Fanfic: Historias de Amor e Fantasma | Tema: Portiñon

Posso dormir no seu apartamento?

Dulce ergueu a cabeça e lá estava Anahí encarando-a da porta de sua sala, com um sorriso lindo nos lábios.

--Vai ter uma convenção num hotel perto de lá e nós vamos ser responsáveis pelo buffet. Vou ter que chegar cedo e assim fica mais prático.

--Claro que pode. Não precisa nem perguntar. Então você não tem as chaves do meu ap? Por que essa frescura agora?

--Bom, você tem uma namorada e não quero me traumatizar com o que posso presenciar caso chegue de surpresa.

--Não se preocupe: Angelique não vai estar lá. Até parece que ela dorme comigo todo dia!

--Como vou saber? Pelo que me toca vocês duas estão quase juntando os trapinhos. Afinal, você deu as chaves do apartamento para ela também.

Dulce percebeu seu tom foi aborrecido e resolveu brincar.

--Está com ciúmes porque não é a única a ter livre acesso à minha casa?

Anahí tentou disfarçar sua contrariedade, mas a verdade foi que tinha ficado chateada quando soube da troca de chaves. Era mais uma prova de que o namoro estava se tornando realmente sério.

--Pode fazer o que bem quiser. A casa é sua e não tenho nada com isso.

Dulce a olhou com seriedade.

--O que tanto a está incomodando ultimamente? Anda nervosa o tempo todo e parece que o negócio é comigo. Fiz alguma coisa que te desagradou? Pode dizer.

--Não fez nada, só estou um pouco tensa com este almoço. Vai ser a primeira vez que estarei no comando e isto me assusta um pouco.

Dulce foi até ela e a abraçou carinhosamente.

--Você vai arrasar, Cachinhos. Tudo o que faz é perfeito. Você é perfeita.

E não estava mentindo apenas para incentivar a irmã. Na sua visão, Anahí era a mulher que todos sonham em ter. Era dona de uma doçura no olhar que jamais encontrara em outra pessoa. Seu temperamento era calmo, pacífico, mas também determinado quando necessário. Desde que se encontraram pela primeira vez, percebera de imediato que a aparência frágil e cordata não representava toda a realidade. Corria um filete de rebeldia em suas veias, que despertava quando menos se esperava, surpreendendo aos que pensavam tê-la desvendado.

Contudo, Anahí jamais fora agressiva daquela forma, por isso mesmo tinha certeza de que algo nela estava diferente. Parecia carregar uma raiva contida que sempre explodia quando estavam juntas. Havia uma tensão que antes inexistia.

Aspirou o ar e pode sentir o cheiro bom que emanava de seus cachinhos loiros e sedosos. Era bom senti-la em seus braços, tocar seu corpo macio, afagar seu rosto lindo...

“O que diabos estou pensando? Ela é minha irmã!”, censurou-se imediatamente.

Mais que depressa afastou-se de Anahí e evitou olhá-la. Sentou-se de volta em sua cadeira e começou a revirar os papéis sobre a mesa, desviando a atenção para longe dos maus pensamentos que por um momento tivera.

--Então até à noite. -- a jovem loira despediu-se.

--Até. – balbuciou tentando parecer distraída, mas ainda podia sentir o perfume de Anahi em suas narinas despertando sensações que não sabia interpretar. Ou que não queria entender.

*****
Letícia entrou na sala de Maite e jogou-se no sofá, cruzando as pernas em pose de lótus. Logo a professora chegaria e queria surpreendê-la com sua presença. É claro que a reação provavelmente não seria agradável, mas já estava preparada para aquilo.

E como imaginava, Maite ao vê-la deixou os livros caírem ao chão.

--Letícia?! Mas eu achei que... Você não tinha sofrido um acidente grave? Como está agora aqui? E sem um só arranhão?

Então o alívio deu lugar à irritação.

--Espere um instante, o Isaac disse que você estava em coma no hospital. Ninguém se recupera de um coma deste jeito. Que tipo de mente perversa arma uma coisa dessas para encher os outros de preocupação?

Letícia fez um ar misterioso.

--Na verdade...

--Você é mesmo muito psicótica!

--O mundo é misterioso, profe. Não me pergunte nada, porque nem eu mesma sei ao certo. A última coisa que me lembro é que estava voltando pra casa e um farol me cegou. Não tive muito tempo para pensar antes que o outro carro batesse em mim com toda força e eu rodasse descontroladamente. Então acordei e meu corpo estava lá, deitada numa cama, cheio de tubos saindo e entrando por tudo quanto é tipo de buraco. Quer dizer, nem todos os buracos, é claro.

E deu uma risadinha marota.

--Do que está falando, sua transtornada? – Maite ficou ainda mais raivosa -- Agora vai vir com esse papo religioso de que viu um espírito de luz e se recuperou de todos os ferimentos? Estou vendo que foi um verdadeiro milagre!

--Não, meu corpo continua lá, paradinho onde estava, no mesmo lugar. Eu é que saí para dar uma volta e vim até aqui te ver.

Maite deu uma risada de sarcasmo.

--Você é mesmo muito doida! Se manda daqui e pare de ficar brincando com coisa séria. Sabe quanta gente eu vi chorando por você pelos corredores? E enquanto isso, a engraçadinha estava dando risada, fazendo todo mundo de otário. Isso é doença, sabia? Devia se tratar.

Letícia ignorou completamente as palavras da professora, que esticou a mão para pegá-la pelo braço retirá-la de sua sala na marra. Então Maite viu-se assustada quando sua mão simplesmente atravessou o corpo da garota, retornando vazia.

--O que diabos está acontecendo? – deu um passo para trás apavorada com o que presenciara.

Letícia riu em escárnio.

--Essa sua cara de terror é impagável.

--V-você... Quem é você? Uma alucinação? Estou ficando pirada, é isso?

Mas antes que Letícia pudesse responder ela fez um gesto de mão para que ela se calasse.

--Não fale nada. Não quero ouvir nem mais um pio. Saia daqui e vamos fingir que nada aconteceu. Aliás, nada aconteceu mesmo no mundo real. Tudo não passa de um pesadelo terrível do qual vou acordar daqui a pouco.

--Quer se acalmar! Não sou uma alma penada.

--E o que é? O gênio da lâmpada? – levou as mãos à cabeça sentindo-se zonza – Perdi de vez minha sanidade, meu Pai! Talvez seja uma alucinação causada por algo que comi, inalei, toquei... sei lá. Ou sou esquizofrênica e não sabia.

--Ou talvez eu seja uma alma desencarnada que veio aqui só pra te sacanear.

--Pode ser isso também.

Mais uma vez aproximou-se lentamente de Letícia e tentou tocá-la com as pontas dos dedos, que atravessaram sem encontrar nada no caminho.

--Enlouqueci de vez! – sentou-se desolada em sua cadeira estofada, olhando para o teto com o coração acelerado de quem repentinamente se descobre insano.

--Não é loucura, sua tonta. Só seria se eu não existisse, mas eu existo. Tá certo que não estou um pouco longe do meu corpo, mas eu juro que sou de verdade e não um delírio da sua imaginação.

--Claro. Agora que a fantasminha me disse que é de verdade, estou me sentindo bem mais aliviada.

--Quer ficar calma?

--Calma?! Já pensou que se você está aqui é porque não está mais viva?

--Não é bem assim. O conceito de vida é um pouco mais complexo do que as pessoas pensam. Neste sentido, não morri de verdade, entende? Só estou vivendo em um plano diferente, que aliás é bem legal.

--Se é tão legal assim, por que está me atormentando ao invés de se mandar de vez para... – apontou para cima – Você sabe.

--Ainda tenho uma coisa para resolver antes disso. Quero garantir que as coisas aqui no plano físico saiam de acordo com o que foi determinado pelo plano superior.

--E vai conseguir isto me azucrinando?