Fanfic: A Lenda de um Amor - Sandy Blair | Tema: livro original, romance, época
Capítulo IV
Beth acordou no escuro, tremendo de frio. Franziu a testa ante a cacofonia de sons ao seu redor. Apertando as mãos trêmulas de encontro aos ouvidos, olhou em tomo, para o ambiente desconhecido que a circundava. Não fazia idéia de onde se encontrava, e pouco se importava com isso. A cabeça lhe doía muito, e quando tossiu, expeliu água salgada.
A última coisa da qual se lembrava era de se segurar no barco para se manter viva, enquanto sucessivas ondas tentavam arrancá-la para as águas bravias.
Beth fez uma careta quando um relâmpago brilhou. Ouvindo sons que lhe pareceram de cascos de cavalos e de homens gritando, imaginou as centenas de janelas do castelo, que lavara com tanto cuidado, batendo e se despedaçando. Tentou sentar-se, maravilhando-se por ainda estar viva. Não podia se dar ao luxo de ter janelas quebradas no castelo, sua futura querida pousada, pensou, ainda tonta.
Algo pesado mantinha seu torso e pernas paralisados. Virou o pescoço, e viu duas mulheres imóveis como estátuas de pedra, jazendo sobre seu próprio corpo. Um medo terrível a possuiu, e gritou.
O teto da prisão desconhecida se abriu, e um braço musculoso a segurou. Agarrando com força a mão masculina. Beth fitou o rosto com olhos azuis de seu salvador:
—Duncan?
O senhor de Blackstone, examinou o interior do coche despedaçado. Vendo apenas uma das mulheres ainda viva, que em nada se parecia com a noiva que lhe tinham descrito, soltou uma imprecação. Afastou os corpos das outras já mortas, e puxou a que gritava. Os Bruce iriam pagar caro por aquilo, pensou.
Enquanto a suspendia, a luz forte de um relâmpago brilhou no firmamento, e por um instante a noite se transformou em dia. Quando os rubis do anel que ela usava rebrilharam, um grande alívio o possuiu. Era o seu anel, graças a Deus! Sua noiva estava viva, e isso era o que importava.
Antes que pudesse colocá-la no solo, as mãos da jovem deslizaram sobre seu rosto, e dedos frios circundaram-lhe o pescoço.
—Oh, Duncan! Jamais...
Parou de falar e arregalou os olhos ante a carnificina que a circundava.
— Duncan?!
Antes que ele tivesse tempo de responder, a jovem soltou um suspiro e desmaiou.
— De novo? Será que é uma daquelas flores delicadas que desfalece a todo momento? — perguntou Angus, seu primo e braço direito, olhando por sobre o ombro de Duncan e analisando as roupas da jovem. — E que diabos está vestindo?
O senhor de Blackstone não fazia a menor idéia, porém sua noiva era do continente, e lá tinham hábitos diferentes. Talvez ela tivesse trajado vestes masculinas para se manter a salvo, ponderou. E a estranha calça comprida que usava facilitaria a cavalgada de volta a casa. Para seu casamento.
Beth abriu os olhos e dessa vez viu-se no enorme salão principal de Blackstone, nos braços nos braços poderosos de Duncan MacDougall.
Piscou diversas vezes, tentando entender por que havia um homenzinho vestido de marrom ali e sobre o que tartamudeava. Disse algo a Duncan, e o seu fantasma resmungou algo em resposta. Com a cabeça ainda zonza, mas desejosa de se apoiar nos próprios pés, Beth tentou desvencilhar-se dos braços fortes, mas foi em vão.
Passou a língua pelos lábios rachados ainda com gosto de água salgada e murmurou:
— Por favor, largue-me.
Duncan retrucou dando outra ordem ao homenzinho de expressão preocupada. A sala continuava a rodar, portanto Beth tentou se concentrar no enorme crucifixo de madeira que pendia do peito do estranho.
O que estaria acontecendo?
Com a testa muito franzida, o homenzinho de manto marrom continuou a murmurar, e Duncan a responder. Depois, por fim, dirigiu-se à Beth, perguntando:
— Aceitas este homem como teu esposo?
O coração de Beth pulou dentro do peito, ao perceber por fim do que se tratava.
Estupefata, tentou se libertar de Duncan com um repelão e murmurou:
— Mal posso pensar, quanto mais...
Porém tudo voltou a ficar negro ao seu redor.
— Desmaiou — disse o padre Given, como se ninguém ali tivesse percebido. — Precisamos parar a cerimônia.
Duncan, com o braço direito ocupado, segurando a noiva desvanecida, estendeu o esquerdo e agarrou o burel do padre. Com o gesto brusco, a manga de seu casaco descosturou, enquanto falava entre os dentes cerrados:
— Padre, vamos continuar. Ela consentiu, e disse "eu, Katherine LeBeau, aceito", antes de desmaiar. Existem aqui muitas testemunhas que confirmarão — relanceou um olhar para os homens em volta do salão, e todos aquiesceram com gesto de cabeça.
Duncan voltou a fitar o padre.
— Não a salvei faz uma hora, destruindo sete inimigos, para que o senhor venha lhe negar o desejo de se casar comigo. Na foi culpa da pobre moça ter sido atacada pêlos homens de Bruce. Continue!
Precisava tomar Katherine LeBeau Demont sua esposa ante do pôr-do-sol. Não tinha escolha.
O rei, ou melhor, o tio do rei, o duque de Albany, que estava determinado a se livrar de Katherine, deixara bem claro que sua sobrinha distante deveria ser a esposa de Duncan naquela data, ou Duncan perderia todos os seus bens, que iriam para os Bruce.
Só em pensar que seu clã, sempre tão leal, poderia ser despojado das terras, ficando sem alimento ou abrigo, e sem seu braço protetor, sentia um frio na espinha dorsal. Era intolerável. Voltou a sacudir o braço do padre.
— Diga as palavras!
O sacerdote apressou-se a terminar a cerimônia. Quando por fim murmurou amém, Duncan deixou ecoar um suspirou de satisfação. |
O primo Angus deu-lhe um tapinha nas costas à guisa cumprimento.
— Ai! — gemeu Duncan.
— Desculpe. Esqueci.
— Se fossem as suas costas, não esqueceria, tenho certeza!
Eleanor, sua esposa anterior, fizera seu trabalho maligno muito bem. O ombro de Duncan ainda estava inflamado após seu ataque feroz. Caso não tivesse ficado alerta ao encontrar a carta que Eleanor escrevera para o amante, a megera talvez tivesse executado com sucesso seu plano de assassiná-lo.
Quando ela caíra sobre a própria adaga durante a luta, e morrera, fizera um grande favor a Duncan. Jamais a amara, entretanto nunca teria a coragem de eliminá-la, sendo uma mulher. Entretanto a mãe de Eleanor, uma bruxa cigana, o amaldiçoara após a morte da filha, o que o fizera bani-la para as colinas. Apesar de Eleanor ter morrido por causa de suas próprias artimanhas cruéis, a velha não aceitara a perda.
Duncan jurara então nunca mais se casar. Após prometer fidelidade três vezes, pensando na segurança do clã e passando por vários tipos de sofrimentos, achara que já fizera sua parte perante o rei e Deus, mas estava enganado. Antes que a grama crescesse sobre o túmulo de Eleanor, e que seu ombro sarasse, ordem de Albany com o selo real, chegara às suas mãos.
Olhou para a esposa desmaiada, segura por seus braços. O rosto estava sujo e manchado de sangue, e um galo do tamanho um ovo de ganso surgira em sua testa. Não era de admirar que a pobre moça tivesse desmaiado, pensou.
Duncan olhou para o primo Angus.
— Enquanto a levo ao quarto, mande servir a ceia.
— Posso levá-la — ofereceu-se Angus.
— Não. Agora ela é minha responsabilidade, na saúde e na doença.
Beth voltou a abrir os olhos, e viu a cama de colunas e o to que já lhe eram familiares. Estava em seu quarto no castelo de Blackstone. Suspirou, aliviada. Tudo não passara de um pesadelo, graças a Deus.
Espreguiçou-se e quase soltou um grito de dor. O que acontecera com suas pernas?
A tempestade! Lembrou-se da luta que travara para manter-se no barco. Devia ter-se machucado ali. Com cuidado voltou-se para o lado, e viu nas janelas cortinas pesadas, que antes não existiam. Franziu a testa e passeou o olhar pelo aposento.
Deus! As tapeçarias, espelho e lareira haviam desaparecido! Pior ainda, seus preciosos produtos de maquiagem já não estavam sobre a cômoda, e foi isso que a fez se levantar da cama de um salto.
O quarto pareceu girar, e Beth apoiou-se em uma das colunas do leito, sua mente confusa, com imagens dela mesma presa em um lugar com duas mulheres mortas... Duncan... Homens sangrando... E o padre.
Por certo ainda estava enclausurada em seu pesadelo, raciocinou. Respirou fundo, e beliscou o braço. Mais forte. Nada mudou.
— Trate de acalmar-se, Beth. Isso não passa de um sonho mau, nada mais. Vá lavar o rosto, e tudo voltará ao normal, — murmurou para si mesma. |
Com dor de cabeça, dirigiu-se, cambaleando, na direção banheiro, e... conteve um grito, abafando a boca com as mãos.
No lugar em que deveria estar a banheira, pendiam estranhos vestidos de mangas longas. Onde antes havia a pia, encontrou grandes baús. A necessidade de gritar tomava-se cada vez mais premente, e Beth fez força para se conter.
— Isso não pode estar acontecendo!
Voltou correndo ao quarto, até a janela que dava para o leste e afastou a cortina. A paisagem estava diferente, e apenas uma luz lilás e uma brisa fresca a saudaram.
Era madrugada, o Sol começava a surgir por trás das colinas de um lado da baía. O coração de Beth pareceu parar de bater. Não poderia ter dormido tanto a ponto de tudo ter mudado, poderia?
Relanceou o olhar para a outra margem, procurando os prédios de Drasmoor, as ruas arborizadas e a cúpula da igreja. Encontrou apenas espirais de fumaça, elevando-se de construções baixas, espalhadas perto da praia e nas colinas. Os barcos atracados eram pequenos e com velas. Não havia nenhuma lancha a motor.
— Onde estou, afinal?
Passou a mão trêmula pela testa e sentiu o galo.
Será que fora dar em outra praia com outro castelo? A tempestade fora terrível, e isso era bem possível, raciocinou. Sim!Era isso! Não perdera a razão.
Suspirou e imaginou onde estariam as pessoas que a tinham salvado. Era claro que ainda dormiam, pois começava a amanhecer. Quando sentiu o estômago roncar, sorriu.
— Não é de admirar que esteja com dor de cabeça. Estou faminta!
Ficara desacordada por muito tempo, porém o que mais precisava no momento era encontrar um banheiro.
Não podia perambular pelos corredores vestindo a camisola transparente que alguém lhe emprestara, e que, esperava, fosse uma mulher. Procurou as próprias roupas e voltou a entrar no quarto de vestir que antes fora o banheiro. Não encontrou sua jeans e o suéter, então envergou um vertido longo de seda verde sem mangas.
Abriu a porta do quarto, deu uma olhada para o corredor e ouviu alguém bocejando no andar de baixo.
Começou a descer as escadas, e logo sua ansiedade retomou com toda a força. O salão era idêntico ao de Blackstone, mas a decoração era bem diferente. O castelo em que se encontrava ainda não fora modernizado. Castiçais de parede com óleo iluminavam o ambiente, e seus pés descalços e machucados pisaram o chão rústico.
O proprietário devia ser um fanático por antiguidades, pensou Beth. Imaginou se teria aberto o castelo ao público, para visitas turísticas, pois isso explicaria o motivo do lugar parecer uma praça de armas.
Alcançando o salão, virou uma curva e viu-se na frente a uma mulher pequena e morena, de cerca de trinta anos, vestida com roupas de época.
— Desculpe — murmurou Beth para a criatura espantada que carregava uma pilha de roupas. — Estou procurando o banheiro...
Os olhos da mulher se arregalaram, enquanto procurava ao redor, em busca de ajuda.
Concluindo que a outra também era nova no lugar, Beth deu-lhe um tapinha amigável no braço.
— Não tem importância. Encontrarei sozinha.
Quando se voltou, a mulher segurou-lhe o vestido e apontar na direção de onde Beth viera. Ótimo!, refletiu Beth. Acabara de passar pelo banheiro e nem percebera.
Seguindo a estranha, imaginou o quanto estaria distante de Blackstone. Será que haveria alguém para lhe dar uma carona até lá? Os Silverstein deviam estar preocupados a essa altura imaginando que se afogara. Por certo havia um telefone ali para emergências.
Beth gemeu. Se não encontrasse logo um banheiro...
Murmurando em francês, a mulher morena largou a trouxa de roupas que carregava.
— Senhorita, preciso encontrar um banheiro — disse Beth com amabilidade. — Já!
Ilustrou as palavras, segurando o ventre e dando um pulinho. Então o rosto da outra iluminou-se e ela riu.
—Ah! Oui, oui, madame!
— Sim, meu bem, preciso muito.
A mulher a conduziu escada acima de volta ao grande quarto e, para espanto de Beth, retirou um urinol debaixo da cama.
Parecia que o dono do castelo não só desdenhava a luz elétrica, como também qualquer tipo de encanamento moderno, refletiu Beth.
Talvez esse castelo fosse um museu. Existia uma infinidade deles listados em mapas e guias turísticos. Conformada, suspirou e tratou de usar o que tinha disponível.
Duncan empurrou para longe o prato ainda cheio de comida. Estava sem apetite. Não dormira, sentia-se febril e dolorido, cada vez pior. Alem disso, durante a noite, fora dar uma olhada na esposa adormecida, e sua aparência o assustara. Não apenas estava machucada, cheia de hematomas, mas era uma moça muito sem graça.
Como poderia se animar para levá-la para a cama, era algo que o inquietava. Mas precisava ser feito, e logo, se desejava manter tudo pelo que lutara tanto para conseguir.
— Duncan, por que está tão abatido?
Voltou-se e ficou frente a frente com Flora Campbell, irmã de sua primeira esposa, Mary. Como sempre, era a imagem da feminilidade, trajando um vestido de damasco azul que enfatizava a pele branca como leite. Os profundos olhos castanhos estavam sorridentes.
— Onde está sua linda e nova esposa?
Flora já ouvira todos os comentários, na noite anterior, sobre a aparência da atual mulher de Duncan, e o estava provocando. Sem paciência para brincadeiras, o lorde teve ímpetos de apagar o sorriso da mulher com um tapa.
— Bom dia, Flora.
— Posso oferecer-lhe outra coisa?
Assim dizendo, a dama inclinou-se sobre a mesa, exibindo com generosidade o profundo decote.
— Parece que está sem apetite para o que lhe ofereceram.
Como sempre, Flora usava as palavras como quem usa a espada, fazendo floreios com frases de duplo sentido e ironias. Caso Duncan se demonstrasse ofendido ou irritado, assumiria um ar inocente e protestaria que não dissera nada de mais. E caso um homem resolvesse se aproveitar de suas maneiras provocantes, Flora adotaria o papel de dama pudica.
Duncan a conhecia muito bem, e sua beleza não o atraía nem um pouco. Quem sabe por isso, conforme dizia Angus, ela o provocava sempre.
Logo após a morte de Mary, os Campbell haviam oferecido a Duncan a mão de Flora como esposa. Horrorizado com essa perspectiva, o chefe dos MacDougall dissera ao ex-sogro que não podia aceitar oferta tão generosa, já que os antigos cânones da Igreja proibiam o matrimônio entre pessoas aparentadas por sangue ou laços de família.
Como resposta, e para consternação de Duncan, Campbell oferecera-se para pagar por uma dispensa papal especial, e de novo MacDougall tivera que arranjar uma desculpa.
Resolveu alegar tristeza pelo luto com a morte de Mary a fim de aplacar a ira de Campbell, ofereceu-se para hospedar Flora, sabendo muito bem que isso seria um alívio para o pai que voltara a se casar havia pouco tempo.
Desde então Duncan bancara o casamenteiro e arranjara cinco pretendentes para Flora, mas ela sempre torcia o nariz. Infelizmente não era uma rica herdeira, nem uma viúva com direito aos bens do marido, portanto ninguém se sentira animado a insistir em desposá-la, apesar de sua beleza, depois de algumas tentativas.
Por outro lado, a jovem não era muito fervorosa para ir para um convento distante. No fundo, não passava de uma mulher que escolhera ficar solteira só para contrariá-lo, refletiu Duncan.
Estava para mandá-la embora do salão, quando um burburinho chegou aos seus ouvidos. Ergueu o rosto e deparou-se com sua noiva toda machucada, ao lado da pequena e morena Rachel.
Analisou seu rosto e ficou pensando o que teria acontecido para estar tão agitada. Deu de ombros, raciocinando que não era sua culpa, apesar da jovem parecer a ponto de um ataque de nervos.
Levantou-se e foi ao seu encontro. Quando seus olhares se encontraram, a noiva ficou pálida e estremeceu. Bem, pensou Duncan, não era o mais lindo dos homens, mas também não tinha o rosto de um demônio!
— Milady — murmurou, tomando-lhe a mão.
Beth prendeu o fôlego. Os dedos de Duncan eram quentes e firmes.
Então tudo aquilo era real, ponderou, cada vez mais assustada.
Seu fantasma se tomara um homem de carne e osso, alto e lindo. Como fora possível?
E quem eram todas aquelas pessoas que a fitavam? Sabia que sem maquiagem não era uma bela visão, mas os olhares chegavam a ser rudes. E por que todos se vestiam como se fossem a um baile à fantasia?
Com uma das mãos em volta de sua cintura, Duncan a guiou ao canto oposto do salão e convidou-a a sentar-se.
Beth afastou o olhar das damas com seus estranhos vestidos, e dos homens barbados, reparando nas poltronas de espaldar alto que descobrira no quarto de despejo. Seu coração pareceu dar um salto no peito.
Segurou as mãos de Duncan com força.
— Onde, afinal, estou?
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Autor(a): fanofbooks
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