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Parte IV

— Muito doente? — Dulce repetiu.
— Sim, muito. Ela tem noventa e dois anos e já sofreu dois derrames. Não lhe resta muito tempo.
Ao perceber a sombra que se abateu sobre o semblante geralmente frio, Dulce deu-se conta de que Christopher amava muito a avó e sentiria muita falta dela, quando ela morresse. Não pôde evitar a onda de simpatia que a invadiu.
— Portanto, não tenho tempo para testar alternativas —admitiu. — Ter conhecido você foi um grande golpe de sorte, que eu não podia deixar passar. Como já disse, costumo obedecer os meus instintos. E eles me dizem que nós três iremos formar um bom time. Quando minha avó já não tiver entre nós, você poderá me deixar quando quiser.
A proposta não envolvia sentimentos.
— Mais parece um emprego temporário — Dulce comentou.
— Para você, sim — ele concordou. — Mas, para Maite, será diferente. Ela será minha filha em todos os sentidos possíveis. Eu a quero, Dulce... Preciso dela.
— Acha que será capaz de amá-la?

— Sim, como se fosse minha própria filha, pelo resto de minha vida — ele jurou.
E a sinceridade daquelas palavras era visível na determinação daquele olhar.
Dulce descobriu-se a desejar que alguém a quisesse com mesmo ardor.
— E, quando eu decidir deixá-lo, o que vai acontecer com Maite? — ela perguntou.
— Ela ficará com você — Christopher respondeu, após um instante de hesitação. — Desde que você respeite meus direitos de pai, chegaremos a um acordo que atenda às necessidades de ambos, no que diz respeito a ela. Pelo bem de Maite, esta será a sua maior chance na vida, não acha?
Pelo bem de Maite, Dulce repetiu em silêncio, sabendo exatamente onde ouvira isso antes. Embora não a agradassem as sensações desagradáveis com relação à proposta de Christopher, Dulce tivera uma vida de conforto e privilégios, antes de experimentar a pobreza e a dificuldade... e sabia em que lado preferia estar.
— Muito bem — falou por fim. — Aceito sua oferta. Pelo bem de Maite.
— Obrigado —Christopher murmurou. — Prometo, Dulce, que jamais terá motivo para se arrepender de sua decisão.
No entanto, ela já estava arrependida na manhã seguinte, quando desceu a escada, determinada a informá-lo que mudara de idéia. Infelizmente, descobriu que ele havia utilizado mais uma de suas táticas infalíveis, viajando a negócios por uma semana.
Enquanto isso, Maite desabrochava como uma flor rara, em meio aos cuidados e carinho que Lefka e Althea lhe dispensavam. Dulce nem sequer a ouviu chorar!
O que a magoou um bocado, pois enquanto fora cuidada apenas por Dulce, Maite praticamente não parara de chorar desde a morte da mãe.

Porém, a mágoa maior vinha do fato de sua tia não ter sequer tentado entrar em contato com ela. Dulce não sabia se isso se devia à indiferença de Laura, ou a ordens de Christopher. Mas, conhecendo a tia tão bem, sabia que se ela quisesse saber das sobrinhas, teria encontrado um meio mesmo que para isso tivesse de desafiar o patrão.
A medida que a semana foi passado, o corpo de Dulce foi se curando. O galo na testa desapareceu e os hematomas começaram a se dissipar. Até mesmo seu orgulho ferido cedeu lugar à aceitação, pois ela sabia que jamais seria capaz de negar a Maite a oportunidade de uma vida tão privilegiada.