Fanfic: Acca

     O quarto estava escuro, salvo a luz verde do relógio digital que marcava 4:00 horas da manhã e iluminava de forma fúnebre uns poucos papeis em cima da escrivaninha. A madrugada estava nublada, fria e silenciosa. O vento batia na janela, anunciando a má sorte de quem não tinha um teto, e os suspiros que emanavam da cama indicavam a inconsciência de um ser exausto.
    Carlos dormia. Estava cansado, resultado de uma jornada de 36 horas de trabalho no centro medico. Não era um sono tranquilo. Sonhava: Havia uma sala branca, acolchoada, vazia e silenciosa. Silencio cortante que rasga a alma e dilacera a consciência.  Uma ameaça à sanidade. A porta da sala se abre e um sujeito é jogado lá dentro. Usava camisa de força. Cabeça raspada, olhos vidrados, secos, frios. Não se movia. Estava fadado ao tormento da solidão imposta. Não havia alternativa a não ser rezar. Por mais céticos que sejamos a fé é o ultimo recurso da esperança. Não deveria.
     Sempre começava a Ladainha do Coração de Jesus e terminava com o Pai Nosso. Rezava. A sala fazia seu trabalho: Esmagava-o, prendia-o dentro da própria mente. E ele, insistente na sua defesa, rezava. “Senhor tenha piedade de nós pecadores...”, “Deus onipotente e eterno, olhai para o Coração de vosso Filho diletíssimo e para os louvores e as satisfações que ele, em nome dos pecadores, vos tributa; e aos que imploram a vossa misericórdia concedei benigno o perdão, em nome de vosso mesmo Filho Jesus Cristo, que convosco vive e reina, em união com o Espírito Santo, por todos os séculos dos séculos. Amém.” “Senhor tenha piedade de nós pecadores”, “pecadores”, “PECADORES!”.
    Carlos acordou assustado. Seu telefone tocava estridente, irritante. Levantou com dificuldade, tentando conciliar sonho com realidade, tentando afastar de sua mente o eco da angustia de uma oração desesperadora. A cabeça doía e o mundo girava. Por um breve momento pensou que estivesse no hospital, mas a realidade lúgubre de seu quarto prevaleceu sobre a face do louco que rezava.
-- Alo?
-- Doutor Carlos?
-- Sim...
-- Houve um problema aqui no hospital. Precisamos do senhor aqui. – Era tudo o que ele queria. Carlos ocupava a cadeira de diretor do hospital que era dividido com o seu colega de faculdade Ricardo. Uma posição importante já que era um cargo de confiança do governo e, nos dias atuais, tal posição era fundamental.
-- São 4:15 da manhã, não é o turno do Ricardo?
-- É justamente com o doutor Ricardo o problema...
-- O que aconteceu?
-- Ele foi assassinado.