Fanfic: Sinas de Sangue | Tema: Vampiros
O AVIÃO COMEÇARA A DESCER E EU SENTI as pontas dos meus dedos formigarem. Algo se agitava em meu estômago e eu não sabia se era por causas psicológicas ou biológicas - talvez ambas. O nervosismo não deixara que eu comesse nada. Meus dedos batucavam na poltrona do avião e a voz da aeromoça falou, primeiro em inglês, depois em italiano, que estávamos descendo em Roma. O tempo, a partir dali, ficara indistinto - poderia ter passado tão lentamente como gelo derretendo na sombra no inverno ou tão rápido quanto um piscar de olhos.
Meus ouvidos ainda se concentravam nas músicas que tocavam em meu MP4, mas meus pensamentos estavam longe, imaginando e tecendo futuros. Ainda bem que tia Milena dera-me calmantes. Tinha medo só de pensar no que poderia acontecer se a minha ansiedade estivesse à flor da pele. Desci do avião, com passos lentos causados pelo torpor dos remédios e pelo próprio tédio da viagem. Meus tênis estavam meio folgados nos pés, como se estivessem desamarrados, mas eu não estava ligando muito.
Pelo o que soubera do Brasil até a Itália o fuso horário era muito diferente e não seria de se estranhar se eu estivesse com sono. E, olhando para a janela com o seu sol de 10 da manhã, realmente o cansaço estava levando a melhor. Estava fatigada, dormindo tarde demais para qualquer uma como eu... Algo se agitou dentro do meu estômago novamente e, quando olhei em volta no aeroporto, vi uma mulher, com aparentemente trinta e cinco anos, segurando uma placa onde estava escrito: “Clarice Rocha Moraes”.
Peguei minha bolsa e bocejei, indo em direção a ela. Não me lembrava direito de suas feições, por causa do sono, mas tinha uma vaga impressão de suas palavras. Ao que parecia, ela me levaria a um hotel para que eu dormisse e depois, de noite, viajaríamos até o resto do caminho. Seu nome era... Raphaela? Rachel? Ai, sabia que era algo assim; então só acenei com a cabeça, grogue, e fui deixando-a me levar até o carro. Ali mesmo eu apaguei, indo para uma terra que só existia dentro da minha mente.
Alguém balançava o meu ombro. Resmunguei algo incoerente. Por que tia Milena sempre me acordava no momento que eu mais queria continuar a dormir?
– Vamos Srta. Moraes – acordei imediatamente; essa não era a voz de tia Milena. Não era nem ao menos em português, era latim. Então a viagem voltara à minha mente, causando-me uma repentina dor de cabeça. Toquei minha testa. – Você está bem?
Focalizei melhor a mulher que estava ao meu lado. Ela era branca, pálida, com olhos... alaranjados?! E as pequenas presas na boca. Seus cabelos eram pretos e anelados e os traços arredondados, mas o mais interessante eram suas orelhas, que eram pontudas. Deveria ter em torno de... uns trinta anos? Repassei a manhã, mas tinha certeza que não era a tutela do aeroporto.
– Quem é você? – Minha voz era sonolenta. Reprimi um bocejo.
– Sou Paola MacEgann, muito prazer.
– Cadê a... – parei, tentando lembrar o nome exato da mulher.
– A Sra. Reymonds? – Ela perguntou. Acenei, confirmando. – Ah! Ela é uma Consolari. Não troca o dia pela noite.
– Eu sei o que são Consolari. – Revirei os olhos. Eu tinha que ter tido alguma educação em casa, correto? Espreguicei, olhando para o relógio. Dez da noite.
– Você já troca os horários? – Sra. MacEgann perguntou interessada, enquanto eu escolhia uma roupa para usar.
– Faz três meses que fiz 15 anos, mas só ando trocando os horários nas últimas duas semanas. Ultimamente durmo lá para as três da manhã e acordo ao meio-dia. Minha tia está sofrendo para me acompanhar... mas não é tão ruim quanto quando eu era criança, não é mesmo?
– Sua tia é a PraetoriaeNobilis Milena Rocha Andrade? – Acenei com a cabeça.
– Minha mãe é a...
– Sim, sim. Joanne Rocha Moraes. PraetoriaePrimogenitus... seu pai, com certeza, deve ser o Marcus... PraetoriaeNobilis também. Você se parece muito com ela... não tem nada dele.
Dei risada, enquanto ia ao banheiro para me lavar.
– Só espero não ter gastado 15 anos da minha vida por nada.
– Ah! Sempre recompensa.
Acenei. Espero, pensei comigo mesma.
Sra. MacEgann estacionou na entrada de um vilarejo, cercado por muros muito altos. Na portaria havia câmeras e todo o tipo de vigilância possível. Revirei os olhos perante a fachada – se algo atacasse ali, podia ter certeza que não seria toda essa vigilância que deteria os invasores.
– Quando entrarmos – disse Sra. MacEgann – eu irei acompanhá-la até a Sala de Testes... mesmo isso sendo desnecessário. – Seus olhos abaixaram para o colar em meu pescoço. Ele era uma Immortalis, então muito raramente eu o retirava do pescoço. Eu conhecia a história desses colares.
Quando um Praetoriae Primogenitus tinha o seu primeiro filho, o seu colar também “dava a luz” um colar para o bebê. Esses colares garantiam a imortalidade dos Primogenitus por 120, que geralmente lideravam sua Família em pares, um homem e uma mulher. E sempre era assim: a líder mulher tinha como primogênita uma menina e o líder homem tinha como primogênito um menino.
Mas todos, todos os vampiros eram treinados ali, na Conspiração dos Sete, fossem ele Praetoriae, Centurio ou Consolari. Olhei ao redor, a floresta densa. Nem sabia que poderiam ter florestas assim aqui na Itália, mas sabia que, se não existisse, a Conspiração dava um jeito de criá-las. Passamos pelos portões e, lá dentro, meus olhos se deliciaram com a vista.
Parecia uma mini cidade. Realmente um vilarejo. No centro havia uma pequena praça, perfeitamente redonda, que era dividida em sete pedaços iguais. Essa divisão era perceptível por causa da grama, pintada de sete cores diferentes: azul, amarelo, verde, vermelho, preto, roxo e laranja. As cores das famílias... pensei comigo mesma. À volta da praça existiam sete sobrados, exatamente iguais, pintados conforme a parte da praça que lhe cabia.
Esse era o único local perfeitamente organizado, porque, depois dos sobrados, as construções eram um caos. Deveria ter algumas dezenas de estabelecimentos, com variadas funções.
– Não tente entender a cidade em si – murmurou Sra. MacEgann, andando devagar com o carro até um grande galpão ao lado da portaria. Ali havia vários carros. – É um caos. Os Anciões anteriores não se importavam em organizar e deu nessa algazarra toda. O que você deve saber é que, depois que se formam, principalmente os Centurio e os Praetoriae ficam aqui. Alguns Consolari também, mas a maioria vai para as Tribos das Famílias, administram lá. É tudo questão de aptidões e necessidades. A praça central é chamada de Sétima Roda e cada um dos sobrados abriga os estudantes. A escola fica ali.
Ela apontou para um prédio próximo do sobrado da cor amarela. Parecia uma faculdade, então não seria difícil eu identificá-lo por ali.
– Do lado dele tem o refeitório, com entrada proibida para qualquer um que não seja estudante. Todo o resto – ela apontou para a algazarra de tijolos – são casas de Anciões, ajudantes, líderes ou então comércios. Com o tempo você vai memorizando onde ficam as coisas.
Acenei, enquanto começávamos a sair da garagem enorme.
– O Prédio das Reuniões fica bem ali – ela apontou para um prédio de uns sete andares, atrás do sobrado azul. – Os sobrados estão em ordem de acordo com a idade das famílias. Aqua, Aer, Terra, Ignis, Niger Foramen, Anima e Corpus. Azul, Amarelo, Verde, Vermelho, Preto, Roxo e Laranja. Praticamente tudo nesse lugar vai estar nessa ordem.
Balancei a cabeça e caminhamos em direção ao Prédio das Reuniões, que era atrás do sobrado da família Aqua. O saguão parecia daqueles escritórios de advocacia, todo polido, prático e limpo. Não havia muitas pessoas, só duas recepcionistas. Ao fundo havia três elevadores. Olhei para o relógio no meu pulso: 04:48hs.
– Onde estão todos? – Perguntei a Sra. MacEgann enquanto nos aproximávamos do balcão.
– Hoje é sábado. As atividades aqui só vão até as duas da manhã. – Ela explicou. – A maioria dos que já passaram pela Hunt Transitum e Consolari vão para a cidade, viajar. Como segunda-feira irá começar as aulas e a maioria dos novatos chega hoje e amanhã, a Sala de Reconhecimento estará disponível por todas às 48 horas.
Uma das garotas do balcão se virou para nós.
– Olá Sra. MacEgann – Ela falou, direcionando-se para a Sra. MacEgann.
– Olá Srta. Lewis. Nós vamos para a Sala de Reconhecimento. Sabe quem está lá?
A Srta. Lewis analisou algo em seu computador.
– O Sr. Heilung – Disse. Sra. MacEgann estremeceu, suspirando logo após.
– Okay, obrigada – e me direcionou para um dos elevadores. – O Sr. Heilung é horrível – murmurou consigo mesma.
– De que família você é, Sra. MacEgann? – Perguntei. Não conseguia identificá-la.
– Sou a líder dos Centurio da Septimus Familia Corpus. Todos os líderes dos Centurio e dos Consolari são divididos. Cada família tem seus líderes, homem e mulher, que são escolhidos por votação nessas duas classes. Os Consolari são liderados por nós, Centurio, que somos controlados pelos líderes dos Praetoriae Nobilis. Depois vêm os Praetoriae Primogenitus, que lideram todos. São os Anciões das famílias. É bem simples.
– Por isso que é um prédio?
Ela acenou.
– Cada andar é uma família. As mais velhas em cima, as mais novas embaixo. Devemos ter, em cada andar, umas dez salas... isso daria 70 nos andares, mais o saguão aqui no térreo. No subsolo também tem salas, e é para lá que vamos.
Nisso o elevador chegou; entramos e ela apertou o botão -1. Não havia ninguém conosco. Ela ficou quieta e, em pouquíssimo tempo, o elevador abriu em nosso andar. Era em círculo, havendo sete portas. Lembrei-me de tia Milena dizendo: “Sete é um número sagrado minha querida. Para nós, vampiros, sete é mágico. Tudo o que você ver na Conspiração terá a ver com esse número.” Realmente ela estava certa.
– As salas aqui embaixo são emergenciais. Só uma é usada frequentemente: a Sala de Reconhecimento. Você deve entrar sozinha lá. Heiz Heilung estará lá, te esperando. Desejo-lhe sorte – você vai precisar.
Acenei, o nervosismo novamente tomando conta de mim.
Empurrei a primeira porta do meu lado esquerdo e entrei. Havia uma grande mesa de madeira ali. Não havia mais nada além dessa mesa e uma cadeira, aonde um homem com aparentemente 25 anos se localizava. Seus cabelos eram loiros prateados, cortados à escovinha. A face muito pálida e as orelhas pontudas. Além disso, seus olhos vermelhos vivo pareciam soltar faíscas a cada movimento. Postura rígida e as presas branquíssimas faziam-no parece um oficial do exército, contendo uma raiva homicida dentro de si.
Heiz Heilung – o Quarto Ancião.
– Sente-se. – Sua voz era tão dura quanto pedra. Estava vestindo uma camiseta branca que colava em seu peito musculoso. Seu colar pendia no pescoço, denunciando sua posição, além da longa capa, vermelha como sangue. Sentei-me na cadeira à sua frente. – Qual o seu nome?
– Clarice Rocha Moraes – disse pausadamente. Tudo bem que os vampiros eram meio distantes e formais quando não conheciam direito com quem estavam falando, mas aquele senhor estava muito além disso. Ele levantou as sobrancelhas e seus olhos abaixaram-se para meu colar.
– A primogênita da Sra. Moraes, hein? Pois bem, pelas normas ainda assim tenho que Reconhecê-la como aos outros.
Abriu uma gaveta e tirou seis objetos dali: uma pedra, um copo, uma vela, um cata-vento, um espelho e massinha de modelar. Franzi a testa. Massinha de modelar?
– Feche os olhos – disse. Fechei minhas pálpebras e tudo ficou escuro. – Vou colocar em suas mãos os seis objetos. Você deve me falar o que parecer quente.
Eu sabia que era assim. Tia Milena até dissera que o nosso elemento esquentava a pedra. Ele colocou o primeiro objeto. Sabia que era a pedra pela sua consistência. Minha mão ferveu e eu sorri. Bingo!
Ele tirou a pedra de minhas mãos e colocou algo bem fininho e eu soube que era o cabo do cata-vento. Por incrível que pareça minha mão também queimou com aquilo. Uni as sobrancelhas, mas não falei nada. O terceiro objeto era o copo... que parecia lava de tão quente. Os outros três objetos também pareciam fogo em minhas mãos.
– Abra os olhos – ele disse ao retirar o espelho de minha mão. Abri-os e encolhi os ombros. – Qual esquentou?
Pensei em lhe falar que todos, mas algo me refreou.
– O primeiro, senhor – sabia que era isso que ele queria ouvir. Sua expressão continuava vazia.
– Bem, bem, bem... – deu um suspiro. – Bem-vinda à Tertus Familia Terra. O seu uniforme será providenciado até segunda-feira, as 6:00hs. Procure os Guardiões de sua família – eles irão lhe ensinar tudo o que deve saber. O seu material será lhe entregue junto com o uniforme que deverá usar sempre que for às aulas.
Ele tirou folheto.
– Ai terá todas as informações necessárias. Pode se retirar senhorita Clarice Rocha Moraes, Praetoriae Primogenitus da Tertus Familia Terra.
Autor(a): hnribeiro
Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).
Prévia do próximo capítulo
EMPURREI A OITAVA PORTA À ESQUERDA DO corredor, que era feito de rocha escura, que tinha uma plaquinha “C. R. Moraes”. O quarto que era meu. Minhas malas estavam aos pés da cama, em cima do baú. A cama era feita de pedra sólida, nascida direto do chão de granito. Na cabeceira nascia uma árvore de tronco grosso, colada na ...
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