Fanfic: Pela Lente do Amor-AyA {Finalizada} | Tema: AyA

Somente o fato de estar chocada com a rudeza do julgamento dele impediu-a de chorar. Queria dizer-lhe que não tinha propriedades, nem riqueza, nem um futuro maravilhoso com respaldo financeiro, nem empregados, nem nada. Mas sentiu satisfação e orgulho de não contar tudo. Aquele homem cruel e rude vasculharia cada faceta de sua vida nas duas semanas seguintes, mas guardaria esse segredo lá no fundo do seu coração. Se fosse para lutar contra todos esses anos de penumbra, que o fizesse como quem pensa que vai encontrar um mundo florido e cheiroso e com governantas para lhe servir o chá das cinco. Só ela saberia que, depois de Windrow, seria a difícil batalha da sobrevivência.

Ela deu um suspiro profundo e fechou os olhos, sentindo uma estranha paz nesse gesto, embora o mundo fosse igualmente escuro tanto com os olhos abertos como com eles fechados. Afinal, disse tranqüilamente:

— Se sair na frente, dr. Herrera, vou tentar chegar à entrada do edifício e àquele riacho que o senhor mencionou. E, se eu conseguir, ao menos, aproximar-me do local, peço-lhe que tente evitar que eu caia dentro d`água.

Alfonso encarou-a intrigado. Não tinha percebido o quanto aquele desafio era importante para ele até o instante em que Any o aceitou. Também ficara surpreso com a intensidade de suas próprias emoções. Achou que houvesse perdido a paciente e isso era constatar que falhara. De repente, Anahí retroce-deu e ele se sentiu aliviado: por não perdê-la e por não falhar.

Herrera deu um passo para o lado e falou:

— Vá na frente, srta. Portilla. Estou logo atrás de você.

O som oco de seus passos demonstrava que o saguão da clínica era largo e desimpedido. A amplificação do som indicou que chegara a um corredor; então, virou à direita, automaticamente, sentindo-se à vontade com a escolha. Percebeu que seu cérebro havia registrado o caminho para entrar e sair do edifício e tudo o que lhe restava a fazer era relaxar. Teve que lutar internamente para não estender os braços diante do corpo ou acima da cabeça, mantendo-os dobrados à altura dos quadris, como Dulce ensinara.

Ouviu a voz de Alfonso, que a seguia tão próximo como prometera:

— Nós sempre protegemos a cabeça ou o rosto. É puro instinto, para defender os olhos. A ironia é que os cegos não precisam mais de sua vista e, na maioria das vezes, sofrem contusões nas pernas. O instinto também pode ser cego. Temos de ensiná-la a combatê-lo.

Então, ele havia percebido sua luta para manter as mãos abaixadas. Era assim tão óbvio?

Any pisou o tapete de borracha da entrada principal e ouviu o som sibilante das portas ao se abrirem à sua frente. Naquele exato momento, pensou que seus joelhos se dobrariam e ela despencaria no chão. Parou, tentando controlar o violento tremor das pernas. Mordeu o lábio inferior, esforçando-se para conter as lágrimas.

O médico encorajou-a:

— Está tudo bem. As portas permanecerão abertas até que passe.