— Duas taças de champanhe é demais para você?
— Você me deixou beber duas taças? — perguntou ela debilmente, apoiando-se na extremidade da mesa. — Alfonso , eu não estava brincando quando falei sobre a minha intolerância a álcool. Não vou conseguir sair daqui andando!
— Acabamos de casar. Todos acharão romântico se eu a carregar nos braços.
— Não se eu agitar a toalha de mesa como uma bandeira e cantar baladas das Terras Altas com toda potência dos meus pulmões — disse aborrecida.
Alfonso riu, mas afastou o copo de champanhe para longe dela e sinalizou para o garçom. Pouco tempo depois, apareceu um copo de leite a seu lado e Anahí o tomou agradecida. Todos na mesa murmuraram e pregaram contra os resultados medonhos de misturar champanhe e leite, mas ela reconhecia um salvador quando via um, e não estava a fim de dispensá-lo.
Mas mesmo com o leite reduzindo a velocidade com que o álcool era absorvido pela sua circulação sanguínea, sabia que não ia conseguir sair do restaurante andando.
E não conseguiu. O braço de Alfonso circundava-lhe a cintura como um torniquete, ajudando-a a chegar até o carro. Após acomodá-la no assento, ele contornou o veículo e se sentou atrás do volante, dando adeus e agradecendo a todos os desejos de felicidade recebidos dos amigos. Em seguida, fechou a porta e permaneceu parado por um momento, apenas mexendo nervosamente na aliança em seu dedo anular. Por fim, pôs a chave na ignição e se virou para fitar Anahí, que estava quase deitada no assento, com os olhos meio-fechados e um sorriso intrigante nos lábios. Sob a luz da iluminação da rua, seus olhos verdes adquiriram um reflexo prateado. Era tão macia e feminina. O sutil perfume floral que exalava penetrou as narinas dele, inebriando-o, tentando-o a inspirá-lo ao longo daquela pele acetinada. Agora ela era sua esposa, uma companheira legitima e íntima... Sua esposa!
Alfonso quase gemeu em voz alta, lembrando do seu outro casamento e da face radiante de Dulce, caminhando a seu lado no corredor da igreja, os beijos ardentes que trocaram ao término da cerimônia.
Sua esposa! Dulce fora sua esposa. Jamais cogitara a possibilidade de outra mulher ocupar aquela posição, arcar com aquele título. Até a cerimônia ter início, não tinha dúvidas quanto àquele segundo casamento, mas quando as familiares e assustadoras palavras do juiz alcançaram seus ouvidos, começara a suar frio. Não podia, não queria se arrepender do seu casamento com Anahí, mas de repente a as lembranças do passado o assombraram. Dulce se fora para sempre. Não podia mais chamá-la de esposa, porque pelas leis do Texas e dos Estados Unidos e, por sua própria vontade, a mulher a seu lado agora era a sua esposa.
Anahí Matthews. Proferiu o nome mentalmente, imprimindo-o lá. Anahí Matthews, sua esposa. A rígida e elegante Anahí, sempre tão distante, agora era sua. Alfonso sabia que nenhuma outra mulher deveria ocupar seus pensamentos naquela noite, mas não conseguia parar de pensar em Dulce. Não podia deixar de compará-la a Anahí. Dulce era uma mulher forte, capaz de discutir e enfrentá-lo cara a cara. E depois simplesmente beijá-lo com todo o ardor da sua natureza impetuosa. Era uma explosão de cores. A pele bronzeada, a cabeça repleta de cachos castanho-mel luminosos, os olhos tão azuis quanto o céu do solstício de verão. Dulce era o sol, quente e brilhante. Anahí era a lua, pálida, fria e distante. Anahí... O que havia nela que a tornava tão intrigante? Seriam os olhos tão velados e misteriosos? Algum dia ele teria desejado alguém mais do que a desejava? Seus mistérios só o atraíam ainda mais, fazendo-o querer desvendá-los.
Mas ao entrarem no apartamento, na primeira noite em que ambos passariam juntos, soube que não poderia fazer amor com ela. Passara a semana toda pensando nesse momento, desejando-a, querendo sentir sua carne macia sob a dele, mas agora percebia que simplesmente não conseguiria. A aflição que o enfraquecera nas últimas semanas voltara à vida, fresca e amarga como sempre fora. Teria que dizer adeus a Dulce.
Quando a porta se fechou, Anahí se virou nos braços dele, contorcendo-se, envolvendo-o pelo pescoço. Ele a beijou de leve, odiando a rigidez do próprio corpo. Então, abaixou-lhe os braços e a afastou.
— Deixe-me dar uma olhada neste lugar — protelou. — Não o vi desde que você colocou a mobília.
— Ficou ótimo!
Alfonso caminhou pelo apartamento e Anahí o seguiu, Confusa por ele ter se livrado do seu abraço. Desequilibrada, abaixou-se e retirou os sapatos, sentindo-se mais estável descalça do que cambaleando sobre os saltos dos sapatos. Alfonso aprovou a decoração, então parecia não ter mais palavras. Suspirou e correu uma das mãos pelos cabelos. Conseguindo por fim tomar uma decisão, caminhou até Anahí e passou o braço em torno da sua cintura novamente. Firmando-a, levou-a até a porta do quarto dela. Apesar da necessidade que sentia de ficar só, o fato de não poder entrar naquele quarto sem um convite, ainda o irritava. Abriu a porta, alcançou o interruptor e acendeu a luz. Então segurou-a pelos ombros.
— Sinto muito — proferiu num tom baixo e frio.
— A cerimônia me afetou demais e não posso... Preciso ficar sozinho esta noite. Sinto muito — repetiu, esperando pela reação dela.
Não houve nenhuma. Anahí se limitou a encará-lo, parecendo menor que o habitual porque estava descalça. Os olhos exóticos desprovidos do brilho de minutos atrás.
— Boa noite — disse ela e se afastou, fechando a porta, antes que ele pudesse dizer qualquer outra coisa, se é que viria outra palavra a sua mente. Alfonso ficou parado olhando para a madeira branca da porta, os ombros largos caídos, as recordações atingindo-o dolorosamente durante vários minutos até ele se virar e seguir para o próprio quarto.
Deitou-se, mas não conseguiu dormir. Os anos que vivera com Dulce passaram pela sua mente como um filme, voltando a familiarizá-lo com todas as expressões que cruzavam a face bonita e expressiva da esposa. Os planos que fizeram durante as duas gravidezes dela. O orgulho e a profunda adoração que sentira ao pegar os filhos pela primeira vez nos braços. Lágrimas quentes queimaram o fundo dos seus olhos, mas não rolaram. Seus filhos. Justin. Shane.