Fanfic: Entre Acasos -Portiñón- (Finalizada) | Tema: portinõn

Dulce

- Fica essa noite também? - Minha cabeça repousava em seu colo enquanto assistíamos pela milésima vez "Madagascar".

Não queria ficar sozinha, ainda me sentia meio necessitada de carinho e afago. Sabia que aquele pedido implicaria em dar esperançar para Lorena, mas queria realmente a companhia dela.

- Tá, mas você promete que vai conversar menos de madrugada? - brincava com mechas do meu cabelo entre os dedos. Fiz um ar de indignada com o comentário e sorri.

Passamos o restante da tarde assim, vendo todos os desenhos que eu tinha. Lorena era simplesmente alucinada por animações. Quando estávamos juntas, era a conta de sair um em cartaz que já éramos as primeiras da fila para assistir, disputando lugar com os pirralhinhos. Os olhinhos dela até brilhavam quando o desenho começava. Achava engraçada a euforia dela com desenhos.

- Dulcinha, amanhã eu trabalho, como faço pra chegar lá, daqui?

- Eu te levo.

- Mas é muito cedo! Não precisa. Só me explica como chego lá que es...

- Eu te levo e ponto! Preciso visitar o cliente-mala. A Renata me paga! Por causa da ganância dela eu estou me ferrando! E cada dia mais, com esse chato!

- Ela falou que achava que você estaria chateada com ela por causa de um trabalho que ela aceitou e não pode desenvolver - levantei-me de seu colo e a observei.

- Como assim "ela falou"? Vocês se viram quando?

Lorena se ajeitou no sofá e olhou como quem diz o que não era para ser dito.

- Seguinte... Eu conversei com ela essa semana. Acho que foi na quarta.

- E por que ela disse que eu estava com raiva dela?

- Porque ela te passou o cliente chato...

- Você entendeu, Lorena! Não se faça de boba! Agora eu entendi tudo! Foi a Renata que te disse onde me encontrar, não foi? - olhei-a com olhos ameaçadores, mas no fundo, não estava chateada. Só queria mesmo parecer. Acho que, nessa altura, até agradecia por Lorena estar aqui. Se não estivesse eu teria que correr para casa da Dani e não escaparia das explicações!

- Verdade. Foi ela - baixou o olhar. - Mas não briga com ela, por favor! Ela só queria ajudar pra que nos entendêssemos!

- Affe... Deveria ter imaginado antes! - abrandei o olhar e sorri. - Como você conseguiu falar com ela? Ela tá no Mato Grosso!

- E-mail, meu amor! Método de comunicação eficaz quando o celular está fora de área! - sorriu como anunciante de lojas de departamento. - Daí, ela me passou o telefone de onde estava e eu liguei!

- Tsc, tsc, tsc... Mulheres! Ninguém segura quando querem algo!

O sono começou a menear em minhas pálpebras, mas como sempre, fiquei enrolando até adormecer no sofá. Estava entrando no mundo de Morpheus, mas com o restinho de consciência, ainda pude ouvir a voz de Lorena ao longe.

- Eu preciso de você, Dulce... Não posso te perder, não de novo...  Porque, com você o meu mundo ficaria completo - recitou um pedaço da musica que foi nossa e beijou meus lábios. E foi a última coisa que senti antes de me entregar ao sono.

Abri os olhos e percebi que estava em minha cama. Senti a respiração pesada de Lorena em meu pescoço, seu braço em volta de minha cintura e as pernas entrelaçadas nas minhas. Olhei para o relógio em meu criado que marcava 6:27.

Virei com muito cuidado para que Lorena não acordasse. Ao me movimentar, ouvi o ronronar conhecido, meio reclamado pelos movimentos.

Estava tão linda... Afastei cuidadosamente alguns cachos que lhe caiam sobre os olhos e fiquei observando aquele rosto iluminado por alguns raios de sol vindos através da cortina mal fechada. Não me recordava de já ter visto Lorena dormindo. A verdade é que, com a perseguição incessante de sua mãe, dormimos juntas pouquíssimas vezes.

Por alguns segundos senti um pouco da amargura das lembranças do passado, mas logo se dissiparam, dando lugar à lembrança das palavras da noite anterior.

Brincava com uma mecha de seus cabelos enquanto pensamentos me assaltavam.

"Seria perfeito se pudesse ser real... Você aqui, acordando comigo, nossas sessões de cinema, suas vontades loucas de sair no meio da noite... Ah, Lorena, queria que tudo pudesse ser consertado, também! Queria que tudo fosse simples de se reaver. Queria que fosse assim, como acordar do seu lado e todos os buracos estivessem costurados, as feridas curadas, e sem mágoa nenhuma, nem de vez em quando...".