Fanfics Brasil - Quando abrir seus olhos De Fé e de Justiça(Mini-Fanfic)

Fanfic: De Fé e de Justiça(Mini-Fanfic) | Tema: As Cronicas de Narnia


Capítulo: Quando abrir seus olhos

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Quando abrir seus olhos


Com uma das mãos ele buscou o corpo dela ao seu lado e o que encontrou foi uma cama vazia. O alerta soou dentro da cabeça dele de forma estridente e Edmund levantou-se, ainda nu, de um só salto. Seus olhos percorreram o quarto em busca da presença familiar de Lucy. Com um toque de alívio ele a encontrou sentada ao pé da cama, abraçando as próprias pernas.


O cabelo desarrumado cobria os ombros e parte do rosto dela. A pele nua parecia totalmente vulnerável ao frio da manhã e ele teve de conter a vontade de abraçá-la mais uma vez. Caminhou até ela sem qualquer constrangimento diante da nudez de ambos. Sentia-se perfeitamente confortável e seguro, o mínimo que esperava é que ela sentisse o mesmo ao lado dele.


Abaixou-se ao lado dela, pegou a capa que estava caída no chão e jogou-a sobre os ombros de Lucy. A jovem rainha não olhou para ele, até encolheu os ombros quando os dedos esguios de Edmund tocaram sua pele num ato descuidado. Ele não se abalou com aquilo, foi determinado o bastante para levar a noite anterior até o fim, então que fosse homem para lidar com o conflito de Lucy. Que fosse homem o bastante para convencê-la de que a amava.


Ele ergueu o queixo dela para que Lucy o encarasse nos olhos. Vê-la chorando sempre fazia seu coração doer com as lembranças da infância traiçoeira. Inevitavelmente ele se lembrava de como escolheu a Feiticeira Branca ao invés dela. Tentou não demonstrar que estava abalado, encarou-a seguro e suave.


- Está frio aqui. – ele disse tranqüilo e confiante – Por que não volta pra cama e nós podemos dormir um pouco mais?


- Você... – ela gaguejou em meio a um soluço – Oh céus! Você está louco!


Ele afastou uma mecha de cabelo para trás da orelha dela e respirou fundo.


- Não, Lu. Pela primeira vez em muito tempo eu estou são e em paz comigo mesmo. – ele disse. Lucy o encarou com desgosto.


- Como pode? – ela questionou e a indignação dava seu primeiro sinal – Você...


- Seduzi você? É isso o que quer dizer? – ele questionou com um tom levemente sarcástico, que lhe era tão comum. – Sim, eu fiz isso.


- Você é nojento! – ela disparou contra ele e tentou empurrá-lo, mas Edmund a segurou antes que pudesse se machucar.


- Não ouvi você reclamando ontem. – ele disse firme – Não obriguei você a nada, você aceitou tudo sem questionar. Qual é o seu problema?


- Qual é o SEU problema? – ela gritou – Nós somos IRMÃOS! – Edmund rangeu os dentes e a segurou com força pelos braços.


- NÃO diga isso! Nuca! – ele rosnou – Eu sou um rei, ainda que não seja nada além disso, e você é uma rainha! Tudo o que eu fiz, tudo o que eu desejo neste momento, é usufruir de algo que me pertence.


- Eu não sou uma propriedade, ou um título seu! Por Aslam, eu sou sua irmã! – Lucy tentou argumentar num tom histérico e tudo o que conseguiu foi outro solavanco.


- E quem tem mais direitos sobre você do que eu? Ninguém a conhece melhor, ninguém pode protegê-la melhor do que eu? – ele disse com uma fúria convicta.


- Isso é ERRADO! É NOJENTO! – ela gritou em meio às lágrimas – Imagine se descobrirem! Todos irão comentar, apontar para nós e dizer coisas horríveis! Humilhados! Repudiados por todos! O que Peter e Susan dirão?


- Você é tão cega ao ponto de não ver que eles não podem dizer nada? – Edmund rangeu os dentes – Abra os olhos, Lucy!


- Você é doente! Eles não são como você! – Lucy tentou virar o rosto, mas Edmund a impediu.


- São piores. – Edmund disse de forma inesperadamente controlada – Um dia, quando você perceber o que este lugar está fazendo com todos nós, vai ver que não há opções. Ou ficamos juntos, ou vamos acabar loucos, numa terra estranha onde nada se parece com o nosso mundo! Peter e Susan foram os primeiros...


- Está mentindo! – ela insistiu.


- Não estou. – ele disse sincero – Assim como não estava mentindo ontem à noite.


- Não pode esperar que eu acredite que você sente algo por mim! – Lucy insistiu em sua teimosia.


- Não me importa se você credita ou não, porque eu vou continuar te amando do mesmo jeito. E pretendo fazer de você minha noiva, não importa o que eu tenha que fazer para isso. – ele a encarou determinado.


- Peter não vai permitir, nem eu vou aceitar um absurdo desses! – num impulso, Edmund esmagou os lábios dela contra os seus, num beijo furioso e violento. Ela não resistiu muito, nem poderia. Minutos depois, os lábios de ambos estavam inchados e dos dele um filete de sangue corria. A respiração ofegante e nos olhos de Edmund o desejo, a raiva, a paixão e o ódio queimavam numa mistura caótica.


- Não esqueça que é pela minha mão que as leis são escritas, leis que todos são obrigados a seguir, inclusive Peter. – a voz dele soou grave, perigosa e terrivelmente sedutora – Eu sou o guardião da Justiça. Mas se eu tiver um pouco de sorte, essa noite renderá algum fruto e isso não deixará muito espaço para escolhas.


Ela não disse nada, nem poderia. O fôlego ainda era escasso e na cabeça delas os pensamentos haviam se tornado um emaranhado confuso. Edmund tinha esse efeito, deixá-la sem palavras.


- Vou me trocar no outro quarto. Fique aqui o quanto quiser, não vou importuná-la. Por enquanto. – ele disse seguro, deu as costas para ela e saiu, nu, caminhando para a antecâmara.


Furioso? Sim, ele estava furioso. Ele estava indignado com a idéia dela rejeitá-lo. Sabia que seria difícil, sabia que Lucy ficaria confusa, mas não imagina uma reação tão ruim, tão pouco imaginava que doeria tanto.


Eram irmãos e talvez ela fosse a única naquele palácio que ainda tinha certeza disso. Para ele, Lucy era uma garota, uma garota atraente. E ele era um homem, habituado a guerra, às grandes batalhas, aos contratempos que se impunham diante dele. E um homem que não era imune ao apelo que ela exercia sobre seus instintos mais básicos e que a amava de uma forma quase dolorosa.


Ele era o melhor pra ela, sem sombra de dúvidas. Seguro, familiar, amigo, já tinham sido tanta coisa um pro outro e ele se sentia tão desesperadamente dependente dela. Lucy era a única coisa, a única lembrança concreta de que havia um outro mundo fora de Nárnia, um que ele não conhecia mais, nem sentia falta, mas que fazia parte dele. Sem ela Edmund sentia a loucura se aproximar perigosamente.


Ele deixou o palácio e saiu para uma cavalgada. Precisava de velocidade, precisava de qualquer coisa que o mantivesse calmo e concentrado para decidir seu próximo passo. Mas ele duvidava da existência de uma resposta para sua pergunta. O que fazer para conquistar sua irmã? Bem, talvez Peter soubesse o que fazer.


Peter, este seria um desafio a parte. Não que ele tivesse moral pra dizer qualquer coisa, mas ele sem duvida achava que tinha e ia tentar assumir o posto de pai e defender Lucy. Aquilo era irritante!


A discussão com Lucy foi uma declaração aberta de guerra e agora cabia a ele acenar uma proposta de paz. Mostrar a ela que a situação era preferível à possibilidade de ter de aceitar um pretendente estrangeiro, e principalmente, convencê-la de que seus sentimentos eram sinceros. Seria um desafio e tanto, seria trabalhoso, mas estava convencido de que o premio valeria a pena.


Voltou ao palácio numa cavalgava a veloz. Foi recebido de imediato por um fauno que servia como camareiro real de Peter. O fauno fez uma grande mesura, ostentando a túnica com o símbolo real do Leão Dourado e seguro de sua importância. Ele empinou o nariz e com uma voz cerimoniosa anunciou a mensagem.


- Peter, O Magnífico, Grande Rei de Nárnia, Senhor de Cair Paravel, Imperador das Ilhas Solitárias, Cavaleiro da Mui Nobre Ordem do Leão, convoca seu estimado e real irmão, Rei Edmund, O Justo, Duque do Ermo do Lampião, Conde dos Mares Ocidentais e Cavaleiro de Nárnia, para uma audiência no gabinete de estudos imediatamente. – Edmund teve que se segurar para não rir do fauno, tão seguro da importância de seus serviços. Aquele tipo de mensagem dispensava comentários. Peter adorava o som de seus títulos quase tanto quanto o poder que eles lhe conferiam. Mensagens pomposas e arautos era para o Grande Rei uma espécie de marca registrada, enquanto para ele não passavam de presunção.


Edmund agradeceu ao arauto e se dirigiu ao gabinete real para saber do que se tratava a tal audiência. Peter o convocaria até para falar de suas duvidas a respeito de qual túnica deveria usar em um banquete oficial, mas usar todos os títulos numa mensagem fazia a coisa soar importante demais para ser ignorada. Mais tarde, quando o irmão mais velho não o estivesse importunando, ele procuraria Lucy para outra conversa.


Peter estava sentado, usando roupas em tons de azul escuros e verde, debruçado sobre documentos de Estado e os analisava com grande atenção. Ele não se dignou a erguer a cabeça para encarar o irmão mais novo, apenas fez sinal para que Edmund tomasse assento, o que o rei mais jovem acabou por fazer.


- Alguém declarou guerra e isso te deixou inseguro, ou você apenas gosta de ouvir um arauto pronunciando todos os seus títulos numa mensagem? – Edmund perguntou num tom debochado, que fez Peter erguer a cabeça e encará-lo com um ar de desagrado. – Essa coroa te deixou ainda mais pomposo do que já era.


- E você continua tão inconveniente em seus comentários quanto sempre foi. – Peter rebateu mal humorado.


- Não me chamou aqui para discutirmos como duas crianças, não é? – Edmund questionou com um sorriso sarcástico. Peter se endireitou na cadeira.


- Não, o assunto é mais importante. – Peter disse solene – Susan decidiu não aceitar nenhum pretendente. – Edmund teve que controlar o impulso de um comentário ácido e manter-se calado diante da decisão da irmã mais velha – Já que a rainha mais velha não aceitará nenhum marido estrangeiro, a única disponível para futuras alianças é Lucy. Eu estava justamente analisando algumas propostas interessantes. Cor da Arquelândia, um dos filhos do Tisroc e o príncipe herdeiro de Galmar são os candidatos mais prováveis. O que pensa disso? – Edmundo sentiu uma onda de raiva invadir-lhe o corpo.


- Cor da Arquelândia é uma criança que acabou de se descobrir herdeiro de um trono e seu irmão é tão irresponsável e infantil quanto qualquer príncipe de sua idade. Não passam de dois garotos que tem muito que aprender antes de servirem como consortes a uma rainha de Nárnia. – Edmund falou convicto – Aceitar um dos filhos do Tisroc, depois do que Rabadash fez seria intolerável, eu e Lucy lutamos na batalha contra eles no ano passado! E Galmar? Não pode estar realmente pensando em mandar Lucy para um lugar tão distante.


- São ofertas de peso. – Peter disse encarando Edmund seriamente.


- Decline todas elas, exatamente como fez com as ofertas à Susan. – Edmund retrucou.


- E porque eu faria isso? – Peter questionou.


- Lucy não deseja sair de Nárnia, nem deseja abandonar seu lugar de rainha, o que é um direito dela. – Edmund respondeu firme – Estou apenas defendo seus interesses.


- Então me diga como, em nome da Juba do Leão, seduzi-la se encaixa nesta missão tão nobre que você decidiu assumir? – Peter rosnou furioso contra Edmund, que por sua vez se limitou a manter uma expressão serena e relaxar em sua cadeira.


- Então é isso. – Edmund constatou tranqüilo – Ela já contou a vocês, pensei que ficaria calada por mais tempo. Vamos, Peter. Diga logo o que está entalado na sua garganta antes que tenha um ataque do coração.


- Como você pôde? Pior, como tem a audácia de sentar diante de mim e se referir a ela com tão pouco caso? Ela é sua irmã e você não só a desonrou, como agora a trata com sarcasmo! - Peter vociferou enquanto socava a mesa entre eles.


- Correção, real irmão. Eu não estou fazendo pouco caso de Lucy, nem a trato com sarcasmo como você diz. Essas são atitudes que dispenso apenas à suas demonstrações de superioridade, exatamente como está fazendo agora. – Edmund disse – Quanto à parte de tê-la seduzido, sim. Sou culpado de levar para a cama a única mulher que tem o direito de estar ao meu lado. Diga-me como isso o ofende de forma tão grandiosa, a ponto de se achar no direito de lançar sobre mim todo poder de seus títulos, quando você fez exatamente o mesmo com Susan? – Peter ficou pálido como uma folha de pergaminho e tornou a sentar-se em sua cadeira.


- Não se atreva... – ele murmurou.


- Não me atrever a que? – Edmund o desafiou abertamente – A dizer que você seduziu Susan e divide a cama com ela a mais de um ano? Quando foi exatamente? – Edmund ponderou – Na mesma noite em que você voltou da guerra contra os gigantes e descobriu que por muito pouco ela não foi obrigada a se casar com Rabadash?


- Como você... – Peter parecia incapaz de formular uma frase completa.


- Como eu sei? – Edmund completou por ele – Simples. Não sou cego, nem absolutamente ingênuo como Lucy. Vi você conversando no balcão aquela noite e notei que depois disso Susan nunca mais dormiu nos aposentos dela. A forma como você sempre encontra uma maneira de se encontrar com ela pelos corredores e trocar meia dúzia de palavras sussurradas. Parecem dois amantes que se encontram as escondidas e de fato o são.


- É diferente. – Peter tentou recuperar a compostura – Susan é minha rainha, minha amiga e companheira, não uma brincadeira.


- Ela é sua rainha, sua companheira, melhor amiga e é SUA IRMÃ TAMBÉM! – Edmund rugiu – E o que te faz pensar que Lucy não represente exatamente o mesmo para mim? Pelo Leão, desça deste pedestal onde você se colocou e pare de pensar que está acima dos outros em questões de moralidade. Somos irmãos e somos iguais. Os mesmos defeitos, as mesmas qualidades e as mesmas fraquezas, que no caso seria uma inclinação natural aos desejos que em nosso mundo eram proibidos.


- Vai me dizer que nas leis de Nárnia nada condena isso? – Peter o olhou com uma ponta de esperança.


- Estive pensando a respeito. – Edmund respondeu mais calmo – Não achei nada que condene a prática e mesmo que houvesse, somos reis. Podemos alterar o que está na lei e assegurar a este país alguma estabilidade.


- O que quer dizer? – Peter o encarou confuso.


- Peter, nascemos num país onde a monarquia é um símbolo nacional e você não notou o mais obvio em tudo isso? – Edmund questionou incrédulo – O trono é hereditário e uma monarquia que não tem herdeiros está fadada a ruína! Eventualmente, e me surpreende isso não ter acontecido antes, o povo vai questionar seu estado civil e a ausência de um herdeiro, não só do Grande Rei, mas dos demais monarcas. O que eu proponho é dar a Nárnia herdeiros puros.


- Tornar possível casamentos consangüíneos na família real? – Peter o encarou espantado.


- Por que não? – Edmund disse de forma óbvia – Era uma prática comum na antiguidade do nosso mundo. Os faraós do Egito se casavam com suas irmãs, isso evitava disputas e fortalecia a dinastia, além do mais, eu não estou disposto a me casar com uma anã ou uma fêmea de centauro. Ninguém poderia questionar a legitimidade ao trono de filhos concebidos por você e Susan.


- A idéia tem seu mérito. – Peter admitiu. Edmund revirou os olhos – Então você afirma que suas intenções com Lucy são sérias?


- Você está igualzinho a um pai interrogando o pretendente da filha. Pela Juba do Leão, é claro que tenho intenções sérias. Eu não estaria sugerindo uma coisa dessas se não tivesse intenção de me enquadrar neste parâmetro. – Edmund retrucou impaciente.


- Então faça a droga do pedido! – Peter falou de uma vez – Todo pretendente a uma das rainhas deve se dirigir a mim com um pedido formal e um acordo vantajoso. Seu status como rei não o exime disso.


- Você é realmente um bastardo miserável. – Edmund resmungou antes de se levantar, endireitar a coluna e encarar Peter com firmeza.


- Estou esperando. – Peter sorriu malicioso.


- Muito bem. Eu, Edmund , O Justo, Rei de Nárnia; venho diante do Grande Rei Peter, pedir a mão de Lucy, A Destemida, Rainha de Nárnia, em casamento. – Peter teve que se controlar para não rir – E como recomendações de minha posição, os títulos de Duque do Ermo do Lampião, Conde dos Mares Ocidentais e Cavaleiro de Nárnia, me servem bem. Asseguro que como minha noiva, a Rainha Lucy receberá todos os títulos, na condição de consorte.


- Eu gostaria de ter uma forma de gravar isso. – Peter riu – Foi de longe a coisa mais engraçada que já vi.


- E então... – Edmund questionou impaciente – Qual é a sua resposta?


- Boa sorte com ela. – Peter disse presunçoso – Lu não vai gostar nada disso.


- Você já concedeu, ela não tem que gostar, pelo menos por enquanto. – Edmund disse dando as costas – Mas ela vai acabar se acostumando com a idéia e eu vou me esforçar pra que isso seja tão prazeroso para ela quanto será para mim.


Edmund nunca lera Maquiavel quando estava no mundo real, nem tinha noção da arte da guerra quando ainda era apenas uma criança comum, mas se o grande filosofo o tivesse conhecido na condição de rei, diria que aquele garoto era um modelo exemplar de um monarca.


Do que vale um rei que não tem a coragem necessária para tomar em suas mãos o destino de seu país e fazer o que deve ser feito? Se um monarca deve escolher, inevitavelmente, entre ser amado pelo povo, ou temido por ele, a decisão de Edmund era simples. Peter sempre esteve destinado ao amor popular e às grandes aclamações. Cabia ao Rei Justo a tarefa de impor medidas enérgicas e controversas, cujos resultados acabavam por enaltecer a imagem do Grande Rei.


Esta seria mais uma situação em que ele se via dividido entre amor e temor. Com toda certeza, Lucy não ficaria nada feliz quando soubesse, pelo menos no primeiro momento. Ele estava eliminando definitivamente as opções dela, junto com a concorrência e se as coisas continuassem neste ritmo, logo ele conseguiria que o casamento se tornasse uma ordem do Grande Rei e então ela não teria qualquer chance de escolha.


Edmund estava furioso com ela por sua fraqueza. Ela o havia aceitado, em momento algum tentou afastá-lo na noite anterior e ainda declarou sua fé nele. Ao primeiro desafio, ao primeiro sinal de que tudo aquilo estava muito longe de ser uma brincadeira, ela o afastou. A fé dela, antes tão certa e inabalável, não resistiu à primeira prova. Pois bem, agora era tarde de mais para ela voltar atrás. Para ele, a raiva servia para camuflar a mágoa pela rejeição.


Ele voltou ao próprio quarto para buscar algo que tinha guardado há algum tempo. De dentro de um pequeno baú, ele retirou uma bolsinha de veludo vermelho e tornou a sair do quarto.


Esbarrou com Susan pelos corredores, mas ela nada disse. Apenas lançou a ele um olhar confuso e saiu em direção aos jardins. Se Edmund conhecia Peter, podia ter certeza de que o irmão mais velho já tinha comunicado a Susan suas intenções e ela não era dada a negar qualquer coisa que Peter quisesse, mesmo que no meio do caminho sempre caíssem numa discussão.


Ele chegou à porta do quarto de Lucy, onde haviam dois guardas plantados e com expressões determinadas. Sua querida Lucy havia ordenado que ninguém entrasse em seus domínios, principalmente ele. Edmund teve vontade de rir da situação. Ela realmente achava que duas sentinelas iriam impedi-lo de vê-la? Ela estava sonhando.


- Sinto muito, Majestade. – um deles disse, enquanto mantinham lanças cruzadas em frente à porta – A Rainha Lucy não deseja ver ninguém e deu ordens expressas de que não deseja falar com Sua Majestade.


- Soldado, estou aqui com a permissão do Grande Rei Peter e trago um comunicado especial de meu real irmão à rainha. – Edmund disse convicto – Deixe-me passar.


Os soldados encararam um ao outro em dúvida. Os três irmãos mais jovens gozavam de igualdade hierárquica, mas ninguém tinha autoridade para ir contra uma ordem do Grande Rei Peter. Ainda que a rainha Lucy fosse a mais agraciada pelos mimos de todos os irmãos, por ser a mais jovem e amável, isso não a eximia de ter de acatar uma ordem.


Por fim os soltados abriram passagem para Edmund e fizeram reverência ao rei, enquanto ele entreva sem cerimônias no apartamento da quarta monarca de Nárnia.


Lucy estava sentada em uma poltrona junto à janela. Diante dela havia um prato de comida intocado e uma taça cheia de vinho diluído em água. Ela se recusava a tocar em qualquer alimento e seu rosto parecia abatido. Por mais que aquela imagem estivesse muito longe de se parecer com a da garota radiante que ela era, Edmund notou que a melancolia parecia trazer a tona uma beleza nova e muito mais madura.


Ela não olhou para ele. Manteve os olhos fixos na paisagem do lado de fora da janela, como se esperasse ganhar asas e sair voando dali. Não, ele não permitiria que ela ganhasse asas para fugir dele. Lucy era seu lindo canário, sua cotovia, e ela devia estar sempre perto e disposta a cantar para ele.


- Eu disse que não desejava ver ninguém. Do que me vale ser uma rainha se não posso nem mesmo ter uma simples ordem obedecida? – ela questionou num tom aborrecido e apático. Edmund deu mais um passo em direção a ela, mas ainda mantinha uma distância cerimoniosa.


- Rainha sim, mas como eu você não pode contrariar as vontades de Peter. – ele disse calmo.


- Se é uma mensagem de Peter, então por que ele mesmo não veio até mim, ou mandou um mensageiro? De todas as pessoas no mundo, ele tinha que mandar justamente você? – ela questionou irritada. Era uma atitude muito incomum nela, que sempre foi a mais simpática e educada da família.


- O assunto me diz respeito também. – Edmund disse simplesmente – Peter tem recebido muitas ofertas de casamento destinadas a você, agora que Susan decidiu não aceitar nenhum pretendente estrangeiro.


- E por que diabos isso lhe diz respeito? Cabe a mim e Peter concordarmos ou não com as propostas. – Lucy retrucou. Edmund não se deixou abalar pela atitude dela.


- Entre tantas propostas distintas está a minha. – ele disse sereno enquanto ela o encarava atônita – Estive com nosso estimado irmão agora a pouco e expus meu ponto de vista e algumas idéias.


- É impossível que Peter tenha concordado com qualquer barbaridade que você tenha dito. – ela respondeu com um leve tom de esperança.


- Impossível ou não, Peter aceitou, em nome de Nárnia e em seu nome, a minha proposta. – Edmund disse fazendo esforço para não soar presunçoso – Estou aqui para comunicar a você que estamos noivos e, no que depender de mim, a cerimônia se realizará o mais rápido possível.


- Mas eu não vou aceitar um absurdo destes! – ela disse se levantando de uma vez – É de mim que estão falando! Não serei tratada como um objeto de barganha! Peter vai ter que me ouvir!


- Tente, se isso te faz feliz. – Edmund deu de ombros – Aviso que será inútil.


- Por que está fazendo isso comigo, Ed? – ela o encarou de fato pela primeira vez. Os olhos marejados de lágrimas exprimiam toda angustia e desilusão que ela estava sentindo. Edmund quis abraçá-la.


- Porque eu não estava mentindo quando disse que te amava. – ele falou num tom mais baixo – Porque eu acreditei quando disse que tinha fé em mim. Porque você quer ficar em Nárnia e eu posso garantir isso. Porque você é tudo o que eu tenho. Gostaria que você acreditasse nisso, pelo menos você.


- Não faz sentido. – ela disse indignada.


- Não faz? Então por que você não resistiu na noite passada? Eu teria parado se você tivesse demonstrado qualquer sinal de rejeição, mas você não fez isso. – ela balançou a cabeça de forma negativa.


- Eu não estava sóbria. – foi o argumento.


- Se isso deixa sua consciência tranqüila, então continue afirmando isso até que acredite. – ele disse sério – Você não estava tão bêbada assim e o que eu sei é que a bebia apenas te dá coragem para fazer coisas que você sempre quis. – Lucy se calou, com uma expressão de pavor no rosto – Mas minta pela primeira vez. Ficarei feliz em saber que sua primeira mentira foi para esconder o que sente por mim, ou pelo menos me iludirei pensando assim pelo resto da minha vida.


- Ed... – ela estava tão confusa, tão perdida, que não notou que em meio a troca de argumentos ele havia se aproximado. Uma das mãos dele, de uma maneira sorrateira, segurou a dela.


Lucy não disse nada por um longo tempo. Ele se sentiu confortável para seguir em frente e abraçá-la. Repousou sua cabeça no ombro dela e sentiu o perfume de rosas que ela tinha. Sem que ela notasse, ele tirou da pequena bolsa de veludo vermelho um anel de ouro, com uma flor maravilhosamente trabalhada pelo ourives e com um diamante cravado no centro. O anel deslizou pelo dedo dela, enquanto Edmund beijava-lhe o pescoço.


Ele se levantou e ergueu o rosto dela. Ela ainda chorava e em seu rosto passavam tantas emoções que ela não sabia qual sentir primeiro. Ela ainda estava furiosa e enojada, mas no meio de tantos sentimentos conflitantes, ele viu a dúvida e o carinho estampados na face dela.


- Desista, Lu. – ele sussurrou firme e rouco junto ao ouvido dela – Você sabe que eu vou acabar ganhando no fim das contas.


- Isso é errado... – foi o argumento vacilante dela.


- Eu digo o que é certo ou errado. Nós diremos o que é certo ou errado. – ele disse convicto – E agora eu digo que você é minha e vai ser sempre. Por mais que diga que não, por mais que me odeie neste momento. Eu estou te roubando para mim. Estou fazendo de você minha noiva.


- Isso não vai ser fácil. – ela tentou parecer segura. Ele sorriu um sorriso enviesado.


- E quem gosta de coisas fáceis? – sem avisou ele a beijou e, cegamente, a imprensou contra a parede do quarto, enquanto sua língua invadia impiedosamente a boca dela. Lucy emitiu um gemido que ele mal registrou.


Num lapso de consciência repentina, Lucy despertou do transe que Edmund lançava sobre ela. Num movimento brusco ela conseguiu empurrá-lo, mas ele insistia em continuar o beijo. Num ato instintivo, ela o estapeou. Edmund a soltou de imediato, enquanto a encarava num misto de raiva e desejo.


- Saia daqui! – ela ordenou com os lábios inchados e o cabelo totalmente desalinhado. Edmund sorriu malicioso.


- Eu vou, querida. – o tom era vingativo – Mas eu volto. E da próxima vez vou exigir muito mais de você, minha amada noiva. – ele deixou o quarto como um furacão, enquanto Lucy o observava atenta e então desviava o olhar para a aliança em seu dedo.



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Autor(a): duda_esposito

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