Fanfic: Um estranho Divórcio

Dulce subia as escadas para ver um apartamento em Chelsea. O anúncio classificado do jornal o descrevera como "original", e agora ela o traduzia como "velho e caindo aos pedaços". Porém, o aluguel estava dentro de suas posses e a vizinhança, embora não fosse terrivelmente "chique", parecia sossegada e segura.

Desde a noite da sessão de fotografias, ela voltara a procurar um apartamento, mais decidida do que nunca. Era imperativo que se mudasse da casa de Christopher o mais breve possível.

Poderia ter sido pior, pensou. Na manhã seguinte àquela noite, depois de uma boa noite de sono, ambos haviam voltado à normalidade, e o beijo fora quase esquecido.

Porém, o beijo acontecera e era como se algo indefinível tivesse mudado entre eles. A paixão que compartilharam naquele momento parecia estar ainda pairando no ar, pronta para explodir à primeira situação propícia. O desejo parecia estar adormecido em suas veias, esperando pelo instante em que sua mente estivesse distraída. A simples visão de Christopher, seus movimentos e atos mais corriqueiros eram um tormento para ela.

Tinha de afastar-se dele e prosseguir sua vida; estava cansada daquela tortura.

O apartamento que via, agora, ficava num pequeno edifício de tijolinhos à vista, muito antigo, mas com alguma dignidade. O pequeno hall de entrada era limpo, embora o cheiro de desinfetante a deixasse atordoada. O corretor que a acompanhava tecia elogios ao lugar:

— Pode ver que é uma pechincha — falou. — Muito espaço, janelas grandes, forro alto. E tem aquecimento, também.

Dulce tentou se concentrar nas janelas, mas tudo o que via era o carpete estragado, as paredes sujas e descascadas.

— A cozinha é por aqui — o homem indicou, sentindo a hesitação dela.

Dulce o seguiu, agradavelmente surpresa ao ver que a cozinha, embora não fosse muito bonita, era quase nova e limpa. O banheiro, no entanto, era um desastre, com azulejos quebrados e o espelho manchado. O quarto de dormir era espaçoso e tinha uma vista para o jardim da casa vizinha, e Dulce imaginou que teria uma visão agradável das flores, na primavera.

Pensou em seu próprio jardinzinho, na casa do Village. Mesmo não tendo muito cuidado com ele, sentiria sua falta, quando a primavera chegasse.

— Então, o que acha, sra. Saviñón? — o corretor perguntou.

Ela hesitou, depois sorriu e concordou com a cabeça. O apartamento precisaria de alguns reparos, mas aos poucos ela o colocaria em ordem. Com algumas cortinas, aqui e ali, um tapete... sim, iria servir.

Fez um cheque para o depósito, limpando novamente sua conta bancária. O homem entregou-lhe um formulário, que ela preencheu e lhe devolveu.

— Telefono para a senhora assim que tudo estiver aprovado. É apenas uma formalidade, a senhora entende. Afinal, sendo presidente de uma empresa... — Olhou significativamente para o casaco de peles que ela trazia dobrado no braço.

Dulce agradeceu e saiu. Pensou em tomar o metrô, mas já estava ficando escuro, por isso caminhou um pouco até encontrar um táxi. Não estava em condições de pagar um táxi, mas também não estava em condições de ser assaltada, pensou. Christopher estava em casa, quando ela chegou.

— Onde você esteve? — ele perguntou, assim que Dulce abriu a porta.

Ela o fitou, surpresa.

— Fui ver um apartamento. Por quê? Aconteceu alguma coisa? Ele suspirou e massageou a nuca, visivelmente aliviado.

— Não. Desculpe, não tive intenção de ser grosseiro, mas estava muito preocupado. Liguei para o seu escritório para lhe dizer que traria uma pizza para casa, e Annie disse que você tinha saído logo depois do almoço porque estava com dor de cabeça. Por que não disse a verdade para ela?

Dulce largou a bolsa e desabotoou seu casaco, irracionalmente satisfeita pela preocupação de Christopher.

— Annie não sabe do divórcio. Aliás, ninguém sabe.

— Por que não?