Fanfic: Como eu era antes de você - Laliter | Tema: Laliter

Lali: Qual o melhor lugar onde você já foi?

Peter e eu estávamos sentados no abrigo, esperando que uma chuvinha repentina parasse para darmos uma volta nos jardins atrás do castelo. Peter não gostava de andar pelas áreas principais, pois lá muita gente ficava olhando para ele. Mas a horta era um dos tesouros ocultos do castelo, aonde poucos iam. Os pomares escondidos ficavam separados por trilhas de seixos, por onde a cadeira de rodas passava facilmente.

Peter: Melhor de que forma? Por que essa pergunta? — Despejei um pouco de sopa de uma garrafa térmica e segurei a colher próximo à sua boca.

Lali: É de tomate.

Peter: Certo. Meu Deus, está quente. Espere um instante. — Ele olhou para longe. — Escalei o monte Kilimanjaro quando fiz trinta anos. Foi incrível.

Lali: Que altura?

Peter: Mais de cinco mil metros até o pico Uhuru. Nos últimos metros já estava engatinhando. A altitude prejudica muito.

Lali: Estava frio?

Peter: Não... — Ele sorriu. — Não é como o Everest. Pelo menos, na época do ano em que fui. — Ele olhou ao longe, imerso na lembrança. — Foi lindo. É considerado o teto da África. Lá de cima dá para ver quase até o fim do mundo.

Peter ficou calado por um instante. Olhei para ele, pensando onde realmente estaria. Quando tínhamos essas conversas, ele parecia o meu colega de escola que se distanciou de nós depois que se aventurou pelo mundo.

Lali: Que outros lugares você gostou de conhecer?

Peter: A Baía Eau Douce, nas Ilhas Maurício. A população de lá é muito simpática, as praias são lindas, ótimas para mergulhos. Hum... o Parque Nacional de Tsavo, no Quênia, com toda a sua terra vermelha e os animais selvagens. O Parque Nacional Yosemite, na Califórnia. Montanhas tão altas que o cérebro da gente não consegue processar tamanha imensidão. — Contou de uma noite que passou escalando, pendurado num penhasco a muitos metros do chão, e precisou prender o saco de dormir no rochedo, pois, caso rolasse o corpo durante o sono, aconteceria um desastre.

Lali: Você acabou de descrever o meu pior pesadelo.

Peter: Gosto de grandes cidades também. Adorei Sydney. E as terras ao norte da Islândia. Lá tem um lugar perto do aeroporto onde se pode tomar banho em fontes vulcânicas. É uma paisagem um pouco estranha, nuclear. Ah, gostei também de andar a cavalo na planície central da China. Cheguei lá após dois dias a cavalo, partindo da capital da província de Sichuan; os moradores cuspiram em mim, pois nunca tinham visto um homem branco antes.

Lali: Tem algum lugar que você não conhece? — Ele tomou mais um pouco de sopa.

Peter: Coreia do Norte? — Ele pensou. — Ah, nunca fui à Disneylândia. Será que vale a pena? Nem à Eurodisney.

Lali: Uma vez, comprei uma passagem para a Austrália. Mas nunca fui. — Ele virou-se para mim, surpreso. — Acontece. Tudo bem. Talvez eu vá um dia — acrescentei.

Peter: Nada de “talvez”. Você precisa sair daqui, Esposito. Prometa que não vai passar o resto da vida enfada nesta cidade que mais parece uma maldita estampa de jogo americano.

Lali: Prometer? Por quê? — Tentei fazer uma voz suave. — Aonde você vai?

Peter: É que... não aguento pensar que você vai ficar aqui pelo resto da vida. — Ele engoliu em seco. — Você é muito inteligente. Muito interessante. — Ele desviou os olhos de mim. — Você só vive uma vez. É sua obrigação aproveitar a vida da melhor forma possível.

Lali: Está bem — concordei, com cuidado. — Então me diga para onde eu devia ir. Aonde você iria, se pudesse ir para qualquer lugar?

Peter: Agora?

Lali: Sim, agora. E não me venha com Kilimanjaro. Tem de ser um lugar onde eu possa me imaginar — expliquei. — O rosto de Peter relaxou e ele ficou parecendo outra pessoa. Naquele momento, um sorriso brotou em seu rosto, seus olhos apertados de satisfação.

Peter: Eu iria a Paris. Sentaria numa mesa na calçada do Café Marais, tomaria uma xícara de café e comeria croissants quentes com manteiga sem sal e geleia de morango.

Lali: Marais?

Peter: É um pequeno bairro no centro de Paris. Com ruas de pedras, prédios residenciais que parecem balançar; gays, judeus ortodoxos e mulheres de certa idade que já foram parecidas com Brigitte Bardot. É o melhor lugar para ficar. — Virei-me para ele e disse baixinho:

Lali: Podíamos ir. De Eurostar. É simples, acho que nem precisaríamos que Gaston fosse junto. Nunca fui a Paris. Adoraria ir. De verdade. Principalmente com alguém que já conhece. O que acha, Peter?

***