Fanfic: Entre Acasos -Portiñón- (Finalizada) | Tema: portinõn

Anahí

Michele estendeu o braço para que passássemos, enquanto na outra mão pendia o revolver que ela segurava com uma precisão de quem sabia exatamente o que estava fazendo.

Olhei para a arma e senti um tremor na espinha. Nunca havia pensado em encarar uma situação dessas, ficar frente a frente com uma arma ou coisa parecida. Uma coisa era ser ameaçada ou agredida pelo Ricardo, outra coisa era ver alguém com quem sequer troquei uma dúzia de palavras com uma arma apontada para meu rosto e com a real intenção de me machucar.

Papai passou à minha frente, indo em direção a soleira da porta. Num gesto bruto, papai tentou retirar a arma da mão de Michele e gritou para que eu corresse. Mas não consegui. Estava estagnada de medo, de pavor! Medo daquela mulher, medo da reação do meu pai, medo de ter acontecido alguma cosia com a Dulce... Muito medo.

Michele parecia ter antecipado a intenção de papai e, com um chute certeiro entre as pernas, fez com que ele caísse retorcendo de dor.

Corri para ele tentando ver se estava tudo bem, mas antes que eu me aproximasse, vi o cano prateado próximo ao meu rosto. Suas mãos sequer tremiam!

- Velhos... O mundo seria tão mais fácil sem eles, não acha? Só fazem merda, só conseguem estragar o humor da gente! Mandam abaixar o som, mandam dirigir devagar, olhar para atravessar a rua... Mas numa coisa eles são espertos! Falam para nunca reagirmos! Tsc tsc tsc... Seu pai é um velhote idiota, Anahí. Ele deveria ter aprendido isso. Aliás, ele deveria estar te ensinando isso e não eu! Afinal, eu sou a vilã! Quero dizer... A anfitriã da festa!

Sorriu olhando para meu pai caído no chão, dando um chute em seu rosto. Gotas de sangue espirraram em minha calça e papai ficou desacordado.

- Não! Não faz isso! Deixa ele! Eu faço o que você quiser, mas deixa ele...

- Olha o que esse velho burro fez! Causou os próprios hematomas! Mas se você diz que vai fazer o que eu quiser... – sorriu assustadoramente.

Não conhecia aquela Michele. Ela parecia tão diferente na faculdade... Parecia até ser normal!

– Tira os cadarços e amarra os braços e as pernas dele. E se não amarrar direito... Eu mato ele e deixo a mocinha lá de dentro aleijada – sorriu.

Estava ficando cada vez com mais medo daquele sorriso... Ele estava constantemente nos lábios dela e isso me deixava com a certeza de que ela era capaz de tudo.

Me abaixei e amarrei os braços e as pernas de papai bem forte. “Espero que a policia chegue logo!!!”, pensei desejando mais que tudo que eles fossem rápidos pelo menos uma vez na vida!

- Pronto... – falei com a voz fraca.

- Agora leva ele pra lá – apontou para o armário do servente, que tinha no final do corredor. – Vamos deixar ele descansando ali.

Peguei papai pelos ombros e fui puxando ate a porta do armário. Michele me jogou um molho de chaves que imaginei ser do porteiro.

- Alguma dessas é daí. Abre e joga ele ai dentro.

- Mas... Ele vai sufocar!!!

Ela gargalhou e voltou a me olhar... Agora parecia estar com pena.

- O que eu posso fazer, meu bem? Ele pediu...

Fiz o que ela mandou e entramos para dentro do apartamento da Dul. Chegando lá dei de cara com Lorena sentada no sofá, com as mãos amarradas e Dul desacordada, a cabeça no ombro de Lorena e um corte na testa com um filete de sangue seco.


Corri para Dul e sacudi ela algumas vezes. Nada dela acordar. Comecei a ficar desesperada, pensando no que poderia ter acontecido! Nessas horas só passam coisas ruins na cabeça!
- Não me deixa, Dulce! Por favor... Não me deixa! – falava baixinho enquanto sacudia seu corpo. – Não faz isso comigo! Não assim! Por favor!!! – sem perceber as lágrimas já estavam rolando em meus olhos.

- Toma – Michele estendeu um pano em minha direção. Pelo cheiro percebi que era álcool. – Ela está desacordada... Estava muito agitada... Como seu pai. Tive que dar um jeitinho – deu de ombros e sentou no sofá de frente para onde estávamos.

Passei o pano pelo pescoço de Dul e depois aproximei do nariz, a uma distância segura para que não sufocasse ela.

Alguns segundos depois Dul suspirou e me fez respirar aliviada e sorrir um sorriso meio torto, feliz por ela estar bem!

- Meu amor, você este bem? Fala comigo, Dul!

- Estou... Sonhei com a... – levantou num salto olhando para Michele.

- Não foi sonho, Dul... Infelizmente.

- Bom, já que estamos todas aqui... Que tal conversarmos um pouco? – ficou nos encarando. O revólver pousado nas pernas cruzadas. Parecia relaxada e extremamente cômoda com a situação... Parecia se divertir. – ótimo! Também acho que deveríamos conversar!

Fez uma pequena pausa, limpou a garganta e continuou.

- Eu fiquei pensando que vocês não me atrapalhariam... Que só achariam que aquele paspalho tinha uma amante... Mas não. Era tão melhor para vocês se tivessem ficado quietas...

- Como eu ficaria quieta com aquele maníaco me ameaçando? – Dulce respondeu com uma frieza que eu nunca havia visto. Tive medo da reação de Michele diante daquela resposta. Olhei para Lorena interrogativamente e ela deu de ombros, balançando a cabeça negativamente.

Acho que pela primeira vez a presença de Lorena não me incomodava. Gostaria de entender o que ela estava fazendo ali, mas não tive coragem de perguntar.

- Pois então, Dulce... Acho que já temos intimidade para que eu te chame de Dul, né? Pois bem. Não era para ele ter ameaçado vocês, mas o que acontece quando se tem músculos e beleza? Falta cérebro e sutileza!

- Engraçado... Você fala como se fosse a peça chave de tudo e vem falar que estragamos sua vida? Acho que te faltou tudo!

- Dul... Não abusa da minha boa vontade. Nem sei por que você ainda está viva! Mas me diga, Lorena... – virou-se para Lorena que parecia estática, sem qualquer reação. Estava pálida como vela! - Você tinha uma família, estava praticamente casada... Tinha tudo o que queria... Voltar pra isso? – abriu os braços como se mostrasse a situação. – Mendigar um pouco de carinho? Você não precisava... Tinha um homem lindo, inteligente, bem sucedido... Um verdadeiro milagre de Deus existir homens assim, sabia?

- N-não. E-eu... Eu amo a Dulce... – abaixou a cabeça ao som da gargalhada de Michele.

- Mas ela não te ama... Olha só ao lado de quem ela está? Note a coisa mais simples: para que lado o corpo dela está pendendo?

Dul, que também estava amarrada, tinha o corpo agora ligeiramente flexionado para meu lado. Mas Lorena não moveu o olhar para nosso lado.

- O que está tentando fazer, Michele? Magoar o coração de alguém ou se vingar?

Ignorou nitidamente a pergunta de Dul e voltou o olhar para mim.

- E você? Largou o namorado por causa de uma mulher? Faça-me o favor, Anahí!

Senti o olhar de Dulce sobre mim e gelei. Não era para ela descobrir desse jeito! Não era para ela saber por uma boca que não fosse a minha.

- O que você tem, hein? … feita de açúcar? Nem tão linda assim você é!

Dulce sorriu irônica. Eu não conseguia entender como aquela mulher pacifica e reservada que eu conhecia estava ácida e sarcástica.

- Talvez... Sortuda deve ser você que se agarrou a primeira oportunidade, que diga-se de passagem foi péssima, para sair do interior e não teve a capacidade de preservar sua própria irmã. Tenho inveja da sua sorte.

- CALA A BOCA! Você não sabe de nada!


- Engraçado como são as coisas... Nunca precisei recorrer a nada dessas coisas para ter o que quis... O que aconteceu? Tédio? Você foi maltratada na infância? Precisava de atenção?

O olhar de raiva de Michele chegava a queimar em Dul.

- Olha... O que você quer, Michele? Fala que a gente tenta ver... – falei tentando acalmar as coisas.

- Ah, Anahí... Tentando defender a namorada, né? Não se preocupe... Eu vou fazer vocês duas acabarem juntas!