Fanfic: Como eu era antes de você - Laliter | Tema: Laliter

É inacreditável que tantas pessoas possam recusar um pedido de ajuda que envolva uma cadeira de rodas atolada na lama, principalmente quando o pedido vem de uma garota usando uma minissaia e lançando seu sorriso mais amável. Não costumo lidar bem com estranhos, mas o desespero me fez destemida. Passei de um grupo a outro de turistas que estavam na tribuna principal, perguntando se podiam ajudar um minuto. Olharam para mim e para minhas roupas como se eu estivesse tramando alguma cilada.

Lali: Trata-se de um cadeirante — eu insistia. — Está um pouco preso.

Turistas: Estamos só esperando pelo próximo páreo — diziam. Ou: — Desculpe-me. — Ou: — Só depois do páreo das duas e meia. Temos um cavalo correndo nesse.

Cheguei até mesmo a pensar em arranjar um jóquei ou dois. Mas, quando cheguei perto da área destinada a eles, reparei que eram menores que eu.No momento em que cheguei ao local de aquecimento, eu estava incandescente de raiva contida. Desconfio que rosnava para as pessoas, e não sorria. E ali estavam, finalmente, alegria suprema, os rapazes de camisas polo listradas. Nas costas das camisas lia-se “Última Batalha do Marky” e eles seguravam latas de Pilsner e Tennent’s Extra. O sotaque dava a entender que eram de algum lugar da Inglaterra e eu tinha certeza que não tinham parado de beber nem por um instante nas últimas vinte e quatro horas. Eles vibraram quando me aproximei, e precisei lutar contra a vontade de lhes mostrar o dedo outra vez.

Wil: Sorria, belezinha. É o último fim de semana de solteiro de Marky — disse um, com voz pastosa e colocando no meu ombro a mão do tamanho de um pernil. — Bom, acho que você deveria dar um beijo nele.

Lali: Na verdade — disse eu —, vim aqui pedir ajuda a vocês.

Wil: Ajudo no que quiser, gata. — A frase foi acompanhada de uma piscadela .

Lali: Não, sério. Preciso que vocês ajudem a um amigo. Lá no estacionamento.

Wil: Desculpe, não sei se estou em condições de ajudar, gata.

Eles se viraram para a pista, já perdendo o interesse em mim. Olhei por cima do meu ombro para o estacionamento, vendo Gaston puxando inutilmente a cadeira. Imaginei-me voltando para casa e contando aos pais de Peter que tínhamos largado a caríssima cadeira de rodas num  estacionamento. Foi então que vi a tatuagem.

Lali: Ele é soldado— falei, alto. — Ex-soldado. — Um por um, eles se viraram para mim. — Foi ferido. No Iraque. Nós só queríamos que ele tivesse um bom dia ao ar livre. Mas ninguém nos ajuda. — Ao falar isso, senti lágrimas brotarem nos meus olhos.

Marky: Veterano? Você está brincando. Onde ele está?

Lali: No estacionamento. Pedi a várias pessoas, mas elas simplesmente não quiseram ajudar. — Tive a impressão de que eles levaram um ou dois minutos para processar o que eu dizia. Depois, se entreolharam, admirados.

Wil: Vamos, rapazes. Não vamos assistir a esse páreo. — Passaram por mim em uma fila nada reta. Eu podia ouvi-los comentar entre eles, murmurando: — Malditos civis... não têm ideia de como é isso...

Quando alcançamos o estacionamento, vi Gaston ao lado de Peter, cuja cabeça estava enfada na gola do casaco por causa do frio, apesar de Gaston ter colocado mais uma manta no ombro dele.

Lali: Esses simpáticos cavalheiros se ofereceram para nos ajudar — expliquei. Gaston olhou as latas de cerveja. Preciso admitir que era preciso se esforçar para imaginar algum deles em uniforme militar.

Marky: Querem levar ele para onde? — perguntou. Os outros rodearam Peter, saudando-o com a cabeça. Gaston indicou o nosso carro.

Gaston: Queremos colocá-lo no carro. Mas, para fazermos isso, temos de levar a cadeira até o suporte e depois dar marcha a ré até ele.

Marky: Não precisa fazer isso — disse dando um tapinha nas costas de Gaston. — Podemos carregá-lo até o carro, não é, rapazes? — Um coro de vozes concordou. Eles começaram a se posicionar ao redor da cadeira.

Lali: Não sei... é uma distância grande para vocês carregarem — avisei. — E a cadeira é muito pesada.

Wil: Não se preocupe, gata. Fazemos qualquer coisa por um colega de farda, não é, rapazes? — Não vamos deixar você aqui, camarada. Jamais abandonamos um companheiro, não é?

Olhei para Gaston e, com a cabeça, neguei furiosamente diante de sua cara intrigada. Peter parecia incapaz de se manifestar. Estava sério e, então, quando os homens se agruparam ao redor de sua cadeira e com um grito a içaram, ele ficou meio assustado. Os tênis deles escorregaram na lama e senti meu coração disparar. A cadeira de Peter tinha sido levantada a vários centímetros do chão. Gaston correu para pegar a bolsa de Peter e abrir o carro antes que chegássemos até lá.

Tínhamos trocado números de telefone quando eu finalmente me livrei de Marky e seus companheiros. Eles fizeram uma vaquinha de quarenta libras para ser doada para o fundo de reabilitação de Peter e só desistiram quando eu disse que ficaríamos mais contentes se fizessem um brinde a nós.

Lali: Eles foram úteis, não? — perguntei, animada, ao ligar o carro.

Peter: O mais alto derramou toda a cerveja na minha perna direita — disse Peter. — Estou com cheiro de cervejaria.

Gaston: Não, não acredito no que estou vendo — exclamou Gaston, quando finalmente saí pela entrada principal. — Olhem. Ali tem um enorme estacionamento para deficientes, ao lado da tribuna. E todo asfaltado.

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