Fanfic: A Maldição de Perséfone | Tema: Percy Jackson Abandono
Na verdade, foi no dia seguinte, quando conheci Nico di Angelo, e reencontrei Annabeth.
Os dois chegaram ao acampamento lá pelo meio dia. Annabeth tinha perdido o ônibus no dia anterior, e, pelo que eu entendi, Nico tinha dado uma carona a ela.
Na verdade, eu não entendi muito bem isso, não. Quer dizer, Nico devia ter uns doze anos, e eu não vi nenhum carro por lá.
De qualquer forma, eles estavam ali e Percy nos apresentou.
— Legal ver você de novo, Pierce. — Disse Annabeth, sorrindo, seu cabelo loiro e ondulado emoldurando seu rosto como a aura de um anjo – daqueles lindos e fabulosos que a gente vê em algumas pinturas e estátuas de catedrais.
Ela tinha mudado bastante. Eu me lembrava de uma garota branquela e franzina, meio mal-encarada, pronta para largar menininhas no inferno só pra não se meter em encrenca em dobro com o deus dos mortos.
Curiosamente, a Annabeth que eu via ali não parecia ser capaz de abandonar um animalzinho ferido na beira da estrada, quanto mais uma garota no inferno.
Ela e Percy não se grudaram na nossa frente, – como certas pessoas costumam fazer, para o desconforto geral da nação – mas deu pra perceber pela química entre os dois que deviam ser mais que amigos.
Nico foi outro achado interessante. Ele imediatamente me lembrou de alguém, embora eu não tenha conseguido ligar os pontos na mesma hora. Com cabelos pretos desgrenhados, olhos azuis profundos como o céu noturno de uma noite sem estrelas, ombros curvados pra frente e olheiras escuras e cheias do tamanho de duas ameixas, Nico parecia um homem velho e sobrecarregado.
Mas era mais fofo que um bonequinho de biscuit – eu só queria enfeitar um bolo de casamento com ele, sei lá.
Sua reação quando fui cumprimentá-lo foi bastante estranha, e, reflita, eu nem mencionei o negócio do biscuit.
Ele olhou pra mim uma única vez, baixou os olhos pro chão e se ocupou de ficar completamente vermelho e mudo pelo resto do tempo. Quando tentei falar com ele, o menino quase deu um pulo no lugar, murmurou alguma coisa incompreensível para seus sapatos e saiu andando na direção oposta, de cabeça baixa.
— Hum... O que foi que eu fiz? — Perguntei a Percy e Annabeth.
Os dois me olharam com um sorrisinho nos olhos, como se soubessem exatamente qual era a razão daquilo tudo.
— Nada, ele é assim mesmo. — Disse Annabeth.
E largou o assunto ali.
Eu só fui entender o que fora aquilo mais tarde, quando Nico se sentou sozinho na mesa treze. A mesa do chalé de Hades.
Isso não me fez gostar menos do garoto, mas me deixou pensando “hããããã, então você também não cumpriu seu juramento sobre o rio Styx”.
Algo que, pra mim, sinceramente, não fazia a menor diferença.
Naquela noite, descobri que Annabeth também fazia parte da panelinha “vamos esconder a profecia da Pierce”.
Eu a pressionei um pouco, imaginando se seria mais fácil de dobrar, mas a garota logo puxou a sardinha pra outro lado e, quando eu fui ver, ela estava me contando uma história de duas horas sobre a “Grande Profecia Anterior”, que começou com Hades mandando um, desculpe, o Minotauro sequestrar a mãe de Percy, e terminou, de alguma forma, também com Hades, só que dessa vez aparecendo pra salvar o dia e todos os deuses do Olimpo, que ficaram encurralados pelas tropas de Cronos no Empire State Building.
— Então, sabe, ele até que não é tão mau depois de tudo. — Foi a conclusão a qual ela chegou.
— Mmm... — Eu murmurei, sugando meu Tropical Banana pelo canudinho.
O dia seguinte foi dia de capturar a bandeira.
Durante o verão, o jogo era realizado a toda quinta-feira, mas, no meio do ano letivo, só aos finais de semana o acampamento ficava cheio o bastante para haver esse tipo de evento.
Aquele jogo era um pouco parecido com um que a gente tinha em World of Warcraft, “Capture the Flag” em Warsong Gulch. Cada time tinha uma bandeira escondida em algum lugar da floresta, que o outro time tinha que pegar e carregar para sua própria base, antes que o time adversário fizesse o mesmo.
A semelhança que eu quero apontar entre ele e o battleground de WoW – que a maioria desses jogos de capture the flag em acampamentos não tinha – era que você podia levar um monte de armas letais pro meio de campo, e devia se preocupar em não morrer até que um dos lados vencesse.
Bem, tecnicamente, pelas regras, você não deveria poder matar, ou mutilar seu oponente, mas, caso o fizesse, sua punição seria ir pra cama sem sobremesa – por uma semana!
Fair enough, right?
Mas não era só com os outros campistas que você tinha que se preocupar. Não. Quíron summonava monstros na floresta para deixar as apostas ainda mais interessantes.
Então, você pode ter certeza, eu fiquei bem feliz quando Dionísio me disse que eu não ia poder participar daquilo.
Ia desequilibrar os lados, ele disse.
Como se eu fosse, tipo, super-hiper-poderosa e tal.
Mas aí Quíron me convidou para ser juíza.
Foi legal, porque ele disse que eu ia poder montar nas costas dele.
Mas foi estranho, porque, na verdade... Ele quis dizer que eu ia ter que montar nas costas dele. Pra minha própria segurança, ou alguma coisa assim.
Enfim.
Que razões eu tinha para recusar?
Os chalés se dividiram em dois times da seguinte forma: de um lado, o time vermelho, com Ares, Afrodite, Hermes, Hipnos, Nike, Tique e Hécate; e do outro, o time azul, com Deméter, Atena, Apolo, Hefesto, Íris, Hebe, e Dionísio.
Nico escolheu o primeiro grupo, Percy escolheu o segundo.
Ah, e uma coisa que eu me esqueci de dizer: Annabeth era do chalé seis, o chalé de Atena, e Julian era do chalé quinze, dos filhos de Hipnos, o deus do sono – curioso, não? Como eu não percebi os sinais?
Então, você já pode chutar pra quem eu estava torcendo?
Vou dar uma dica...
Pensando bem, não vou dar, não.
O jogo começou devagar, os dois lados ainda deviam estar montando seu banco de estratégias, então Quíron me levou para dar um passeio pela floresta.
Prometo que serei sucinta a respeito disso.
Cavalgar cavalos os alados: okay.
Cavalos marinhos: okay.
Centauros: not so much. Eu não conseguia me livrar da ideia de que ele estivesse completamente pelado da cintura pra baixo, e fiquei morrendo de vergonha de me segurar nele por causa isso.
Quíron só me deixou descer quando encontramos a bandeira do time vermelho. Ele disse que as chances dos combates começarem ali eram bem grandes, já que o time azul sempre escondia melhor a sua bandeira, e então se deitou na grama à margem do rio e nós ficamos espreitando.
Eu não tinha tido muitas chances de falar com ele de novo naqueles dias. Quíron estava sempre ocupado: quando não estava fora em alguma missão, estava exercendo sua boa influência sobre jovens ligeiramente perturbados e hiperativos, ou cuidando dos feridos na enfermaria.
Eu ainda não tinha certeza se gostava dele ou não, mas não achava sua companhia desagradável.
Contando que eu não precisasse cavalgá-lo.
De qualquer forma, ele era gentil com todo mundo, e gostava muito dos garotos e do que fazia – é impossível odiar alguém assim, mesmo quando essa pessoa não deixa você voltar pra casa.
— Ah, eu já ia me esquecendo. — Disse ele.
Quíron abriu sua bolsa tira-colo de couro e de lá saiu...
Uma bolsinha de couro menor.
— Isso é seu.
— Ah, obrigada. — Falei.
E fiquei segurando a bolsinha.
— Na verdade, o que é seu está dentro.
— Ah...
Abri a bolsa.
Dentro encontrei uma pulseira de prata – ou, pelo menos, foi isso que eu pensei que fosse, mas depois me disseram que o metal era uma liga de adamantium (é, é, a coisa lá do Wolverine) – com um conjuntinho de pingentes coloridos muito bem feitinhos: um parecia um bastão com asas; o outro era claramente uma harpa dourada em miniatura com detalhes incríveis e fios de ouro; os dois últimos pareciam uma foice e um escudo.
— Quando você diz que isso é meu, — falei — você quer dizer que isso já era meu, ou você está me dando agora?
— Isso é seu desde tempos muito antigos, Pierce. — Explicou Quíron. — Foram presentes de seus pretendentes à sua mãe, Deméter, por sua mão em casamento. — E então citou, como se estivesse tirando aquilo de um livro: — "Hermes entregou sua vara para enfeitar seu quarto, Apolo criou a melodiosa harpa, para seus ouvidos, e Ares desfez-se de seu próprio escudo em seu favor. Todavia, a mãe zelosa recusou-a a todos, mas entregou-lhe os objetos como presentes em seu casamento, que Hefesto reunira em um colar de muitas cores." A foice foi acrescentada séculos mais tarde, quando você se tornou mortal. Presente de sua mãe.
— Isso não é uma pulseira? — Eu perguntei bastante surpresa.
— Bem, imagino que você possa usá-la como uma agora... — Respondeu ele meio pensativo.
Eu já tinha ouvido falar daquela história. Aparentemente, todos os irmãos de Perséfone, ou, hum, meus irmãos, eram louquinhos de pedra, e queriam se casar comigo – por mais doentio que isso possa parecer.
Mas o que me escandalizou de verdade foi o tamanho daquele colar. Quer dizer, quantos anos eu deveria ter pra usar aquilo no meu pescoço? Dez? Onze?
Misericórdia, como diria tia Rose.
— Okay. — Falei.
Eu coloquei o negócio no bolso de trás da minha calça.
E torci pra ele cair no chão quando eu estivesse andando.
— Eu sei que isso deve ser difícil pra você, Pierce, mas você precisa entender que está numa posição delicada aqui. Seus pais ainda estão decidindo se devem ou não envolvê-la. Se for confirmado ser um assunto relativo aos deuses, como mortal, você não deverá participar, mas, caso seja um assunto relativo aos mortais, então sim, você poderá ter uma participação, embora indireta. Seja paciente. Em breve tudo será esclarecido.
— Hm. Certo... E ter uma participação indireta quer dizer que...?
— Que você vai poder ajudar dentro dos limites estabelecidos por seu pai.
Ajudar?
Rá!
Àquela altura, eu já nem estava mais pensando muito em ajudar ninguém.
Na verdade, eu estava começando a considerar a ideia de dar uma de Kratos... E sair barbarizando tudo.
— Mmm. E esses limites têm alguma coisa a ver com “os termos do trato” entre Zeus e mim, que você estava dizendo outro dia?
— Bem, sim.
— Hm. E têm alguma coisa a ver com o motivo pelo qual eu vim parar aqui em primeiro lugar?
— Também.
— Conte-me mais.
Ele olhou pra mim, provavelmente considerando se era a hora certa para tocar naquele assunto comigo.
Eu acredito que sua resposta tenha sido “não”, mas ele resolveu me contar mesmo assim.
Pelo que me disse, Zeus tirou minha imortalidade porque eu teria sido “muito condescendente com os mortais” – fazendo pérolas para que pudessem sair do Submundo, usando meus poderes e influência para alterar o destino da humanidade, interferindo diretamente no curso da história em favor dos homens – o que, segundo suas leis muito justas, não era permitido.
Em outras palavras: eu estava de castigo por praticar boas ações demais.
O que era, de fato, muito razoável. Afinal, pra alguém que consegue morrer por causa de suor excessivo, perder a imortalidade por fazer boas ações excessivas era fácil.
Os termos da minha “condicional”, como continuou me dizendo, na verdade eram bem simples: eu tinha que passar uma vida humana inteira sem ajudar mortais de qualquer maneira que não fosse da única forma permitida – só poderia dar a eles conselhos e meios para alcançarem seus próprios objetivos, e nada mais.
Quando Quíron me disse aquilo, eu logo pensei: “Já me ferrei então. Percy, Grover e Annabeth usaram aquelas pérolas lá pra sair do inferno”.
Mas decidi simplesmente não apontar esse fato.
— E lá vêm eles. — Anunciou Quíron, colocando-se de pé.
Um grupo do time azul tinha conseguido pegar a bandeira vermelha, e estava descendo o rio.
Pensando bem, acho que o objetivo do jogo era descer o rio com a bandeira, não levá-la para a própria base.
É. É isso mesmo.
Então, o time azul estava descendo o rio.
— Venha, Pierce, o jogo está prestes a ficar interessante. — Disse Quíron, animadíssimo, içando-me para o seu lombo de cavalo.
Se interessante fosse sinônimo de violento e selvagem, o senhor Quíron deveria estar coberto de razão.
Mal o time azul tinha dado dois passos com a bandeira, e uns trinta malucos do chalé de Ares voaram em cima deles.
Quase tão imediatamente, alguns garotos dos chalés de Hefesto e Apolo chegaram trazendo reforços, e a pancadaria começou.
Eu fiquei horrorizada! Eu esperava que o pessoal fosse lutar daquele jeito! Tinha gente se machucando de verdade...
— Ela pode fazer aquilo? — Eu arquejei, quase sem respirar, depois de ver Clarisse cravar sua lança na cocha de um menino mais novo do que ela.
— O que? Ah, aquilo? É claro que sim. Amanhã o garoto já vai estar novinho em folha, você vai ver.
Como ele tinha tanta certeza disso, eu não sei.
Mas aí Percy apareceu.
Ele trouxe o rompimento da represa com ele.
Daquele fiapo miserável de água do riacho surgiu um aguaceiro fenomenal, foi um espetáculo, lavou o pessoal até a alma – e, se Quíron não tivesse saído de lá rapidinho, nós dois também teríamos tomado um belo banho.
Só depois disso é que eu fiquei pensando: se Percy é filho do deus dos mares, por que raios ele pode controlar a água dos rios também?
Não que eu tivesse alguma coisa contra.
Longe disso.
Só não me parecia justo que ele pudesse fazer aquilo. Quer dizer, isso dava ao seu time uma vantagem desleal no jogo.
Foi o que eu pensei, até ver Nico jogando.
Nico era o único que não trazia consigo nenhuma arma, e eu fiquei apavorada ao ver os filhos de Hefesto avançarem contra ele com maças e machadinhas.
Só então consegui dar algum crédito à ideia de que aquele menino fosse filho de John.
Ele não se mexeu um centímetro, mas o tabuleiro virou à sua volta.
Eu vi alguns garotos serem atingidos por pedras que ninguém jogou; outros desapareceram ao entrarem numa nuvem escura que apareceu ali do nada; e ainda alguns simplesmente jogaram suas armas aos pés dele e saíram correndo e gritando como um bando de menininhas.
Quando chegou a vez de Percy, eu pensei apenas: sh*t just got real.
— Você tinha razão, — disse Nico, torcendo a boca num meio sorriso — esse jogo é bem divertido.
Percy sorriu de volta.
— Eu não falei que você ia gostar?
Foi como assistir a uma luta de Pokémon.
Percy controlava a água, mas Nico controlava a terra e as sombras. Ele podia desaparecer à penumbra de uma árvore e reaparecer vários metros à frente, podia fazer as pedras levitarem e provocar terremotos.
Logo, todos os campistas tinham se reunido em volta para olhar, e o combate continuava esquentando.
Até que, então, uma enorme cratera se abriu no meio do rio, e de lá saiu a maior serpente que já foi vista
Ela era gigantesca. Uma anaconda seria um filhotinho perto dela, eu não estou brincando. Aquela cobra era tão grande que poderia me engolir inteira, sem nem deslocar a mandíbula.
E, bem provavelmente, era isso que ela queria fazer.
A reação de Quíron logo me avisou que aquele monstro, especificamente, não fora convidado para a noite do pijama, e, quando sua cabeça triangular e sibilante voltou-se na nossa direção, ele sacou uma flecha da aljava pendurada em seu dorso, e mirou bem no meio dos olhos amarelos da criatura.
— Não! — Gritei instintivamente. Eu nem sei por que gritei "não", quer dizer, era óbvio que a cobra ia nos matar se Quíron não fizesse nada, mas ele hesitou, o que deu à jararaca tempo suficiente para dar o bote.
E ela teria abocanhado nós dois na maior tranquilidade, se Quíron não tivesse se levantado nas patas traseiras para segurá-la. Ele empurrou o focinho dela com as próprias mãos! O que foi a coisa mais legal que eu já vi um senhorzinho fazer!
E teria sido mais legal ainda se eu não tivesse caído das costas dele nesse exato momento.
Os campistas não ficaram parados só olhando também, não, é claro. Depois de um breve momento de choque, todos partiram para o ataque, demonstrando com muito empenho pra que serviam todos os seus anos de treinamento e trabalho duro: os filhos de Ares lançaram suas lanças, os filhos de Apolo atiraram suas flechas, os filhos de Hefesto jogaram martelos e machados contra sua couraça, e cada criança que carregasse uma espada golpeou a serpente como se não houvesse amanhã.
Por fim, o chão se abriu novamente, e a monstruosidade foi tragada para dentro tão de repente quanto havia vindo...
Me levando embora com ela.
Autor(a): ookamipuppy
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
Prévia do próximo capítulo
... a tal da "Grande Profecia". Eu acordei num sofá de couro. Quer dizer, foi o que eu pensei que fosse, até lembrar que não se fazem sofás com couro de cobra. Bem, assim espero. Então eu olhei em volta, tentando identificar o local, mas tudo que consegui ver foi um abismo profundo, do qual subiam rajadas quentes de vapor ...
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