Fanfics Brasil - Capítulo um Sombria

Fanfic: Sombria


Capítulo: Capítulo um

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Bom, não parecia ser tão ruim assim como eu pensava. Depois de tanto tempo naquele avião e agora, mais algumas horas de carro, eu certamente ficarei com a bunda quadrada, além de dormente. Mas eu já estava acostumada com esse infeliz evento. Desde os meus dez anos de idade mamãe me obrigava a passar um tempo com meu pai, em Wicklow. E eu simplesmente detestava isso. Quero dizer, detestava menos que mamãe. Mas ainda assim detestava. Deixe-me explicar melhor minha situação, não quero que você me ache uma chata resmungona logo no início.


 


Meus pais se separaram antes mesmo de eu nascer. Não sei muito bem o motivo, talvez não houvesse motivo algum. Simplesmente aconteceu. Mas não, eu não sou nem um pouco problemática por causa disso. Apesar de que, às vezes meus pais achem que essa é a única explicação para os meus problemas. E olhem que eu sou completamente a favor da separação deles. Quer dizer, é claro que eu preferiria que nós fôssemos uma família unida, mas se o preço disso fosse ter que ser obrigada a ouvir as freqüentes discussões deles, eu prefiro que as coisas fiquem como estão. Digamos que eles não podem se falar sem haver no mínimo uma grosseria. O clima entre os dois é, sem dúvidas, um dos piores. Pelo menos desde que eu me lembre.


 


Eu morava com minha mãe em Dublin, e estudava em uma das escolas mais conhecidas, e nossa família (Ou melhor, uma parte da família de meu pai) era uma das mais conhecidas do local. Para ser mais clara, era uma família de nome. Então, eu praticamente engatinhei junto com todos os meus amigos. Únicos amigos, talvez. Acontece que não precisava muita coisa para ser uma das alunas mais populares daquele colégio. Bastaria um pouco de sorte e pronto, você teria tudo. Pelo menos era assim que as coisas caminhavam na Saint Patrick School.


 


E vocês devem estar se perguntando o porquê dessa garota maluca está se mudando. Que fique bem claro que a escolha não foi minha. Digamos que a última vez que meus pais se encontraram foi no ano passado. No final do ano passado, para ser mais exata.


 


 -Sua filha é uma bêbada! – Meu pai gritou. Ele sempre gostava de falar que eu era apenas filha de minha mãe quando eu fazia alguma besteira.


 


-Cale a boca, Peter! – Minha mãe berrou, procurando algum objeto o mais próximo possível e mais pesado para tacar nele.


 


Pelo menos era essa a reação que eu esperava dela, já que estava em prantos. E quando minha mãe ficava com raiva, ela chorava feito uma torneira. Infelizmente eu adquirira esse hábito dela.  


 


-Como isso foi acontecer? Como? – Ela colocou as mãos no rosto escarlate tentando conter as lágrimas. – Isso só pode ser influência da sua família! Aqueles porcos!


 


-Você não conhece metade da minha família, Emily! – Meu pai rebateu.


 


-Nem você!


 


-Mesmo assim, nunca soube de casos de alguém se embebedando por aí. Isso foi irresponsabilidade sua. Se você ficasse de olho nela nada disso teria acontecido.


 


-Então a culpa é toda minha? – Ela disse com a voz trêmula.


 


-Não... Não estou querendo dizer isso. Só que, bem – Ele pareceu confuso pelo que pude ouvir – Esse tipo de amizade não é para Brianna. Já conversamos sobre isso...


 


Mentira! Papai nunca me disse nada contra minhas amigas. O que ele poderia dizer? Todas elas foram abençoadas com uma beleza exuberante, inteligência e sagacidade.


 


Catherine era a garota mais bonita e popular de toda a escola. Ela fazia sua auto-estima ficar lá embaixo só por passar por você. Kristen tinha o rosto tão angelical que era capaz de enganar o mais esperto dos adultos. E todas nós parecíamos pobres meninas inocentes na mente de qualquer pessoa, pelo menos era isso que eu imaginava. Mas não vou ficar aqui descrevendo como minhas amigas eram tão bonitas, tão espertas, tão legais, tão educadas, e tão filhas da puta. Isso você irá descobrir aos poucos.


 


Tudo o que posso dizer, é que quando eu sofri um pequeno acidente, papai veio correndo de Wicklow para ficar hospedado em um hotel (Ah, ta bom! Uma gentileza chamar aquilo de hotel) em Dublin. Tudo isso porque naquele dia eles iriam chegar a uma conclusão que mudaria minha vida. E como mudaria. Quando chegou em casa, tão vermelho quanto minha mãe, ele soltou aquelas palavras nada amistosas. Mas entendam, aquilo parecia a forma de demonstrarem carinho um pelo outro. Não que papai não me amasse e quisesse dizer que no momento em que eu fazia coisas erradas – Lê-se nas entrelinhas: Sempre – que eu era só filha de minha mãe. Que eu era uma desconhecida na vida dele. De forma alguma!


 


Papai me amava tanto que nunca deixou com que me faltasse nada. E tenho certeza que sofreu muito com a separação dele e minha mãe, mas que mesmo assim nunca deixou de me visitar quando eu ainda era um bebê. E minha mãe também. Mesmo separada de meu pai, ela sempre disse a mim que a melhor coisa de seu casamento foi o meu nascimento e que com certeza havia valido a pena aturar meu pai por todos aqueles anos. E ela também nunca deixou me faltar nada. Tinha todo o carinho, toda a atenção e todo o amor de ambos. E também de meu irmão Matt.


 


Ah, mas isso é uma outra história. O fato é que desde que eu me lembre, ela e papai viviam brigando quando se encontravam e por isso quase não se viam. Mas acredite, eles ainda se amavam. Por mais que fossem teimosos, cabeças duras, ridículos e pomposos demais para admitir isso. E como eu sei de tudo isso? Desde criancinha eu via minha mãe várias vezes revendo fotos, lendo cartas, e podia ver no olhar dela a tristeza. E era tão grande a sua tristeza que às vezes chegava a transbordar pelos olhos. Claro que ela nunca soube disso. E quanto a papai, bem, ele ainda tinha várias fotos de nós juntos espalhadas por várias partes de sua casa em Wicklow.


 


E, além disso, ele tinha uma foto de seu casamento em seu quarto, mas sempre tirava da parede quando eu ia passar as férias com ele. Mas é claro que eu sabia que ele possuía a foto. Nada escapa de meus olhos. Eu só não sabia o que os impedia de ficar juntos. Mas preferiria não entrar neste assunto. Era um problema deles, talvez um dia resolvessem tudo. E mais, eu ia explodir de tanto rir se os ouvisse brigando por tanto tempo. Chegava às vezes ser engraçado, estou falando sério.


 


O fato é que depois de uma longa discussão sobre os meus modos, eles chegaram a terrível conclusão de que eu era – E sempre fui – uma adolescente problemática, rebelde, triste, e que ainda não aceitava a separação dos pais. E, por isso, me envolvia em problemas que envolviam a pobre polícia de Dublin, pessoas que ligavam para minha casa a todo instante me chamando de louca porque disse/fiz algo que envolvia pessoas mortas de suas famílias, e agora, estava me tornando uma bêbada. Talvez eles também achassem que eu era esquizofrênica. Nunca ouvi tamanho absurdo! E agora estou eu, voltando para Wicklow, mas desta vez, não apenas para passar minhas queridas férias.


 


 -Até ela se curar do vício. – Papai disse. Pobre papai, acha que pode curar meus problemas porque iremos morar no campo. 


 


Longe das más influências, como ele disse, longe do vício. Como se houvesse vício! Não sou uma viciada! Tive vontade gritar isso em sua cara. E preste atenção, eu realmente não sou uma viciada. Foi apenas um pequeno acidente. Mas quem iria acreditar em mim? Quem? Se eu pudesse, realmente, adoraria contar para eles o que eu fiz nos últimos dezesseis anos.


 


Gostaria de contar que estou felicíssima como as coisas andam, que não sou revoltada por eles serem separados, que amo muito eles, e que me afastar da agitação de Dublin com certeza não irá fazer com que meus problemas se acabem. Mas não era tão fácil assim contar a eles. Acho que até Matt havia perdido a confiança em mim.


Ah, Matt!
É claro, havia esquecido de contar essa história. O fato é que eu não sou filha única. Dois anos após a separação deles, minha mãe engravidou de Matt.
Preciso de um motivo mais vivo para dizer que eles ainda são apaixonados um pelo outro?Tudo bem, tudo bem, não entrarei em mais detalhes. Como disse, esses pequenos detalhes vocês saberão com o passar do tempo. A minha história começada no meio do ano passado, era mais uma festa comum, mais amigos comuns, mais problemas comuns.


O que eu quero dizer é, imagine você, sexta feira à noite. De repente o seu telefone toca. A garota do outro lado da linha é Catherine, a sua melhor amiga e a garota mais bonita e popular de todo o colégio. Ela está te convidando para mais uma festa em sua casa.
O que você faria?


Eu também sou humana, também tenho uma vida social, mesmo que não goste de ficar muito próximo das pessoas vivas. Mas não havia como recusar.
Toda a escola estaria lá. Mas eu não estava tão entusiasmada. Vou explicar melhor. Eu só aceitei o convite porque tinha trabalho a fazer. Cerca de um mês, James, um babaca da escola, se envolveu em uma brincadeira de mau gosto que acabou levando uma pessoa à morte. E, digamos, que eu descobri tudo. Ou melhor, me contaram tudo. Ou melhor ainda, eu vi tudo.


Posso afirmar ainda que eu não sou maluca. Eu juro. O problema é que eu vejo gente morta. É, você leu isso certo sim, não seja idiota. E não só vejo, falo com eles também.


 


Primeiramente, não, não é o tempo todo. Eu não saio por aí vendo mortos em toda esquina, eles não aparecem para mim todo dia e eu quase não vou ao cemitério. Na verdade, não é tão fácil encontrar um fantasma em um cemitério. Quando quiser achar um, procure saber qual era o lugar que ele mais ficava quando estava vivo, e certamente você o encontrará lá. Você sabe como é, velhos hábitos nunca morrem.


E, cerca de seis meses antes disso acontecer, eu descobri que essa não era só a minha anormalidade. Como se isso já não bastasse, agora eu podia ver acontecimentos recentes na vida das pessoas só pelo simples fato de tocá-las. E isso só serviu para me afastar mais ainda das pessoas, pois doía. Não era uma sensação boa, era muito desagradável. E se eu já tinha fama de maluca, esquisita, e problemática, certamente as pessoas deveriam ter maus pensamentos de mim agora.
Mas isso não vem ao caso.


O fantasma que perseguia James se chamava Charlie. E em minha opinião, eram dois babacas. Charlie estava embriagado de ódio, sede por vingança. E isso não era nada bom. Porque no geral, eu tenho que ajudá-los a resolver seus problemas para que finalmente eles possam viver em paz. Mas como eu poderia acabar com a vida de James também? Então decidi ir à festa, temendo pela vida de James. Meu dever era protegê-lo.


Mas quando cheguei à casa de Catherine, Charlie não estava perseguindo James em momento algum. James estava sozinho, se divertindo muito, enchendo a cara e num circulo com várias meninas. Garanto que se eu fosse um pouquinho mais malvada eu me tornaria amiga de Charlie. Mas eu não sou. E também não gostava dos fantasmas. Mortos ou vivos, não passavam de pessoas. E pessoas são tão fúteis, tão esquisitas, tão hipócritas, que eu me envergonho de ser uma.


 


Desculpem pelo meu discurso repugnante, mas sou uma pessoa um pouco revoltada com o rumo das coisas nesse mundo. E sem dúvidas, as pessoas só estragam tudo. Mas vou parar por aqui.


Sem Charlie em meu caminho, eu me tornara inútil. Não tinha nada para fazer naquela festa barulhenta cheia de adolescentes patéticos. Eu fiquei por muito tempo ouvindo a conversa de algumas pessoas e tentando conversar com outras. Alguns garotos – fora de si, só pode ser – tentaram algo comigo, mas eu fiquei completamente enraivecida porque todos eles vinham diretamente encostando em mim. E quando eu toco nas pessoas, vocês sabem, eu tenho sensações horríveis por causa daquela história de ver acontecimentos de suas vidas. Então eu fico lerda, cheia de dor e com muita raiva.


Sem falar que minha cabeça doía por causa da música alta, meu estômago revirava por causa do cheiro forte de bebida, e eu estava deslocada, porque não sabia o que fazer naquela maldita festa. Então o jeito foi ficar sentada em uma mesinha com algumas pessoas.


Claro que com o tempo acabei bebendo um pouco. Normalmente, quando íamos a alguns pubs (antes dos seis meses atrás quando descobri que não podia nem esbarrar em pessoas), eu e minhas amigas bebíamos um pouco. Que adolescente não vai a pubs! Eu pensava.


Então já estava acostumada com a bebida. Mas sinceramente eu não sei o que aconteceu. Estava tudo barulhento demais, tudo alegre demais. E eu descobri que quando ficasse bêbada eu não via mais nada ao encostar nas pessoas. Acho que meu pai estava certo, eu estava bêbada naquele dia. Mas não foi por mal. Tudo que eu queria era voltar a ser uma adolescente normal pelo menos uma vez.


Estou errada por isso? Não é legal sair por aí encostando em todo mundo e até mesmo as pessoas que você ama te machucarem de uma forma tão intensa. Eu estava vulnerável demais, aberta demais. Tudo e todos podiam me machucar. Eu não podia nem sair mais com algum menino sem me machucar. E quando eu descobri que poderia usar a bebida como uma anestesia, puxa vida, eu fiquei maravilhada, encantada, talvez nem mesmo houvesse palavras para descrever como eu me senti.


Talvez tenha sido a mesma sensação quando Alice descobriu o país das maravilhas, no livro Alice no país das maravilhas. Ou talvez foi a mesma reação como a de Ponce de León quando achou a sua queria Fonte da Juventude. Não importa. O que realmente interessa é que eu me senti a pessoa mais feliz, realizada e sortuda do mundo. Talvez eu pretendesse viver bêbada pelo resto de minha vida. Então não me importei em encher a cara. E olha, eu nunca ri tanto em minha vida. Pelo que posso me lembrar, eu mal encostava nas pessoas novamente e soltava risadas tão sinceras, tão felizes, que hoje eu tenho pena de mim mesma ao lembrar disso. Mas alguém pode me culpar por querer ser normal outra vez?


O que eu me lembro, é que estava sentada na mesa, rindo como uma idiota, quando percebi que estava rindo sozinha. Tentei procurar as pessoas, e por acaso, avistei Charlie do outro lado. E acho que devo ter rido disso também. Porém minha risada não pode ter durado por muito tempo, pois ainda posso me lembrar o que ele estava fazendo. Ele estava por cima de um corpo, aparentemente ambos estavam molhados. Será que já está chovendo? – Eu pensei furiosa. – Essa maldita Irlanda só sabe chover! – Esbravejei.


 


Só então quando me levantei é que percebi que não estava chovendo nada. Charlie estava era numa piscina. E realmente estava sobre um corpo. Juro que por um instante eu quase perguntei a ele o que ele estava em cima de James. Foi uma sorte a minha ter anos de experiência com fantasmas. Não sei qual, mas com certeza uma parte do meu cérebro entendeu tudo. Charlie se aproveitara das circunstâncias em que eu me encontrava para se vingar de James, e agora estava tentando matá-lo afogado. E não sei também se foi essa parte do meu cérebro que me fez sair correndo – cambaleando, para ser sincera – empurrando todo mundo que estava em minha frente, e me atirando na piscina de Catherine.


Pude ouvir vários “ohs” e vários “ahs”, mas nenhuma boa alma veio me ajudar. Muito pelo contrário, eu não conseguia nadar, de modo que eu estava engolindo muita água, e não conseguia livrar James de Charlie, pelo que parecia, ele também estava tentando me afogar.


Algumas pessoas tentaram nos livrar da piscina, depois de um tempo, mas não conseguiam entender porque não estavam conseguindo, já que nenhum deles podia ver Charlie. Quer dizer, eu estava lutando ao mesmo tempo para me livrar das pessoas que queriam me ajudar, e me livrar de Charlie. Na verdade, tudo que eu queria era dar um belo soco em Charlie. Mas é claro que ninguém entendeu nada.


Logo uma ambulância chegou.


Lembro que os convidados de Catherine conseguiram me tirar com facilidade da piscina, enquanto os médicos vinham tentavam ajudar James. Mas o pobre James levou alguns minutos para conseguir se livrar de Charlie. Em quanto isso, eu vomitava muito. Nunca me senti tão enjoada. Além de estar sem fôlego algum. Lembro que o rosto de James estava muito roxo, e não tinha certeza se ele ainda respirava.


Charlie me olhou rindo, e logo entrou na ambulância com James. Se ele queria se aproximar de James, é porque ele ainda não estava morto, então eu ainda poderia salvá-lo.


 


Enquanto levavam James na ambulância, eu peguei meu carro e fui atrás deles. Claro que demorei um século para achar minha chave, e mais ainda para encaixá-la na fechadura. É claro que eu não estava sóbria e estava arriscando minha vida e a vida de outros motoristas e de alguns pedestres. Mas que escolha eu tinha? Havia tudo sido culpa minha. Se eu não fosse tão egoísta, nada daquilo teria acontecido a James.


 


Charlie viu que eu estava o seguindo, e decidiu se livrar de mim. Eu estava tão vulnerável que foi muito fácil. Ele se materializou em meu carro, me dando um baita susto. Depois tivemos uma pequena discussão e finalmente ele se apossou do meu volante. Tentei socá-lo, mas não deu certo. O que aconteceu, é que acabei batendo em alguma coisa e meu carro capotou. Depois disso, não me lembro de mais nada.


Só consigo me lembrar que quando acordei minha mãe estava pálida e com olheiras. Ela não me deixou ver meu rosto de forma alguma. Ela estava extremamente chateada comigo. Alguns dos meus amigos vieram me visitar no hospital. Mas muitos não voltaram mais. Acho que eles também não gostaram da minha aparência.


Quando voltei para casa, meu pai veio correndo para Dublin e teve aquela discussão com minha mãe. A conclusão foi de que eu iria morar com meu pai, afim de que se eu fosse morar no campo, levaria uma vida mais sossegada e poderia repensar nos meus atos. E eu odiava aquele lugar. A vida realmente não é justa. Especialmente quando a gente tenta fazer o bem.


 


Mas o pior de tudo nessa história, é que agora terei que me mudar para Wicklow. Sentirei saudades de Dublin, mas às vezes é preciso recomeçar. Tentava concordar com tudo o que meu pai me falava sobre Wicklow: “Situado no meio das Colinas verdejantes, encontram-se pequenos desfiladeiros lindos, cascatas, e lagos calmos. É por uma boa razão que este Condado é conhecido como o “Jardim da Irlanda”. Um lugar rico de belezas naturais.”


De qualquer forma, agora não há mais volta.


–Não se preocupe querida, eu manterei contato todos os dias. -Minha mãe disse chorosa. Sabia que ela sofreria muito com a minha partida.


–Não deixe de se comunicar, mãe. -Falei um pouco triste, mas no fundo queria que ela visse o quanto eu estava arrependida e que me impedisse de ir a Wicklow.


–Eu sentirei sua falta. -Ela disse com os olhos cheios de lágrimas.


 


–Eu te amo. -Abracei-a mais forte do que imaginaria.


–Nos veremos em breve, eu prometo.


E logo entrei no avião com Matt. Não podia acreditar que estava deixando minha mãe, meus amigos e tudo o que construí em dezesseis anos. Enquanto meu irmão Matt estava maravilhado. Quer dizer, nem havia necessidade de Matt ir comigo para Wicklow. Mas ele fez questão. Implorou mamãe para que fosse também. Matt era um mané.


Meu humor estava terrível. Na verdade, estava pior que o normal. Minha vontade era de arrumar confusão com o primeiro passageiro que se sentasse ao meu lado, ou talvez dar um belo ponta pé em uma aeromoça. Eu era tão infantil. Sempre queria descontar meus problemas em cima das pessoas que não tinham culpa, mas felizmente nunca tive coragem para fazer isso. No máximo, as grosserias aconteciam só em minha mente.


Quando cheguei a Wicklow, estava chovendo. Não me surpreendi. Dublin também era assim, mas às vezes o clima ficava quente e ensolarado. Às vezes. Coloquei minha capa de chuva e fui encontrar meu pai. Assim que nos viu, abriu um sorriso largo em eu rosto e seus olhos azuis soltaram um brilho que me deixaram culpada por maldizer tanto aquele lugar, enquanto meu pai estava contando os dias para que nós chegássemos. Pobre papai. Eu era uma pessoa tão má, egoísta e problemática. Eles sem dúvida não mereciam isso.


–E então meninos, como vocês estão?


–Tudo certo, pai! -Matt exclamou.


 


–E você Brianna? -Meu pai perguntou preocupado, passando a mão em meus cabelos que estavam úmidos por causa da chuva.


–Estou ótima. -Falei, mas sem convencê-lo muito.


 


–Isso é bom. Então, querem fazer um lanche antes de irmos para casa?


–Não, obrigada. Não estou com fome. -Disse antes que Matt fosse capaz de dizer o contrário.


–Hmmm, nesse caso, acho melhor irmos andando. Está muito frio.


Entramos no velho carro de meu pai e fomos para nossa nova casa. Digo nova porque não iríamos nos mudar para a casa em que estávamos acostumados a passar nossas férias. Quando descobriu que iríamos morar com ele, papai ficou tão maravilhado, tão surpreso, tão feliz, que fez questão de nos agradar. Queria muito que nós fossemos felizes longe de mamãe de tudo que estávamos acostumados. Portanto, largou a velha casa em que morava, que realmente era bem pequena e não muito bonita, e resolveu comprar uma espécie de sítio, ou antiga fazenda, ou sei lá o que era. Não consigo me lembrar agora o que era. Mas o fato é que ele estava ridiculamente encantando. Após alguns minutos no carro, ele disse:


–Vocês vão adorar a casa.


–Ah. -Foi tudo o que consegui dizer.


–Fica muito longe da cidade? -Matt perguntou ajeitando os óculos.


 


–Hmm, um pouco. -Meu pai disse um tanto envergonhado. -Mas vocês irão adorar.


–Como conseguiu o sítio? -Matt continuou.


–Pertencia a nossa família, na verdade. Está com um primo meu, diz ele que é muito antigo. E o melhor de tudo é que tudo saiu por um preço muito bacana!


–Deve haver algo de errado com ele. -Disse mal humorada, e logo me arrependi. Não sei o que me levou a ser tão rude com meu pai. Sinceramente, não sei o que houve comigo.


–Como assim? -Meu pai disse tristonho e assustado.


–Ninguém vende algo por um preço tão barato assim sem que haja alguma coisa, hã, errada, vamos assim dizer.


 


–Ora, mas não há nada de errado! -Ele exclamou -O sítio está em perfeita condição, e além do mais, você se esquece de que é a nossa família, e...


–Papai, nós mal vemos a nossa família. Esqueceu-se de que a parte da sua família é espalhada pela Irlanda?


–Sim, mas mesmo assim somos uma família. Você está parecendo aquela egoísta da sua mãe dizendo que minha família são um bando de porcos hipócritas e esquisitos que não têm consideração com ninguém e que só pensam no próprio umbigo, mas olhem, ela está absolutamente enganada e errada, e se...


–Papai. -Matt disse assustado. Ele era o único que se sentia afetado com as discussões deles. Para mim, era só uma forma de demonstrarem o quanto ainda se importavam um com o outro.


–Está bem, está bem. Mas eles foram bem gentis conosco, Brianna.


 


–Está bem. – Eu disse seca, olhando para a chuva.


No lado direito tudo que eu conseguia ver era árvores e grama. Tudo era verde. Não havia nenhum animal e nenhuma flor. Apenas árvores e grama. A mesma coisa acontecia com o lado esquerdo. E já estávamos vendo as mesmas coisas há bastante tempo. Era bastante nítido porque o local era conhecido como “Jardim da Irlanda”.


Senti Matt suspirar. Ele nunca me perdoaria por nós estarmos nos mudando agora. Quer dizer, eu nem sei por que Matt estava assim. Matt que escolheu vir comigo para Wicklow, não eu. E além de tudo, ele não tinha muitos amigos. Ou melhor, é claro que ele tinha tudo para ter, mas acho que não queria isso, e ao mesmo tempo, as pessoas o consideravam meio chato. Matt era aquele tipo de garoto bonitinho, mas que parecia ser superdotado. Então, ele era o que menos tinha a perder.


 


Virei a cabeça de novo para janela, quando percebi que ele suspirou, sem coragem para encará-lo. Porém, enquanto estava perdida em meus pensamentos, percebi que algo diferente se destacava no meio de todo aquele verde. Olhei mais atentamente, tentando descobrir o que era. Mas o carro estava rápido demais, e todo aquele verde não estava ajudando muito. Parecia um cachorro negro correndo, mas era um animal grande demais para ser um cachorro. E ele também estava correndo muito rápido, talvez ele fosse capaz de ultrapassar o nosso carro se corresse mais rápido. E cada vez mais que ele corria, mais desaparecia.


 


-É logo ali. -Meu pai disse, com um sorriso enorme no rosto.


 


Alguns minutos depois, nós avistamos a casa. Ela parecia ser a maior casa do lugar, pelo menos foi o que eu observei desde que entramos no carro e viemos procurar isso. Frustrada por agora ter certeza de que não haveria mais volta, tentei olhar novamente à procura do animal, mas ele não estava mais lá, o que me decepcionou um pouco. Apesar de que a casa tivesse sido reformada ha bastante tempo, eu imagino, senti uma sensação estranha ao vê-la. Talvez seja também por causa do tempo nublado, que a deixava com a impressão de uma dessas casas velhas e abandonadas. E eu sentia dor nos olhos só de olhá-la. É como se ela estivesse esperando por um milagre.


 


-Er, os proprietários são meus primos Edward com sua esposa Lucy e eles têm uma filha de sua idade Brianna. Sua prima Heather.


 


-Hm, que bom. – Eu disse.


 


-Nós iremos morar com eles


 


-Morar com eles? Como assim morar com eles? Pensei que você tivesse comprado a casa. -Eu disse seca.


 


-Terei que pagar um aluguel, hã, na verdade. Mas será legal, assim poderemos ficar mais próximos de nossa família. Eles foram tão gentis conosco.


 


-Está certo. -Disse confusa.


 


Depois de algum tempo, meu pai estacionou o carro perto da casa. Ficamos um tempo em silêncio, observando a casa enquanto tia Lucy se aproximava do carro com os braços erguidos, pronunciando algo que não consegui entender. Era uma casa de três andares. Era bastante alta e larga. Agora, ela estava pintada de branco, com alguns degraus na porta, e um jarro de flores ao lado da porta de entrada. Quando meu pai finalmente saiu do carro, tia Lucy deu um abraço apertado em meu pai por um longo tempo.


 


-Oh, Peter! Quanto tempo. Você não mudou muita coisa desde a última vez que nos vimos. Só está um pouco mais velho. -Ela disse rindo. Era uma senhora bem risonha.


 


-Muito tempo, Lucy. Muito tempo.


 


–Sim, sim. Você não era nem casado ainda, meu Deus! -Ela exclamou. Que ótimo. Eles não se viam a mais de dezesseis anos.


 


-Sim, é mesmo. Estes são meus filhos, Brianna e Matthew.


 


-Matthew -Ela disse apertando as bochechas de Matt. -Você é um rapaz lindo. Deve ter deixado muitas namoradas em Dublin, não é mesmo? -Ela disse rindo mais uma vez. Matt ficou vermelho como um tomate e teve que endireitar seus óculos depois daquele apertão. -E você Brianna! Que moça linda. Ah, que maravilha! Que maravilha! -Ela exclamou e logo veio em minha direção. Fiquei apreensiva. Não sabia se corria para bem longe ou se me manteria parada no mesmo lugar, tentando parecer simpática. -É tão bom que vocês venham morar conosco. Heather irá adorar sua presença aqui! -Ela disse dando tapinhas em minhas costas, e poderia jurar que se ela usasse mais força, seria capaz de deslocar meus ossos.


 


Mas enquanto ela dava tapinhas em minhas costas, descobri que ela era uma boa pessoa. E não descobri isso porque ela simplesmente me contou. Descobri porque eu vi. E logo ela fez um sinal para que Heather viesse até nós. Heather revirou os olhos, mesmo longe eu pude perceber isso, e veio andando devagar até onde estávamos.


 


-Oi. -Ela disse seca. E pude perceber que ela estava com fones no ouvido.


 


-Heather, este é seu tio Peter, e seus primos Brianna e Matthew -Tia Lucy disse sorridente.


 


-Hmmm, sejam bem vindos. -Heather disse de má vontade. Por algum motivo me senti incomodada. Caramba! Era assim que minha própria família me receberia?


 


Essa tal de Heather não deveria mesmo gostar de dividir a casa. Mas a culpa era de meus pais e desse tal primo distante de meu pai, que nos deixou morar na casa dele. Tia Lucy continuou falando mais coisas e rindo muitas vezes, até que finalmente fomos pegar as nossas malas. Quando entrei na casa acendi a luz da sala, para ter uma visão melhor.


A sala era amarela com o teto branco, os sofás eram de um tom de amarelo um pouco mais escuro que os da parede. O piso era de madeira, e pude perceber que era muito antigo. Até que por dentro a casa parecia ser mais bonita do que por fora, apesar de estar um pouco vazia. Era uma casa bem grande, e me senti perdida, mesmo no meio de todos aqueles móveis. Andei mais um pouco e entrei na cozinha. As paredes eram de azulejos brancos com alguns detalhes azuis e os aparelhos eletrônicos eram todos brancos. Mais para frente, em uma parte mais isolada da cozinha, havia uma janela grande, com cortinas brancas também. Na frente da janela, havia uma grande mesa de madeira, com uma toalha colorida. Voltei para sala, onde encontrei meu pai carregando algumas caixas.


 


-Pode nos ajudar com as malas? -Ele perguntou.


 


-Claro. -Voltei correndo para o carro e peguei minhas malas. Porém quando voltei para dentro da casa, não resisti à curiosidade e larguei as malas em cima do sofá.


Fui andando mais pela casa, e percebi que havia uma porta fechada.


Tentei me aproximar dela para abrir, mas quando estiquei minhas mãos, senti uma sensação estranha. Desisti de abri-la e estava quase me virando quando ouvi uma voz:


 


 -Não há nada aí. -Dei um pulo. Quando me virei, Heather parecia impaciente.


 


-Como? -Eu perguntei assustada.


 


-Está trancada desde que nos mudamos. Não há nada aí dentro. -Ela repetiu.


 


-Ah. -Foi tudo o que consegui dizer, depois do susto. Então ela se virou e foi andando para a sala, com algumas malas.


 


-Eu pedi a sua ajuda e você larga sua mala em cima do sofá! -Disse meu pai.


 


-Desculpe, não resisti à curiosidade. -Eu disse rindo.


 


-O que achou da casa?


 


-Bem legal. -Disse desanimada.


 


Logo depois tia Lucy apareceu com mais algumas malas, e pediu para que Heather me levasse até o meu quarto. Fui até o sofá e peguei minhas malas, indo em direção à escada. Assim que coloquei meus pés no primeiro degrau da escada ela rangeu.


 


-Muito bem, nada é perfeito. -Lembrei a mim mesma, mas Heather não pareceu gostar da brincadeira.


 


Subi as escadas devagar, prestando atenção em cada degrau para não cair. Mas no meio do caminho, senti um frio em minha espinha, como se estivesse sendo observada. Mas quando olhei para trás, não havia ninguém, com exceção de Matt.


Porém quando cheguei, assustei-me quando vi mais uma sala, só que dessa vez com uma lareira e sofás vermelhos, e alguns objetos que ficavam no escritório antigo de meu pai. Um relógio antigo de madeira ficava parado e silencioso. Havia outra janela grande, com cortinas meio douradas misturadas com marrom. Eu olhei boquiaberta para tudo aquilo. Era a sala mais bonita que eu já havia visto, mesmo que não combinasse em nada com a casa. Parecia mágica.


Havia mais dois banheiros nesse andar e, finalmente, o mais interessante, foi que agora tínhamos uma biblioteca. Era enorme, com várias estantes cheias de livros e no centro de tudo, uma mesa com um computador em cima. Entrei lá para observar melhor, e Heather ficou encostada na porta, me esperando. Mas não pareceu se incomodar, já que estava com seus fones. Passei os dedos por todos os livros e apreciando todos os títulos, uma mania que sempre tive. Porém, ao passar os dedos em uma das estantes, percebi que eles ficaram negros por causa da poeira. Aqueles livros deveriam ser muito antigos.


 


Mas, pelo menos, eu teria alguma chance de me acostumar a morar aqui. Embora isso parecesse impossível. Peguei as malas de volta e voltei a acompanhar Heather. O terceiro andar era um corredor bem simples. As únicas coisa que haviam eram várias portas e alguns quadros. Meu quarto era o último, na terceira porta do lado esquerdo. Ao lado do de Heather. E o de Matt era em frente ao meu. Quando abri a porta fiquei fascinada.


 


Claro que em meu antigo quarto, eu possuía tudo que uma adolescente precisaria. Ele era rosa, uma relíquia de meus tempos de bailarina, eu tinha uma cama com um dossel combinando com todo o espaço de meu quarto. Havia um closet enorme. Próximo da janela havia um sofá branco, e milhões de pufes espalhados pelo quarto. Próximo ao sofá havia uma televisão de tela plana, com um DVD. As cortinas eram um tom de rosa mais escuro. Ao lado dela, havia uma mini-cozinha, caso eu sentisse fome e estivesse com preguiça de descer até a cozinha. Além de meus aparelhos de som, estante para livros e DVDs, quadros belíssimos, um mural de fotos com todos os meus amigos e familiares. Um computador só meu em cima de minha escrivaninha, etc.


 


Mas meu novo quarto bem menor, era de um tom lilás meio desbotado, mas tinha personalidade, algo que meu antigo quarto não tinha. Na verdade, meu antigo quarto não parecia muito com o meu jeito. Meus novos móveis eram de madeira, inclusive a minha cama. Era uma cama de madeira bem escura. Havia também a minha antiga escrivaninha, uma janela ao lado de minha nova cama com cortinas brancas, de renda. A casa era da mesma altura que a árvore que tinha em frente, então eu podia tocar em alguns galhos pela minha janela. E, na janela, havia um assento. Algo que adorei.


 


No quarto havia também uma pequena prateleira onde eu colocaria os meus livros favoritos, porta retratos e alguns outros enfeites. Abri a mala que trouxe e comecei a colocar alguns objetos que faziam parte de meu antigo quarto. Assim que terminei, desci as escadas para ver se alguém precisava de minha ajuda. Meu irmão apareceu correndo em minha direção.


 


-Acho que ficamos com a melhor casa do local. Pelo menos por dentro. Você já viu o meu quarto?


 


-Ainda não. Mas o meu é perfeito. Matt agora não estava mais tão triste por estar se mudando. Acho até que ele passou a gostar da casa. Mas eu, mesmo gostando do meu quarto, da biblioteca, e da sala do segundo andar, não estava muito preparada para morar aqui.


 


-Como você demorou. Está feliz? -Meu pai perguntou.


 


–Sim. -Disse pensando em alguma coisa para completar a resposta, mas não consegui encontrar nenhuma palavra apropriada.


 


-Fico feliz que esteja gostando da casa.


 


-É, entendo. Bom, vou terminar de arrumar minhas coisas.


 


Dei um beijo na bochecha de meu pai, numa tentativa de deixá-lo perceber que eu estava feliz, quando na verdade eu não estava. E, acredite, essa tática me foi útil por muitos anos. Voltei correndo, quase caindo pelo caminho, com minhas malas para meu quarto. Depois de arrumar cada roupa e cada toalha, colcha, fronhas, cadernos, bolsas, sapatos e todas as outras coisas que trouxe, percebi que havia algo em meu quarto que não tinha percebido antes: Meus novos uniformes em cima da cadeira de minha escrivaninha.


 


 


Respirei fundo e fui até a escrivaninha. Eram quatro blusas azul-marinho, com as mangas e gola branca. Na frente estava escrito Bheagán College. Abri a porta de meu guarda-roupa e fiquei me imaginando com aquele uniforme. Imaginei-me também com o antigo. Fiquei me olhando no espelho e refletindo como seria minha nova vida neste lugar. É claro que em casa as coisas poderiam até melhorar.


 


Mas e na escola? Tudo bem que eu sempre tive muita facilidade de me comunicar com as pessoas, mas também tive muitas facilidades em arrumar problemas. Sem falar, que eu já estava acostumada com o mundo que vivia. Eu não podia de repente abandonar tudo e jogar todo o meu modo de enxergar as coisas para o alto, e começar tudo de novo. Achei melhor não pensar mais nisso. Não importava como seria meu ano escolar, eu teria que superar isso.


 


Meu pai deveria estar sentado na sala com tia Lucy, e provavelmente Matt estava tentando oferecer ajuda para arrumar alguma coisa. Ele sempre quis ser muito prestativo, enquanto eu nunca fiz questão disso. Na verdade, eu era um pouco preguiçosa com essa história de arrumar casa. Então, fiquei deitada em minha cama, segurando um porta retrato que tinha uma de minhas fotos favoritas: Nós estávamos em uma festa na praia, eu, Catherine, Massie, Claire, Jack, Jenna, Gina, Henry, Lucas, Diego, Juan e Eliza. Era uma das minhas fotos favoritas, porque realmente foi um dia legal. Era mais uma das festas que sempre fazíamos para nos divertir. Mas, neste dia, eu me senti parte deles. Eu consiga me encaixar no grupo pela primeira vez, e eu nem sabia por que. Quero dizer, nós engatinhamos juntos, brincamos juntos, crescemos juntos...


 


Mas eu sempre me achei meio diferente. E, naquele dia, sem nenhum motivo, eu senti que tinha amigos de verdade. Mas foi só naquele dia, só naquele momento. Depois, eu vi que estava completamente errada. Naquela festa, nós estávamos jogando vôlei, inventamos novas brincadeiras, aproveitamos muito o mar, e a visão belíssima da praia. Mas minha diferença para o resto das meninas era notável.


 


Para começar, Catherine sempre foi a garota mais bonita que eu já conheci. Ela tinha os cabelos louros meio dourados e ao mesmo tempo com algumas mechas claras, e o que mais chamava atenção é que era algo natural. Eles eram ondulados até metade de sua cintura fina, e faziam cachos delicados nas pontas. E, mesmo não tendo olhos azuis, ela tinha os olhos cor de caramelo. Mas o corpo dela era invejável.


 


Catherine era o tipo de garota que todas queriam ser. Pelo menos, eu. E tenho certeza de que se você a conhecesse, também gostaria de ser.


 


 Massie tinha os cabelos castanhos com mechas douradas, olhos esverdeados e convinhas na bochecha quando sorria, e não possuía nenhuma espinha. E ainda por cima tinha o nariz arrebitado.


 


Claire tinha os cabelos negros bem lisos e compridos, e os olhos azuis nem tão claros e nem tão escuros. Era um tipo de azul único.


 


Jenna e Gina eram um pouco parecidas. Eram elas louras e tinham os olhos, castanho- esverdeados. Elas pareciam irmãs de tão parecidas, mas na verdade, eram primas. E eu nunca fui parecida com alguma prima, pelo menos não que eu conhecesse. -Apesar de agora saber que não era a única ruiva na família, já que Heather também era ruiva. E minha diferença era notável. Ruiva, altura mediana, e branquela. Você sabe como ruivas são, todas bem branquinhas, enquanto que as outras meninas não eram tão brancas e ainda ficavam bem bronzeadas quando iam à praia. Mas a única cor que eu conseguia ter, era vermelho. E isso acontecia na maioria das vezes. Você sabe que ruivos ficam vermelhos quase o tempo todo. E eu nem tinha um corpo impecável. Sempre fui magra, e apesar de meu cabelo ser bem liso, não tem graça nenhuma. Ele era tão comum. A única diferença é que era laranja, e isso me destacava um pouquinho. Mas fora isso, eu não possuía mais nada que chamasse a atenção.


 


Então, ouvi alguém bater em minha porta, mas não tive nem tempo para responder ou para esconder o, porta retrato, pois a porta levemente foi se abrindo e o rosto de meu pai apareceu. Talvez, ele estivesse curioso para saber o que eu estava fazendo trancada em meu quarto ao invés de participar da arrumação da casa. Ou então ele já sabia que eu estaria exatamente vendo as fotos com meus amigos.


 


Meu pai não era o tipo de pessoa que ficava te prendendo, que exigia explicações de você para tudo que você fizesse. Mas, ele estava extremamente preocupado com o meu comportamento nessa nova casa. E, além de tudo, eu sabia que ele estava preocupado com a minha felicidade. Mas era uma coisa estranha, já que eu sabia que não seria feliz aqui. E, ele também deveria saber disso. Porém, ele foi entrando sem dizer uma única palavra até parar em minha frente.


 


-Já está com saudades de seus amigos? -Ele disse um pouco tímido.


 


Bom, eu não queria responder que estava, porque na verdade eu não estava. Eu estava era com saudades de Dublin, de minha casa, e estava com medo de ficar nesta casa. Mas como eu podia dizer tudo isso a ele? Então, tudo que fiz foi balançar a cabeça positivamente. Ele permaneceu um tempo em silêncio e logo continuou:


 


-Mas, não se preocupe. Você fará novos amigos aqui também. Amanhã já vai começar suas aulas, e você irá conhecer gente nova. E, além disso, sua prima estará lá com você. Por que você não vai conversar com Heather agora?


 


-Estou cansada. -Então, percebi que ele respirou bem fundo antes de continuar.


 


-Certo, mas ainda acho que você poderia ir lá e conversar com ela. Moraremos juntos agora. – Ele deu uma pausa, e após três longos minutos ele continuou -Só vim aqui para lhe dizer que estamos fazendo um lanche. Gostaria que participasse.



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Autor(a): adeleandsimon

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