Fanfic: Irresistível | Tema: Light

Dulce recuava cada vez que uma onda fria chegava até suas coxas. Apesar da temperatura baixa, estava entretida e enterrou os pés na areia.

De início ao caminhar na areia seus pensamentos estavam depressivos. Sua pobreza, o desfecho infeliz do casamento, a dependência em relação a um homem como Ucker, que aparentemente não tinha muita compaixão dentro de si. 

Tudo pesava em seus ombros.

Mas muito pior do que problemas de dinheiro, Ucker ou Lyle, era o sentimento de que estava absurdamente sozinha em um mundo imenso, onde nada lhe era familiar.

Dulce fechou os olhos sentindo a brisa do mar em seu rosto.

Havia levado anos para aprender a lidar com um mundo que dançava uma batida que nem sempre conhecia ou compreendia. Porém, aprendera a simular. Desde os nove anos dava duro para parecer que acompanhava o passo de todas as outras pessoas.

Desde aquela tarde, em 1979, quando a avó e o médico conversaram sobre sua disfunção. Que elas tentavam esconder do mundo. Entendia de decoração, culinária, etiqueta, mas não conseguia realizar uma leitura acima do nível de quarta série. Escondia os problemas por trás do charme e da sedução, por trás do rosto e do corpo. Embora hoje soubesse que era disléxica e não retardada, continuava escondendo. Ainda sentia muita vergonha.

Na sua lista de regras, era de sempre garantir que as pessoas gostassem dela e logo acima de ser uma boa anfitriã. E a determinação de se parecer exatamente como as outras pessoas. Para isso, tentava aprender duas palavras novas a cada semana e se lembrar delas. Para isso assistia filmes clássicos, históricos e da literatura.

Quem podia entender o que ela passava tentando não parecer uma idiota na frente das pessoas, era um sentimento muito íntimo dela que ela escondia muito bem.

Dulce saiu de seus pensamentos e estendeu a mão para uma anêmona-do-mar e tocou-a de leve. Mas os tentáculos grudentos fecharam-se nos seus dedos. Assustada, Dulce pulou para trás. Uma segunda onda atingiu-lhe as coxas, os joelhos dobraram e ela caiu de costas na arrebentação. E outra onda levou-a para longe e revirou-a mais algumas vezes, empurrando Dulce para areia. O mar gelado batia em seu peito, deixando Dulce sem fôlego. A água salgada e a areia encheram-lhe a boca, enquanto ela batia as pernas e lutava para manter a cabeça acima da superfície. Um pedaço de alga marinha enrolou em seu pescoço e mais uma vez, uma onda, agora ainda maior, pegou-a pelas costas, jogando-a na beirada da água como um torpedo. Com a ajuda de uma mão, ficou de pé e andou com dificuldade até a praia. 

Quando chegou à segurança da areia, caiu sobre as mãos e os joelhos e respirou fundo várias vezes. Cuspiu a areia da boca, agarrou a alga do pescoço e jogou-a para o lado.

No popular, falando a língua do povo do sul TOMOU UM CALDO daqueles.

Olhou para a casa de Ucker na esperança de que seu micão tivesse passado despercebido.

Não passou.

Com óculos escuros escondendo os olhos, Ucker caminhava em sua direção, extremamente charmoso, delicioso o suficiente para que ela pensasse em lambê-lo, subindo de um lado e descendo pelo outro, mas com aquele mico, Dulce queria rastejar para o mar e morrer.

Uma sonora gargalhada alcançou seus ouvidos. Em um instante, Dulce esqueceu o frio, a areia e a alga assassina. Esqueceu a própria aparência e quis morrer. Uma raiva crescente correu por suas veias e acionou uma fúria quase descontrolada. Trabalhara a vida inteira para evitar o rídiculo e não havia nada que odiasse mais do que ter alguém rindo dela,

Mesmo que ele tivesse uma forma gostosa, deliciosa e que dava vontade de arrancar suas roupas.