Fanfic: Layza | Tema: Branca de Neve
Prólogo.
Tinha certeza que o dia estava mais do que agradável, o céu estava azul e sem nuvens, a brisa soprava fresca e o sol aquecia sem queimar. Era com certeza um dia mais do que bom.
Do lado de fora.
Nunca entendeu exatamente o porquê de se fazer um culto, entendia que era necessário apresentar o herdeiro do trono a sua corte, só não sabia onde Deus entrava na história. Nunca soube.
Não é que ela não acreditasse em Deus, apenas não tinha um motivo forte o bastante para cultuá-lo. Jamais o viu e não conhecia ninguém que o houvesse feito, ninguém são, pelo menos. Se Deus estava em tudo ao seu redor, acreditava nele, mas não sairia por aí cultuando as flores, as pedras e as folhas. Não era uma questão de crença, era uma questão de religião.
E de paciência, que não era exatamente sua característica mais marcante.
Pudera, estava trancada naquela igreja há alguns milênios ouvindo a mesma besteira que ouvira durante todos os batismos que fora obrigada a presenciar. Não era como se aquele bebê fosse herdar o reino, ser da prole de um rei não ajudava em nada as mulheres. Sabia disso mais do que gostava.
O fato é que realeza e coisas de nobres não lhe pareciam de grande serventia. Gostava de escalar rochas e subir em árvores, de nadar nua nos lagos de água quente e de correr atrás de cães magrelos, de rolar na neve durante o inverno e de pular em montes de folhas secas no outono. Gostava de ser menina, não de ser princesa, isso não era nem um pouco divertido, os vestidos eram apertados demais, os penteados ridículos demais e a companhia era quase sempre velha demais, por mais que houvessem crianças na corte, a infância delas parecia ter acontecido há centenas de anos ou nunca ter acontecido. Temia que isso acontecesse com ela, temia mais ainda que já estivesse acontecendo.
Há alguns meses, ninguém a imaginaria dentro de um vestido e agora lá estava ela, espremida dentro de um cotehardie branco sob um kirtle cinza escuro de tecido brocado e com os cabelos negros presos atrás da cabeça em uma longa trança, seu coro cabeludo ainda doía onde fora puxado, mas não tanto quanto seus pés dentro das botas de couro preto feitas sob medida para torturá-la. Nunca havia usado jóias e agora era obrigada a usar sua tiara com flocos de neve de prata e o medalhão que ganhara de seu avô materno no aniversário daquele ano, uma gargantilha com pequenas maçãs de rubis. Jamais a obrigaram a comparecer a um evento da corte e aquele era o segundo batismo que vira naquela primavera.
Estava se tornando uma princesa contra a vontade e aquilo não era justo, bom, poucas coisas na vida eram, de qualquer forma.
Olhou para sua priminha ou para o monte de pano em que ela estava enrolada com pena. Mal nascera e já tinha marido. Todos os Fall casam-se com Goldflowers, era assim e assim seria até o fim dos tempos.
No fim, voltou a prestar atenção na cerimônia. O padre se posicionou atrás da rubrica e ela suspirou aliviada, seu tormento, pelo menos aquela parte dele, estava chegando ao fim. Frido não sabia disso.
- Já está acabando? - perguntou com o grunhido irritante que era a sua voz.
- Sim, meu senhor, só tenha mais um pouco de paciência.
Se fosse eu a perguntar, levaria uns tapas por interromper. Mimavam seu primo como se ele fosse um rei, quando na verdade nem chegava a ser príncipe. Sabia o porquê daquilo, ele tinha uma doença conhecida como sangue aguado, quando se machucava, a ferida dificilmente estancava sem nenhuma intervenção. Mesmo assim, Frido era mais donzela do que ela jamais foi.
Ele percebeu que ela o encarava e devolveu o olhar, lhe mandando um beijo. Bufando, desviou o rosto, como alguém podia ser tão insuportável? Por que, de todos os meninos do mundo, aquele era seu primo?
Levou um leve tapa na nuca e ergueu os olhos para sua ama-seca.
- De pé - só então percebeu que era a única pessoa sentada da igreja, se levantou rápido, ninguém parecia ter reparado sua distração.
Não se engane, murmurou uma voz dentro dela, essas pessoas reparam tudo.
As justas seguiam como de costume, dois cavaleiros corriam um contra o outro encima de cavalos com lanças nas mãos, um cai e o outro continua, o vencedor retornaria no dia seguinte, o derrotado não tinha mais lugar ali. A não ser que seja nobre, sempre há lugar para os nobres.
Ainda mais quando se tratava de nobres regentes.
Estava em um camarote real, um de quatro. O seu fora decorado com motivos da bandeira de Invernora, seu pai estava em um cadeirão com sua mãe a esquerda e seu tio (e conselheiro real) a direita. Ela estava um degrau abaixo deles. A esposa de seu tio e Frido sentavam-se com o resto dos nobres, num banco posto na frente do camarote, junto com a sua ama-seca e o capitão da guarda de seu pai.
- É ELE MÃE, É O TIO! - berrou seu primo envergonhando a família enquanto praticamente saltitava em seu lugar, desejou secretamente que ele caísse na arena e fosse atropelado por um ou quatro cavalos.
- Eu sei querido, acalme-se - disse sua tia Solar com uma voz calma e sensual.
Pegou uma maçã na cesta de frutas e a mordeu vorazmente. Amava maçãs, principalmente as vermelhas.
- Príncipe Verão, de Sunray ENFRENTA Sir Carl Irons, de Blackrock.
Os cavaleiros cavalgaram perto do público plebeu que berrou e se esticou para tocar nas montarias, depois vieram aos nobres. Verão sorria e arrancava suspiros de todas as donzelas ao redor, parou e fez uma reverência exagerada ao seu rei e progenitor. O tal Carl Irons veio até seu camarote, sem sorrir nem gracejar, na verdade parecia perturbado. Bom, se estivesse prestes a enfrentar o filho de um rei, também estaria.
- Vossa Majestade - curvou-se e permaneceu de cabeça baixa, seus cabelos cobriram parte de sua face quando o fez.
- Invernora está com você, sir - Invernora estava com todos os outros cavaleiros do reino, aparentemente.
- Meu tio vai te derrubar! - não sabe exatamente o que lhe deu coragem, ela apenas agiu.
Num instante a maçã mordida estava em sua mão, no seguinte chocava-se com a cabeça de seu primo. Não dava para saber quem estava mais surpreso, Frido, sua tia Solar ou o pobre do cavaleiro.
Achou que fosse apanhar da ama-seca até sair sangue, achou que seus pais a mandariam de volta para Invernora naquele instante, achou que sua tia a esganaria bem ali. Mas então seu pai riu, sendo seguido por um risinho sua mãe e, mais alto do que todos, a gargalhada de seu tio Frígido.
Não foi dessa vez, quase disse para sua tia quando ela a encarou com nada mais do que fúria assassina, mas não era estúpida ao ponto de afrontá-la duas vezes no mesmo dia.
- Sinceramente espero que esteja errado, meu Senhor. Minha Senhora - Solar não prestou muita atenção em Carl, retirou-se arrastando seu amado fracote pelo braço. - Se Vossa Alteza Real tiver a bondade... - Não compreendeu o que ele queria dizer.
- Seu favor - esclareceu sua ama-seca, a olhando decepcionada.
Aprendera aqueles costumes durante todo o caminho de Invernora á Outona, mas não acreditava que já tinha um sir para chamar de seu. Quando uma dama favorece um cavaleiro, também permite que ele a acompanhe aos banquetes durante todo o torneio. Na maioria das vezes, um favor acabava em noivado.
Envergonhada com sua ignorância, desamarrou a fita de cetim que estava no seu pulso esquerdo e se levantou de sua cadeira, a entregando ao cavaleiro.
- Espero que me conceda tão boa pontaria quanto a de Vossa Alteza Real.
- Que Deus e Nosso Senhor Jesus Cristo o ouçam - sua visão periférica permitiu que visse sua ama-seca repetindo as palavras sem fazer som, sorriu com aquilo, mas Carl achou que era para ele que sorria e se viu obrigado a sorrir de volta. Fez uma curta referência e voltou a se sentar.
- Quem é Carl Irons? - perguntou sua mãe curiosa quando o cavaleiro se fora, muitos anos atrás ela entregou seu favor para o filho mais novo de um rei e agora era uma rainha. Um pedaço de fita não devia ter tanta importância, mas tinha.
- O quarto filho de Lord Rupert Irons, de Blackrock - respondeu seu tio Frígido, um tanto quanto receoso.
- Isso nós já sabemos, perguntei quem é Carl Irons. De verdade.
- Bom... - o tom da voz diminuíra a um sussurro e isso a atiçou a ouvir a conversa - um bêbado, jogador compulsivo com um apetite selvagem por prostitutas e um ainda maior por escândalos.
- E vem dizer isso agora?! - Seu pai estava irado e ela também.
- Não quis ser indelicado, os Irons controlam grande parte das minas de ferro de Invernora.
- Mas não controlam os herdeiros, aparentemente - sua mãe estava transtornada. - Como se armou cavaleiro?
- Sobreviveu ao ataque dos anões do Bosque Sombrio, Rei Gelo IV...
- ...armou todos os sobreviventes cavaleiros - completou seu pai, ainda mais aborrecido. - Nosso pai faz as asneiras e eu pago, como sempre.
- Uma coisa comum para um rei - respondeu seu tio, deixando o ambiente ainda mais desagradável.
A hierarquia de Invernora não seguia o sangue e sim a glória. Seu tio Frígido devia ter herdado o trono depois de seu avô, mas ao invés de tornar-se um cavaleiro, tornou-se um escriba. Em vez de lutar nas batalhas, controlava as finanças. Em vez de ser um herói, tornou-se um sábio. E então seu avô nomeou o filho caçula como herdeiro. A família quebrou-se, seu tio se exilou em Verona durante cinco anos, retornando apenas com a morte do pai. Trazia a reestruturação da família, mas também trazia Solar Sunrise como esposa e Solar trazia Frido no ventre.
Os cavaleiros já portavam seus elmos, escudos e lanças quando voltou a prestar atenção neles. Carl havia amarrado a fita em sua lança, bem perto do punho.
A trombeta soou e os cavaleiros esporearam suas montarias. Prendeu as mãos sobre o colo e enterrou as unhas nas palmas, repetindo mentalmente caia. No primeiro embate, as lanças nem chegaram a se encontrar e isso quase a matou. Era comum que príncipe Verão derrubasse seu oponente de uma vez. Os cavalos diminuíam a velocidade e deram a volta na cerca para logo depois voltarem a galopar. Desta vez, Carl se esforçou, segurando a lança reta do começo ao fim da arena, atingindo de raspão o braço do oponente. Príncipe Verão parecia tão surpreso quanto ofendido. Não derrubara um cavaleirinho insignificante na primeira tentativa e fora atingido na segunda, aquilo era vergonhoso. O orgulho de um Sunrise é algo extremamente delicado, Solar por exemplo, perdia a justa do próprio irmão por causa de uma maçã.
No último embate, Carl estava vencendo, a menos que fosse derrubado ela teria que acompanhá-lo no banquete daquela noite. Um banquete tem muita bebida e muitos olhos estariam postos no homem que venceu o príncipe. Mas quando os cavaleiros estavam prestes a se cruzar, algo aconteceu.
Algo quer dizer um homem seminu entrando na arena berrando alguma coisa inteligível. O som, provavelmente uma palavra soava: laftãoum.
Todos instantaneamente deixaram a justa de lado. Todos menos o príncipe. Era uma situação cômica, na verdade, num momento se ouvia o som dos cascos do cavalo, então os berros do bêbado e por fim um clac de madeira se quebrando. Príncipe Verão estava inclinado para o lado, quase caindo de sua montaria.
E Carl Irons estava no chão.
Autor(a): babs
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