Fanfic: Dívida de Honra - AyA (Adaptada) FINALIZADA | Tema: AyA

Sonhou com a Escócia, com um dia quente e ensolarado, num céu sem nuvens. Eles estavam
passeando pelos pântanos, longe da casa, onde minúsculas flores forravam o solo. De lá
podiam ver o ponto onde as águas do loch se misturavam às do mar. Estavam os dois sozinhos,
o ar era parado e morno. Mas durante todo aquele verão, eles sempre estavam a sós, mesmo
quando os outros estavam por perto.
Ela não o via desde aquelas férias. Ele era então um rapaz, mas agora era um homem. Tinha
saído de Oxford, naquele ano, e fora buscar Mia e a ela no velho carro, na estação.
Estava muito preocupada com Mia e com as bagagens, e nervosa, porque sabia que ele
estava à espera; sabia também que ele odiava sua família, apesar de não entender por quê. Ela
se abaixou para levantar a mala, ao mesmo tempo que ele, que cobriu a mão dela com a sua.
Ela levantou os olhos, um pouco ofuscada pelo sol, seus olhares se cruzaram e... naquele
instante ela soube!
Nenhum dos dois disse nada especial, só as banalidades habituais. Naquele mesmo dia, se
encontraram de novo, no hall frio e sombrio da velha casa.
— Vamos dar uma volta — Alfonso disse a ela, como se ambos tivessem combinado aquele
encontro. Saíram juntos e algo desabrochou. O coração de Anahí estava aquecido e leve,
cheio, de uma gloriosa certeza. Naquele dia, teve a sensação de que a vida tinha começado
para ela. Seu futuro era Alfonso. Não tinha dúvidas, não tinha incertezas. Via-se novamente
deitada na grama, que os carneiros tinham cortado rente. Alfonso acariciava seus cabelos.
— Seus cabelos cheiram a urzes... — ele disse. Foi na última tarde em que foram felizes.
— Não teve certeza de quando acordou. O sonho tinha sido tão real, tão forte, que ainda
estava com ela, na escuridão daquele quarto desconhecido. A princípio não se lembrou de
onde estava, mas aos poucos a memória voltou, fazendo a felicidade desaparecer
rapidamente, como desaparece a areia que escorre entre os dedos.
Espreguiçou-se na cama espaçosa. O quarto estava escuro, mas pelas frestas da janela viu que
já era dia. Continuou ali deitada, a mente subitamente alerta, procurando afastar as memórias
do passado. Não queria se lembrar, fazia muito tempo e era doloroso demais. E agora estou
casada com ele, pensou, sentindo a aliança pesar em seu dedo.
Tinha se casado com uma recordação, pensou, assustada. Houvera um tempo em que Alfonso
sabia o que ela pensava, sem necessidade de palavras. O que tinha havido entre eles? O
primeiro amor.., atração de adolescência? Não. Ela havia amado Alfonso. Mas ele era um outro
homem agora; frio, distante, imprevisível. Quando olhava em seus olhos, só via ódio. Ou uma
sensualidade tão feroz, tão além dos limites da habitual, que a assustava.
Amassou entre os dedos o lençol de linho e se virou na cama. Não adiantava ficar lembrando o
passado, nem deixar que as coisas acontecessem fora de seu controle, como na noite passada;
e também de nada adiantaria se tornar amarga e desconfiada. Os dois estavam ali e Veneza
era linda. Uma onda de otimismo a invadiu. Ia desfrutar daquele lugar. A cidade a esperava lá
fora e uma enorme esperança nasceu em seu coração.
Levantou-se e correu para as janelas, abrindo as cortinas. A manhã estava rosada, o sol ainda
coberto por nuvens leves. A imponente basílica de Santa Maria se erguia difusa no meio da
neblina da manhã. Não se ouvia nenhum ruído na saleta ao lado.