhasco? – Minha voz saiu entrecortada, fiquei nervosa ao saber minha localização. Especulei se ele não planejava me atirar de lá.
- Sim. Está com medo?
- Claro que não. – Essa resposta não me convencia, quem dirá convencê-lo.
- Ah, eu posso sentir o medo emanar de você. – Falou com um sorriso na voz e um tom sedutor. – Você confia em mim?
- Er... Você quer mesmo uma resposta? – Eu estava começando a ficar nervosa.
- Não precisa. Eu só preciso que confie em mim.
- Como eu posso confiar em um desconhecido?
- Eu não sou tão desconhecido assim. E se alguma coisa acontecer com você os seus irmãos arrancam o meu coração, me esquartejam, me queimam, e jogam as minha cinzas em cada extremo desse planeta. Você quer mais?
- Esse seria um bom motivo pra confiar, nem que seja um pouquinho, em você.
- Então venha... – Enquanto pegava em minhas mãos e as colocava em seus ombros ele falou. – Suba em minhas costas.
Por um momento hesitei, mas minha curiosidade por saber o que iria acontecer-me a seguir vencia. Logo eu pulei e me posicionei em suas costas. Costas largas, quentes e musculosas. Tive um pouco de dificuldade, ele era alto; mas com sua ajuda eu consegui. Ele pegou minhas mãos, posicionou-as na base de seu pescoço, fazendo com que eu as juntasse e segurasse uma na outra. Depois ele pegou minhas pernas, cruzando-as apertadamente e as segurando em um aperto de aço.
- Eu quero que você segure firme, não solte seus braços. Segurarei suas pernas.
- E o que você vai fazer? – Perguntei assustada.
- Eu vou pular. – Falou simplesmente. – Quero dizer, nós vamos.
- O que?
- Se segura!
Senti que ele corria a uma velocidade incrível. E segundos depois eu estava caindo. Apertei meus braços o mais forte que conseguia, se ele não fosse o que era, tenho certeza que estaria sufocando. Parecia que eu estava em meio a uma ventania, tive certeza que meu rosto se deformava com a força do vendo. E à medida que caíamos eu gritava e pensava: “Meu Deus, eu vou morrer.”; “O que eu fiz para morrer assim?”. Enquanto ele, ele estava rindo, eufórico. Quando chegamos perto o bastante para sentir respingos finos de água em nossa pele, ele fez uma curva. Seu corpo meio que se esquivou e virou.
- O que está acontecendo? – Gritei, para que ele escutasse. – Estamos mortos?
- Não grita. O que você sente?
- Vento, muito vento, e água. – Falei agora em tom normal.
- Pois é. Solte uma mão e a estenda para baixo.
Ao fazer isso, senti minha mão ir à direção contrária da água a uma velocidade incrível. E momentos depois eu a subi e senti o cheiro. Era água do mar.
- Estamos... Voando? – Perguntei, fascinada com o fato.
- Oh meu Deus. Ela descobriu o mundo!
Continuamos a voar. Senti nossos corpos subirem e depois continuarem para frente. Caiamos em queda livre, voltávamos a voar, giravamos. Era como se eu estivesse voando do lado de fora de um avião. Era uma sensação boa, de liberdade. Eu fiquei feliz por sentir aquilo, aquele frio na barriga, o coração acelerado por culpa da adrenalina.
Eu sempre quis saber como era voar, como era a sensação. Um sorriso inesperado escapou por minha boca. Era um pequeno sorriso, mas estava bom para um começo.
Voamos por algum tempo; eu não sabia se foram horas, minutos. Fiquei tão absorta com a explosão de sensações que perdi a noção. Naquele momento eu só conseguia fechar os olhos e sentir. Ao descermos ele teve de me chamar, pois eu estava em um tipo de transe.
- Katrina. Você ainda está viva?- Falou rindo.
- Ah... Acho que sim.
- Vamos?
- Para onde?
- Para casa sua maluca!
- Ah, sim. Vamos.
Enquanto eu era rebocada de volta para casa fui pensando em todo o passei anterior. Tive a certeza de que não iria esquecê-lo.
Meus irmãos voltaram um dia depois do prometido, sempre escondendo coisas, conversando em segredo e por conseqüência me deixando um tanto curiosa. Todos os dias alguém me levava para fazer uma coisa diferente, tentando me fazer esquecer um pouco dos problemas.
E quantas vezes alguém começava a tocar, e eu, ressentida com o som inebriante da música me retirava do cômodo, ou ali mesmo começava a chorar; e no mesmo instante eles paravam, até que aprenderam a não tocar nenhum tipo de música perto de mim.
Enquanto os dias se passavam eu ia me conformando mais e mais com os acontecimentos. Ainda doía, mas era o que tinha de ser. Eu era apoiada por todos, e sentia que um carinho crescia mutuamente entre nós. Eu estava começando a me sentir bem naquele lugar, começando a me sentir em casa.
Os pesadelos ainda vinham atormentar-me pela noite, porém em uma freqüência bem menor. Eu comia mais, conversava mais. Eu estava voltando parcialmente a ser o que era.
Para me auxiliar, e me tornar um pouco mais independente, primeiro eles me deram uma bengala. Levei um tempo para me acostumar a andar sozinha, tateando os lugares para encontrar os obstáculos, algumas vezes destruindo um vaso, ou qualquer outro objeto indesejado que estivesse a minha frente. Nó início pensei em desistência, mas logo vi que me acostumaria. Um tempo depois, tiveram uma idéia melhor, presentearam-me com um cão guia, que por sua vez era bem mais fácil de seguir. Pelo menos eu não precisava sair por aí destruindo tudo.
- Katrina, desce aqui, precisamos falar com você! – Escuto o grito vindo do andar inferior.
Enquanto descia as escadas, com cuidado, acompanhando o meu cão guia, eu tentei adivinhar o que eles queriam falar comigo. Mas não cheguei a uma conclusão sensata.
- Sente-se, por favor! – Falou o Ryan, em um tom sério.
- O que aconteceu? – Perguntei, enquanto me sentava.
- Você está há muito tempo em casa. Você ainda tem de aprender muita coisa, e precisa de uma base, conhecer novas pessoas... – Falou o Dean, mas logo foi interrompido pelo Ryan.
- Resumindo, você vai para a escola.
- O que?! – Exclamei.
- Nós sabemos que vai ser um pouco difícil no inicio...
- Como você é modesto, Damon. – Falei um tanto enraivecida.
- Katrina, não vamos ter nenhuma discussão. Você vai e ponto final. – Falou o Luca, com um tom autoritário.
- O que? Você é meu pai agora?
- Não, mas sou seu irmão mais velho, e nós todos somos responsáveis por você, então...
- E também não é você que vai a piadinha da escola.
- Nem você, por que vamos estar lá para te proteger. – Falou o Rafa.
- Mas vocês não terminaram a escola?
- Sim. Mas vamos todos. Eu, você, o Luca, Damon, Dean, Jason e Júlia. E estaremos lá para cuidar de você.
- Mas...
- Vocês começam na segunda. Katrina, você ainda terá dois dias para se preparar psicologicamente. – Elizabeth falou, sorrindo.
- Muito animador! – Quando vi que não teria sucesso, resolvi não questionar mais.
- Então tudo bem. Segunda-feira iremos a escola. – Exclamou a Júlia, animadamente.
Autor(a): Bia Vieira
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
Prévia do próximo capítulo
Os dois dias foram se passando. Foram dias de preparativos. Somente a Júlia estava muito animada com a notícia de que voltaríamos à escola. Ela queria sentir essa sensação de novo, apesar de ter aprendido tudo e muito mais no instituto. Já os outros, me incluindo, estavam indo por obrigação, os menin ...
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