Fanfic: Entre Acasos -Portiñón- (Finalizada) | Tema: portinõn

Anahí

 "Idiota... simplesmente idiota. Como eu pude fazer isso? E agora? Como iremos nos olhar, conversar, estudar, sair, ficar a sós... como? Será que eu terei vontade de beijar novamente aqueles lábios? Aqueles lábios... Macios e suaves, inebriantes! Aquele calor, aquela intensidade... É como degustar um bom vinho. Não sou filosofa de botequim, mas tem uma coisa embriagante naquele beijo! Desejo, calor, suavidade, excitação, carinho... tanta coisa em um só ato! Como ela consegue fazer isso com meu corpo? ELA... A... feminino... não consigo entender. Quero, mas não quero querer. Quero, mas não posso querer. Não posso porque ela não quer, não posso porque tenho namorado, não posso porque não é certo... Não posso porque quero. Enfim, o que sinto por você, Dulce? O que estou sentindo? Desde quando sinto? O que é isso tudo? Curiosidade? Amizade? Desejo? Tesão?... Não sei... Não sei".

Remoí as mesmas perguntas por todo o dia até que a noite chegou e adormeci. Sonhei com Dul.

*****

 Dulce

A segunda-feira chegou como num estalo. Tinha uma reunião com o cliente às 13 horas e, como havia acordado tarde, senti que meu dia todo iria passar muito rápido. Arrumei a casa, preparei todo material da reunião em um slide simples e fui para o banho.

Apesar de achar essas reuniões com clientes uma coisa muito chata, costumo tirar algo de bom delas, mas dessa vez, não teve jeito! O cliente era um mala sem alça e a esposa dele duas vezes pior. Sai da reunião depois das sete horas, aliviada por ter matado um leão, e insatisfeita por ter que refazer todo o layout do site.

Foi então que lembrei que teria mais um leão para matar: o clima entre eu e Anahí. Por mais que às vezes eu conseguisse levar as coisas tranquilamente, ainda assim não gostava do peso que ficava e da distância que muitas vezes essas coisas causam. Tive medo de Anahí mal olhar para mim. Ao imaginar em como ela poderia se comportar, senti um frio na espinha.

Cheguei à faculdade quarenta e cinco minutos atrasada, por causa do trânsito péssimo desse horário. Preferi não entrar na primeira aula, para evitar constrangimento interrompendo a aula no meio. Fiquei pensando em todas as formas de quebrar o gelo que poderia se formar. Imaginando possíveis conversas e brincadeiras. Apesar de saber que não faria nem metade delas, eu ainda as imaginava enquanto me dirigia para sala. Encontrei a Any no meio do corredor, minhas pernas estremeceram e senti meu rosto em chamas.

- Já ia te ligar! Achei que não viria a aula! - disse sorrindo, me abraçando e beijando meu rosto.

Fiquei desconcertada com a atitude dela. Não com o abraço, porque era nosso costume nos cumprimentarmos assim... Com o beijo um pouco, afinal, não é fácil receber um beijo no rosto quando se lembra do beijo na boca. Mas na verdade, me senti desconcertada com a reação dela. Realmente, parecia que não havia nada acontecido.

- Ah, um cliente mala e sua esposa! Nossa... Sinceramente, acho que a Renata tem que começar a ir nessas reuniões! Já estou ficando louca com esses clientes! E o pior é que tenho sexto sentido pra "malice" porque eu não queria pegar esse trabalho, mas a Renata insistiu, disse que a grana era boa... Affe. Desculpe. Cheguei despejando meu mau humor em você! - sorri. - E você? Como está? Curtiu muita ressaca ontem? - tateei no escuro, com medo de que aquela pergunta levasse aos acontecimentos do sábado.

- Não. Fiquei dormindo quase o dia todo e pensando em como fazer para desmascarar o idiota do Ricardo.

- Verdade! Você já pensou no que vai fazer a respeito?

- Na verdade, estou pensando em não fazer nada, por enquanto.

- Como assim, Any?! O cara te machuca, e você vai deixar como está? Não pode, moça! Tem que tomar alguma atitude!

- Ah, e o que você sugere? Contar para minha mãe? Olha, mamãe, o seu marido, esse anjo de candura, estava quase trepando com minha coleguinha de sala no estacionamento e quando peguei os dois no flagra, ele apertou meu braço com tanta força que me machucou e ainda me ameaçou! - disse em um tom seco de ironia que poucas vezes a vi usar. - Não, Dulce. As coisas não funcionam assim na minha casa. Eu preciso provar o que aconteceu e não tenho como! Nem tem mais alguma marca no meu braço, graças a Deus, diga-se de passagem.

- Mas então você vai deixar assim, como está?

- Estou pensando em uma coisa... Ele se encontrou com a Michele na sexta feira, e todas as sextas ele diz para minha mãe que vai jogar bilhar com os amigos... "momento macho", como ele diz. E ele fica fora a noite quase inteira.

- Acho que ele não está jogando bilhar há algum tempo - disse sorrindo.

- Pois é. Acho que ele e a Michele se vêem todas as sextas, mas há quanto tempo será isso? Pensei que nós poderíamos descobrir.

- Nós? Tipo, eu e você? - imaginei-ne sorrateiramente com um macacão preto, toca, espionando um bandido de um beco escuro, como os espiões de desenhos animados. Sorri com o pensamento.

- Claro, Dul! Não tem outra pessoa que possa me ajudar. A não ser que você não queira - fez aquela cara de menino abandonado que sabia que eu não resistia. - Eu vou entender se não puder, ou não quiser...

- Pára com o drama, Any! Você sabe que eu não agüento essa carinha! Eu ajudo, claro! Mas ainda não sei como faremos nem quando faremos! Mas ajudo!

- Ótimo! Eu já pensei em quase tudo! Esse mês não faremos nada. Eles devem estar tomando cuidado. Podem estar pensando que eu estou vigiando. Então, deixaremos a poeira baixar e voltarem a ser descuidados, e então: Cabum! Pegamos eles! - esfregou as mãos como quem tem um plano maquiavélico, e sorriu.

Tive vontade de segurar seu rosto e beijá-la diante dessa encenação de vilã que acabara de fazer, mas me controlei o suficiente para só gargalhar.

- Acho que você está adorando isso! E o que você tem em mente?

- Bom, isso te conto outro dia. Vamos pra aula? Já deve ter começado.

O restante da noite transcorreu tranquilamente, assim como as duas semanas seguintes. Evitava olhar em seus olhos, pois sentia os meus presos, e logo pairava aquele peso de quando o desejo sufoca, tirando todo o ar do lugar. Não mais achava que era confusão de minha parte, ou que era unilateral. Eu sabia que Any, às vezes, também pensava o mesmo e queria o mesmo, mas respeitávamos a decisão de não tocar no assunto e, muito menos, tínhamos a intenção de estragar tudo com algum ato impensado.

Eu havia conseguido fugir de Maite durante os dois fins de semana que se seguiram, mas sabia que não conseguiria fugir no terceiro. Não gosto de ficar com pessoas desconhecidas, muito menos em baladas. Gosto de conhecer e me apaixonar e acho que por isso tenho esse talento de me envolver com pessoas que não possuem o mesmo interesse sexual que eu. Então, decidi que sairíamos sexta à noite.

Na sexta, depois que a aula terminou, acompanhei Anahí até seu carro e fui em direção ao meu, vasculhando a mochila atrás das chaves. Percebi que Anahí havia esquecido a blusa de frio comigo, mas deixei para lá. Entregaria na segunda ou levaria em sua casa amanhã. Quando levantei os olhos, senti todo meu corpo estremecer, e uma súbita falta de ar.

- Me disseram que eu te encontraria aqui.