Fanfic: Historias de Amor e Fantasma | Tema: Portiñon

Maite estava distante, meio aérea naquela manhã nebulosa. Saíra de uma reunião do corpo docente do departamento de ciências sociais e o maravilhoso evento funcionara como um poderoso sonífero. Era o tipo de encontro improdutivo que sempre virava para discussões filosóficas que em nada ajudavam no planejamento do conteúdo didático. Tudo era questionado com base em doutrinas subjetivas e sem uma aplicação prática que auxiliasse na melhoria dos métodos de ensino. Falava-se muito, decidia-se quase nada.

Isaac a encontrou mirando a paisagem além da janela de sua sala. Estava tão absorta que se assustou com o barulho da sua chegada.

--Nossa, acho que me distraí completamente!

--No que estava pensando? Parecia bem longe daqui.

--Pelo contrário. Estava observando os estudantes indo e vindo pelas alamedas.

--Procurando por alguém em especial?

Maite olhou para Isaac com aborrecimento.

--Lá vem você com essa história.

--Só perguntei pra saber se alguém já te contou o que aconteceu.

--Em relação ao que?

--Letícia. Lembra bem dela, né?

--Está sendo irônico? O que ela aprontou dessa vez?

Isaac fez uma pausa antes de continuar. Não tinha certeza do quanto sua amiga estava envolvida com a garota.

--Ela sofreu um acidente.

Maite arregalou os olhos surpresa.

--Como assim?!

--Infelizmente ela está em coma no hospital.

Parecia tão impossível que algo assim houvesse acontecido!

--Semana passada fui a um barzinho com alguns alunos e ela estava lá. Até me deu carona.

--É, eu sei, saiu mesmo uma conversa por aí que vocês duas saíram juntas do tal bar para um destino ignorado.

Maite indignou-se.

--Quem anda espalhando essas histórias?

--Então é mentira?

--Nós saímos juntas sim, mas foi porque bebi demais e não quis dirigir. Ela me deu uma carona perfeitamente inocente. Deixou-me em casa e foi embora.

Maite  mais uma vez irritou-se com aquela falação sem sentido que parecia sempre persegui-la.

--Como foi exatamente o acidente? – mudou o rumo de seus pensamentos.

Isaac torceu a boca.

--Ontem à noite quando ela saia de uma balada, um carro avançou o sinal e chocou-se contra o dela. O motorista estava bêbado e, para minha total consternação, o imbecil não sofreu um só arranhão.

A professora baixou a cabeça, abalada com o que ouvia. Letícia há assediava o tempo todo, mas era uma garota com um futuro enorme à frente para ser vivido com intensidade. Não merecia ter seus sonhos interrompidos de uma forma tão brusca.

--Quais as chances dela sobreviver?

--Os amigos dela que foram vê-la dizem que os médicos não sabem. O coma pode durar horas, dias, ou... – recusou-se a terminar a frase.

--Isso não é justo. – Maite entristeceu-se -- Os jovens não deveriam ter permissão para morrer.

Isaac balançou a cabeça em concordância, enquanto via os olhos de sua amiga encherem-se de lágrimas, que a custo tentava segurar. Ele também sentira-se extremamente melancólico com a notícia.

Achou melhor romper o clima funesto antes que virasse uma choradeira de ambos os lados.

--Mas mudando de assunto, sexta é aniversário do João e vamos comemorar lá em casa. Vê se não falta.

João era o marido de Isaac e até a separação de Maite e Angelique, os quatro sempre saíam juntos nas noitadas.

Maite hesitou. Não queria ver a ex e tinha certeza que João a convidaria também por serem grandes amigos.

--Não sei, Isaac, preferia não me encontrar com Angelique tão cedo assim.

--Bobagem! Nós nos recusamos a escolher entre você ou ela. Somos amigos das duas e assim gostaríamos de permanecer. Resolvam de uma vez suas diferenças para que possamos colocar uma pedra sobre o assunto e seguir em frente.

--Fácil dizer quando não se foi substituído por outra pessoa enquanto estava fora de casa viajando. Foi muito sujo da parte dela começar um relacionamento antes mesmo de terminar comigo. E ainda por cima colocou a culpa em mim pelo fim do namoro. Tudo por causa de uma traição ocorrida há tempos atrás enquanto eu estava bêbada como um gambá.

--Eu sei de tudo isto, meu amor. Mas de nada adianta remoer-se desta forma. Ela partiu para outra, pois você tem que fazer o mesmo. Arrume outra namorada e refaça sua vida.

Maite sentou-se no pequeno sofá junto à janela e suspirou.

--O que me magoa foi saber o quanto foi fácil para ela me trocar. Como se nada do que vivemos tivesse o menor valor. Simplesmente me comunicou o fim de nossa relação e me despachou sem maiores explicações, com aquela desculpa estúpida de que supostamente eu estaria sendo infiel durante minha viagem de pesquisa. E, no entanto, a verdade é que a hipócrita já tinha se engraçado com outra mulher e precisava limpar a casa. Sabe como é? Jogar fora o que era inútil para abrir espaço para o novo. E a primeira coisa da qual ela se livrou foi de mim.

--Se foi isto o que aconteceu, significa que vocês duas não estavam se entendendo direito. Sabe que ela até compreendeu que você estava bêbada quando traçou a empregada, mas jamais a perdoou.

--E assim termina uma bela história de amor.

--Infelizmente a vida nem sempre é fácil de se levar. Você tem que se erguer e voltar à ativa. Lembra dos tempos da faculdade? Você era terrível.

--Como não canso de dizer, sempre foi bem menos do que o pessoal acreditava. Estou sempre levando fama sem proveito.

--Quem não te conhece que te compre, Mai Ainda me lembro do que você dizia sempre: “Se senta pra mijar e não é sapo, tô comendo”.

--Aquele tempo passou e não tenho mais todo esse ânimo. Quero um relacionamento significativo e não aventurazinhas para alimentar o meu ego. Não tenho mais necessidade de me auto afirmar.

--Então venha na festa. Lá vai ter um monte de mulheres solteiras, loucas para achar alguém que as leve a sério.

Maite riu daquela afirmativa. Na verdade era ela quem precisava de uma mulher que a compreendesse e aceitasse seu jeito absorto, que muitas vezes a fazia parecer insensível. Evidentemente esta mulher não era Angelique.