Fanfic: As Escolhas

  Quer a receita para um dia perfeito? Ótimo, lá vai: seja acordada pelo pai da sua filha às uma da manhã, logo em seguida ouça ele dizer que não quer você por perto da menina, fique chorando até às quatro e depois pegue no sono num sofá super desconfortável. Acorde às onze com o barulho do seu celular tocando desesperadamente, porque você perdeu uma reunião importante que nem sabia que tinha e lá vai... você teve o dia perfeito.

  Eduarda ainda tinha encontrado um monte de papelada esperando por ela assim que ela chegou na sede da Maceoli. Realmente, parecia que o universo estava conspirando ao seu favor.

  - Eu soube que você chegou atrasada hoje, Duda - Manuel se sentou numa das cadeiras que ficavam de frente da grandiosa mesa de vidro de Eduarda - você sabe que não pode fazer isso.

  Eduarda suspirou e não tirou os olhos das planilhas de venda da Maceoli. Tudo que ela não merecia hoje era aquele discurso de "a maior responsabilidade de um administrador é dar o exemplo pros seus funcionários".

  - Eu sinto muito, pai - Eduarda anotou um valor da planilha na sua agenda - eu tava cansada por causa da mudança e acabei dormindo demais.

  - Como assim dormiu demais? - Manuel puxou a agenda das mãos de Eduarda - Filha, você não é uma simples funcionária dessa empresa.

  Eduarda se encostou na sua cadeira de couro e olhou diretamente pro pai. Ótimo, ela pensou, o discurso vai começar. Apertem os cintos e tente não dormir!

  - A grande responsabilidade de um administrador - Manuel apontou pra Eduarda - é servir de exemplo pros seus funcionários.

  Então, Eduarda riu. Não só riu, gargalhou. Ela estava tão cansada de todo aquele discurso de empresária perfeita. Dane-se a Eduarda Maceoli futura dona do império das cerâmicas, nesse momento ela era a Eduarda mãe. A mãe que abandonou a sua filha há quatro anos e que a perdeu de novo agora.

  Não dá pra ser pra chegar na hora, Eduarda pensou, quando você tem um coração partido.

  - Posso saber o que é tão engraçado, Eduarda? - Manuel se levantou abruptamente - Me diga o que tem de engraçado em arruinar a indústria que o seu bisavô construiu?

  Um dia ruim sempre poderia ficar pior, aparentemente.

  - Eu cheguei atrasada, Maceoli - Eduarda olhou pro relógio e viu que já tinha passado da hora do fim do expediente - Isso não é o fim do mundo e isso não significa que eu vou arruinar a empresa que o meu bisavô construiu.

  - Lógico que você não vai, Eduarda. - Manuel apoiou os braços na mesa e olhou diretamente pra filha - Eu criei você pra dirigir isso aqui quando eu não puder mais. Eu posso ter deixado você fazer a universidade no país da sua mãe, eu posso ter deixado você trabalhar em uma empresinha qualquer, mas isso acabou, entendeu, Eduarda? Agora esses caprichos acabaram e você vai aprender a lidar com as responsabilidades de ser uma Maceoli.

  Como assim agora? Não era isso que Eduarda tinha feito a vida toda: ser uma Maceoli? Agir como um maldito robô? Qual foi a última vez que ela agiu como uma mulher normal e não como uma Maceoli?

  Exatamente. Nunca.

  Caramba, ela tinha abandonado um homem incrível e uma filha perfeita porque ela simplemente não quis quebrar com o padrão de "Maceoli Perfeita". Ela tinha deixado a Helena pra trás por causa desse maldito sobrenome e ele estava dizendo que ela precisava começar a ter responsabilidade agora?

  - Pai, eu já disse que sinto muito, certo?

  - Sentir muito não é suficiente. - Manuel afroxou o nó da gravata - Aqui dentro eu sou o seu chefe e eu já vou te avisando logo que eu não costumo ser um chefe bonzinho. Ainda mais com alguém com o nosso sobrenome.

  Eduarda pegou sua bolsa dentro de um armário pequeno que ficava atrás da cadeira dela e se levantou.

  - Ótimo, seja o pior chefe do mundo, - Eduarda passou pelo pai sem nem sequer olhar pra ele - mas não aja como se o senhor pudesse me obrigar a ficar aqui caso eu não queira, porque o senhor não pode.

  Manuel olhou bestificado para a filha. Eduarda nunca tinha lhe respondido daquela maneira. Nunca.

  - Onde você pensa que está indo, mocinha? 

  - Para casa - Eduarda abriu a porta do seu escritório - já passou do horário de eu ir embora.

  - Eu não acabei de falar com você, Eduarda. Eu tenho que te passar os dados sobre a campanha publicitária da loja. Você tem uma reunião com o publicitário chefe amanhã.

  Nossa, outra reunião que ela nem sabia que existia e que, dessa vez, aconteceria num belo dia de sábado. Por que será que isso não deixava Eduarda surpresa?

  - Eu vou ficar muito feliz de receber esses dados por email.

  - Se você sair dessa empresa agora, Eduarda, as coisas vão ficar bem sérias pra você.

  - Elas vão? - Eduarda ergueu o queixo em um sinal de desafio - Por quê? Por acaso o senhor vai me demitir?

  Silêncio.

  - Sábia decisão!- Eduarda deu um meio sorriso - Você é mesmo uma administrador esperto, papai.

  Então, Eduarda saiu do escritório batendo a porta atrás de si.