Fanfics Brasil - 7 A Lenda de um Amor - Sandy Blair

Fanfic: A Lenda de um Amor - Sandy Blair | Tema: livro original, romance, época


Capítulo: 7

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Capítulo VI


 


Desapontada com o furor e a resistência de Duncan em ajudá-la, Beth vagou de cômodo em cômodo no castelo, batendo nos painéis de madeira, olhando atrás das tapeçarias, debaixo de camas e tapetes, na esperança de encontrar uma passagem secreta que a pudesse levar de volta ao seu mundo, ou acordar daquele pesadelo.


Quando nada encontrou, procurou nos espelhos, imaginado que poderia atravessar um deles, como Alice no País das Maravilhas. Após horas de buscas, nada mudara a não ser o estado de seu vestido.


Seu único consolo era que já não tinha uma dor de cabeça tão forte. Fosse lá o que Rachel pusera em sua bebida a fizera melhorar. Ciente de que tais curas medicinais eram comuns nesses tempos, ficou ainda mais acabrunhada.


Exausta, buscou refúgio dos olhares curiosos em uma saleta discreta do castelo. Ali, deslizou os dedos pelas lombadas de vários livros sobre uma mesa e leu uma delas: La Belle Dame Sans Merci, de Chartier.


— Francês — resmungou.


Os livros eram parte importante da vida de Beth, seu conforto em um mundo frio e indiferente. Nesse instante sentia falta dos romances que lera e relera nos períodos negros da vida, quando precisara de uma desculpa para chorar e do consolo de que melhores dias viriam. Os romances históricos escoceses eram alguns de seus preferidos.


Suspirou ante a ironia. Obtivera seu lindo cavaleiro da Escócia, em carne e osso, ainda mais belo do que imaginara, mas estava se escondendo, porque não queria participar de sua vida em outra época.


Além disso, durante a conversa que tivera com Duncan, ficara evidente que ele não suportava a visão da nova esposa. Beth suspirou e abriu um livro que ensinava como ser piedosa e muito religiosa.


Franziu o nariz. Não era isso que procurava, pensou. Havia ali muitas obras de teor religioso como o Livro das Horas, e o Calendário dos Santos, inúmeras preces, cânticos, poemas, e uma sobre como curar bizarros males do corpo; um volume sobre veterinária e mais histórias de santos.


A quantidade de textos religiosos a surpreendeu. Embora católico, Duncan não lhe parecia um homem muito piedoso. Por fim, após uma longa procura, encontrou o que desejava: romances. Com tantas esposas indo e vindo de Blackstone, tivera certeza de que os encontraria. Leu as lombadas: Lancelot, Merlin, Tristâo, Sir Degrevant, fosse lá quem fosse esse personagem, e A Busca do Santo Graal.


Nada muito interessante, concluiu. De qualquer modo, já que não tinha outras opções mais modernas, carregou os livros até a janela mais próxima, sentou-se e tratou de ficar confortável.


Folheou Lancelot e, para sua frustração, estava escrito em francês, assim como Tristão e Sir Degrevant. Abriu A Busca do Santo Graal e sentiu-se aliviada. Era em inglês arcaico, mas conseguia entender o texto.


Entretanto dentro de alguns minutos, seu olhar vagou de novo para a janela e para os planos de escapar de seu pesadelo. Observou as águas no momento serenas, que batiam nas rochas lá em baixo. A última lembrança que tinha do mundo real era de um mar encapelado e escuro, e de que vomitara muita água salgada quando despertara, dentro da carroça tombada.


De repente arregalou os olhos, sentindo o coração acelerado. Era isso! Precisava entrar de novo na água para escapar e retornar ao século XXI!


— Desculpe madame, não tive intenção de perturbá-la.


Assustada, Beth ergueu o rosto e deparou-se com o esposo de Rachel, Isaac Silverstein, parado no umbral da porta da saleta, os braços ocupados com muitos rolos de pergaminho.


— Por favor, entre, Isaac. Não sabia que este cômodo estava sendo usado.


Com o coração ainda aos saltos, Beth tratou de se levantar da poltrona.


— Não, por gentileza, senhora! Sente-se. Não irá me incommoder.


Beth sorriu ante a mistura de idiomas, que também parecia ser uma característica de Rachel. Decidiu que precisava vencer as suspeitas e o medo que sentia daquelas pessoas que, até pouco tempo atrás, só conhecera através da leitura dos diários de Duncan e dos relatos de Tom.


Isaac, alto e magro como seu descendente tão distante, aproximou-se.


— Por que não compareceu às vésperas?


— O que é isso?


— Preces.


— Oh! Não sou católica.


Isaac franziu a testa, mas nada disse, limitando-se a ler a capa do livro que Beth segurava.


— Boa leitura, senhora.


Espero que sim.


— Não quis ler algo mais profundo?


Beth franziu o nariz.


— Prefiro romances. Fugir da realidade... sabe como é...


Ante o olhar aturdido do homem, esclareceu.


— Gosto de lendas e contos, e adoro finais felizes.


— Ah! E seu primeiro esposo, senhora? Qual era a sua paixão?


Beth sentiu-se enrubescer.


— Nunca fui casada — vendo Silverstein arregalar os olhos, acrescentou. — A não ser com Duncan.


— Mas, honorable dame, teve um primeiro marido na França... oui?


Não! Nunca estive nesse país, e por certo jamais me casei antes — rodou o anel de rubis no dedo, imaginando como uma jóia tão bela poderia lhe incutir tanta apreensão. — Esta é a primeira vez — insistiu.


Com expressão incrédula, Isaac então perguntou:


— Madame, posso saber seu nome completo?


— Katherine Elizabeth MacDougall Pudding... e MacDougall — sorriu. — Agora tenho duplamente esse sobrenome.


O homem mordeu o lábio, de modo pensativo.


— Desculpe senhora. Preciso tomar uma providência.


— Foi um prazer falar consigo. Rachel, sua esposa, tem sido...


Mas Isaac já correra para a porta, como se mil demônios o perseguissem, deixando Beth sozinha.


 


 


— Querida, entre aí.


Assim dizendo, Isaac agarrou Rachel pelo braço e fechou a porta do quarto.


— Marido, por mais que deseje fazer amor com você, este não é o momento.


— Quieta! — Isaac examinou o aposento para ver se não havia mais ninguém ali. — Acontece que tive a conversa mais estapafúrdia com a atual esposa de MacDougall.


—E...?


— Não tenho tempo para explicar agora, mas preciso que descubra tudo que puder sobre o passado dessa mulher.


— Por que você mesmo não lhe pergunta? Tenho que tingir lã, remendar roupas...


— Rachel — interrompeu Isaac com severidade — temo que nosso Duncan tenha se casado com uma impostora.


A esposa ficou pálida como um lençol.


— Impossível! Se assim for, todos perderão tudo.


Com a testa porejada de suor, o marido aquiesceu.


 


 


Duncan debruçou-se no parapeito e viu Beth, as saias arregaçadas em volta das pernas, de quatro como um caranguejo, percorrendo a amurada mais baixa do castelo.


— Em nome dos Céus o que ela está tentando fazer agora?


Angus olhou para baixo.


— Não faço a menor idéia, meu amigo, porém é melhor detê-la, antes que se precipite no mar.


Duncan começou a descer as escadas, praguejando.


— Digo a você que ela é doida! E é uma pena, porque tem belas pernas. Mas de boa vontade deixaria que se afogasse, para me vingar de Albany e ter a quarta esposa morando sob minha proteção.


— Sim — concordou Angus, enquanto passavam correndo pelo pátio interno até as arcadas da entrada do castelo. — Mas será que a intenção dela é mesmo se suicidar?


Não sei nem me interessa, contanto que não consiga seu intento. Não podemos nos dar ao luxo de perdê-la.


Percorreram os flancos rochosos de Blackstone, escorregando no limo, mas encontraram deserta a área onde haviam visto lady Beth.


— Acha que caiu no mar? — perguntou Angus, observando a água em busca do corpo.


— Não. Olhe!


Duncan pulou uma poça e apontou para pegadas frescas logo acima da linha da água, na direção do outro lado do castelo. Com o coração acelerado de alívio, comandou:


— Venha!


Circundaram todo o castelo sem encontrar a esposa perdida. Adentrando os portões, Duncan perguntou à sentinela:


— Viu lady Beth?


— Sim, milorde. Acabou de entrar no castelo, toda molhada. Duncan penetrou na morada, esfregando as mãos que sangravam, esfoladas, por ter-se apoiado nos escorregadios muros de pedras, e voltou-se para Angus.


— Pode ter certeza que essa mulher me levará à morte.


Entrou como um raio no salão, pronto a cuspir fogo.


— Onde está ela? — gritou para todos que ali se encontravam. Flora inclinou a linda cabeça para um lado.


— Por "ela" refere-se à sua bela esposa, milorde?


Apenas a pressa fez Duncan sufocar uma reposta arrevesada, e murmurou:


—Sim.


Os lábios de Flora se curvaram em um sorrio irônico, e apontou para a escadaria.


— Acabou de subir, carregando algas.


—Algas?!


Duncan não esperou por mais nada. Nos seus calcanhares, Angus quis saber:


— O que pretende fazer quando a encontrar?


— Por enquanto vou apenas vigiá-la, mas logo que puder irei trancá-la a sete chaves na ala oeste.


De fato, após a conversa estapafúrdia que tivera com Beth, quando concluíra que era desequilibrada, mandara o pedreiro derrubar algumas paredes da ala oeste para fazer-lhe um apartamento espaçoso. Afinal, não era um bruto insensível, refletiu. A esposa viveria com relativo conforto até que obtivesse sua recompensa, ou ela a sua. O que sobrevivesse seria o vitorioso.


 


 


Beth soltou um suspiro, olhando para os lençóis que trançara formando uma corda, e que atirara pelo quarto de despejo da ala leste, a fim de descer até a beirada do mar. Tivera esperanças de escapar daquele mundo arcaico, mas fora em vão. Nada mudara, a não ser pelo frio atroz que sentia e pelo estado lamentável de seu vestido.


E, no entanto, precisava escapar, pensou. Seu amor próprio já estava em frangalhos também.


Ao contrário do fantasma bom e compassivo, o Duncan de carne e osso permanecia distante e arrogante, como se ela não fosse digna de atenção. Além disso, Beth não tolerava mais a Rainha da Beleza da Idade Média, Flora Campbell, sempre rondando e observando-a a distância, de modo disfarçado. E sentia o coração apertado e dolorido, quando Duncan atirava olhares para a linda mulher.


Tentando afastar os pensamentos de autocomiseração, olhou para as algas que trouxera consigo. Secas e moídas, com a mistura de aveia e algumas claras de ovos, seriam um tolerável creme de limpeza facial, refletiu. E poderia continuar usando o ungüento de manteiga e pétalas de rosas que Rachel lhe dera.


Do contrário, em breve sua cútis estaria sem viço e suja. E com a falta de maquiagem...


Estremeceu ante o pensamento terrível e rumou de volta ao grande salão, em busca de Rachel, que se oferecera, através de gestos e algumas palavras compreensíveis, a adaptar as roupas da terceira esposa de Duncan para a atual.


A perspectiva não era nada animadora, pois ninguém gostava de usar vestidos de uma mulher já falecida, porém Beth precisava se vestir, e o guarda-roupa da n° 3 de lorde MacDougall era o único que lhe caía relativamente bem.


Beth encontrou o salão lotado com os homens do clã, ansiosos e irrequietos. Por fim divisou Rachel no meio da multidão.


— O que está acontecendo?


— Nosso lorde! Desmaiou no pátio.


Um medo terrível apossou-se de Beth.


— Onde está? Quero vê-lo.


— Não é conveniente, senhora...


— Exijo ver Duncan já!


A outra suspirou, resignada.


—Como quiser...


No terceiro andar, Beth deparou com um homem que já lhe era familiar, e que lhe fora apresentado como o segundo no comando do clã.


— Milady — saudou, inclinando a cabeça.


— Bom dia. Gostaria de ver meu marido.


O homem cruzou os braços, em um gesto definitivo. 


— Não, milady.  


Continuou a falar, mas tudo que Beth compreendeu foi que se negava a atendê-la. 


Em seu mundo, lembrou-se, já lidara com muita gente teimosa em seu trabalho no Hotel St. Regis. e tratou de erguer a  cabeça em um gesto de desafio.


— Como se chama?


Parando de falar, o homem corou. Era evidente que não estava habituado a ser questionado e interrompido, muito menos por uma mulher.


— Angus MacDougall, milady. Sou primo de Duncan. ï — Dê-me passagem, sr. MacDougall. Verei meu marido agora mesmo.


— Não será bem-vinda nem por ele nem pelo médico. Médico? O coração de Beth deu um pulo no peito. Lera o suficiente para saber que homens da época e do estofo de Duncan só procuravam a medicina quando estavam muito mal. Encarou Angus e estendeu o braço para a maçaneta da porta.


— Não, milady — Angus se interpôs em seu caminho. — Peco-lhe que vá embora com Rachel Nosso líder falará com a senhora quando se sentir melhor.


Beth olhou de Angus para Rachel, que puxava pelo braço. Bem, pensou, tinha novidades paca os dois. Iria entrar e ver o homem do outro lado da porta. Afinal, era seu marido!


Voltou a fitar o beligerante escocês parado como uma torre à sua frente. Se o desafio não dera certo, refletiu, precisava mudar de tática. Aproximou-se mais e bateu de leve no peito de Angus.


— Ambos queremos o melhor para Duncan, concorda? — perguntou com calma, espaçando bem as palavras para ser compreendida. Angus aquiesceu com um gesto de cabeça. — Certo. Sou sua esposa e estou preocupada. Para ajudá-lo, preciso saber o que tem. E não posso fazer isso deste lado da porta. Entende... milorde? — Angus voltou a acenar de modo ríspido.


— Ótimo! Então, por favor, dê um passo para o lado — o primo de Duncan sorriu, revelando dentes perfeitos sob o bigode ruivo, e quando ia de novo balançar a cabeça em negativa, ouviu-se um lamento de cortar o coração do outro lado da porta.


Sem pensar duas vezes, Beth deu uma joelhada na região mais sensível do corpo de Angus. Empalidecendo de dor, o rapaz caiu de joelhos e, rápida como um raio, Beth arregaçou as saias e passou por cima dele.


— Desculpe, milorde Angus, mas não tive alternativa. Rachel, por favor, tome conta do cavalheiro, porque vou entrar e ver meu marido,


Encontrou Duncan branco como um lençol, deitado em uma enxerga, um braço pendendo para o chão. O velho que se encontrava ao lado franziu a testa, ante a entrada intempestiva de Beth, e voltou a atenção de novo para o braço do líder.


Beth sufocou um gemido ao ver o sangue que escorria de um talho enorme.


Lançou-se sobre o homem como uma fúria.


— O que pensa que está fazendo?!


O velho a ignorou e continuou a recolher o sangue em uma vasilha.


Beth arrancou o objeto das mãos sujas do pseudo-médico, e empurrou-o para um canto, apressando-se a estancar o sangue com um aperto sobre o corte.


— Deus! Está ardendo em febre — murmurou.


— Pare, milady! — gritou o médico. — É necessário deixar o sangue ruim escoar de seu corpo!


Sem dar ouvidos, Beth continuou a fazer força para estancar a ferida, e gritou a plenos pulmões: 


—Rachel!


Quando a francesa enfiou a cabeça pela porta, pediu:


— Tire este velho idiota daqui e ache panos limpos para fazer uma atadura!


Pardon. madame? — murmurou Rachel, sem entender.


Beth respirou fundo, armando-se de paciência, e falou bem devagar:


— Por favor, faça o médico sair e arrume um curativo.


Assim dizendo, afastou-se um pouco, para que Rachel visse a ferida que o imbecil provocara no braço de Duncan.


— Oh, oui, madame! — exclamou Rachel. — Doutor, saia, por favor.


— Mulher estúpida! —vociferou o médico, recolhendo seus utensílios.


— O que ele disse? — perguntou Beth. que não entendera bem a frase.


Rachel mordeu o lábio.


— Acha que a senhora é rude, madame.


— Pouco me importa, contanto que saia logo — replicou Beth, fitando Duncan com apreensão.


Colocou a mão em sua testa, e sentiu a temperatura alta. Haveria aspirina no século XV? Claro que não! E o que teria causado tanta febre?.


Inclinou-se sobre o corpo exangue do marido.


— Duncan? Pode me ouvir?


O lorde não abrira os olhos desde a briga com o médico, e continuou quieto.


Beth sabia que precisava despi-lo, e não poderia fazer isso sozinha. Olhou em volta do quarto austero, em busca de algo para estancar o sangue. Nada encontrando, rasgou com os dentes a manga do vestido. Estava relativamente limpa, ao contrário da saia, que fora arrastada na lama e na poeira.


Enrolou o tecido em tomo do antebraço musculoso e, tendo detido a hemorragia, concentrou-se na tarefa de despi-lo.


Nesse momento. Angus entrou, o rosto congestionado.


— Milady, aconselho-a...


— Pare de me ameaçar, milorde, e venha até aqui. Duncan está ardendo em febre! Ajude-me a despi-lo.


— Afaste-se — rosnou o outro MacDougall, empurrando-a.


Sem confiar em suas intenções, Beth postou-se do outro da enxerga, sufocando uma exclamação aflita, quando Angus virou Duncan de lado, e uma ferida irregular surgiu no ombro esquerdo do marido.


Enorme, parecia uma bocarra aberta e purulenta. A infecção era galopante, e os poucos pontos que haviam sido dados, estavam retesados. Era uma visão horrível.


Angus também parecia horrorizado.


— Homem! — murmurou mais para si mesmo. — Por que não me disse?


Beth tratou de enxugar as lágrimas que teimavam em rolar de seus olhos.


— Rápido! Precisamos despi-lo!


Logo Rachel irrompeu no quarto, trazendo uma vasilha com água, uma pequena atadura, agulha e linha.


Beth agarrou a vasilha.


— Preciso de mais água... Fervendo... E mais ataduras. Montes de ataduras!


Quando Rachel franziu a testa, sem entender, Beth mostrou-lhe o ombro de Duncan, fazendo a francesa empalidecer.


— Agora mesmo, Rachel! — apontou para a pequena pilha de panos brancos que chegara. — Preciso de muito mais! A mulher acenou de modo afirmativo e voltou a sair.


Beth ajoelhou-se junto ao marido e examinou a ferida. Voltou-se para Angus:


— Não tem motivos para acreditar em mim, mas, por favor, imploro, faça o que eu disser — as lágrimas impediam-na de falar com voz firme. — Primeiro preciso limpar o corte que o médico fez, antes que todo o braço fique infeccionado.


O médico idiota nem se preocupara em lavar as mãos imundas, e Beth duvidava que a lâmina que utilizara para cortar a carne de Duncan estivesse limpa. Só Deus sabia o tipo de bactérias que introduzira no corpo do pobre marido!


Olhou para a agulha que Rachel trouxera e sentiu o estômago revirar. Jamais enfiara uma na pele de alguém, refletiu, mas já costurara muitas galinhas recheadas antes de irem ao forno.


Por certo não faria um trabalho pior do que aqueles que a circundavam, pensou, pois pelo menos sabia o que era esterilização.


Enquanto Beth expunha a ferida no braço de Duncan, Rachel voltou correndo, trazendo uma bacia grande com água fumegante. Em seguida entrou Isaac com sabão e panos limpos suficientes para enrolar uma múmia.


Beth principiou a cortar os panos em pequenos pedaços. Quando começou a colocá-los na água fervente com as próprias mãos, Rachel protestou.


— Não, senhora!


Fazendo força para não gritar de dor por causa da temperatura da água, Beth retirou as mãos vermelhas, sacudiu os panos para esfriá-los e começou a limpar a ferida.


Quando o corte ficou bem limpo, dentro das parcas possibilidades, Beth pegou a agulha e os fios de seda, esterilizou-os também e fez uma prece muda.


Por favor. Senhor, que minha mão não trema.


Com calma e precisão, aliviada pelo fato de Duncan não se mexer, começou a dar os pontos, dez ao todo, sob os olhares estupefatos dos presentes. Por fim ergueu os olhos e viu Rachel ao seu lado, segurando um pote com um ungüento oleoso. Beth balançou a cabeça em uma muda negativa, mas a outra insistiu.


Oui, madame, é necessário.


Com relutância, a nova esposa de Duncan voltou a mergulhar as mãos na água fervente, e quando achou que estavam bem limpas, colocou uma parte da pomada sobre uns panos já  esterilizados, esperando que a coloração esverdeada e marrom fosse devido às ervas medicinais que continha.


Quando o curativo terminou, passou a mão pelos cabelos úmidos de suor, deparou-se com Angus que a observava e disse


— É hora de limpar a ferida no ombro.


Sem proferir uma palavra. Angus virou Duncan na enxerga enquanto os demais permaneciam ao redor.


Beth sabia que precisava abrir a chaga para drená-la. Fixou a cintura de Angus.


— Dê-me o dirk.


Depois de tantas leituras de romances sobre a antiga Escócia, sabia o nome do punhal que os escoceses usavam.


O cavaleiro a fitou com os olhos semicerrados, murmurou algo para Isaac, que murmurou de volta, e por fim retirou o punhal da cintura, entregando-o.


Beth voltou a fazer o ritual da esterilização. Mergulhou a arma na água que Rachel voltara a mudar. Mordeu o lábio para evitar um gemido de dor e retirou o braço, esfolado até o cotovelo pela água escaldante.


Fitou Angus e fez um aceno que foi perfeitamente entendido. O primo segurou Duncan com força, Beth engoliu a seco, e cortou os nós frouxos que prendiam os lábios semi-abertos da ferida, uma golfada de pus fétido deslizou como mel pelas costas do doente, fazendo Beth e Angus franzirem o cenho com o fedor nauseabundo.


— Rachel, mais água quente — pediu a nova esposa com um fio de voz.


De olhos esbugalhados, a francesa obedeceu, saindo do quarto como um raio.


Beth foi retirando o pus com cuidado, sempre rezando para que, pelo menos, o marido abrisse os olhos ou gemesse. Mas como Duncan continuava inerte, o pânico a dominou, e suas mãos tremeram. Será que seus esforços eram em vão?, perguntou-se, angustiada.


 


 


Não era médica, não dispunha de antibióticos ali, nem mesmo sabia o grau da febre ou a pulsação do marido.


Rachel voltou nesse instante, e Bem tomou a mergulhar as mãos, já muito vermelhas e esfoladas, na água fervente. Tudo faria ao seu alcance, seguindo o que lera, ouvira dos amigos, e assistira na televisão, para salvar o senhor de Blackstone. Depois só restaria confiar em Deus e em Sua misericórdia.


Quando o ferimento por fim foi limpo, imaginou se deveria dar pontos. Sabia, pelos conhecimentos sobre primeiros socorros, que só se costurava uma ferida até doze horas após o ocorrido. Pelo que Angus lhe contara, a de Duncan fora provocada havia bastante tempo.


Olhou para trás ao ouvir um murmúrio abafado e viu dezenas de rostos ansiosos na soleira da porta do quarto.


— Pense, Beth, pense...


Lembrou-se de que quando o filho de Linda, sua amiga, fora operado de apêndice supurado, os médicos haviam aplicado no corte gaze envolvida em um produto à base de sua, para que fechasse. Linda dissera que o método deixaria uma cicatriz feia, mas o menino sobreviveria.


— Rachel, preciso de sal — pediu com firmeza.


Ignorava a quantidade certa que era preciso para uma solução, mas concluiu que não devia ser muito.


— Sal, madame?


— Sim. E afaste todas essas pessoas daqui.


Quando terminasse de fazer o curativo, precisaria de privacidade para lavar todo o corpo de Duncan com água fria a fim de aplacar a febre. Era isso que sua amiga Tammy fazia quando seu bebê tinha infecção no ouvido. E claro que também lhe dava analgésicos e antibióticos, mas...


Observando a respiração compassada de Duncan, Beth suspirou. O marido ainda não voltara a si, e a idéia de que poderia morrer e tomar a ser um fantasma amigo a deixava desesperada.


Não fazia o menor sentido, refletiu. O Duncan de carne e osso não gostava dela e julgava-a louca, entretanto bastava que a fitasse para deixá-la com os joelhos bambos.


Rachel tocou-a no ombro, cortando o fio de seus pensamentos.


Honorable dame, por favor... Dormir... Vigiarei MacDougall.


Beth endireitou-se, enxugando as lágrimas com as costas das mãos.


— Obrigada, mas vou ficar aqui — tocou a fronte do doente e, para sua tristeza, sentiu que a febre continuava alta.


Não sabia como o destino a fizera voltar no tempo, mas suspeitava que fora porque Duncan morrera muito cedo. Não permitiria que isso acontecesse.


— Preciso de mais água fria.


— Precisa comer também — replicou Rachel.


Mas comida era a última coisa que Beth desejava.


— Só água, por favor.


Rachel saiu, e Angus entrou.


— Como está meu senhor?


— É cedo para dizer.


— Ele não morrerá?


— Espero que não, Angus.


O cavaleiro recostou-se na parede e cruzou os braços sobre o peito.


— Por que se importa com ele?


Era uma boa pergunta, e Beth respondeu com simplicidade.


— É meu marido.


— Mas não o ama. E ainda precisam se conhecer para que ele obtenha a herança.


— Conhecer?


— Sim. Ainda não consumaram o casamento.


E como Angus podia saber disso?, questionou-se Beth. Mas sim, apenas a Beth Pudding sem graça podia estar casada com um homem forte, alto e lindo como Duncan, e continuar virgem três dias após a cerimônia! Ante tal pensamento, ficou vermelha de raiva.


— Se nos... conhecemos ainda ou não é problema meu, e não seu! Além disso, tenho meu próprio castelo, muito mais bonito que este. E não ouse dizer que deixaria Duncan morrer para ficar com tudo! Fui clara?


— Muito.


— Fico satisfeita que tenhamos nos entendido.


Assim dizendo, Beth sentou-se na cadeira que Rachel providenciara, quando esta percebera que a nova castelã não arredaria o pé do quarto.


Examinou os próprios braços e mãos. Doíam muito, apesar do ungüento que Rachel passara. Havia bolhas nas pontas dos dedos, e Beth começou a chorar com pena de si mesma. Ficaria com cicatrizes, pensou. Era só o que lhe faltava!


Mas dias depois o poder dos conhecimentos cicatrizantes de Rachel se fizeram perceber, pois a pele voltou a ficar branca, macia, e sem marcas.


 


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Autor(a): fanofbooks

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