Fanfic: Leis do Destino | Tema: Portinon

Na capela do hospital, Dulce se recolheu buscando uma decisão sábia sobre como proceder com seus amigos e sua namorada. Não rezava, não era adepta a rituais, nem ao menos sabia se acreditava em uma figura sobrenatural, divina. Sentou-se ali com o único intuito de se refugiar e chorar sem que precisasse dar explicações.

Notou alguém se sentar ao seu lado, e reconheceu a psicóloga que lhe avisara sobre a liberação para visitar Anahi. Enxugou as lágrimas, tímida deu um sorriso discreto para Angelique que cochichou:

-- Não precisa ficar com vergonha, eu também venho aqui para chorar.

Dulce sorriu.

-- Não quis entrar para visitar sua amiga?

-- Entrei, mas não demorei como a senhora recomendou.

--Anahi vai precisar muito dos amigos para enfrentar esse trauma...

-- Eu sei...

-- Vai precisar de carinho, segurança, paciência, precisa se sentir à vontade para chorar, para desabafar.

-- Ela terá isso dos amigos, mas a senhora também vai ajudar não é?

-- Claro, a ajuda profissional é muito importante. Mas, não estarei sempre ao lado dela, até agora ela não falou uma palavra sobre o que aconteceu, vai levar um tempo ainda...

-- Entendo. Ajudarei como puder doutora...?

-- Angelique e você seria...? – a psicóloga completou se apresentando.

-- Dulce, mas sem o doutora.

Dulce estendeu a mão sorrindo.

-- Muito prazer Dulce. … bom saber que Anahi pode contar com você. 

Angelique se levantou depois de se despedir formalmente, mas, antes de deixar a capela disse:

-- Ah! Dulce! Seus amigos já foram, se você quiser passar a noite com sua amiga acompanhando-a... Ela está sozinha na enfermaria por recomendação médica, mas, ela precisa de acompanhante.

Angelique sorriu cúmplice para Dulce, como se adivinhasse o que se passava. 

Se a psicóloga foi um sinal dos céus para mostrar um caminho para Dulce, isso a ruivinha não tinha certeza, mas, lhe deu o sinal verde que precisava para ficar ao lado de sua namorada, como ela desejava.

Entrou no quarto e encontrou Anahi dormindo, com sua fragilidade exposta nas marcas, curativos espalhados. Em um relance, Dulce viu o beijo entre ela e Pedro, e a declaração dele ecoava por sua mente. Entretanto, o que foi mais forte diante de Anahi, foi o sentimento sufocante de perda que Dulce experimentara. Não queria, não podia perder Anahi, diante da namorada, enxergou tudo tão claramente: estava apaixonada, mais que isso, sentia por ela o que sempre duvidou que existisse com a intensidade, dramaticidade e magia que escritores, poetas e músicos descreviam. Apavorou-se por ter a ideia da dimensão do que sentia por Anahi e mais ainda, imaginando sua reação se acontecesse algo pior a ela.

Puxou uma cadeira para perto do leito, segurou a mão machucada de Anahi e chorou copiosamente, permitiu-se desabar finalmente, por um emaranhado de sentimentos confusos: medo, alívio, paixão, temor, revolta, carinho, angústia. Seu pranto persistiu até suas energias se esgotarem, dormiu ali mesmo, sentada, com seu rosto colado com a mão de Anahi.
**********

Anahi acordou se certificando que continuava no hospital olhou para seu braço direito, com um acesso venoso instalado, estranhou sua mão esquerda presa e ao olhar se deparou com Dulce com metade do corpo repousando sobre o leito, sobre sua mão.

Mesmo ressentida por Dulce supostamente tê-la deixado com Pedro na noite anterior, Anahi abriu um sorriso sincero, tenro. Mexeu sua mão despertando o leve sono da namorada.

-- Any? Faz tempo que você acordou?

-- Não, acabei de acordar...

Dulce fez uma careta de dor ao se levantar.

-- Como você está se sentindo? – Perguntou a Anahi.

-- Acho que com menos dor do que você...

Dulce ajeitava os cabelos disfarçando sua desconfiança, temendo a mágoa de Anahi.

-- Vou procurar a enfermeira, seu soro acabou... 

-- Dulce! Você está fugindo de mim?

-- Por quê? Deveria?

-- Claro que não... Já fugiu ontem não é? Agora de novo...

-- Não fugi Any... 

-- Então vem cá, senta perto de mim...

Anahi expôs sua vulnerabilidade, com lágrimas nos olhos chamou Dulce como se procurasse proteção do carinho de sua namorada. Dulce não pestanejou, lançou-se sobre a cama, acolhendo a namorada em um abraço apertado, consolando-a, transmitindo todo carinho e segurança que seu sentimento por ela era capaz de proporcionar.

-- Eu vou cuidar de você, não vou sair do seu lado, te prometo... Não serei covarde.

Dulce repetia enquanto beijava a cabeça de Anahi recostada no seu peito. A promessa não era só para Anahi, era principalmente a verbalização da decisão que Dulce tomara, no momento em que encarou os olhos marejados da namorada a chamando para sentar perto dela.

-- Foi um pesadelo Dul...

-- Eu imagino minha linda... Mas, você não está sozinha, estou com você, ele não te fará mal!

O momento de carinho e conforto entre o casal foi interrompido por Angelique que delicadamente disse:

-- Acho que o Dr. Miranda não vai gostar muito de ver duas pessoas no mesmo leito, diria que é um absurdo a Comissão de Controle de Infecção Hospitalar não fiscalizar os quartos logo cedo...

Dulce se levantou tímida.

-- Desculpe-me doutora Angelique

-- Vocês se conhecem? – Anahi perguntou intrigada.

-- Somos colegas de fé por assim dizer não é Dulce?

Dulce acenou em acordo, enquanto Anahi arqueava uma das sombracelhas insatisfeita com a resposta misteriosa. 

-- Resolvi passar cedo aqui, por que sabia que o Dr. Miranda lhe daria alta ao sair do plantão, então, vim te entregar meu cartão, atendo aqui no ambulatório, se você quiser conversar, liga pra marcar horário, você pode precisar uma hora dessas.

Enquanto Angelique orientava Anahi o médico que a atendeu entrou no quarto comunicando sua alta. Ouviram as recomendações do médico atentamente, Dulce se comprometeu a cuidar de Anahi e convencê-la a ingressar na terapia com Angelique. Antes de se despedir, a psicóloga chamou Dulce em particular e alertou:

-- Os primeiros dias serão complicados Dulce, possivelmente Anahi terá pesadelos, pode ter dificuldades em contar o que aconteceu, vai evitar contato com outras pessoas... O médico prescreveu um ansiolítico, mas, o mais importante é que Anahi se sinta segura, não se sinta pressionada, se puder evitar encontros com esse agressor, na delegacia, por exemplo, é fundamental.

-- Pode deixar doutora, vou me assegurar disso. Obrigada por tudo.

-- Fique você também com meu cartão, caso você precise de outras orientações.

-- Obrigada.

Anahi observava atenta a intimidade das duas, visivelmente incomodada.

-- Vamos pra casa? – Dulce ajudou Anahi a se levantar.

-- Vamos! Antes que você paquere as enfermeiras desse turno.

-- Não acredito que você está com esse bico por puro ciúme Any!

-- De onde veio essa amizade de infância com essa psicóloga?

-- Ela me encontrou na capela do hospital e me trouxe pra você sua boba!

Anahi sorriu sem graça.

-- Agora vamos, antes que seus admiradores e heróis cheguem.