Fanfic: Como o Vento | Tema: Portiñon

Nos primeiros dias, Sara estranhou a ausência de Anahi para lhe contar as histórias antes de dormir, mas o empenho de Dulce em suprir aquele déficit tinha sido tão grande que logo a menina se acostumou à forma peculiar que a mãe tinha de lhe contar histórias. Elas se apegaram mais, e Dulce adorou aquela maior proximidade.

Sua filha crescia, e quando fosse adolescente, melhor seria se fossem amigas, confidentes...ela crescera quase sozinha, não porque os pais não eram presentes, mas por inexperiência mesmo. Agora, adulta, com uma filha e enfrentando todos aqueles problemas, entendia muito bem a confusão que era a cabeça da dona Ana. Não era fácil educar uma criança, que dirá uma adolescente de personalidade forte como ela tinha sido. O melhor de tudo é que o amor vencera e ela adorava a mãe e ia seguir os conselhos de Maite, ou seja, diria para todo mundo ouvir que amava a sua mãe.

Sara, superava a ausência de Anahi, até porque ela fazia tudo para que o tempo que passavam juntas fosse o melhor possível. E daquela forma que só ela sabia ter, convencera a menina que aquela era a melhor solução. Dulce ouvira aquelas palavras da boa de sua filha e com ares de quem tinha entendido tudo...para as crianças tudo era mais fácil.

Ela, no entanto, sentia falta de Anahi, a verdade era essa, muita falta. Chegar em casa e vê-la indo embora ainda lhe causava muito desconforto. Desconforto maior ainda, porque via a babá feliz. Parecia que voltar para a sua nova casa era das melhores coisas da vida...aquilo a deixava triste, mas se Sara tinha ultrapassado a falta de Anahi, ela também ultrapassaria. O bom de tudo, era que no trabalho, com a avalanche de projetos, não tinha sequer tempo para respirar, quanto mais para pensar nas confusões do seu coração...e assim a vida seguia.

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Mais uma semana voava e no frenesi constante daquela empresa. Dulce trabalhava mais concentrada do que nunca porque não podia mais fazer hora extra e também não fazia questão, redescobrira o prazer de estar na sua casa, cuidando das suas coisas, da filha, em paz...

Maite gostara daquela mudança...sua amiga era muito responsável, madura para umas coisas, mas ainda precisava aprender outras e nada como a vida para ensinar, às vezes a duras penas, mas era necessário.

Quem não gostara nada daquela nova Dulce era Liana, já que a colega não dispensava mais tanta atenção nos seus almoços, cada vez mais raros. Ela só pensava em trabalho e ficava cada vez mais difícil seduzi-la, mas ela não desistiria fácil, não era mulher de desistir e ainda teria aquela mulher.

Após uma reunião resolveu manifestar seu desagrado:

-- Dulce, já não conseguimos mais conversar com calma, nossos almoços são sempre a correr...estou com saudades de nossos papos. -- Dissera de forma sedutora e Dulce percebeu.

--Oh Liana, eu também sinto falta de nossas conversas, mas sabe como é...filha meu bem, minha filha é o centro da minha vida. -- Disse Dulce sorrindo.

--Não seria o caso de contratar outra babá? Uma mais disponível? -- Ela achava o cúmulo Dulce sucumbir às exigências daquela babá.

--Não! A Anahi é a melhor babá que já passou por aquela casa. -- Sentiu uma espécie de raiva da colega, mas rapidamente reconsiderou... Ela não tinha culpa da montanha russa que era suas emoções.

--Tudo bem, já percebi que a moça é cheia de qualidades e que a tua filha a adora, mas posso sentir falta da minha colega? Dos nossos papos, desse sorriso lindo que não vejo há alguns dias nesse rosto mais lindo ainda? -- Resolvera ser explícita.

Dulce sorriu e Maite que entrara na sala a tempo de ouvir a ultima frase, pensara que a colega tinha ido para o tudo ou nada. Talvez fosse bom para Dulce...já estivera mais certa disso, mas quem sabe a colega nova não conseguia tirar a babá dos pensamentos da amiga.

--Já sei, se a Sara tirar o gesso esse final de semana, vocês estão convidadas a passar um final de semana conosco em Santos. -- Dissera mais por educação, já que a colega insistia...e Maite seria a salvação...estava claro que Liana queria alguma coisa além da amizade, mas não estava disposta, não ainda...

Maite fez cara de quem não queria ser vela, mas só Dulce entendia aquela expressão e teve que se segurar para não dar uma bela gargalhada.

Liana queria outra coisa, mas para começo de história estava muito bem...talvez a criança atrapalhasse seus planos, mas ainda tinha alguns dias para orquestrar um plano.

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Anahi e Sara estavam deitadas num dos enormes puffs do lounge enquanto esperavam o regresso de Dulce de mais um dia de trabalho.

--Any, amanhã vou tirar o gesso e na sexta-feira já vou passar o final de semana na tua casa. Quero muito conhecer tudo.

--Sarita, sabe que tem que pedir à tua mãe e ela tem que autorizar.

--E porquê não autorizaria? Minha mãe confia em ti e eu já disse um milhão de vezes que quero conhecer a tua casa. Outro dia ela até disse que às vezes tinha ciúme porque parecia que eu gostava mais de ti do que dela.

Anahi sorriu!

--Mas não é verdade. Eu amo a minha mãe, ela é a melhor mãe do mundo, mas eu também gosto de ti um tantão, muito muito muito e quero fazer bagunça...-- Riu com aquela carinha de sapeca.

--E vamos fazer muita bagunça meu amor.

--Any, quando era pequena fazias muita bagunça?

--Não muita...-- Infância...não era das melhores lembranças, mas teria que disfarçar, Sara era apenas uma criança e não estava preparada para aquelas histórias tristes.

--Subia em árvores como eu? Olha o que isso me valeu. -- Olhou para o braço e sorriu.

--Não lembro muito dessa fase schatzie. -- Sua mente era bloqueada do período da primeira infância, tinha flashes que iam e vinham, lembrava da casa que ficara dos cinco aos sete anos e depois do orfanato até ser adotada pelos pais Alemães. Aos poucos seu coração foi diminuindo no peito...

--Dizem que não pareço nada com a minha mãe, já eu acho que pareço sim, temos os mesmos cabelos ruivos,  sou bonita como ela, eu sou bonita Any? -- A inocência era a melhor fase da vida, definitivamente.

--Muito, tu és linda schatzie, e pareces sim com a tua mãe...mas deves parecer também com o teu pai...

--E tu, pareces com a tua mãe ou com o teu pai?

Anahi  não fazia a menor ideia...passou a vida inteira tentando se ver nos traços de Rudi ou de Ania, mas jamais vira nada com que se identificasse.

--Sara, já ouviu falar de filhos adotivos? -- Seu coração doía, mas sentiu necessidade de falar.

--Sim, claro. Na minha escola tem o Yuri que é filho de pais que não são pais de verdade. Ele foi pego bebê, mas não saiu da barriga da mãe...uma coisa assim... -- ela a olhava muito interessada naquele assunto.

--Então, eu fui uma criança como o Yuri...não nasci da barriga da minha mãe...

--Não? Então não sabes quem são teus pais de verdade?

--Meus pais foram o Rudi e a Ania...mas tens razão, não sei quem foram meus pais de verdade.

--Mas o Rudi e a Ania foram bons contigo? Se eles te pegaram é porque gostaram de ti...

--O Rudi foi o melhor pai do mundo. -- Sentiu lágrimas quentes querendo descer pela sua face -- Ele me ensinou tudo, sobre castelos, estrelas, sobre vinho quando comecei a crescer, ele trabalhava numa vinícola...

--O que é vinícola?

--É o lugar onde fazem vinhos. -- A voz começava a ficar embargada.

--E a tua mãe te ensinava o quê? Vocês brincavam de casinha? Com bonecas?

Anahi não agüentou mais e chorou. Sara não entendeu nada, mas a abraçou.

Como dizer a uma criança de apenas oito anos que a mãe adotiva não gostava dela? Que o sonho de ter uma filha era apenas do pai e que cedo sofreu na pele a revolta de uma mulher doente. Mulher que dizia gritando nos momentos de surto que não queria filha alguma e Anahi só queria agradá-la, só queria dar e receber amor...aquelas lembranças e muitas outras nada agradáveis vieram com a velocidade de um trem atormentar a sua cabeça...chorou até se acalmar.

--Any, choraste porque os teus pais estão no céu? -- A inocência daquela menina fazia tudo ficar menos doloroso.

--Sim Sara, foi por isso...e minha mãe me ensinou muita coisa e brincávamos sim de casinha...

Dulce e sara tomavam um sorvete para comemorar a total recuperação, já que tinha tirado o gesso e o médico dissera que estava tudo bem e que podia brincar à vontade, mas sem subir em árvores, claro.

--Mãe, tinhas prometido, eu quero passar o final de semana com a Any.

--Filha, a Anahi já te atura a semana toda e ainda vai ter paciência para te aturar nos dias de folga, nem pensar. – Dulce não ia dar corda às vontades da filha.

--Mas mãe, pergunta à Any, ela está com tudo arrumado. Vamos fazer comida, ela vai me ensinar a fazer pizza, a Angelique já pegou filmes infantis para mim, a cama da Anahi é grande e vou dormir com ela...mãe deixa.

--Mas Sara, a Anahi não mora sozinha...

--Mãe, a Angelique  me adora, deixa por favor...

--Ok Sara, sem dramas, mas vou perguntar à Anahi e só vai se ela disser que não tem problema.

--Problema nenhum. Não fique triste, eu te ligo todos os dias e domingo chega depressa e volto para a minha outra casa.

Dulce  sorriu, para a filha tudo era fácil...como a vida seria fácil se tivéssemos sempre a leveza das crianças...Pensara.

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Sara descia as escadas no colo de Anahi e as duas estavam felizes. Finalmente chegara o tão sonhado final de semana juntas em casa da babá.

--Minha filha, não achas que já estás grande demais para andar carregada.

--Ah mãe, eu pedi e a Any deixou...ela gosta e eu adoro, que mal tem?

--Já arrumaste as tuas coisas, e sem exagero?

--Já sim dona Dulce e a parte do sem exagero ficou por minha conta porque essa pequena, como sempre, queria levar o guarda-roupa inteiro.

Riram com vontade.

--Filha, já sabes...

--Sim, obedecer a Any, não correr para não cair, subir em árvores nem pensar...já sei mãe e a Any é tão chata quanto tu, ou seja, não me deixa fazer nada dessas artes...--Fez cara de emburrada e as adultas riram com aquela espontaneidade há algum tempo perdida.

--Vou levá-las! -- Disse já se levantando para pegar a chave do carro.

--Não precisa...muito obrigada, mas a Angelique já está aí fora...

--Sim mãe, ela está com o carro do Christian...vamos de carro do tio Cris, adoro aquele carro.

Dulce as levou até à porta...aquela sensação de novo...alguma coisa fora do lugar, e era cada vez mais forte.

Ela foi beijar a filha que continuava no colo de Anahi...a menina se mexeu e os lábios de Dulce roçaram levemente os de Anahi. A corrente elétrica percorreu a espinha dela com tanta intensidade que teve que se encostar na parede...um simples roçar de lábios e aquilo...Anahi saiu logo, Dulce diria que quase correu, mas poderia ser coisa de sua cabeça já que não pensava com clareza.

Ficou encostada naquela porta por longos minutos, até que decidiu fazer alguma coisa para despertá-la daquele transe.

Primeiro ligou para Maite, confirmando o fim-de-semana. Tinha recebido uns convites de uma empresa dona de um hotel novo e poderiam se divertir um bocado. A amiga gostou e confirmou a sua presença.

Depois ligou para Liana que não disfarçou a sua alegria, ainda mais quando disse que Sara tinha ido passar o final de semana com Anahi. Ao final da conversa, a colega dissera que voaria até Santos...

Dulce caiu no sofá e ficou a pensar porque não conseguia estar com a mesma empolgação...estava claro que Liana a queria e ela não era exatamente uma mulher qualquer, era linda, sedutora, atraente...porquê aquela apatia...aquela sensação de tanto faz?

Ia dar o seu máximo para reverter aquela sensação e Liana com certeza a ajudaria.