Fanfics Brasil - 34 Uma Escola de Charme - Adaptada Vondy

Fanfic: Uma Escola de Charme - Adaptada Vondy | Tema: Vondy


Capítulo: 34

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Capítulo XI – Orgulho Irredutível


Junto a um timão de navio, um jovem timoneiro navega com cuidado.


Walt Whitman,
Junto a um Timão de Navio




- Fale-me sobre sua família, Dino - pediu Dulce.

Sentado diante dela à mesa do refeitório, ele ergueu o olhar da camisa que estava emendando. O tecido azul foi esquecido sobre os joelhos ossudos, e uma expressão distante anuviou-lhe os olhos negros.

Dulce não teve que se perguntar por muito tempo onde o devaneio o levara.

- Não vejo minha Delilah, nem minhas filhas, há quatro anos - comentou Dino, enfim.

Dulce sentiu cada palavra mansa, simples, como se fosse um tapa com luva de pelica. Sempre soubera que a escravidão era algo desumano, injusto, mas sua convicção originara-se da leitura de panfletos e artigos escritos por homens e mulheres cultos.

Em contraste, a presença de Dino, sua dignidade, seu quieto desespero, ilustravam a questão com brutal claridade.

- Incomoda a você falar a esse respeito? - perguntou ela.

- Tanto quanto não falar. - Ele meteu a agulha na costura da camisa, uma peça de algodão comumente usada por todos os membros da tripulação.

Quase todos, refletiu ela, movendo-se em desconforto no banco. Agora que haviam entrado nos climas do sul, não sofrera mais da gripe. Ainda assim, o espartilho a incomodava mais do que nunca. Sentir apenas o contato daquele algodão macio de encontro à pele devia ser maravilhoso.

Mesmo sabendo que a mãe precisaria de seus sais diante da simples ideia de a filha baixar seu padrão de vestimentas, Dulce abolira a crinolina e diminuíra a camada de anáguas. Sentira-se culpada fazendo aquilo, mas era bem mais confortável. A cada dia, relaxava um pouco. E sua confiança se fortalecia. Depois de tantos anos obrigando-se a tentar se encaixar nos moldes da sociedade, ficava admirada em suspeitar de repente que o problema não estava nela, mas sim nos próprios moldes.

Agora, na posição de setenta e três milhas náuticas ao norte do Equador e um pouco a oeste das Rochas de St. Paul, tomou a decisão de se livrar de mais uma anágua ou duas dali em diante.

- Então, conte-me sobre sua família, por favor - pediu a Dino, sentindo-se mesquinha por estar pensando em seu próprio desconforto.

Ele retomou a costura, a expressão em seu rosto relaxando até o ar sonhador de antes.

- Delilah e eu nos conhecemos num dos encontros de domingo. Ela era uma garota travessa, sempre a um passo de problemas. Mas ninguém se importava, porque cantava feito um rouxinol na igreja e tinha o rosto de um anjo.

Dino sorriu, e Dulce perguntou-se qual seria a sensação de ter um homem sorrindo daquela maneira por sua causa. Quando ele imaginava Delilah como um anjo, queria dizer aquilo literalmente, com a auréola e as asas, ou era o amor em seu coração que a agraciava com uma aura especial?

Ela saboreou o romântico pensamento. Como era singular ter companheiros de tripulação, ocorreu-lhe de repente. Como era fácil envolver-se nas preocupações dos demais. Achava a vida a bordo tão interessante que deixara de pensar em Poncho por dias a fio. Não acrescentara quase nada à carta que estivera elaborando para enviar-lhe, o que pretendia fazer na vez seguinte que mantivessem contato com um navio. Seus relatos a Arthur não tinham nada de incomum. A despeito de tê-la atacado pessoalmente a cada oportunidade, o comportamento de Christopher tinha sido desgostosamente exemplar.

- Então, vocês se conheceram na igreja - disse a Dino, ansiosa pelo restante da historia.

O rosto sério dele suavizou-se com a lembrança.

- O Sr. Vitor, o pai de Christopher... sempre quis que eu me casasse com uma garota de Albion, mas, depois que conheci Delilah, eu nem sequer quis ouvir falar a respeito, apesar de só poder vê-la aos domingos, já que ela morava em outro lugar.

Dulce dava-se conta do que Dino não colocara em palavras. O casamento entre escravos da mesma propriedade assegurava que haveria uma nova geração de trabalhadores. A simples ideia era tão ultrajante que mal podia compreendê-la.

- Então, vocês tiveram permissão para se casar - arriscou.

Dino esboçou um sorriso.

- Senhorita, num desses dias deve perguntar a Christopher como nos tivemos “permissão” para casar.

Ela não perguntava mais nada a Christopher. Ambos estavam obstinados quanto a permanecerem longe do caminho um do outro. E, por sua vez, não queria ser a primeira a romper o silêncio.

- Nós nos casamos quando eu tinha dezesseis anos. Delilah tinha quinze, pelo que podíamos dizer - contou Dino, continuando a costurar eficazmente.

Falava de maneira tão casual que Dulce precisou de um momento para entender que os escravos não ficavam sabendo a data de seu aniversário. Era evidente, pensou, com amargura. Um aniversário iria humanizar um escravo, e o sistema dependia de mantê-los ao nível de gado.

- Então, nasceram as meninas, primeiro Ruthie e, depois, Celeste. Ruthie é a criança mais linda em todo o mundo, sem duvida. Celeste também, eu acredito - apressou-se ele a acrescentar. - Mas eu nunca vi Celeste. Nunca vi minha garotinha.

Retirou a grande mão debaixo do tecido, uma gota de sangue brotando-lhe na ponta do dedo.

- Com licença, senhorita - disse, levantando-se. - É melhor eu ir limpar isto antes que acabe manchando a camisa.

Nunca vi minha garotinha.

As palavras pairaram sobre o refeitório com grande desolação. Depois que o viu saindo, Dulce inclinou-se sobre a mesa e pegou o trabalho dele. A costura estava perfeita, com pontos tão pequenos e regulares que mal podia vê-los. Correu a mão sobre o tecido e, de algum modo, soube que Delilah, uma mulher a quem nunca conheceria, daria a própria a alma para estar tocando aquela camisa.

Quando o Cisne Prata navegava a algumas milhas da linha do Equador, uma lua cheia e serena pairou sobre o navio. Ainda assim, as águas do Atlântico estavam um tanto agitadas, com correntes que haviam ganhado força por milhares de milhas, por toda a extensão desde a costa da África. Ale e Fayette, que haviam desfrutado alguns dias de bem-estar, tornaram a se recolher à cabine com novo acesso de enjoos.

Dulce notou Christopher de seu lugar junto ao timão, parecia estar ficando melhor do que nunca. Ela passava muito tempo no convés principal, no refeitório ou na cabine de navegação, absorvendo conhecimento e vivência de marujo como uma esponja do mar. Caminhava de maneira menos desajeitada pelo convés, tendo aprendido a se equilibrar com uma mão na amurada ou no cordame.

Ela o desconcertava, surgindo do nada e fingindo que não o via. No dia seguinte, enquanto se aproximavam da linha do Equador, ele ficou junto ao timão mais uma vez. Viu-a aproximando-se dali, obviamente alheia a sua presença.

Observou-a fazendo uma pausa para se agachar e apanhar o gato, segurando-o de encontro ao peito e acariciando-lhe o pelo. A nova confiança em seus gestos e postura fazia uma grande diferença em sua aparência. As roupas não eram tão empertigadas e refinadas quanto as que usara no salão da mansão em Beacon Hill. Os cabelos mais curtos desprendiam-se do rabo-de-cavalo cascateando em torno do pescoço e ombros.

Ainda assim, apesar de todo o desalinho, parecia, diferente. Apresentava uma nova postura e atitude. Ele deu-se conta de que preferia uma mulher de roupas simples e pés descalços que o fitava nos olhos do que uma submissa e perfeitamente arrumada que se encolhia com timidez ao menor olhar.

Estava aborrecido com o fato de ela ignorá-lo, mas, ao menos, respeitava-a.

No momento, ela baixara a guarda, parando para erguer o rosto para o céu de azul intenso e nuvens de algodão. Recentemente, passara a não usar mais chapéu, nem sombrinha, e parecia não notar o efeito que o vento e o sol produziam. A pele pálida adquirira um suave bronzeado, os cabelos castanhos exibiam reflexos dourados. Era uma aparência que, sem dúvida, a esnobe mãe dela teria denominado como a de uma plebeia.

Ainda assim, ele tinha uma outra palavra para descrevê-la.

Um guincho assustado atravessou o ar, sobressaltando tanto a ele quanto Dulce. Ela soltou o gato, que correu pelo convés. Foi então que Christopher avistou o Doutor prendendo o porco debaixo do braço, uma grande faca na outra mão.

- Pelos céus! - murmurou Dulce. - Ele vai matar Lydia.

Christopher seguiu-a.

- Lydia? Você deu esse nome ao porco? 

Dulce o ignorou.

- Doutor! Doutor, por favor, pare!

O cozinheiro virou-se na direção do apelo aflito.

- O que foi, senhorita?

- Você não pode... não deve matar o porco.

O Doutor lançou um olhar a Christopher.

- O porco engordou o bastante. Achei que já era tempo. Capitão?

Christopher olhou para o animal agitado que o cozinheiro continha a custo sob o braço. Notou o horror e a dor no semblante de Dulce.

- Acho que podemos deixar o animal em paz - disse ao cozinheiro, dando de ombros. - Já estamos perto do Brasil e nosso estoque de comida é grande.

- Mas...

- Deixe o porco, Doutor. Ela se lastimou durante três dias por causa daquela última galinha que você usou no cozido. Não poderei aguentar uma mulher chorosa.

No dia seguinte, Christopher viu Duce cobrindo os olhos com a mão em concha para observar Click e Craven passando piche no mastro principal. Os dois estavam presos por alças de couro, as pernas e peitos despidos reluzindo ao sol. Fizeram uma pausa em seu trabalho para lhe acenarem, e, sorrindo, ela acenou de volta.

Não era apropriado, pensou ele, que Dulce visse homens de torso nu para cada lugar que olhasse.

Ela só notou sua aproximação quando parou a seu lado.

- Capitão Uckermann - murmurou. 

- Eu vou ficar um pouco ao timão. - Ele falou com estudada indiferença.

Dulce o observou com nervosismo, como se não confiasse nele ou em si mesma quando estavam juntos.

- Eu queria estar na proa no momento em que atravessarmos a linha do Equador. Poderia me avisar quando isso acontecer?

Christopher ficou absurdamente feliz em atendê-la. Talvez aquela fosse a virtude de Dulce. Talvez fosse por aquela razão que a tripulação atendia-lhe os pedidos. Sua genuína curiosidade em relação a tudo amenizava a monotonia dos longos dias no mar.

- Sr. Datty, apresente-se ao leme em seu lugar - disse a Timothy.

- Sim, senhor. - O garoto obedeceu com uma continência exagerada que o divertiu.

Ele, então, estendeu a mão a Dulce. Ela hesitou, observando-lhe a mão como se fosse uma serpente venenosa.

- É feita de carne e osso como a mão de qualquer outro homem - assegurou-lhe ele, num tom espirituoso, ocultando a irritação. Vendo-a corar, Christopher sorriu. - A menos que esse seja exatamente o problema.

Quase desafiadora, Dulce aceitou-lhe a mão. O toque da mão dela foi, surpreendente. Mulheres de sua posição social tinham pele suave e macia. Dulce, por sua vez, tinha um aperto de mão firme e pequenos calos.

- Pelo que vejo, você leva as suas aulas de confecção de velas e navegação bastante a sério - disse ele, conduzindo-a até o alto da proa.

- Eu levo tudo a sério, capitão.

- Eu notei. E qual a razão disso? - Ambos chegaram à proa do navio, e Christopher virou-se para estudá-la.

- Não faço ideia.

- Lá! - exclamou ele de repente, cobrindo os olhos com a mão. - Lá está!

- O quê?

- O Equador. - Christopher tirou sua luneta do bolso e passou-a as mãos dela.

Dulce fechou um olho e observou através da luneta.

- O que estou procurando?

- O Equador. Não era o que queria ver?

Ver? Mas...

- Continue olhando. - Furtivamente, Christopher arrancou um fio de seu cabelo. Sob pretexto de ajustar o foco, segurou o fio atravessado sobre a lente.

- Agora pode vê-la? A linha do equador?

- Oh, sim! - exclamou ela, com evidente entusiasmo. - Acredito que sim. - Os lábios cheios curvaram-se num sorriso que exerceu um efeito inquietante sobre Christopher. - Que fascinante! E aquilo não é um elefante caminhando sobre a linha?

Ele tirou-lhe a luneta e voltou a guardá-la no bolso.

- Eu tinha certeza de que você não se deixaria ludibriar. 

Dulce fitou-o com o costumeiro ar de altiva reprovação, embora os olhos ainda brilhassem com humor.

- Não tenho hábito de deixar que me façam tão de tola assim, capitão. Não imagino por que você resolveu tentar me pregar uma peça dessas.

- Para vê-la sorrir. Você não faz isso com frequência o bastante, mas deveria.

Ela o fitou com um ar sério.

- E por que deveria?

- Porque... - Christopher começava a se sentir tolo. - Porque lhe ordeno que o faça e eu sou o capitão.

Dulce presenteou-o com um sorriso.

- Nesse caso, acho que não tenho escolha. 

Ele retribuiu o sorriso.

- Não, senhorita, acho que não tem. - Recostou-se na amurada. - Estamos a cerca de novecentas milhas do Rio.

- Parece uma imensa distância. - Dulce protegeu os olhos do sol e observou a vastidão de mar que os cercava.

- Há apenas o mar. Até onde a vista pode alcançar. É por isso que gosto que a tripulação se dê bem.

- E de fato todos parecem se entender. Até o Sr. Click tem estado mais animado na última semana. Quando acha que chegaremos ao Rio de Janeiro?

- Dentro desta semana. Há um prêmio de cem dólares para cada dia que conseguirmos chegar de antecedência ao prazo estipulado.

Embora conversassem sobre assuntos corriqueiros, Christopher sentia uma emoção indefinível que nada tinha a ver com distância, prazos ou qualquer outra coisa exceto a mulher a seu lado naquele navio.

Aquilo lhe era novo. Ela lhe era uma novidade. No passado, fora atraído por mulheres cuja beleza superara a inteligência, cuja futilidade falara mais alto do que o bom senso. Em suma, mulheres que não o tinham feito vê-lo a si mesmo pelo que era, um jovem mimado e vazio que só acabara entendendo a importância da conscientização social quando fora tarde demais. Costumara preferir mulheres que não o desafiavam a ser mais do que era. Mas não mais. Não tinha certeza exatamente de quando ou por que acontecera, mas a uma determinada altura começara a sentir algo agradável e novo por Dulce Savinon.

- Ouça - disse, nervoso com as sensações que o dominavam. - Eu percebo que nós não temos nos entendido...

- Não por falta de tentativa da minha parte.

Christopher cerrou os dentes para não retrucar.

- Não estrague minha boa vontade me enfurecendo.

- Eu não estava...

- Apenas por que estou impedindo você. Agora, ouça. Eu fiquei zangado com a maneira como você conseguiu tomar parte nesta viagem. Usou suas ligações com Arthur Herrera em proveito próprio.

- Não é mais do que homens de negócios costumam fazer.

- Droga! - explodiu ele, irritado. - Você é pessoa mais difícil de se pedir desculpas que já conheci.

Dulce apertou os lábios ao ouvi-lo praguejando.

- É isso que está fazendo? Pedindo desculpas?

- Sim, maldição!

- Bem, não está dando certo.

- Não por falta de tentativa da minha parte - retrucou Christopher, imitando-a.


- Segure-se bem, aí, senhorita - disse Chips, avisando Dulce. - Mantenha uma mão no cordame não importando o que aconteça e certifique-se de que seus pés estão bem apoiados nas vergas quando passar por elas.

Embora não estivesse a muito mais de dois metros acima do convés, Dulce sentia-se vulnerável, em especial quando o navio subiu com uma onda e balançou um pouco. Ainda assim, a despeito de sua incerteza, sentia-se orgulhosa e empolgada. A Dulce que partira do porto de Boston jamais teria se atrevido a subir no cordame de um navio. Mas uma vez que os homens do Cisne tinham decidido ensiná-la sobre as atividades de um marujo, ela ousara experimentar uma centena de coisas novas, e sua confiança crescia a cada dia.

- Mas que diabos... – Christopher aproximou-se depressa, a expressão no rosto carregada. - Droga, Chips, você não pôde deixá-la subir no cordame desse jeito.

- Não é culpa dele, capitão - interveio Dulce de imediato. - Eu insisti. Ouvi dizer que já estamos perto de Cabo Frio e eu queria ver a paisagem do alto.

A verdade era que Dulce queria ver tudo. Para ela, a viagem se tornara uma jornada de descobertas e autoconhecimento. Não fazia ideia do que encontraria ao final. Tudo o que sabia era que se sentia mais em casa a bordo daquele navio do que jamais se sentira em meio à sua própria vida na distante Boston.

- Desça daí neste instante - ordenou Christopher, num tom firme. Estava parado junto a uma coluna de madeira, parecendo tão atraente quanto autoritário.

Dulce não pôde deter a onda de calor que a invadiu.

Embora ele não tivesse como saber, era o responsável pela recém-descoberta sensação dela de pertencer a algum lugar. O jeito como falava ou se comportava não importava nem um pouco a Christopher Uckermann. Não a tratava nem melhor nem pior do que a qualquer membro da tripulação. Graças ao capitão, ela aprendera a lidar com um acesso de raiva masculino, a entender o que era provocar e gracejar, a ver humor em situações que antes tinham costumado chocá-la.

O aspecto engraçado era que Harry não parecia fazer ideia de como aquilo era bom para ela. Dulce abriu-lhe um sorriso corajoso. Subir no corda parecera-lhe uma ideia tão boa quando havia lhe ocorrido. Chips subia pelo cordame de lá para cá feito um chipanzé, fazendo aquilo parecer tão simples. Ainda assim, agora que subia mais e mais, Dulce começava a se arrepender.

- Não me faça ir tirá-la dai - disse Christopher, furioso. 

Ela tomou sua decisão rapidamente. Seu orgulho exigia que prosseguisse.

Desde que haviam cruzado a linha do Equador vários dias antes, ambos tinham voltado a evitar um ao outro. Ele que reservasse seu charme para garotas de cabeças vazias e bustos cheios, pensou Dulce, decidida a não se deixar governar por aquele homem arrogante.

- Eu vou continuar, Sr. Pole - disse a Chips.

O carpinteiro do navio lançou um olhar impotente a Christopher.

- Mão e pé opostos a cada vez, senhorita, esse é o jeito certo.

- Droga, eu vou atirar você aos tubarões, Pole! - gritou Christopher. - Não pense que não vou.

- Não vai. - Chips não conseguiu conter um sorriso. - Preciso ajudar a dama. É a primeira vez que ela faz isso, sabe?

Dulce tentou não sorrir enquanto segurou-se ao cordame com uma mão e ergueu o pé oposto até a verga seguinte. As saias esvoaçantes tornavam a subida desajeitada, não havia o menor recato em escalar as cordas daquela maneira, mas não conseguia se conter. Ansiava por avistar a terra exótica e distante até a qual haviam navegado tão depressa.

- Posso ver a sua calcinha daqui - gritou Christopher. Ela quase se soltou. Apenas o instinto de sobrevivência a fez continuar se segurando com firmeza.

- Um cavalheiro não olharia. E, com toda a certeza, não faria nenhum comentário.

- E quem disse que eu sou um cavalheiro?

Dulce lançou um rápido olhar para baixo e deu-se conta de que ele também estava subindo. Em questão de segundos, subia pelos cabos e logo a encarava através do emaranhado do cordame.

- Já que insiste nessa subida - disse ele calmamente - acompanharei você para poder salvá-la caso comece a cair. 

- Se eu começar a cair - retrucou ela - não haverá como me salvar. - Quase riu a ver-lhe a súbita expressão de perplexidade nos olhos verdes. - Não se preocupe. Não planejo cair. E não precisa subir comigo.

- Prefere que eu fique no convés abaixo de você, olhando para as suas saias com o restante dos marujos?

Dulce segurou as cordas com raiva.

- Não darei resposta a uma pergunta insolente dessas.
Sem dizer mais nada, continuou subindo, como vira os marujos fazendo com tanta frequência. A escalada era mais difícil do que parecia, pois as cordas frouxas tinham a tendência de se curvar daqui e dali com o balanço do navio.

Esforçou-se ao máximo para tentar ignorar Christopher. Quando se achavam a meio caminho do alto do mastro principal, cometeu o erro de tornar a olhar para baixo.

- Céus - sussurrou.

- É uma longa descida até o convés, não? - comentou Christopher, num tom jovial.

Ela o ignorou. O convés parecia minúsculo, salpicado com caixas e rolos de corda em miniatura. Devido ao formato do navio, sabia que, se subisse mais, teria a sensação de estar flutuando bem acima do mar aberto.

O vento soprava-lhe os cabelos, o sol aquecia-lhe o rosto. Deus, o calor era intenso. Havia gotas de suor em sua fronte e na palma das mãos.

Aquela fora uma ideia tola, absurda. Por que quisera subir pelo cordame naquele dia?

- Suba um pouco mais - sugeriu Christopher, o tom de voz insolente, provocador. - Venha até aqui onde as cordas ficam tão juntas que chamamos isto de “escada das damas”. Vai achar que este trecho foi feito para você.

Dulce odiava que ele estivesse vendo seu medo. Procurando não olhar mais para baixo, continuou subindo. As cordas já lhe machucavam as mãos, que ardiam com o suor.

Oh, por favor, suplicava numa prece silenciosa, se eu sobreviver a isto, nunca mais tentarei nada tão ousado outra vez.

Seu olhar correu pelas velas do Cisne e, então, encontrou o horizonte ao sul. O que viu lhe causou tamanho encantamento que quase se soltou das cordas.

- Segure-se firme - disse-lhe Christopher, colocando-se a seu lado. - Você, finalmente, está tendo uma boa visão do Brasil.

- É fascinante! - exclamou ela, esquecendo-se de sua raiva. - As montanhas são tão bonitas, parece que são esculpidas em veludo verde.

- Lá está o Corcovado, e as formações mais altas são chamadas de Dedos de Deus - explicou Christopher, indicando uma fileira de cinco picos acentuados acima da linha do mar. O verde-esmeralda brilhante em contraste com o azul intenso do mar produzia uma paisagem tão bela que Dulce sentiu os olhos marejados.

- Os Dedos de Deus - repetiu ela, tocada com o significado do nome.

- A cidade montanhosa mais próxima é Petrópolis. No verão, os cariocas costumam ir para lá em busca do tempo mais ameno e para fugir da febre amarela.

Ela estremeceu, lembrando-se do que lera a respeito. Era uma grande causa de morte, especialmente contagiosa para os ianques que não tinham resistência à doença.

- É difícil imaginar moléstia tal numa terra tão bonita. - Manteve seu olhar no horizonte, embevecida com a vista, até que as mãos tremeram com o esforço de se segurar junto ao cordame.

- Capitão - disse de repente - olhe lá adiante, em direção nordeste.

Christopher olhou por sobre o ombro e estudou o céu. As nuvens distantes pareciam carregadas. A luz que se originava daquele quadrante tinha um tom amarelado.

Enquanto se segurava, Dulce notou a agitação do mar.

- Há uma tempestade se aproximando, não é? - indagou.

- Sim, das grandes.

Um grito assustado ecoou do convés.

- O que, afinal, vocês dois estão fazendo aí em cima? 

Sobressaltada, Dulce largou acidentalmente as cordas. Por um segundo, ficou solta, flutuando. De repente, com um tranco, parou de cair. Christopher metera as mãos pelas cordas e a segurara pelos pulsos, o esforço visível na expressão de seu rosto.

- Sugiro - disse-lhe por entre os dentes - que você se segure as cordas. Agora.

Dulce obedeceu automaticamente, as mãos mais rápidas do que o raciocínio. Sentiu novo ardor nas palmas que lhe pareciam um tanto esfoladas.

- Desçam daí neste instante! - gritou Ale, a voz estridente com o medo. - Vocês dois.

- Obrigada - disse Dulce, olhando com gratidão e incredulidade para Christopher. - Sem dúvida, você salvou a minha vida.

- Não gosto de ter que ficar salvando vidas - resmungou ele, começando a descer. - Não torne a me assustar desse jeito.

Algo naquele tom de voz intrigou Dulce. Com um estranho nó na garganta, iniciou sua descida, apoiando cuidadosamente cada pé e seguindo-o com a mão oposta. As palmas das mãos ardiam, mas não se importava. A sensação de queda e, depois, a de Christopher segurando-a a tempo haviam sido extraordinárias. Simples medo não era o bastante para descrever o que a dominara.

- Você se machucou? - perguntou ele.

- Não. – Dulce lançou-lhe um sorriso trêmulo. - Eu nunca assustei ninguém antes. Não dessa maneira, quero dizer.

- Então, de que maneira?

Ela manteve o olhar atento no cordame e falou de um lugar em seu íntimo que sempre tivera resguardado.

- Acho que eu era bastante assustadora para os rapazes que eram mandados para dançar comigo nas festas.

- Nesse caso, tais rapazes não deviam passar de covardes.

Dulce não queria a compaixão, nem a simpatia dele.

- Nunca sabiam o que me dizer, nem eu a eles e, portanto, a situação era sempre constrangedora. Ou, como eu disse, assustadora. - Quando sentiu as tábuas de madeira do convés sob os pés, soltou um suspiro de alivio.

- Pelos céus! - exclamou Ale em tom de reprimenda. - O que estavam pensando? Podiam ter morrido.

- E teríamos se você houvesse gritado um pouco mais alto, mãe - disse Christopher.

- Não pude me conter. Eu sempre grito quando um desastre parece iminente.

- Tudo acabou bem. - Subitamente, Dulce sentiu-se tão pouco à vontade quanto nas rodas sociais de Boston. No alto do cordame, olhando ao longo do vasto oceano para uma terra de beleza tão mística, sentira-se como uma pessoa diferente. Agora, com o sólido convés de carvalho oscilando sob seus pés, voltava a ser ela mesma, a desajeitada e calada Dulce. Desnudara muito de sua alma lá em cima. Christopher sabia de coisas que nunca dissera a nenhuma outra pessoa.
Sem se atrever a fitá-lo, disse finalmente. 

- Parece que esfolei um pouco as palmas das mãos. Acho melhor eu descer para cuidar dos machucados.

Afastou-se depressa na direção da escada, mas o vento ainda carregou a voz de Alexandra. 

- Eu sei que você ficou descontente com as circunstâncias, Christopher, mas precisa tentar se livrar da garota atirando-a ao mar?




Gatinhas voltei!!! 


Por causa dum problema acabei abandonando a web, mas essa samana, depois de muito tempo sem entrar no site, resolvi entrar para ver como andavam as coisas e vi que algumas pessoas estavam pedindo para mim terminar a web e cá estou eu. 


beijos, obrigada.



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Autor(a): chrisdul

Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).

Prévia do próximo capítulo

Capítulo XII – Rio de Janeiro Um navio esplêndido para uma viagem pelo oceano Era aquele baleeiro Nenhuma tempestade abalava sua tripulação Ou preocupava o capitão. O homem detrás do timão havia sido ensinado a sentir Desprezo pela ventania mais forte. E sempre parecia, quando o tempo clareava, Que ele estivera em sua ca ...


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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 49



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  • carolinevondyzinha Postado em 15/04/2015 - 20:09:41

    Meu deuses cadê vc posta +

  • lalita_vondy Postado em 15/07/2014 - 16:40:06

    Oieeeee LEITORA nova!! Posta mais por favor to curiosa!! Nao abandona nao por favor!!! Posta vai!! Bjoes!!

  • mariaeduardavondy Postado em 30/05/2014 - 15:20:42

    Oii! Sou leitora nova!por favor não abandona a web!Por favor!è uma das webs mais perfeitas q eu já li aq no site!por favor volta a postar!

  • samandra Postado em 08/03/2014 - 09:43:26

    Oi, posta mais :)

  • lolawho Postado em 24/02/2014 - 15:15:42

    POSTA MAIS!!! PLEASE...

  • taisa Postado em 03/02/2014 - 16:05:57

    Um MÊS SEM CAPÍTULO NOVO :/

  • taisa Postado em 22/01/2014 - 23:23:52

    QUERO POSTS...

  • lolawho Postado em 18/01/2014 - 19:18:39

    Por favor continua a web!!!! *---*

  • a_letiicia Postado em 03/01/2014 - 20:49:47

    Ahhh espero que você dê-nos esses capítulos enormes todos os dias, todos os dias! hahaha Porque é tão gostoso ir descendo, descendo e descendo o capítulo e ainda ter mais coisa pra ler hahahahahh na verdade é bom porque dá continuidade, não fica aquela história toda picada com meia dúzia de palavras por capítulos, interrompendo as coisas que tem que acontecer sabe? não sei explicar, mas é ótimo!!! hahaha Enfim, eu sabia!!!! Sabia que a timidez, a tristeza, e a inibição da Dulce eram culpa daquele bando de imbecis que ela tinha que conviver. Olha como ela está feliz nesse navio? Ela como ela está se divertindo, se soltando... Ela encontrou o seu lugar ali, perto das pessoas que a 'alta sociedade' provavelmente despreza. Claro que a Dulce tá se livrando pouco a pouco das 'máscaras', o cabelo grande com esses penteados horríveis, os óculos, as roupas enormes e pesadas, os sapatos antiquados... E isso é culpa do Christopher também, que a propósito já está louco por ela.

  • vemkgaabi Postado em 03/01/2014 - 11:37:36

    Por favor posta maaais estou amando a web *---*


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