Fanfic: Um estranho Divórcio

— Enquanto tomo banho, espero que você se esqueça de minha choradeira — Dulce juntou, tentando manter a voz firme, obviamente consciente do rumo que os pensamentos dele tomavam. — Guarde um pedaço de pizza para mim — avisou, antes de sair.

Christopher respirou fundo, tentando afastar imagens dela dentro do banheiro, retirando as roupas para tomar banho. Concentrou-se no pensamento de que Dulce finalmente desabafara, permitindo que ele visse suas lágrimas e a consolasse. Estava mais calma e tranquila, agora, como se um peso tivesse sido retirado de seus ombros.

Quando ouviu parar o barulho de água no banheiro, retirou a pizza do forno e colocou-a na mesa de centro da sala. Arrumou pratos, talheres e copos e ligou a televisão, sintonizando um canal que apresentava um filme antigo, para o caso de não precisarem conversar, se Dulce não estivesse disposta.

Ela saiu do banheiro alguns minutos depois, enrolada num robe felpudo. Os cabelos estavam presos descuidadamente, e o rosto, limpo, a pele, fresca e rosada. Embora gostasse de vê-la arrumada, Christopher a achou mais atraente que nunca.

— Que filme é esse? — ela perguntou, sentando-se no chão, a uma distância segura dele.

— Não sei, acabei de ligar. Mas é com Cary Grant.

— Que bom! Espero que seja uma comédia bem bobinha. É tudo do que eu preciso. — Serviu-se de pizza, parecendo tranquila e relaxada pela primeira vez, desde que voltara da Europa. Novamente Christopher congratulou-se por ter agido da maneira correta.

Ficaram em silêncio, comendo e vendo tevê, num clima calmo e sossegado.

— Então, o apartamento é muito ruim? — ele perguntou casualmente, no intervalo comercial.

— Não é nenhum palácio — ela respondeu. — Mas também não é um barraco. Em todo caso, vou ficar ali apenas alguns meses, até acertar minhas finanças.

Christopher estremecia só de pensar em Dulce vivendo num lugar pouco apropriado.

— Na minha opinião, você deveria esperar um pouco mais — falou, cauteloso. — Pode aparecer alguma coisa melhor.

— Não. Acho que este é o melhor que posso conseguir, levando-se em conta o que posso pagar de aluguel. Assim que a imobiliária autorizar, eu me mudo.

Deram-se boa noite assim que o filme terminou e seguiram para seus quartos separados. Christopher permaneceu acordado durante um longo tempo, tentando imaginar como poderia ajudá-la, pois sabia que ela não aceitaria sua interferência nas decisões que acabara de tomar.

Porém, não poderia permitir que Dulce se mudasse para um apartamento que, além de desconfortável, não oferecia a menor segurança.

Quando finalmente adormeceu, já havia formulado um plano.

Na manhã seguinte, acordou antes de Dulce. Depois de tomar banho e se vestir, fez o café e foi até à sala, onde ela deixara o casaco e a bolsa. Não estava bem certo se teria coragem de mexer em seus pertences, e por duas vezes pegou e largou a bolsa, incerto.

Quando estava prestes a desistir da ideia, viu uma folha de jornal dobrada, saindo do bolso do casaco. Pôde ver um anúncio com um círculo vermelho em volta e, aproximando-se, conseguiu ler o que estava escrito, sem precisar sequer tocar no casaco. Então era este o apartamento que ela vira?, pensou, atônito. Ficava num dos piores bairros da cidade!

Memorizou o número do telefone da imobiliária e tomou um rápido café, antes que Dulce surgisse na cozinha, pronta para sair.

— O café está pronto — ele ofereceu, vestindo a jaqueta e preparando-se para sair. — Preciso ir, agora.

Dulce dirigiu-lhe um olhar intrigado.

— Pensei que era uma regra em sua vida evitar compromissos logo cedo — falou.

— É verdade. Mas, às vezes, algumas responsabilidades são inevitáveis — ele explicou, sem fitá-la. Não era um mentiroso muito bom e não queria dar-lhe a oportunidade de fazer mais perguntas.

O estúdio estava às escuras, quanto Christopher chegou. Acendeu as luzes e foi para o escritório que dividia com Peg, pegando o telefone antes mesmo de sentar. Discou o número que havia memorizado do recorte de jornal.

— Estou ligando sobre o apartamento anunciado — informou quando o homem atendeu.

— Sinto muito, já foi alugado.

— Eu sei — Christopher falou rapidamente, antes que o corretor desligasse. — Foi a sra. Dulce Saviñón quem o alugou.

Houve um silêncio. Depois, relutante, o homem indagou:

— Quem é que está falando? ,

Christopher não sabia exatamente como responder, mas acabou decidindo que era melhor falar a verdade:

— Aqui é o ex-marido dela.

— Bem, se é o ex-marido, por que se incomoda se ela vai alugar ou não o apartamento? Se pretende criar algum problema, eu...

— Não é nada disso — Christopher o interrompeu. — Acontece que gostaria que ela encontrasse um lugar melhor para morar.

— Como assim, melhor! — O corretor parecia ofendido. — Escute aqui, meu senhor, nós só administramos imóveis de qualidade. Nada de prostitutas, nem drogados, ou...

— Não foi isso que eu quis dizer — Christopher tentou reparar seu erro. — É que Dulce é uma senhora de classe, entende? E pertence a um lugar mais... — interrompeu-se, antes que pudesse dizer mais algum insulto involuntário.

— E o que quer que eu faça? Ela já pagou o depósito— e, se o formulário que preencheu for aprovado, ela fica com o apartamento.

— Pois eu lhe pago o dobro do depósito se o senhor desfizer o negócio — Christopher propôs.

— O quê? O senhor é algum maluco?

— Eu lhe mando o dinheiro hoje mesmo. Apenas diga a ela que o formulário não foi aprovado porque ela está sem crédito — ele acrescentou. — Na verdade, nem estará mentindo, pois ela está mesmo mal de finanças.

Mais uma pausa silenciosa.

— Quer dizer que o senhor vai me pagar o dobro do depósito para que eu alugue o apartamento para outra pessoa. Certo?

— Exatamente.

A hesitação do corretor desapareceu completamente:

— Está certo. Faça um cheque em nome de Fred Campbell — instruiu.

Combinaram o valor e, minutos depois, Christopher fez um cheque e enviou-o por um mensageiro. Felizmente os negócios na agência andavam bem e ele podia se permitir aquele impulso.