Fanfic: Zoe e as aventuras na Amazônia | Tema: Harry Potter
Zoe suava frio, deitado na cama. Não conseguira dormir, tampouco afastar da mente a tempestade de emoções pelas quais havia participado momentos antes. O pequeno garoto sequer imaginara ser capaz de escapar ileso, muito menos fazer tal performance... Estranha performance. Ele não entendia como aquilo aconteceu. Sorte? Talvez! Mas isso não era algo comum na vida dele.
Todas as situações que exigiam um pouco de habilidade e atraiam olhares curiosos eram penosamente desastrosas. Os momentos acumulavam-se em seu passado. Ele lembrou-se do último saque em um jogo de vôlei. A bola até tinha conseguido uma altura e força razoáveis, para sua própria surpresa, mas não precisou de mais um segundo pra cair em si e perceber que ela tinha ido de encontro à rede. Quem ele poderia enganar, afinal? Era só o menino desastrado, alvo das zombarias, risos abafados e olhares da escola. No futebol era um cenário comum estar entre os últimos garotos da turma escolhidos para a formação do time. Com alguma “sorte”, acabava sendo escolhido antes de Vitor, o garoto gordo da turma, o único que parecia não se importar em puxar algum assunto com ele.
A inabilidade no esporte fez com que o menino odiasse as aulas de educação física. Os momentos que mais parecia gostar eram durante as aulas de informática, onde poderia isolar-se na cabine e prestar atenção exclusivamente ao professor, ou mesmo dividir o monitor com Vitor. As aulas de laboratório eram igualmente interessantes à ele. Para ser sincero, nessas Zoe parecia deleitar-se. Misturar os conteúdos dos frascos e rabiscar experimentos no papel com pauta, enquanto a maior parte da turma parecia entrar em devaneio, eram, ao garoto, um verdadeiro entretenimento.
E, ainda assim, ele voltava a lembrar-se, foi capaz de algo que o deixou aturdido, há não muitas quadras da escola. Zoe sabia que aquilo, de alguma maneira, tinha sido obra sua... ele sentiu a cabeça latejar quando ocorreu. A pequena multidão em volta, curiosa ou horrorizada demais para correr, atribuiu aquilo a um milagre divino. Algo tão extraordinário que a senhora de óculos, com os cabelos amarrados num coque, ao presenciar o acontecido, ajoelhou-se e orou num tom de voz elevado, levando alguns dos traunsentes a inflamar ainda mais a multidão de curiosos.
- Tudo bem contigo, Curumim?
A mãe de Zoe era uma mulher esguia, com algumas leves marcas de expressão no rosto, porém, ainda assim, de uma fisionomia agradável. Ela, como de costume, usava um vestido que era largo para sua estrutura, o que ela dizia ser mais afável para dormir.
Ele não pretendia contar o que ocorrera, pelo menos não por enquanto. Ele não sabia dizer o porquê, apenas queria manter isso para ele naquele instante.
- Tudo sim, mãe. Boa noite! - respondeu, com a voz carregada de um sono fingido.
- Vá dormir então, querido. Pare de pensar na vida, senão é capaz de amanhecer o dia e tu ainda estares de cara pro teto.
- Uhum... - ele disse, fechando os olhos.
Ao ouvir o barulho da porta se fechando, ele levantou e trancou-a. Não queria cerrar os olhos nem mesmo continuar deitado, pois estava frenético, a ponto de explodir por dentro. Isso era algo novo. Seria ainda consequência do ato anterior? Se fosse, estava funcionando, porque seu coração batia como um tambor de escola de samba em noite de carnaval na Sapucaí.
Preciso me acalmar. Isso não é nada, só um sentimento forte. Rápido passa!
Decidiu ir à sala assistir um pouco de tv, pois a mãe já estava provavelmente dormindo e não notaria sua presença se o volume permanecesse numa altura baixa. A sala era um local abafado, com mais imóveis do que parecia comportar. Diferente da maioria das salas de uma típica casa brasileira, aquela tinha três sofás, um em cada lado da casa e o último(de dois assentos) de frente para o armário que carregava a televisão. Ele sentou-se nesse último, tateando por debaixo de si, em busca do controle. Ao ligá-la, apressou-se para diminuir o volume e colocá-lo num tom baixo. O percorrer dos canais o distraiu dos pensamentos latentes, mas não por muito tempo, aliás, a programação do canal aberto, de madrugada, não parecia muito interessante. Ele deixou num talk show, o que só serviu de pano de fundo para que a recordação viesse à tona.
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Ele havia saído da escola, como qualquer outro dia, junto com Vitor que, por vezes, o acompanhava até a parada de ônibus que se situava quatro quadras depois do colégio particular Ernesto Damasceno, um dos mais tradicionais da cidade do interior amazônida. Aquela parada não se diferenciava muito das outras. Possuia um banco de aço com uma base que dava sustentação a um encosto e um teto arqueado e laranja. O local estava cheio de pessoas lutando para tentar encontrar abrigo na cobertura ou em alguma outra sombra, tentando escapar do sol escaldante do meio-dia e das duas próximas horas adjacentes. Lá ele estava, esperando o ônibus que demorava uma vida a passar. A essa hora o ponto sempre era abarrotado de indivíduos vindo de suas ocupações, a caminho de suas casas a fim de almoçar e ter uma breve oportunidade de descanso.
O instante que ele avistou o seu transporte vindo lentamente do horizonte, ficou aliviado, já checando seus pertences para ver se tudo estava em ordem. Com isso feito, ele apenas fixou o olhar para o ônibus, entretando sentiu alguém apontar um objeto na sua costa.
- Não olha pra trás, moleque! Passa a mochila.
Fosse a sua ingenuidade de nunca ter sido assaltado, sua reação foi de virar e encarar quem o estava ameaçando. O bandido pareceu chocado com a atitude, pelo menos foi o que Zoe enxergou nos olhos dele. A reação do menino deixou o assaltante furioso, pois o movimento fez com que todos na parada percebessem a tentativa de roubo, fazendo com que alguns gritassem, outros corressem e outros fizessem as duas coisas. A escassa multidão ao redor que ficou, continuou fitando o malfeitor com uma expressão de horror impressas em suas faces.
- Tu perdeu o juízo, mané? Quer levar um pipoco no meio desse teu miolo? Passa logo isso.
Dessa vez o bandido engatilhou a arma, brandindo-a em direção ao rosto de Zoe, que olhou aterrorizado.
O menino não entendeu muito bem o que aconteceu, unicamente desejou de uma maneira muito consistente que não queria e não iria morrer ali, naquela parada. Foi quando sua cabeça doeu e a vista ficou levemente turva. Daí, somente recordou de ter ouvido o bandido gritar muito alto, largar a arma no chão e olhar, estonteado, para a própria mão, que estava com a palma totalmente vermelha, com alguns pontos de sangue. Antes de tentar sair correndo, olhou estupefato para Zoe, dando tempo para que um rapaz desferisse um golpe no seu maxilar. O ato de coragem pareceu florescer o de outras pessoas, que logo se aproximaram para direcionar outros golpes ao assaltante, começando assim um linxamento que apenas inchou mais e mais, a medida que as pessoas percebiam a posição indefesa do bandido. Zoe pôde, mesmo com aquela comoção toda, ter um vislumbre do estado em que a arma se encontrava. Era algo totalmente inexplicável, como se ela tivesse entrado em um processo de liquefação. Onde antes estava um objeto sólido, a parte que parecia ter sido o cano da arma estava derretido, e a base parecia ter sofrido o mesmo processo, restando um pouco de solidez, o que serviu para distinguir o instrumento como uma arma. Inutilizável, totalmente danificado, entretanto ainda reconhecível como uma arma. A senhora de coque próxima a ele e de saia longa pareceu ter visto o mesmo que ele, levando-a a ajoelhar-se e agradecer a Deus por ter sido testemunha de um milagre. As pessoas também começaram a prestar mais atenção na arma, surpresas pelo estado em que se encontrava. Algumas olhavam de volta para Zoe, outras para o assaltante.
“Ela não estava assim, eu vi quando ele apontou a arma pro menino.” - disse uma moça de voz afetada.
“Claro que estava, o bandido tentou assaltar ele com uma arma estragada” - respondeu um rapaz que parecia estar na casa dos 50 anos.
“Vocês não percebem? O cano estava intacto. Isso é milagre de Deus. O Pai Celeste deu um escape ao menino. Vocês foram testemunhas do amor do Eterno.” - disse a senhora evangélica, que neste momento havia levantado para se dirigir às pessoas
Parecia que um longo tempo passara, mas não passava de uma impressão, pois naquele instante o ônibus tinha chegado à parada, fazendo com que Zoe subisse apressadamente, pagasse sua passagem e sentasse no fundo do ônibus, tentando, então, não atrair o olhar de mais ninguém.
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Não importa o que fizesse, a imagem sempre voltava à sua cabeça. A senhora evangélica agora dentro do ônibus, insistindo com o garoto, tentando convencê-lo a ir à sua igreja para que pudesse testemunhar aos outros fiéis o que ele presenciara. No entanto, de alguma forma, ele sabia que não só presenciara aquilo, mas fez com que a arma derretesse. Naquele momento, por mais absurdo que aquilo pudesse soar aos ouvidos de alguém ou até mesmo à sua própria mente, bem no fundo ele carregava essa certeza.
Agora, no meio da noite, ele já não tinha mais tanta assim. O que aconteceu era, de fato, estranho. Mas podia isso ter sido algo que ele, o garoto bobo e desastrado, motivo de chacota perante toda a turma por não saber chutar uma bola, tivesse feito? Algo tão aterrorisante, e, ainda assim, tão magnífico por não ter uma explicação racional?
- Em pé, não é, Zoe?! Eu te mando dormir e tu me apareces aqui, na sala, assistindo tv, tamanha duas horas da madrugada! - disse a mãe, indignada pela desobediência do filho e olhando o próprio relógio de pulso.
O tempo passou tanto assim?
Zoe, que retomara a consciência para o que acontecia à sua volta, viu que a tv agora transmitia um comercial de alguma rede de supermercados local. A mãe estava em pé ao lado do sofá, com o vestido arrumado de uma maneira desleixada sobre o corpo e uma expressão séria.
- Desculpa, mãe! Só não tô conseguindo dormir. Tive um dia meio estranho hoje.
Ele não planejava ter dito isto, mas já parecia ter sido tarde, pois a mãe já estava preocupada, buscando saber o que tinha acontecido.
- Como assim? Eu te perguntei antes de ir dormir o que estava acontecendo e você disse que estava tudo bem.
- Foi a força da expressão, mãe! Eu não queria dizer isso. Só tive um dia cheio, coisas da escola, rotina sempre a mesma. Esse tipo de situação. - Ele disse, tentando não chamar a atenção da mãe, mas sem sucesso.
- Eu ouvi muito bem. Agora trate de me dizer a verdade. Eu sei muito bem quando meu filho não tá bem. Tu chegaste estranho em casa. Não dormiu no horário que sempre está acostumado a dormir e agora vem com essa conversa. Uma mãe sempre sabe das coisas. Tolos vocês pensam que nós não estamos a par do que vocês sentem. Além do mais, já lhe disse milhões de vezes pra você se abrir comigo sempre que precisar. Agora, Zoe, diga: o que está acontecendo? - ela olhou-o nos olhos com firmeza, esperando uma resposta.
E agora, o que eu digo? Ela nunca acreditaria em mim. Burro! Como fui deixar essa escapar... Argh
- Err... foi uma situação, digamos que... inusitada. - Ele pausou um instante antes de continuar
- Pois sou toda ouvidos. - disse, sentando ao lado do filho no sofá.
- Quando eu voltei da escola, aconteceu uma coisa meio ch...
- Não me diga que aqueles meninos voltaram a mexer contigo, Curumim? Eu vou falar com a diretora dessa escola. Talvez te coloque pra aprender umas técnicas de auto-defesa. Elas podem ser necessárias nesse tipo de coisa. Eu já devia ter feito isso faz tempo, aliás!
- MÃE! Eu já disse que não precisa ficar me defendendo na escola, eu sei me virar.
- E chegou aqui em casa todo machucado no mês passado.
- Isso não vem ao caso. Primeiro que ninguém me bateu.
- Te insultaram? - ela disse num tom de voz apressado
- Fui assaltado, mãe!
Zoe soltou a frase de uma forma repentina, como se estivesse esperando pra se livrar desse pensamento que o atormentava.
- Assaltado? Era isso que te perturbava tanto? Filho, tu poderias ter me dito isso antes. Eles levaram só o que? A moch... - era como se ela entendesse, então, que o menino havia chegado de mochila em casa - Eles levaram o que de você, Zoe?
- Nada! Foi só uma tentativa...
- Menos mal. Ele te feriu? - disse tocando no braço do filho
- Não. Ele nem me tocou, apesar de ter apontado a arma pra minha cabeça.
A mãe fez uma expressão de horror e já ia abrir a boca pra dizer algo, mas o filho se adiantou
- Como eu disse, estou bem. Não fui ferido. Pra falar a verdade, o bandido levou a pior. Quando subi no ônibus, ele estava sendo lixado por quem tava por perto.
- Pois mais do que merecido. Imagina, fazer isso com o meu Curumim...
- O que me preocupa são as circunstâncias que o levaram a ser linxado.
- O que tu queres me dizer? Não foi o assalto que o levou a isso... ?
- Até foi! Mas... - Zoe hesitou
- Maaaas...
- Ah, mãe! Eu não sei como dizer isso... A arma derreteu... É estranho, eu sei, mas eu não tenho como dizer isso de outra forma e nem mesmo sei como explicar. Foi isso que aconteceu...
A mãe pareceu empalidecer diante da resposta de Zoe. Ela sabia muito bem que fatos estranhos estavam no passado do filho, o que a fez mudar o menino diversas vezes de escola. Até quando ele ainda era muito novo, precisando de diversos tipos de cuidados, ocorreu algo que a deixou preocupada. Ele tinha não mais que três anos, quando colocou o dedo em um fio descascado que estava na rua, deixado de uma forma desleixada por algum vizinho que provavelmente havia puxado-o para fazer algum tipo de “gato” na energia elétrica e ainda estava no meio do procedimento. Quando o menino pôs o dedo na ponta, a mãe, saindo à porta de casa, viu o filho no exato instante da execução do ato e deu um grito estrondoso, fazendo com que o menino largasse o fio. O cabo estava conectado ao interruptor de energia, mas, de alguma maneira, o menino não havia sido atingido. Ela foi à igreja aquele dia, agradecer a Santa Rita, de quem era devota. Entretanto, não pensou que outros eventos parecidos fossem acontecer ao longo da vida do menino.
Com certeza isso que ele contara, era algo que demonstrava algum tipo de poder ou energia que o garoto possuia, e ela não era capaz de entender.
- Filho, tu me disses que... a arma... derreteu?
- Isso mãe, ela derreteu. Eu não sei nada sobre isso, mas foi o que aconteceu comigo.
Ela fechou os olhos, respirando fundo e tentando manter a calma perante o filho.
- Filho... tu sabes que certas peculiaridades já aconteceram contigo.
- Eu sei, mãe. Mas nada que seja, de perto, como isso. Eu sou uma aberração, não sou mãe? Eu nem sei se eu fiz mesmo isso, mas se fiz, eu só posso pensar que sou algum tipo de monstruosidade que não se encaixa na sociedade. Eu já sou diferente na escola, a senhora sabe disso, e...
- Shhhhhhhhhhh! - Ela fez menção pra que ele se calasse. - Não diga algo assim. Eu não sei o que aconteceu, assim como tu, mas não pense que não és uma pessoa sã.
- O que eu posso ser então? - Ele perguntou, com a voz um pouco exaltada
- Meu filho, acima de tudo. E um menino especial, só isso!
Zoe estava pronto para responder à mãe, quando ouviu alguém bater a porta.
Autor(a): lucasleitao
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