Christopher não se moveu, embora o corpo todo fraquejasse. Em meio às emoções que o assaltavam, uma onda de alívio o inundou como um bálsamo. Dulce não acreditava que ele fosse capaz de trair intencionalmente o próprio irmão. Ela não se convencera da verdade que Derrick tentara impor. Não acreditava sequer que ele pudesse forçar uma mulher a se entregar contra a vontade, mesmo depois da forma como a possuíra.
Ele suspirou, oprimido pela culpa.
Dulce ainda não o considerava capaz de cometer qualquer gesto de violência. No entanto, estava enganada. Poderia matar se necessário, e mataria para protegê-la. Christopher se virou, preso pelo elo que os braços proporcionavam, e contemplou o rosto aberto e confiável. Poderia matar por aquela mulher, mas não deixaria que ela morresse por ele.
Dulce não estava segura com Derrick tão perto, mas o desejo que sentia por ela representava o maior dos perigos. Não podia permitir que se tornasse outra criatura perdida, assim como ele.
— O que aconteceu não importa mais. Já passou — ele declarou com um suspiro profundo. — Derrick sempre acreditou no que quis, e eu segui em frente sem o meu irmão. Não posso mudar os fatos. — Ela balançou a cabeça, e a generosidade de Dulce o impeliu a acreditar numa solução melhor.
— Você não pode conversar com Derrick e dizer a verdade? — Christopher riu com amargura, mas os dedos acariciando os cabelos de Dulce continuavam gentis.
— Eu tentei muitas e muitas vezes. O problema é que ele não quer ouvir a verdade. Prefere acreditar em Lola, e vai continuar acreditando nela até o fim dos tempos. É por isso que você tem de ir embora daqui.
Dulce franziu a testa sem compreender a linha de raciocínio.
— Derrick é perigoso. Receio que ele possa tentar machucá-la para chegar a mim. Você tem de partir.
Dulce balançou a cabeça, com um sorriso que o fez se sentir tolo.
— Não tenho medo de Derrick. — As palavras soaram confiantes, mas ele pode sentir a apreensão pairando no ar. Tocou-a nos cabelos, tateando a textura sedosa. Christopher fechou os olhos, tentando guardar a sensação na lembrança. Perder Dulce causaria muita dor, mas quando soubesse que ela estava em algum lugar seguro, viva e a salvo, teria forças para suportar.
— Ouça, Dulce. Vou lhe dar algum dinheiro e... — Ela balançou a cabeça, e Christopher ignorou. — E pedirei a Mick que a leve para algum lugar protegido. Para onde gostaria de ir? Escolha qualquer lugar. Londres? Paris? Alguma ilha tropical? — Dulce negou com movimento ainda mais veemente.
— Não quero ir para lugar algum se isso significar ter de deixar você.
Christopher se afastou, reprimindo a irritação. Será que ela não compreendia que estava apenas tentando protegê-la?
— Eu já disse, Dulce. Não quero ficar com você — declarou com severidade. Ela permaneceu em silêncio por um momento e disse suavemente:
— Então, por que fez amor comigo em plena boate? Como explicar que sou capaz de perceber o desespero do seu desejo?
Christopher fixou olhos avelãs com frustração crescente. Entretanto, ela não se abalou sob o olhar gélido. Em vez disso, avançou o passo e procurou as mãos dele. Os polegares pequenos roçaram as palmas, numa carícia doce e confortadora.
— Christopher, você está apaixonado por mim. Então, em vez de tentar fingir que quer me enviar para algum lugar distante e seguro, por que não admite de uma vez por todas que me ama? Por que não assume que me quer bem aqui, do seu lado? Você não percebe que é onde estarei mais protegida?
— Dulce...
— O que nós dois ganhamos se eu for embora? Ambos terminaremos sozinhos.
— Sim — ele concordou a contragosto. — Mas você terminará viva.
Dulce subiu as mãos pelos braços vigorosos e o enlaçou pelo pescoço. Um sorriso terno abrandou a expressão preocupada do rosto adorável.
— Se Derrick realmente quisesse me fazer algum, teria aproveitado a oportunidade enquanto dançávamos hoje à noite. — A voz era calma e ponderada, mas ele sabia que Dulce estava apreensiva com a idéia de que alguém desejasse machucá-la. — Responda, Christopher. Tente me convencer. Então, pensarei na sua proposta.
Ele titubeou, incerto. Dulce realmente queria ouvir a verdade?
— Se eu for mesmo embora e nunca mais o vir, quais serão as únicas palavras que, daqui a alguns anos, você se arrependerá por não ter dito?
Christopher ergueu as sobrancelhas. Teria rido se não estivesse tão preocupado e frustrado. Tinha de dar crédito a Dulce. Ela era persistente. Todavia, não respondeu de imediato, não por medo de magoá-la. A verdade que Dulce exigia dele simplesmente não podia sair dos seus lábios.
Quando fora a última vez que dissera?
Lupita?
Sim, tinha de ser Lupita.
Duzentos anos era tempo demais para se lembrar. Ele respirou fundo, receoso. Tinha medo de dizer algo que havia sido tão fácil proferir no passado. Não se cansava repetir para Lupita, para seus pais, Diego e Derrick. Christopher fechou os olhos, consumido pela angústia. Tinha de pronunciar aquelas palavras agora, mesmo que fosse só uma vez.
— Eu gostaria de ter dito... — começou lentamente. — Que eu te amo, Dulce. — Ela sorriu, não com o triunfo que ele esperava, e sim, com gratidão.
— Obrigada. — Dulce suspirou e soltou as mãos, e ele agarrou os punhos delicados antes que ela se afastasse. Envolveu-a com os braços e estreitou-a em seu peito.
Agora, que havia aberto o coração, não conseguia controlar a emoção que pulsava dentro dele.
— Eu te amo, Dulce — sussurrou contra o ouvido dela. — Eu te amo mais do que amei alguém.
— Então, está tudo resolvido — Dulce respondeu com a voz embargada pela emoção. — Ficarei bem aqui.
Christopher empurrou Dulce com gentileza e mirou os olhos claros.
— Você vai embora. — A voz ribombou pelas paredes e teto, mas Dulce não se abalou.
— Não. Eu te amo, e vou ficar.
Christopher estreitou os olhos e abriu a boca. Sem saber o que dizer, afastou-se e caminhou para janela.