Fanfics Brasil - 36 Uma Escola de Charme - Adaptada Vondy

Fanfic: Uma Escola de Charme - Adaptada Vondy | Tema: Vondy


Capítulo: 36

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XIII – Turbilhão de Sentimentos


Seja bom e você será solitário.

Mark Twajn
Seguindo o Equador

Quente, doce e lânguido, aquelas eram as impressões dominantes que Christopher tinha do Rio de Janeiro. Depois de ter concluído seus negócios preliminares com o agente do Sr. Ferreira, ele providenciou para que a carga fosse descarregada. Luigi, que falava o idioma de sua terra natal com uma equipe de estivadores italianos, tinha o serviço sob controle.

Antes de alugar uma carruagem para levá-lo à casa da tia, na Barra da Tijuca, Christopher permaneceu no cais barulhento e movimentado e viu-se dominado por uma sensação esplêndida e tão rara que, em principio, não pôde identificá-la. Mas tinha um nome, orgulho.

Orgulho em ter realizado algo de significado, e o feito tão bem que até mesmo estranhos nas docas tinham acabado de ouvir falar a seu respeito. Capitão Uckermann, que levava uma eficiente tripulação numa embarcação veloz, Capitão Uckermann, que ganhara uma generosa bonificação por ter chegado dias antes da data programada.

Os vigaristas do cais ficaram sabendo quem ele era tão depressa quanto os agentes alfandegários e os comerciantes locais.

- Tenho os melhores diamantes para vender - disse um jovem sorridente com cabelos oleosos e mãos inquietas. - Venha comigo ver a minha coleção - propôs em seu sotaque carregado.

Christopher recusou jovialmente a oferta suspeita e logo viu o comerciante de ar duvidoso ser substituído por uma prostituta morena:

- Você passou tempo demais no mar, querido - disse-lhe sugestivamente, passando a ponta da língua pelos lábios num gesto que deveria ser proibido por lei. - Eu o farei feliz hoje.

- Que tal um jogo de cartas? - perguntou um outro homem.

Christopher sorriu de orelha a orelha. Nem sequer recebera o seu pagamento ainda e, então, porque um súbito vazio surgiu dentro de si, estendeu a mão a prostituta e perguntou:

- Qual é o seu nome, doçura?

Ao final, deu-se conta de que nem sequer ouvira o nome. Tudo o que se lembrou foi da exuberância de suas curvas, do inebriante perfume, da maneira como o corpo ardente o recebeu. Ainda assim, o ato teve um perturbador aspecto mecânico. Ele lhe deu prazer, sim, mas de uma maneira curiosamente distante. E, do mesmo modo, encontrou o seu prazer também, pagando-a generosamente em seguida pelo encontro.

No meio daquela tarde, deixou o bordel com a cabeça aérea pela bebida, o corpo saciado pelo sexo e um turbilhão de pensamentos confusos e incertezas. Haviam-lhe oferecido riquezas contrabandeadas, sexo, jogo e bebida forte. Em uma determinada época, tais coisas tinham sido tudo o que desejara na vida e as teria aceitado de bom grado. Agora, porém, tais prazeres continham apenas um fraco apelo no que lhe dizia respeito. Em vez daquilo, saiu para visitar o mercado, olhar os terraços nas colinas e as belezas naturais do Rio de Janeiro. Mas, em meio à sua contemplação, um pensamento inquietante ocorreu-lhe: nada daquilo tinha significado se não houvesse uma pessoa a seu lado com quem partilhar.

Alguém que olhasse para o mundo com o fascínio da descoberta. Alguém que se embevecesse com as novas paisagens e sons, sua paixão oculta por um semblante reservado. Alguém que se agarrava a uma nova experiência, valorizando-a como se fosse um tesouro.

- Providenciei uma carruagem para você. Já está pronta - disse-lhe Dino quando o viu voltando ao ancoradouro em que se encontrava o Cisne Prata. - O que foi? - indagou, observando-o atentamente. - Parece doente.

- Talvez. Na minha mente - respondeu Christopher, evasivo, e caminhou em direção à carruagem.

Tia Rose ofereceu-lhe uma acolhida embaraçosa de tão efusiva, exclamando sobre sua altura, sua máscula beleza, o intenso verde de seus olhos, a maciez de seus cabelos negros.

Ale observou, permitindo mais alguns momentos de indulgência à orgulhosa tia antes de intervir num tom jovial:

- Ele é meu filho, cara irmã. Não um cavalo de exibição.

- Deveria me ver quando estou sóbrio - disse Christopher, cambaleando de leve.

- É claro. - Rose abraçou-o calorosamente. Exalava os agradáveis aromas de café e flores, Ele esperou que aquilo encobrisse seu próprio odor menos recomendável de bebida e perfume barato. - Perdoe-me, querido. Eu não fui abençoada com filhos e, portanto, aproveito para deixar meu ar maternal vir à tona sempre que tenho oportunidade.

- E você o faz com natural graciosidade - assegurou-lhe ele, sorrindo apesar da forte dor de cabeça. - Onde está Dulce?

Ale e Rose trocaram um olhar significativo. Christopher censurou a si mesmo por deixar transparecer a sua ansiedade.

Dulce desceu pela escada de madeira entalhada, a incerteza evidenciando-se em sua postura rígida.

- Eu peço desculpas por ter deixado todos à espera.

- Bobagem, querida - interrompeu-a Rose, com um sorriso amável. - Nós não nos preocupamos com horários na Vila do Céu.
- Vila do Céu - repetiu Dulce, num tom suave. - Que nome encantador.

- Agora que estamos todos reunidos - disse a anfitriã - Vamos jantar. - Conduziu-os pelo grande vestíbulo até uma passagem em arco. Ale ia de braço dado com ela, e Christopher deparou com a perspectiva de fazer par com Dulce.

Achou a ideia absurdamente atraente.

Ofereceu-lhe o braço.

- Vamos?

Dulce lançou-lhe um olhar surpreso, como se dissesse que não acreditava que estava sendo simpático com ela, um olhar que o exasperava, mas, que ao mesmo tempo, partia-lhe o coração. Ninguém nunca tratara aquela pobre mulher com um mínimo de cortesia?

No momento seguinte, ela torceu o nariz e apertou os lábios com um ar de reprovação.

- Capitão Uckermann, que tipo de negócio andou conduzindo?

Ele não se sentiu exatamente envergonhado. Um tanto constrangido, talvez.

- Andei cuidando de um assunto pessoal também.

- Percebi.

- Foi uma longa viagem. Não é natural para um homem ficar sem isso.

- Tenho certeza de que não sei absolutamente nada a esse respeito.

- Estou tentando me explicar para que você possa incluir isso no seu relatório a Sr. Herrera.

- Ora, como se atreve... - Ela parou de falar quando Ale e a irmã surgiram à frente no raio de visão de ambos. Christopher continuou oferecendo-lhe o braço até que o aceitasse. - Obrigada, capitão - murmurou Dulce, passando o braço pela curva do dele, apesar da evidente relutância.

- Agora que estamos em terra firme, deve me chamar de Christopher.

- Eu não poderia.

Ele fez um gesto na direção da mãe e da tia que atravessavam um pátio à frente,

- As outras damas me chamam pelo meu primeiro nome.

- As suas damas da noite, presumo eu - retrucou Dulce, com rispidez.

- Essas seriam mais como “damas da tarde” - disse ele calmamente. - E, para seu governo, houve apenas uma. Você está guardando dados a meu respeito para o tal relatório, não está?

- É o que talvez eu faça mesmo, capitão.

- Quando mencionei as outras damas, eu me referi à minha mãe e tia - explicou Christopher, arrependendo-se de sua rudeza. - As duas me chamam pelo primeiro nome.

- Elas são sua família.

Christopher piscou-lhe um olho.

- Poderíamos dar um jeito nisso.

Dulce desviou o olhar.

- Não deveria brincar assim.

Talvez eu não estivesse brincando. A ideia era absurda e surpreendente demais para que Christopher a colocasse em palavras. Ainda assim, no instante em que lhe ocorreu, mexeu com algo dentro de si, parecendo alcançar alguma parte de seu coração. Foi a ideia mais estranha que já teve. Casar-se com Dulce Savinon? A reticente, tímida e empertigada ianque que sonhava com Alfonso Herrera?

Era evidente que ele ficara por tempo demais no mar.


Dulce não sentiu apetite para jantar, embora a refeição fosse tanto deliciosa quanto exótica. Havia salada de abacate temperada com sal e vinagre, mandioca, filés, além de dois tipos de vinho, melão, goiaba e gelo com suco de limão, raspado do grande bloco que Christopher levara de presente à tia.

Ainda assim, apesar de toda a fartura, Dulce mal conseguia tocar na comida. Sentia-se inquieta, nervosa, e não sabia por quê. Ansiedade, concluiu, estudando as paredes claras da sala de jantar, as portas e janelas em arco com detalhes em madeira entalhada. Aquilo e um encantamento com aquele lugar novo e estranho, com a fragrância das orquídeas, das árvores frutíferas que cresciam à volta e os sons suaves de violão que ecoavam da ala dos criados.

E desilusão com Christopher... No momento em que pisara em terra firme, ele fora à procura de uma mulher, o que fizera questão de lhe explicar sem a menor hesitação.

- Há tantas coisas a ver - declarou Ale. - E em tão pouco tempo.

- Não precisa restringir o seu tempo - respondeu Rose. - Você poderia ficar comigo.

- Aqui?

- É claro. O que há em Albion para você? 

Ale sorveu um pouco de vinho.

- Albion é o meu lar. E onde criei meu filho e enterrei meu marido. Meu enteado tem dois filhos que eu mal conheço. Passei tempo demais na Europa. Não posso ficar longe de casa para sempre.

Christopher estudou-a com atenção.

- Meu pai está morto, e eu nunca mais voltarei a morar em Albion, mãe. Acho que tia Rose teve uma ótima ideia. Deixe Simas ficar com Albion. Ele nunca precisou mesmo de nós.

Simas. Dulce tentou imaginar o meio-irmão de Christopher, mais velho, evidentemente. Devia ser dissoluto, e ter um nariz grande e vermelho de tanto beber na varanda, enquanto seus escravos trabalhavam até o fim da vida nas plantações.

- Como são os filhos dele? - perguntou Rose.

- Não sei muito bem. Ambos ainda eram pequenos quando parti. O nome do menino é Teodora e a irmã chama-se Belinda. A esposa de Simas, Parvati, não achava a minha atenção bem-vinda. - Uma expressão terna suavizou o rosto de Alee quando acrescentou: - Eu gostaria de ter sido avó. - O ar terno dissipou-se quando lançou um olhar faiscante a Christopher. - Talvez algum dia alguém do meu próprio sangue se dignifique a me dar um neto.

Christopher riu.

- Sei que consegui um pequeno milagre trazendo-nos até aqui tão depressa, mas até mesmo eu encontraria dificuldade em ter um bebê.

Rose explodiu em risos. A irmã limitou-se a sacudir a cabeça.

- O que devo fazer com este garoto?

Dulce cortou um pedacinho de melão e levou-o aos lábios, esperando que os demais não notassem o forte rubor que lhe tingia as faces.

- Encabulamos nossa convidada com toda essa conversa indiscreta - disse Rose. - Que indelicadeza de nossa parte.

- Não, vocês não...

- Bobagem, querida. Vamos passar para assuntos mais polidos. - Ela cruzou os braços bronzeados sobre a mesa. - Você é uma jovem muito inteligente. Ale me disse que você tem o dom para os idiomas.

Dulce sacudiu a cabeça.

- Se os trechos de conversas que ouvi no porto hoje servem de indicação, não sou nenhuma especialista.

- Ela está sendo modesta - assegurou Christopher. - É a melhor intérprete que já tive.

Ela piscou os olhos, surpresa. Depois de sua interferência na conversa com o prático do porto, não esperara elogios.

- É mesmo? - indagou Rose, arqueando uma sobrancelha escura.

- Sim, tia, com toda a certeza.

Dulce sentiu uma onda de contentamento. Elogios da parte de Christopher não deveriam fazê-la sentir-se daquela maneira, mas não conseguia evitar. Sabia que o orgulho era uma vaidade, mas, ainda assim, aquelas palavras aqueciam-na do mesmo modo que o vinho que bebericava.

- Você tem - disse-lhe Rose, observando-a - um sorriso admirável.

Imediatamente, Dulce apertou os lábios. Era provável que o capitão a tivesse elogiado por sentir-se culpado em relação ao próprio comportamento.

- Desculpe-me, eu não deveria ter dito nada - prosseguiu Rose, notando que a embaraçara. - Mas esse sorriso transforma você por completo. E o corte de seu cabelo é bastante revolucionário. Simplesmente adorei-o. Talvez eu corte um pouco o meu também. 

Dulce não soube o que dizer. Ale salvou-a, retomando o assunto sobre Albion e as pessoas que sua família conhecera muitos anos antes. Dulce provou seu gelo com limão e ouviu, apreciando as histórias daqueles adoráveis estranhos, enquanto criados descalços os serviam.
Um som um tanto estridente adentrou pelas janelas em arco, sobressaltando-a. Notando-lhe os olhos arregalados, Rose explicou:

- Esse barulho que está ouvindo é de um pequeno macaco noturno. Já é uma espécie de bicho de estimação da casa. É tímido, mas costuma aparecer na cozinha em busca de uma fruta ou petisco.

- Eu adoraria vê-lo.

- Christopher, leve Dulce para uma volta até lá fora no pátio - disse Rose.

- Não, ouça... - começou Dulce, mudando de ideia depressa. A sugestão de sua anfitriã tinha uma dolorosa semelhança com o estratagema das bem-intencionadas casamenteiras de Boston, eternamente tentando lhe arranjar um par entre os jovens constrangidos. - Não é necessá...

- Será um prazer. - Christopher afastou a cadeira para trás. Ela observou-lhe o rosto para ver se havia a mesma expressão mortificada dos rapazes de Boston.

- Podem passar pela cozinha para apanhar uma cesta de frutas - sugeriu Rose. - O macaco, com certeza, está saltitando pelo jardim.

Tochas iluminavam a área calçada de pedra que formava o coração da vila. Arcos ladeavam o pátio e, em um dos lados, não havia parede, mas uma cerca de ferro e uma árvore imensa, incomum, com tronco retorcido e galhos longos que cresciam quase horizontalmente.

A fragrância de flores inundava o ar noturno, o perfume tão exótico que chegava a inebriar. Dulce parou diante da fonte no centro do pátio e permaneceu imóvel, respirando fundo, sentindo a essência da noite a percorrê-la, despertando partes de si que haviam estado tão profundamente adormecidas que até aquele momento nem sequer soubera que existiam.

- Você está indisposta? - perguntou Christopher, rompendo o silêncio.

Ela abriu os olhos.

- Não. Por que pergunta?

- Você me parece um tanto distraída.

- Mas não é por nenhuma indisposição - respondeu ela, corando. - É porque este lugar é tão maravilhoso. As fragrâncias, os sons e até o próprio ar, tudo isso me faz vibrar - explicou e tornou a corar. - Por falta de uma palavra melhor.

- Vibrar - repetiu ele, uma expressão divertida curvando-lhe de leve os lábios.

- O que quero dizer é que este ambiente me proporciona uma sensação de vitalidade que nunca senti antes. Também exerce esse efeito sobre você, capitão Uckermann?

Christopher estudou-a com um olhar franco e perscrutador que a deixou pouco à vontade. E sem deixar de fitá-la por um instante sequer, disse:

- Acredito que também experimento a mesma sensação que você.

- Não está apenas gracejando comigo?

Ele estendeu-lhe a mão.

- Estranhamente, não estou. Devemos ir em busca do tal macaco?

Quando ela lhe aceitou a mão, a vibração que a percorria intensificou-se. Não esperara por aquilo. Talvez tivesse sido o vinho que bebera. Parecera tão delicioso e exótico. Sentia uma incomum leveza nos pés, uma graciosidade que nunca julgara ter, o que, talvez, fosse mera impressão, uma vez que estivera por tanto tempo no mar.

Caminharam até o final do caminho de pedra, encontrando um relógio de sol sob o escuro da noite.

- Como se faz para se chamar um macaco? - perguntou Christopher.

- Não faço ideia. Nunca vi um macaco antes.

Ele sacudiu a cesta de frutas e produziu um som estranho com a boca, o que a fez rir.

- Esse é o seu chamado de macaco?

Christopher piscou-lhe um olho.

- Consegue fazer melhor?

Ela apertou os lábios e tentou imitar o som estridente que tinham escutado na sala de jantar.

- Não sei como o macaco se sente - disse ele, com um riso - mas você certamente despertou a minha atenção.

Dulce tornou a rir, perguntando-se mais uma vez se era o vinho que bebera, o jardim perfumado ou o simples entusiasmo em estar ali que faziam tudo parecer tão divertido.

- Se o seu riso não tentar o macaco a se aproximar, não sei o que o fará. - Ele apoiou o pé num banco do jardim, sem perceber o quanto ficara sensual naquela posição. - Você tem o riso mais bonito que já ouvi.

- E você, capitão, tem a fala mais macia.

Christopher abriu um largo sorriso.

- Usei-a para conquistar meu lugar no Cisne.

- Sempre me perguntei como conseguiu esta façanha.

- Não vou contar. Você já me acha desprezível o bastante.

- Não o acho desprezível - protestou ela. - Apenas exasperante.

- Ah, exasperante. Isso significa que estou subindo no seu conceito?

- Ao menos é um sentimento que você pode entender, sei que pensa o mesmo a meu respeito.

Christopher fitou-a longamente com um olhar indecifrável.

- Estive com uma mulher na tarde de hoje.

- Sei disso. Não sou tola.

- Ficou chocada?

- Teria valido a pena?

- Vai colocar isso em seu relatório?

- Depende.

- Do quê?

- Da razão que o levou a agir assim. - Dulce mordeu o lábio inferior. - Além da explicação que você me deu antes.

- A razão? A de chocar você? E talvez a de... oras, eu não sei. Não é o que você está pensando. Eu desci do navio sentindo um vazio por dentro. É difícil explicar.

- Então, por que você faz esse tipo de coisa?

- Porque sou um homem péssimo.

Dulce sacudiu a cabeça.

- Acho que, na verdade, você é um homem bom com alguns péssimos hábitos.

Ele apoiou o cotovelo no joelho e abriu-lhe um sorriso devastador.

- Ouça... - Interrompeu-se de repente e apanhou-lhe a mão, segurando-a com força. - Ele está vindo - murmurou.

- O macaco?

- Sim.

Ambos aguardaram em silêncio, esforçando-se para tentar ouvir algo. Um pássaro distante cantou e um outro respondeu ainda mais ao longe. Por perto, a brisa soprava suavemente nas folhagens.

Dulce manteve a sua mão na de Christopher. Gostava daquele contato. Além do calor que irradiava, não pôde deixar de notar-lhe o tamanho também. Ela tinha mãos grandes para uma mulher, mas as dele eram bem maiores, cobrindo as suas por completo, aninhando-lhe os dedos na segurança da palma. Segurança. Era daquela maneira que se sentia com Christopher Uckermann. Segura, como se nada no mundo pudesse atingi-la, desde que estivessem mãos dadas.

Era uma ideia romântica. Uma ideia que lhe era totalmente atípica. Ainda assim, não conseguia dissipá-la.

Segura com ele. Quando não estivera segura? Fisicamente, sempre estivera. Levara a vida protegida da filha de uma das mais importantes famílias de Boston. Mas, de outras maneiras, o perigo fora constante. Nunca sequer conseguira caminhar pelo salão de visitas dos pais sem se sentir como se estivesse correndo o risco de ser tragada.

Ocorreu-lhe que não experimentara mais aquele indefinível temor desde que partira de Boston. Nem mesmo nos momentos mais arriscados da grande tempestade no mar.

- Ali, está vendo? - sussurrou Christopher, os lábios tão próximos ao ouvido dela que uma estranha sequência de arrepios percorreu-a.

Céus, ali estava, num jardim exuberante e perfumado, de mãos dadas com um homem incrivelmente atraente que lhe sussurrava ao ouvido. A sua tola imaginação concebera aquele momento inúmeras vezes, obviamente.

Mas o homem em seus devaneios sempre tinha sido Alfonso Herrera. E, em seus devaneios, o momento jamais parecera assim tão delicioso.

- Não o estou vendo - sussurrou de volta. Disse a si mesma que não havia o menor romantismo naquele momento. Partilhavam apenas de uma mútua curiosidade sobre o que a exótica noite propiciaria uma expectativa de descobrirem os segredos da floresta.

- Olhe para aquela pequena sombra. Ali adiante.

Ele fez a coisa mais extraordinária. Com gentileza tamanha que a deixou de coração enternecido, tocou-lhe o rosto a fim de fazê-la virar a cabeça na direção de um grupo de arbustos. O contato a fez engolir em seco, pois desde tia Elizabeth ninguém nunca a tocara com tanto carinho. Ainda assim, aquilo superava até mesmo a afeição da tia. Produzia-lhe sensações abrasadoras, fazendo seu corpo vibrar, ansiar por algo indefinível que nunca experimentara.

- Está vendo agora? - sussurrou Christopher.

Dulce obrigou-se a se concentrar.

- Acho que sim - murmurou.

Uma pequena criatura saltou furtivamente dos arbustos e aproximou-se, apanhando depressa uma fatia de mamão da cesta deixada ao lado do banco.

- É tão pequenino - comentou Dulce.

O macaco curvou-se acima de seu achado, metendo-o avidamente na boca. Então, agarrando-se à folhagem com a patinha, desapareceu na escuridão da noite.

Dulce sentia-se fascinada. Não conseguiria dissipar o sorriso de seu rosto mesmo que tentasse, mas não tentou. Virou-se para Christopher, dando-se conta de que, mesmo depois que o macaco se fora, ele mantinha os lábios próximos aos seus e ainda lhe aninhava a face no calor da mão.

- É maravilhoso - disse. - Mal posso acreditar que vimos criatura tão surpreendente.

- Você - respondeu Christopher, com um riso na voz - é uma mulher muito difícil de impressionar.

- O que quer dizer? - Dulce estava surpresa em sequer conseguir emitir as palavras, pois a outra mão dele deixara a sua e deslizara tão furtivamente quanto o animalzinho que tinham visto, até a sua cintura, segurando-a de leve, mas com firmeza.

Homens haviam-na tocado durante as danças, mas fora completamente diferente. Todos tinham apresentado o aspecto de soldados rígidos, forçados a confrontarem um regimento armado. Mas Christopher... Deus, ele lhe dava a impressão de que realmente queria estar ali naquele momento, de que queria tocá-la. Viu-o abrindo um sorriso gentil, a luz branda das tochas suavizando-lhe os traços másculos do rosto. 

- O que quero dizer é que atravessei oceanos e enfrentei tempestades para trazê-la até aqui, e você encarou tudo normalmente. Eu não a tinha visto tão completamente cativada até o momento em que você viu o pequeno macaco aparecendo entre os arbustos.

Não foi isso que me cativou por completo. O pensamento e o fato de ser a pura verdade surpreenderam-na. Quase deixou escapar as palavras em voz alta. Mas, no último instante, conteve-se. Porque não confiava em si mesma, nem em seu coração. Não confiava em Christopher para não parti-lo.

- Suponho - respondeu num tom manso, mas irônico - que eu seja exigente demais.

- Exigente demais para alguém como um garoto de fazenda da Virgínia, feito eu, que se tornou marujo. - Christopher continuava tocando-lhe o rosto, seu olhar hipnótico.

Dulce conseguiu abrir um sorriso, apesar do nervosismo.

- Garoto de fazenda? A julgar pelo que sua mãe me contou sobre Albion, você cresceu num mundo de imensa riqueza.

- Nunca encontrei o que eu queria naquele mundo.

Ela umedeceu os lábios, sentindo o gosto das frutas exóticas que comera antes e descobrindo-se estranhamente faminta outra vez.

- O que é que está procurando? - ouviu-se perguntar. - O que quer?

Christopher soltou um riso baixo, rouco, que a arrepiou.

- São duas perguntas distintas. - Embora não parecesse possível, aproximou-se ainda mais, a respiração de ambos se confundindo. Estava tão perto. Dulce nunca estivera assim tão perto de um homem antes.

- Você tem duas respostas distintas? - conseguiu perguntar.

- Tenho somente uma no momento. Somente uma.

Dulce sentiu o toque em sua cintura se acentuando e teve a mais inexplicável vontade de tocá-lo também. 

Hesitante, ergueu uma das mãos que estivera apertando à sua frente e tocou-lhe o peito forte de leve. A expressão que passou pelos olhos verdes foi de surpresa, mas não de contrariedade.

- E qual é? - perguntou Dulce, num sussurro, ainda incapaz de acreditar que estava naquele jardim esplêndido, em meio a um momento mágico, praticamente nos braços daquele capitão enigmático.

- O que eu quero - disse ele, as palavras soando tensas. - Pergunte-me o que eu quero.

- O que você quer?

- Somente responderei se você prometer que vai acreditar em mim,

- Se eu...

- Prometa. Diga que vai acreditar na minha resposta.

- Acreditarei.

Christopher tornou a soltar aquele riso perturbador, sensual.

- O que eu quero - revelou - é beijar você.

- Mentiroso - disse Dulce automaticamente.

- Você prometeu que acreditaria.

- Porque achei que você iria me dizer a verdade.

- Sabe qual é o seu problema?

- Você?

- Não. É que você fala demais. Suponho que eu poderia jurar sobre a Bíblia Sagrada que quero beijar você, mas há uma maneira melhor de convencê-la.

O ardor nos olhos dele surpreendeu-a, manteve-a hipnotizada.

- E qual seria?

- Esta, carinho.

E, então, aconteceu. Lentamente. Cada segundo que se passou foi como um intervalo terno de tempo, e Dulce saboreou cada sensação. Ficou ciente da maneira como ele inclinou a cabeça, como lhe afagou o rosto com o polegar delicadamente, deslizando-o até seu pescoço, tocando um ponto que pulsava com um calor que nunca sentira antes. 

Da maneira como a puxava para mais perto, aumentando a pressão com a outra mão, que pousava em sua cintura. Finalmente, sua atenção concentrou-se naqueles lábios sedutores. Os lábios que ela observara dia após dia com crescente fascínio. Os lábios que a haviam censurado, provocado, que haviam rido, gritado e exibido sorrisos dos mais carismáticos. Christopher não foi sôfrego em seu beijo.

Em princípio, apenas roçou-lhe os lábios com os seus. Lenta e sutilmente, moveu a cabeça enquanto a beijava com suavidade. Dominada pelas sensações, Dulce fechara os olhos. Não demorou a ouvir um gemido abafado, escapando da própria garganta. Como por vontade própria, suas mãos tocaram-no no peito, segurando-lhe a frente da camisa.

Queria que a proximidade entre ambos fosse ainda maior. Queria que aqueles lábios devorassem os seus, mas ele continuava beijando-a com todo o cuidado, segurando-a com gentileza, como se fosse frágil. A mão em sua cintura moveu-se de leve, quase imperceptivelmente, embora ela lhe sentisse o polegar quase lhe chegando ao seio, dando-se conta do toque apesar da rigidez do espartilho. Sentiu o ardor crescendo em seu íntimo, coisas que lera a respeito em livros românticos que supostamente só deveria ter visto depois que tivesse se casado, mas Dulce lera em segredo de qualquer modo. E, oh, aquilo que vivenciava agora era tão melhor. Queria tanto mais do que aquele momento, mas por outro lado, tinha pavor de que terminasse.

Era tomada por uma vontade quase incontrolável de abraçá-lo com força, de retribuir ao beijo ardorosamente. Mas não teve coragem. Não soube como fazê-lo. Não acreditou que ele fosse aceitá-la. 

Foi, portanto, um ato de incrível autocontrole manter-se rígida e imóvel.

E, finalmente, o beijo terminou. Era como se uma maravilhosa eternidade tivesse se passado, como se o mundo tivesse ficado em suspenso e, depois, se  transformado por completo. Ainda assim, quando Christopher deu um passo atrás e a observou com uma expressão séria por longos momentos, pareceu exatamente o mesmo: bonito, descontraído, confiante.

Por sua vez, ela sentia um verdadeiro turbilhão em seu íntimo.

- Não vou pedir desculpas - começou ele, num tom manso - embora um cavalheiro o fizesse. Não lamento que isso tenha acontecido. - Estendeu-lhe a mão, conduzindo-a pelo pátio, e Dulce seguiu-o, sentindo-se como uma marionete, rígida, desajeitada nos movimentos. - É melhor entrarmos. Minha mãe e tia vão querer saber sobre o macaco.

- Que macaco? - perguntou ela, ainda em seu aturdimento.



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Autor(a): chrisdul

Esta é a unica Fanfic escrita por este autor(a).

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Capítulo XIV – Novas Aventuras Oh, cama! Oh, cama! Cama deliciosa! Esse céu na terra para a cabeça cansada. Thomas Hood (1841) Quando acordou no dia seguinte, Christopher ficou olhando longamente para o teto revestido de madeira no quarto espaçoso e arejado na casa da tia. - Ainda não consigo acreditar que fiz isso - disse em voz ...


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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 49



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  • carolinevondyzinha Postado em 15/04/2015 - 20:09:41

    Meu deuses cadê vc posta +

  • lalita_vondy Postado em 15/07/2014 - 16:40:06

    Oieeeee LEITORA nova!! Posta mais por favor to curiosa!! Nao abandona nao por favor!!! Posta vai!! Bjoes!!

  • mariaeduardavondy Postado em 30/05/2014 - 15:20:42

    Oii! Sou leitora nova!por favor não abandona a web!Por favor!è uma das webs mais perfeitas q eu já li aq no site!por favor volta a postar!

  • samandra Postado em 08/03/2014 - 09:43:26

    Oi, posta mais :)

  • lolawho Postado em 24/02/2014 - 15:15:42

    POSTA MAIS!!! PLEASE...

  • taisa Postado em 03/02/2014 - 16:05:57

    Um MÊS SEM CAPÍTULO NOVO :/

  • taisa Postado em 22/01/2014 - 23:23:52

    QUERO POSTS...

  • lolawho Postado em 18/01/2014 - 19:18:39

    Por favor continua a web!!!! *---*

  • a_letiicia Postado em 03/01/2014 - 20:49:47

    Ahhh espero que você dê-nos esses capítulos enormes todos os dias, todos os dias! hahaha Porque é tão gostoso ir descendo, descendo e descendo o capítulo e ainda ter mais coisa pra ler hahahahahh na verdade é bom porque dá continuidade, não fica aquela história toda picada com meia dúzia de palavras por capítulos, interrompendo as coisas que tem que acontecer sabe? não sei explicar, mas é ótimo!!! hahaha Enfim, eu sabia!!!! Sabia que a timidez, a tristeza, e a inibição da Dulce eram culpa daquele bando de imbecis que ela tinha que conviver. Olha como ela está feliz nesse navio? Ela como ela está se divertindo, se soltando... Ela encontrou o seu lugar ali, perto das pessoas que a 'alta sociedade' provavelmente despreza. Claro que a Dulce tá se livrando pouco a pouco das 'máscaras', o cabelo grande com esses penteados horríveis, os óculos, as roupas enormes e pesadas, os sapatos antiquados... E isso é culpa do Christopher também, que a propósito já está louco por ela.

  • vemkgaabi Postado em 03/01/2014 - 11:37:36

    Por favor posta maaais estou amando a web *---*


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