Dulce não soube como conseguiu chegar ao quarto, nem como as pernas a sustentaram. Quando entrou, com a porta fechada, ela caiu na cama. Olhou sem focalizar as mãos caídas sobre o colo, entrelaçadas para impedir que tremessem. Não sabia há quanto tempo estava sentada, sentindo-se vazia.
Gradualmente, uma emoção cresceu dentro dela.
Dor?
Não, não era algo tão definido.
Dulce foi sufocada por um sentimento tão intenso que seu peito parecia rasgar. Ela respirou fundo para suprimir a sensação, e quando exalou, um soluço emergiu dos seus lábios. O som abafado a fez estremecer. Dulce cobriu o rosto com as mãos trêmulas e chorou.
Pensou na frieza de Christopher, nas palavras desprovidas de emoção, na recusa do seu amor. Chorou porque sabia que ele havia lhe dado algo real e verdadeiro. E chorou por si mesma, pois estava de volta ao ponto de onde partira.
Sozinha.
Não.
Ela engoliu as lágrimas com raiva. Recusava-se a mergulhar naquele poço de autopiedade. Não podia fazer Christopher mudar de idéia, mas não desistiria. Não deixaria que ele a arruinasse.
— Você encontrará outro amor — ela disse em voz alta para si. Entretanto, quando o eco das palavras desapareceu, Dulce teve a certeza de que jamais encontraria alguém como Christopher. Sabia que não seria capaz de sentir o mesmo por outro homem.
Você está sendo dramática, a razão a advertiu.
Mas o coração reassegurou a certeza. Ela havia compartilhado uma conexão com Christopher que acontecia só uma vez na vida. Talvez fosse o mesmo que seu pai havia sentido. O amor dele era tão profundo que jamais conseguira se recuperar. Dulce sempre acreditara que, se de fato quisesse, o pai poderia superar. Se ela fosse importante o bastante, ele teria se esforçado para incluí-la na vida dele.
Agora,sabia que era impossível.
Ela se levantou, e a apatia deu lugar à agitação. Não podia lutar contra os fatos. Não podia viver o restante da vida lamentando-se por algo que estava fora do seu alcance. Havia feito aquilo com o pai. Não cometeria o mesmo erro duas vezes. De súbito, decidiu que tinha de sair. Precisar estar rodeada por pessoas, luzes e sons. Tinha de saber que ainda havia vida pulsando em algum outro lugar que não fosse aquele apartamento. Ela procurou o casaco e hesitou, decidindo se deveria colocar roupas mais quentes. Porém, não queria perder tempo. Tinha de sair dali imediatamente.
Onde estaria o casaco?
Vasculhou o armário sem conseguir encontrar, e a busca se tornou mais desesperada a cada segundo que passava. Então, lembrou-se de que havia deixado no quarto de Christopher, na cadeira ao lado da cama. Ela hesitou. Não queria se encontrar com ele, ao menos até ter tempo para pensar e se recompor, o que seria impossível naquele apartamento, rodeada pela presença de Christopher em cada detalhe da decoração.
Dulce endireitou a espinha e seguiu para o quarto dele. A porta estava aberta, e Christopher não se encontrava lá. Ela não parou para pensar como sabia.
Acreditou no instinto.
Dulce encontrou o casaco e ficou no quarto apenas o tempo suficiente para vesti-lo. Quando fechou os botões, os dedos esbarraram no topázio que repousava entre os seios. De súbito, o pingente pareceu pesado ao redor do pescoço, e ela ergueu as mãos para retirar a jóia. Segurou-a diante dela, com a pedra balançando de um lado para outro. A jóia oscilando à luz do abajur parecia dizer que tudo não passava de uma brincadeira colossal.
Ela deixou a gargantilha no criado-mudo e saiu, sem saber para onde ir. Entrou no elevador e pressionou o botão do andar térreo, determinada a ir para qualquer lugar quenão fosse aquele apartamento. Ao chegar, a pesada porta emperrou. Apavorada pela possibilidade de ficar presa naquele estúpido elevador, ela abriu a boca para gritar quando Mick apareceu e abriu a porta com facilidade.
— Obrigada — ela murmurou, sentindo-se tola. Tinha de ser mais forte, tanto física quanto mentalmente. Mick assentiu, mantendo o silêncio habitual. Daquela vez, ela estava tão consumida com seus próprios problemas que não se incomodou com o silêncio. Parou diante da porta e começou ela mesma a soltar os trincos. A lufada de ar frio da noite arrepiou sua pele.
— Tenha cuidado lá fora — o segurança alertou, e Dulce percebeu que estava bem ao seu lado.
— Não se preocupe, eu terei cuidado. — Mick deu um passo e segurou a porta aberta para que ela saísse.
Tocada pelo cuidado do homenzarrão, Dulce olhou por sobre o ombro e enviou-lhe um sorriso. Ficou surpresa quando ele retribuiu. Era engraçado sentir afinidade com Mick agora, que estava de partida. Então, ela seguiu na direção da rua, com os saltos dos sapatos abafados pelos ruídos da cidade vibrante.