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Parte II

Como se fosse atingida pela tensão que os dois emanavam, Maite despertou sobressaltada e emitiu um pequeno protesto. Dulce correu para ela, levada por seus instintos maternais, mas sua presença não foi necessária. Ao baixar os olhos para o bebê, toda a frieza se dissipou no semblante de Christopher, que tocou de leve o rostinho de Maite, fitando-a com profunda ternura. O que realmente apanhou Dulce de surpresa foi o sorriso doce que a menina exibiu, deixando claro que já o reconhecia.
— Ei! — queixou-se por cima do braço de Christopher. —Esses sorrisos deveriam ser dirigidos somente para mim!
Ao ouvir a voz da irmã, Maite procurou e, ao encontrá-la, fixou os olhos nos dela, alargando o sorriso.
— Agora, sim, está melhor! — Dulce elogiou, também indo.
Estava tão distraída com o bebê, que nem se deu conta que havia colado o corpo ao de Christopher, a fim de monopolizar a atenção da menina. Assim, também não percebeu que ele ficou petrificado pelo contato, fixando o olhar enigmático nos cabelos dourados dela.
— Que cena tocante! — declarou uma voz sofisticada, porém sarcástica. — Gostaria de ter uma máquina fotográfica para registrar este momento para a posteridade. Então, és poderiam pendurar a foto na parede, como um exemplo perfeita harmonia familiar.

Os dois ergueram os olhos, mas suas expressões foram muito diferentes. Dulce demonstrou surpresa pelo ataque inesperado, enquanto Christopher pareceu simplesmente resignado.
— É um prazer revê-la, Fuzz— ele cumprimentou.
Porém, não havia o menor toque de prazer em suas palavras, assim como parecia não haver nada de positivo envolvendo Fuzz. Dulce estremeceu, observando a outra aproximar-se.
Era uma mulher muito bonita. Os cabelos loiros-platinados postura do corpo esbelto envolto em seda transpiravam dinheiro, classe e autoconfiança. O que mais impressionava a eram os olhos, de um cinza quase prateado, ainda mais que os de Christopher.
Sentindo-se intimidada, Dulce aceitou de bom grado o braço forte que lhe circundou a cintura, em um gesto protetor. Ao mesmo tempo, pôs-se a especular quem seria aquela mulher, rezando para que ela não morasse naquela casa.
— Dulce, esta é minha cunhada, Fuzz Markopoulou - Christopher apresentou-a.
Cunhada? Ora, ele havia se declarado único neto de uma avó moribunda!
— Sua cunhada viúva — Fuzz corrigiu-o, esclarecendo a dúvida silenciosa de Dulce. — Fico feliz por ser a primeira pessoa a lhe dar as boas-vindas — dirigiu-se à recém-chegada, que não gostou do tom falso da declaração.
— Obrigada — Dulce replicou em tom gentil.
Fuzz estendeu-lhe a mão, mas logo deu-se conta do gesso, ao qual Dulce sentiu-se grata, pois assim não teria de tocar a criatura gelada à sua frente.
— Ah, você se machucou! — disse, levemente sarcástica

— Foi um pequeno acidente — Dulce explicou em toa vago. — Portanto, receio não poder apertar sua mão.
Mais uma vez, Maite pareceu afetada pela tensão a sua volta, e emitiu outro gritinho de protesto. Imediatamente, os olhos de Fuzz fixaram-se no bebê e algo em seu semblante alterou-se.
— Ela se parece com você, Christopher — comentou em tom casual.
— É minha filha — ele disse. — O que mais você esperava?
Em vez de responder, Fuzz voltou a fixar os olhos em Dulce, retomando a máscara de frieza. Então, pediu licença e afastou-se, desaparecendo por um caminho que circundava a casa.
— Meu Deus! — Dulce exclamou, aliviada — Por que um clima tão tenso?
Christopher emitiu uma risada cínica.
— Você acaba de conhecer a noiva que minha família havia escolhido para mim — informou.
— A esposa de seu irmão falecido? — ela indagou, chocada.
Seus olhos encontraram os dele e, no mesmo instante, seu corpo foi percorrido por algo parecido a uma corrente elétrica. Aparentemente despercebido das reações de Dulce, Christopher explicou:
— Miguel era bem mais velho que eu. Minha família acredita que devo algo à viúva dele, por ter me tornado herdeiro de tudo, depois da morte dele.
— Ora, mas essa noção é um tanto arcaica! Quando seu irmão morreu?
Dulce reconheceu de pronto a sombra da dor no semblante dele.

Bem, Christopher perdera a esposa seis anos antes e o irmão, recentemente.
— Sinto muito — Dulce murmurou.
— Eu também. Sinto muita falta dele.
— Sei exatamente o que sente. As vezes, nós nos viramos para falar com aquela pessoa e, então, somos tomados pelo terrível sentimento de vazio, e nos lembramos...
Algo se alterou na expressão de Christopher, fazendo Dulce calar, já à espera de uma de suas explosões. Por isso, estava totalmente despreparada para o que aconteceu: ele inclinou e beijou-a.