Fanfic: Marido e Inimigo | Tema: Vondy

Londres dormia, mas o brilho alaranjado das lâmpadas nos postes ainda mantinha a cidade toda iluminada. "De longe, a cidade parece um gigantesco acampamento militar", pensou Dulce.

Martin não falava. Ambos sentiam-se cansados. Deviam ter saído mais cedo da festa. Ele estivera animado á noite toda e, só agora, enquanto a levava para casa, é que parecia preocupado com alguma coisa.

A noite de primavera estava muito limpa e fria. Londres estendia-se à frente deles, num amontoado de telhados, chaminés e torres de fábricas. A lua crescente brilhava como uma lâmina de prata polida.

Dulce encolheu-se dentro do seu aconchegante casaco de lã.

— A festa foi gostosa.

— Foi sim.

Martin olhou para ela.

Alto, loiro, ele era uma pessoa calma e segura. Não falava muito, mas Dulce não se importava com isso, ela também não era de muita conversa. Aquele temperamento sereno e confortador era uma das qualidades dele que mais a atraíam. Só que, dessa vez, Martin estava com a testa franzida, coisa bastante incomum.

— No que está pensando? — Perguntou ela.

— Em você — ele respondeu, sorrindo.

— Em mim? — Dulce riu. — Que bom! — Mas sobre o quê, especificamente?

Martin tirou uma das mãos da direção e acariciou o joelho dela.

Dulce encolheu-se. Sabia que ele sentira novamente aquela tensão involuntária. Ficou embaraçada.

— Está vendo? — Disse Martin. — É nisso que estou pensando.

Ela fez força para não se afastar dele.

— Não somos mais crianças — continuou ele. — Há meses que saímos e nos despedimos apenas com um beijinho de boa-noite.

Dulce baixou o olhar, torcendo os dedos.

— Não posso; ainda não.

— Respeito o seu ponto de vista, querida; entendo como se sente. — Mas será que consegue imaginar como eu me sinto? — Não pode dizer que estou sendo apressado. — Sou muito paciente!

Dulce suspirou. E como.

— É verdade. — Sinto muito, mas eu... Não posso... Não consigo.

Não era a primeira vez que discutia sobre sexo, rejeitando um envolvimento mais íntimo com alguém. Alguns homens já tinham insistido com ela logo nas primeiras vezes em que saíram. Martin fora o mais paciente. Logo percebera que não valeria a pena apressar-se em levá-la para a cama. Ele era calmo, metódico, principalmente em suas relações pessoais, e sempre agia com muita cautela.

Finalmente chegaram à casa de Dulce. Martin olhou-a com receio e falou:

— Não fique aborrecida. — Sorriu, sem graça. — Não devia ter tocado no assunto esta noite.

— Estamos os dois cansados. — Mas sua atitude é muito antiquada, Dul. — As pessoas não vão recriminá-la. — Ninguém contou a você ainda? — Estamos na era da liberdade sexual.

— Cada um na sua!

Dulce sorriu.

— Vai ver que a minha é o "vamos esperar para ver".

Ele a acariciou com suavidade, no rosto.

— Você é incrível, sabia? — É verdade, Dul. — Admiro sua integridade. — Isso significa que também terei de esperar, mas valerá á pena.

Martin riu da expressão de desamparo do rosto de Dulce. Segurou-a pelo queixo e beijou-a ternamente

— Ainda estou convidado para o almoço de amanhã?

— Claro! — Ela saiu do carro. — Que tal um frango assado?

— Ótimo. — Trarei uma garrafa de vinho. — Meio dia?

— Meio dia.

Dulce ainda ficou observando o carro dobrar a esquina, antes de entrar no apartamento. Já fazia dois anos que morava ali, no andar térreo de um casarão estilo vitoriano. Gastara muito tempo e energia até deixá-lo confortável e aconchegante.