Fanfic: Pela Lente do Amor-AyA {Finalizada} | Tema: AyA

Ela tentou livrar-se do nó que a estrangulava e proferiu as palavras entre dentes, bem distintas e com vagar.

— Então poderia me explicar por que vivi no mundo das trevas nesses últimos dezoito anos?
— Pense o contrário: o mundo não está rodeado pelas trevas, mas sua mente. — O tom de voz do médico era suave e melodioso.
— Não consigo compreender!
Ele riu gentilmente.

— Nem nós. Há muitas coisas sobre a mente que jamais conseguimos entender... Você estava certa quanto à cegueira histérica. É uma camuflagem utilizada pela mente. Sua cegueira, provavelmente, cessou alguns dias após o acidente. Sua mente, então, começou a receber as mensagens que a visão enviava, como deveria ser, mas não as mandava de volta, em forma de imagem. Compreende? Nunca tratei de um caso como o seu, mas devem existir registros em algum lugar.

Quando Anahí começou a tremer, não conseguiu mais se controlar. As lágrimas brotaram dos olhos rolando copiosamente, e, junto com elas, a dor presente todos aqueles anos.

O dr. Franklin abraçou-a com carinho.

— Você, na verdade, acreditou todo esse tempo que seria cega para sempre?

Ela concordou com um gesto de cabeça, o rosto enterrado no peito do médico, enquanto soluçava baixinho. Afinal, murmurou:

— Sinto-me ainda pior. Como se fosse uma fraude. Nunca estive cega, mas não posso ver!
— Cegueira é cegueira, Any, e é bastante real, não impor¬ta se causada pela mente ou pela deficiência visual, Pelo menos, há uma chance, uma boa chance, de você recuperar a visão. Tudo o que tem a fazer é abrir a porta para a mente. Essa pode ser a parte mais difícil, pois, obviamente, o que quer que esteja por trás desse obstáculo, é bem pior viver nas trevas. Acalme-se. Vou relatar nossa descoberta ao dr. Herrera e, daqui a pouco, ele virá buscá-la.

— Doutor Alfonso?

— Sim?

Ela mordeu o lábio inferior, indecisa, e, finalmente, soltou um suspiro profundo.

— Parece que eu... acho que... sinto muito. Não sei como explicar. É como se estivesse usando gesso na perna durante dezoito anos para, afinal, descobrir que não estava quebrada. Não sei o que é pior: saber que na realidade não preciso do gesso ou admitir que jamais precisei dele. Faz sentido?

— Perfeitamente — ele respondeu com carinho. — Sabe? Você parece muito desanimada para uma garota cega que aca¬ba de descobrir que poderá voltar a ver. Vamos, anime-se! Isso é só o começo.

Any lançou-lhe um sorriso sem muita convicção. Queria acreditar no que o médico lhe dizia, mas não conseguia. Nesse momento, ele saiu do escritório e fechou a porta atrás de si.

E toda a tristeza que a acompanhara ao longo desses dezoito anos voltou com a mesma intensidade de sempre...
— Em resumo, Alfonso, esse é o caso. Jamais vi algo pare¬cido antes — Franklin afirmou, recostando-se na poltrona.

Alfonso permaneceu imóvel, parado diante da escrivaninha do médico idoso, os olhos perdidos em um ponto qualquer.

— Você tem certeza de que ela não está fingindo?

A resposta veio como um relâmpago, enquanto o encarava com desaprovação.

— Oh, Alfonso! O que é isso? Não me lembro jamais de ter encontrado uma pessoa tão descrente quanto você! Fico até estranhando de você ter alcançado o sucesso com atitudes tão cínicas. Como os pacientes sobrevivem a você?

O jovem sorriu ao responder.

— Talvez eles tenham sobrevivido justamente porque sou cínico. Estamos cercados de pessoas prontas a ter compaixão. Vocês fazem da cegueira uma coisa agradável. Eu sou aquele que a torna desagradável, lembra-se?