Fanfic: A Dama e o Guerreiro - AyA | Tema: AyA (adaptada)

Capítulo I

Véspera do novo século, 1301, 1302

— Maldição! É um navio pirata! — o capitão Abraham exclamou, franzindo o cenho enrugado e esfregando nervosamente as mãos. — Eles estão navegando a toda velocidade que os ventos permitem. Precisamos ser mais rápidos do que esses bastardos! Vamos, homens. Mexam-se!

Era óbvio que apesar de ser um velho lobo-do-mar, o capitão estava muito tenso e preocupado. A ordem aos marujos fora dada em tom imperioso, mas isso não conseguia disfarçar o terror que permeava a voz de falsete do comandante.

Naquele momento, lady Anahí de Clarin, de Yorkshire na Inglaterra, estava em pé na proa do navio, deixando que as gotículas de água salgada lhe beijassem a pele alva enquanto o vento soprava por entre as madeixas reluzentes de seus cabelos. Por uma fração de segundo, ela franziu o cenho, tentando compreender o que o comentário do capitão poderia, realmente, significar para um navio do porte daquele em que estavam viajando. Afinal, fora ela a primeira a avistar a estranha embarcação que se aproximava do navio de bandeira inglesa.

— Um navio pirata — Anahí repetiu mais para si mesma do que para qualquer outra pessoa. Não estava muito certa se acreditava no que o capitão dizia. Claro que já ouvira muitas histórias sobre homens que estariam dispostos a arriscar a vida em alto-mar apenas para fazer fortuna ou aumentar a que já possuíam, mas não sabia quanto dessas histórias era verdade ou apenas lendas. O fato era que a época em que os vikings haviam dominado os mares com seus saques e conquistas há muito ficara para trás. Poucos, ou melhor dizendo, só os loucos se atreveriam a praticar pirataria tão próximo da costa da Inglaterra, pois, se fossem capturados, certamente seriam condenados à morte. O rei Eduardo I era impiedoso com aquele tipo de crime, e não hesitava em mandar decapitar piratas e saqueadores.

— Piratas à vista! — voltou a gritar o capitão Abraham, antes de filar lady Anahí com expressão grave. — E a senhora, milady, por favor, desça para minha cabine. Não pode ficar aqui. E muito perigoso.

— Capitão Abraham, se os piratas tomarem este navio, não estarei segura mesmo se me esconder em sua cabine ou em qualquer outro lugar — respondeu ela com certo descaso.

— Pois saiba, lady Anahí, que não pretendo permitir que piratas assumam o comando de uma embarcação que está sob minha responsabilidade.

— Ah, caro capitão, pretender é algo que não quer dizer muita coisa em algumas ocasiões.

— Eu lutarei até a morte! — exclamou o capitão, indignado.

— Não duvido disso, senhor.

O velho capitão deu um longo suspiro, pois sabia que estava falando com uma jovem que já tinha visto muitas atrocidades, apesar de sua curta existência.

— Lady Anahí, a senhora pode morrer se cair nas mãos de um destes bandidos. Aqueles que ousam se aventurar em uma vida errante pelos mares não têm a menor noção de cavalheirismo e muito menos sabem o que é o mundo civilizado.

“Ah, o mundo civilizado!”, Anahí teve vontade de rir diante de tais palavras. Em seu modo de ver, o mundo civilizado não existia, era uma mera invenção da mente humana para se reconfortar diante das dificuldades da vida. E era justamente por causa dessa pretensa civilidade que ela agora estava a caminho da França.

— Talvez não seja um navio pirata, capitão — tentou argumentar. — Pode ser um de meus primos que deseja dar um adeus de última hora antes de entrarmos em águas francesas.

— Não se engane, milady. Conheço aquele navio — o capitão Abraham insistiu. — É uma nau pirata. Pertence a Thomas de Longueville, um dos piratas mais sanguinários de nosso tempo, e não quero que nada de mau lhe aconteça, senhora.

Bem, pior do que já acontecera seria impossível, concluiu Anahí, pensando que só o fato de estar a caminho da França para se casar com um homem que tinha idade para ser seu avô já era algo cruel demais. No entanto, não ousou dar voz a seus pensamentos, pois aquele era um assunto de família.

— Capitão, não se esqueça de que já passei por muitas situações perigosas em minha vida. Até mesmo lutei contra os piores inimigos de meu povo. Estava na propriedade de meu pai quando os selvagens escoceses liderados por William Wallace atearam fogo a um celeiro, com trinta homens dentro. Fui eu que comandei os homens de meu pai na luta contra o inimigo.

O velho capitão não parecia estar gostando do que ouvia.

— Sim, senhora, seus compatriotas a veneram como a uma santa heroína. Sei também que os homens da Casa de York a seguiram na batalha de Falkirk, mas aqui é diferente. Estamos em pleno mar aberto, milady. Tenha um pouco de juízo, a senhora poderá morrer se um mastro for cortado pelos piratas e cair-lhe sobre a cabeça. Agora, por favor, chame sua criada e vá se refugiar em minha cabine.

— Capitão, com todo respeito, eu...

— Menina, pelo amor de Deus! — empertigou-se o velho lobo-do-mar. — Será que não tem ninguém neste mundo capaz de colocar um pouco de juízo em sua cabeça?

Pela primeira vez, desde que ouvira o capitão mencionar a palavra “pirata”, Anahí sentiu-se realmente preocupada.