Fanfic: Delusional | Tema: Muse
Não quero acordar, por amor de deus, mantém os olhos fechados, deixem-me dormir. Não sentia o meu corpo, estava completamente dormente. A minha dor de cabeça preparava-se para atacar, os meus olhos teimavam em tentar abrir-se, as minhas forças escasseavam, e já tentava mantê-los fechados há imenso tempo. Aquilo não era a minha casa. A cama era estreita, o colchão ainda mais desconfortável, o cheiro estava a pôr-me doente… ainda mais doente do que já sou. E eu que pensava que não havia nada pior do que acordar todos os dias no meu quarto e enfrentar mais um dia a que eu chamava normal. Oh Dom, conseguiste mesmo pensar que a vida não poderia ser pior? Idiota… Agora que a rotina nem parecia tão má assim. O rosto dele continuava tão presente, não conseguia parar de o ver, tinha deixado de o controlar, a visão do seu corpo absente de vida deitado na maca a passar mesmo na frente dos meus olhos repetia-se constantemente.
Por momentos pensei ter ficado cego, o branco do local mais pareceu um clarão repentino. Mas não, era apenas um candeeiro, de um hospital. O que eu tinha feito? Normalmente nunca me lembrava da noite anterior, mas a minha memória decidiu funcionar naquele dia, concentrando-se completamente naquela noite, que eu dava tudo para esquecer. A cabeça doía tanto, não era da ressaca, era do turbilhão de pensamentos, a minha cabeça era uma completo puzzle, agora as suas peças estavam completamente espalhadas por todo o lado, não fazia intenção de voltar a montá-las, não conseguia, não depois da noite anterior. Olhei em redor, a sala estava vazia, quem me dera não ter olfato, o cheiro daquele local era horrível. Percorri a sala com o olhar, ao meu lado estava um pequeno banco metálico, o resto da sala era branca, as paredes tinham pequenos detalhes em madeira, e de resto, coisas normais de um quarto de hospital. Percorri a sala mais uma vez, quando cruzei o olhar de novo com o pequeno banco metálico e reluzente. Fitei algo igualmente brilhante, os olhos azuis lembravam um vasto oceano cristalino, tão cristalino que se tornava… transparente? Mas era ele… As covinhas no rosto, aquela sombra por baixo das maçãs do rosto salientes, aquele rosto escultural…
Dom… Dom… conseguiste ultrapassar a ténue e frágil linha que ainda separava a sanidade da loucura. Nem sei como realmente a mantes-te por tanto tempo, agora és oficialmente doente. Mas ele continuava sentado, conseguia ver através dele, mas ele estava ali, e fitava-me com uma expressão neutra, sem conseguir realmente descrever a emoção por detrás dela, provavelmente não havia nenhuma. Ele apenas me olhava e permanecia quieto. O doido sou eu, ele não está ali… Não pode… Mas mesmo que me ainda estivesse a custar aceitar a minha insanidade total, quando ele desapareceu de repente, assim que um homem, que era obviamente um médico, entrou pela porta, eu senti-me inseguro, algo na sua “companhia” me acalmava. O oceano dos seus olhos era calmo, contrariando tudo o que se passava na minha cabeça.
A sombra do homem refletiu-se no lençol esbranquiçado da cama, e eu fui obrigado a olhar para cima e fitá-lo. Ele ainda não tinha tirado os olhos da folha de papel que segurava na mão, com uma expressão séria. Depois os seus olhos castanhos fitaram-me friamente, e com um toque de repugnância, também, estava a falar com um alcoólico assassino, como poderia ser simpático?
– Como se sente?- A sua voz era tão grave que senti leves abalos. A pergunta era tão estupida que pareceu ser retórica, como me sentia? Ele provavelmente sabia mais detalhadamente que eu, a quantidade de álcool que tinha bebido, a ressaca que resultava disso, para além do do acidente… e de o ter matado… Para onde ele devia ter ido?Desapareceu tão repentinamente… encontrei-me inundado num desejo intenso de o voltar a ver…- Infelizmente, a sua ressaca não é razão suficiente para continuar aqui, a sua mãe está a sua espera, daqui a pouco poderá abandonar o hospital.- Agradeci uns poucos milhões de vezes por não haver nenhum sermão, e mais outros milhões por não ter o meu pai à minha espera. Depois ri para dentro, ele nunca na vida me iria querer ver, como poderia esperar tê-lo à minha espera? Estragas-te tudo de vez, Dom… Se ele alguma vez te dirigir palavra, será porque não tinha outra opção possível.
Ver a minha mãe foi talvez a coisa mais dolorosa do dia… As lágrimas dos seus olhos era pequenas agulhas que perfuravam lenta e dolorosamente o meu coração. Ela não merecia isto… Se ela tivesse o filho que merecia, seria um completo oposto de mim. Os seus braços apressaram-se a rodear-me o pescoço de uma forma ansiosa. Senti a manga da minha blusa humedecer por causa das suas lágrimas, e os seus soluços no meu ombro. Se a ressaca não amparasse os meus sentimentos, provavelmente estaria a chorar mais que ela…
– Estás bem querido? O que aconteceu?!- As palavras eram atiradas em atos de desespero, ela realmente não queria saber o meu estado… ou melhor… ela queria, mas eu não lhe queria dizer… não conseguia. O que aconteceu ela sabia, o seu menino tinha acabado de matar uma pessoa.
– Estou bem mãe… O que vai acontecer agora? Vou ser preso não vou?- Eu estava realmente ansioso, mas a minha entoação não saía como esperado, e soava falsamente calma.
– Acho que não querido… É a primeira vez que isto te acontece… Mas é algo que vamos saber amanhã, eles disseram que nos contactariam.- A voz dela saía extremamente ansiosa, entre arquejos. Depois olhei-a nos olhos, já estava sério, mas com a ressaca ainda fiquei mais que o pretendido, de maneira que o olhar foi o único sitio que ela pôde concentrar toda a ansiedade.
– O pai?- A minha mãe descontraiu a expressão, e olhou-me cúmplice, não percebia como ela não entendia que o meu pai tinha razão ao desistir de mim, e sempre que dizia que era um inútil. Talvez nunca vá perceber o amor de mãe…
– Não veio… Disse-lhe ontem, mas ele desligou o telefone sem dizer nada.- Ela tentava dar-me alguma esperança de um contato da parte de o meu pai, mas ela não sabia que essa esperança tinha morrido há muito tempo.
Chegar a casa foi o ponto alto do dia, em comparação com o hospital, a minha casa parecia o mais perto do paraíso na Terra que poderia encontrar. Mergulhei nos lençóis, enrosquei-me em mim mesmo. Não conseguia parar de pensar, agora uma garrafa tornava-se tão convidativa que era difícil resistir. Mas o rosto dele vinha-me à cabeça, eu não podia nunca mais ficar próximo daquela porcaria. De maneira nenhuma, já o tinha morto a ele, e tinha a certeza que nunca iria encontrar alguém que me tivesse marcado tanto. Mas mesmo assim, era preferível evitá-lo. Os meus braços rodeavam as minhas pernas com tanta força que parecia uma tentativa de me amarrar a mim mesmo, e impedir-me de alguma vez sair dali para arruinar a minha vida ainda mais. Embora agora sim, parecesse impossível, eu sabia que era, não o imaginava, mas sabia que era possível. O meu olhar saltitava de canto em canto do quarto, só me apetecia desligar e nunca mais ter de acordar, mas não conseguia…
– Tem calma…- Nunca tinha ouvido aquela voz, na vida, mas era impossível descrever a maneira maravilhosa com que soava, bem atrás do meu ouvido. Olhei para trás receoso, e reprimi o grito e o salto que me apeteceu dar por impulso no momento em que vi… em que o vi… Os seus olhos azuis e cristalinos pareciam sorrir-me, em conjunto com os seus lábios, que formavam uma linha arqueada. Que sorriso… Agarrei a minha cabeça com as mãos, mas ele não desaparecia, permanecia imóvel á minha frente, sentado na cama. Agora sim, sou completamente doente.
– Matthew?!- O seu nome ainda estava vivo na minha memória, Matthew Bellamy, era ele, á minha frente, no meu quarto, a sorrir-me. Não acreditava, não podia, não era possível, e não era um sonho. Estendi o dedo indicador, que tremia imenso, aproximei-o do seu peito, mas quando me preparava para lhe tocar, afastei o dedo imediatamente, se lhe tocasse, ele poderia desaparecer... Eu não poderia tocar-lhe, ele parecia tão frágil, como quando o vi na noite anterior… Não queria que ele desaparecesse, queria que ele continuasse ali, mesmo que significasse ir para o manicómio, o azul dos seus olhos era um dom, um tesouro, o seu rosto definido era uma obra de arte, a que deus devia ter dedicado mais tempo que o normal. Afastei o dedo imediatamente, ainda incrédulo. E depois risos saíram da sua boca fantasmagórica. O seu riso era melodioso e contagiante, não consegui impedir um sorriso ser esboçado na minha cara.
– Podes tocar-me, palerma… Vá, experimenta…- O seu pedido era tão apelativo que por momentos o meu dedo flutuou pelo ar a seu encontro, mas impedi-o a milímetros do seu peito mais uma vez.
– Mas…- Eu tinha medo, medo de poder estragar um tesouro tão frágil como ele… Apenas com um toque, mas ele soltou mais um riso, o quarto escuro pareceu iluminar-se só com a melodia das suas gargalhadas.
– Não tenhas medo, não me vais magoar, não podes, estou morto, lembras-te?- Acenei com a cabeça tristemente, ele tinha razão, não o podia magoar, ele estava morto… por minha culpa. O meu dedo passou através do seu corpo, era fascinante, ele permanecia quieto e intacto, e mesmo ao passar o dedo por ele, eu não tinha sentido nada… Ele não era real, eu estava doido. Ele estava morto e era culpa minha.- Doeu? Ainda estou aqui, vês?- Acenei com a cabeça quase mecanicamente, estava em completo choque. Estaria eu mesmo a ver um morto? E ele estava a falar comigo, eu não o controlava, ele tinha vida própria, as suas palavras e ações eram completamente dele.
– Que fazes aqui?- Não conseguia formular as perguntas que queria, o choque impedia-me. Parecia que tinha acabado de descobrir que o pai natal era real afinal, e agia infantilmente. Mas o riso de Matthew iluminou todo o ambiente mais uma vez, e eu sorri automaticamente, como poderia resistir àquele riso?
– Não é óbvio? Sou um fantasma agora, e estou aqui para te amaldiçoar para o resto da tua, já miserável, vida. Afinal, mataste-me.- Matt gesticulou dramaticamente, os meus olhos faziam perfeitos círculos pela maneira que estava surpreso. Mas Matthew depressa se desmanchou em risos, eu não consegui impedir algumas gargalhadas da minha parte, mas calei-me, a minha mãe podia ouvir.- E se tu acreditas-te nisso, então parece que tenho de te acompanhar ao hospital mental mais próximo, imediatamente.- Eu sabia que Matt estava a brincar ao início, mas eu estava em completo choque, não vejo um fantasma todos os dias.
– Acho que vamos ter de ir para lá de qualquer das formas…- as palavras eram pensamentos altos, mas eram verdadeiros, eu estava doido… completamente doido. A única coisa que estava a fazer hoje era falar com quem tinha morto na noite anterior.
– Tudo bem, mas mesmo que vás para lá, não te vou deixar em paz…- Matt sorriu, e eu gostei de ouvir aquilo… Como seria se ele não estivesse ali? Eu teria de viver com a culpa de ter morto uma pessoa… Ainda vou ter, mas agora ele estava ali, ao meu lado.
– Para sempre?- Ergui o olhar, que suplicava por uma resposta afirmativa, naquele momento, os seus olhos azuis pareceram sólidos, pois tudo o que estava por detrás dele, eu não via, apenas aquele azul vivo, azul que ninguém com os maiores poderes descritivos existentes, poderia descrever. Matt sorriu.
– Para sempre…
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– Então, vais finalmente sair do quarto hoje?- A voz dele ecoava nos meus ouvidos como se estivesse a gritar a milhas de mim, mas na verdade ele estava mesmo ao meu lado, na berma da cama, movia-se de um lado para outro com uma agilidade quase sobrenatural… espera...ele é um fantasma… Foda-se! também tinha acordado há pouco t ...
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