Fanfic: Estranhas Conhecidas (Portiñon) | Tema: Portiñon, AyD

Eu tinha dormido do finzinho da manhã até o começo da noite. Acordei com Lygia sacudindo o meu ombro como se a casa tivesse pegando fogo. Abri os olhos, completamente sonolenta, preguiçosa e com uma enorme obsessão de esganá-la por me acordar, mas nada fiz, apenas virei-me de lado e cobri a cabeça com o travesseiro para tentar aplacar o excesso de luz que se atirava raivosamente nos meus olhos.
- Quem mandou acender a luz? – briguei mal-humorada. Sempre acordo de mau humor, e ele sempre piora quando alguém me acorda depois de uma noite produtiva como a que eu tive – Apaga essa merda, pelo amor de Deus!
- Merda não combina com pelo amor de Deus... Já são quase nove da noite, a mamãe tá querendo falar contigo. Pediu para você ligar imediatamente – sacudiu o meu ombro novamente, queria mesmo me aborrecer, quer dizer, me despertar – Mais reclamações a seu respeito no escritório do senhor Durval – disse a queima roupa.
- O que esse velho andou dizendo, hein? – tirei o travesseiro da cara – Essa luz vai me matar. Minha cabeça tá rodando, sabia? – reclamei tentando proteger meus olhos com as mãos.
- Ninguém mandou beber desse jeito. – sentou-se ao meu lado na cama – Ele disse que você continua chegando atrasada, e que mandou um cliente à merda só porque ele não gostou do seu projeto. Não pode ser tão intolerante com as pessoas, Dul! Tem que parar com essa ideia narcisista de que só você tem razão.
- Você não sabe de nada! – levantei-me devagar, a labirintite estava gritando dentro de mim – O cara queria que eu projetasse uma casa sem colunas, sabe o que acontece com uma casa sem colunas? Ela cai! Isso é obvio para qualquer criança de 10 anos. – espreguicei-me – Mas, também... a casa era para a sogra dele, eu devia ter assinado o projeto com o carimbo bem grande do escritório do Sr. Durval.
- Você sempre age como criança, não sabe conversar com as pessoas. Quer sempre resolver tudo na marra.
- Sem sermão Srta perfeitinha!
Ela levantou-se da cama, caminhou até a saída do quarto
- O recado tá dado, Dul! – disse e abriu a porta – A propósito, a moça do pseudo Amor impossível te respondeu no site.
- Sério? Que surpresa... óbvia! – sorri debochada – Não te falei que eu sabia ser romântica? Bastava querer, mas... quando eu tiver tempo eu respondo a... Como eu te chamo mesmo? Bobinha? Suspense faz parte do meu show.
- E você é uma bestinha... – sorriu sarcástica – Eu não estaria tão segura quanto você... Na verdade, acho que a “bobinha” te dispensou em “rede internética”.
Desfiz o sorriso, mas logo voltei a sorrir, Lygia só podia estar querendo me irritar. Até hoje, mulher nenhuma havia me dispensado. Tá certo que as mulheres as quais eu saio são na maioria meninas que querem transar e nada mais, no entanto, estava fora de cogitação tomar um fora na frente da minha irmã. Eu nunca entro numa briga para perder.
- Ela só deve estar se fazendo de difícil. – sentei-me na cama, espreguicei-me novamente, mostrando-me indiferente.
- Não tá curiosa para saber o que ela escreveu? – apoiou-se na porta. Por que será que toda mundo acha que pelo fato de sermos mulher, somos atraídas por uma fofoca?
- Nem um pouco, por quê? Tá com tanta vontade assim de me falar, é? – desafiei. – desembucha então!
- Não... já que não se importa, eu não vou te tirar o prazer de ir lá no site dar uma olhadinha.
- Acha que eu vou perder meu tempo entrando naquele site? – olhei o relógio no criado mudo – Tem uma gata me esperando numa festa.
- Festa? – fechou a cara – Amanhã tem trabalho, Dulce. Vai perder o seu emprego se continuar chegando de ressaca e atrasada toda segunda-feira no escritório.
- Aquele velho é um chato!
- Aquele velho é amigo do papai. – abriu a porta, fez menção de que iria sair. – As vezes acho que ele só tolera as suas idiotices por ser amigo do nosso pai.
- Fecha essa porta! – disse e taquei uma almofada na direção dela. Lygia saiu do meu quarto. Verifiquei a porta rapidamente... Ansiosa, liguei o computador. Eu não me importava com garota do site, mas me dar um fora em “rede internética” era demais. Quem ela pensava que era? Devia ser uma garotinha solitária, sem amigos, chata, nerd... que não deve trepar há meses, ou anos, e fica sentada de frente para aquela tela de computador tocando uma enquanto sonha com a mulher perfeita. A mesma perfeição descrita naquelas histórias patéticas e surreais que postam nesses sites de gente carente.
Entrei no tal site, logo cliquei naquela história que Lygia costuma ler... Maldito Platão! Fui direto para os recados... Tinham muitos recados, desci a barra de rolagem até...
De: Amor impossível
Para: Seu amor possível
Mensagem: Não foi a mensagem que fez o seu dia ficar melhor e sim o amor que se manifesta em todas as formas e que nos contagia a cada minuto seja por um gesto ou por um simples olhar. Espero que todos os seus dias sejam melhores. Bjos do seu amor impossível...
“Beijos do seu amor impossível?” Pensei em voz alta, e foi neste instante que Lygia abriu a porta do quarto. Feito uma criança, ela ria e debochava da minha cara.
- Sabia que você não resistiria! – falou entre lágrimas e gargalhadas – Tô chorando de tanto rir. Tomou um toco! A Dul tomou um toco em “rede intenética!” – falava como... babaca. Levantei-me fazendo gestos para que ela parasse de me irritar.
- Muito feio espiar as pessoas, sabia? Isso é invasão de privacidade! – disparei a falar. Se tem uma coisa que eu odeio, é me passar por idiota - Você acha que eu não vou conseguir, é? Ainda não terminou... ela... ela... Só está querendo ser difícil, oras! – disse brava. “Zoação”da minha irmã que não sabia nada de nada eu não ia aturar.
- Pára de perturbar a menina, Dul! Ela foi gentil contigo e no final da mensagem já deixou claro que você não tem chance – apontou a tela do computador – Não sabe ler? Beijos do seu amor im-pos-sí-vel! – soletrou a última palavra.
Era uma bobagem aquela situação, eu sei! Mas eu não suportava perder, passar vergonha, me sentir menosprezada, diminuída, ou qualquer coisa que ameaçasse a minha fama de mau.
- Resolvo isso num minuto, olha... – disse e comecei a teclar com raiva:
De: Seu amor possível
Para: Amor impossível
Mensagem: Certamente, o meu dia já ficou melhor, e sabe por quê? Pelo simples fato de ter recebido a sua resposta. O amor nos contagia sim, com o olhar, os gestos e com as palavras. Pude ler nas entrelinhas das tuas, mas não consigo aceitar que um ser tão sensível quanto você (pode não acreditar, mas minha alma reconheceu a sua) desperdiçará a oportunidade de conhecer uma pessoa que fica extremamente emocionada só por ler as tuas palavras, como se existisse um imã me aproximando de ti. Ainda aguardo o seu e-mail. Bjus do seu amor ainda possível e persistente.
- Meu Deus, Dul! Você é um monstro! – colocou as mãos na boca – Deixa essa menina em paz, isso não vai dar em nada. Ela deve ter namorada e isso pode dar uma tremenda confusão. Vai que a namorada dela lê um troço desse? Vai provocar uma briga, sua delinquente!
- Que briguem e se separem. Tô me lixando pra ela, namorada e...vai que ela é uma gostosona? Eu levo pra cama depois dispenso – sorri sarcástica – Se ela for sem graça eu deixo pra você, tá legal?
- Brincar com os sentimentos das pessoas é um sacrilégio.
- Pára com esse papo careta! – puxei-a pelo braço – Sabe qual é o seu problema, Lygia? – eu adorava grudar o meu corpo daquele jeito na minha irmãzinha, desde os meus doze anos quando Lygia aceitou que eu a beijasse na boca para mostrar como era, sempre a pressionava para que pudéssemos ir um pouco mais longe, só que ela era irredutível.
- Odeio quando você me olha assim, Dul! – falou séria – Me solta, vai?
Apertei-a um pouco mais...
- Você precisa de uma mulher que te mostre como se faz sexo de verdade, sabia? – sorri, encostei minha boca no pescoço dela – Só um beijinho, vai?
Ela me empurrou, eu sorri ainda mais.
- Não tem graça, viu! Eu sou sua irmã... Será que você não respeita nem a sua própria irmã?
Continuei rindo enquanto ela, furiosa, caminhava até a porta.
- Ei! – eu disse – A gente nem é irmã de sangue. Sou adotada, esqueceu?
- Pra mim, você é sim minha irmã. - disse e fechou a porta.
“Saco!” pensei enquanto dedilhava no teclado. Suspirei olhando o relógio, já era quase nove da noite, eu tinha marcado de encontrar Deby e Jess às onze na boate. Abri o site novamente e comecei a ler aquele conto, Maldito Platão... Maldita invenção... de ter mandado um recado praquela garota que devia ser uma tremenda chata. “Amor impossível”, alguém com esse pseudônimo só pode ser um “bagulhão!”. Comecei a ler as primeiras linhas da história...
O telefone começou a tocar, eu atendi sem olhar o visor, estava mais preocupada com a tela do computador.
- Alô – disse.
- Dul, sua piranha! Onde você tá? – Deby gritava no telefone, eu detestava quando ela falava comigo como se eu lhe devesse satisfações. Só porque a gente dorme com alguém, isso não lhe da o direito de controlar a nossa vida, não é?
- Tô em casa. – respondi seca.
- Sua viadinha! Já são uma e meia da manhã. – continuou brava – A gente tá indo pra casa da Fernanda, tem festa lá, igual a de ontem, lembra? O que aconteceu contigo?
- Nada... – disse fechando a página do site que Lygia costumava ler, eu estava um pouco atônita. Não me dera conta de que o tempo havia passado tão depressa enquanto eu estava ali, tentando descobrir o que iria acontecer com a tal da Isadora e da Rafaela. - Eu... eu... – abri o tópico de recados do conto – Não vou! Tchau! – disse me livrando dela para ler a resposta de Amor impossível.