Fanfic: Noite de Abril ♥

"Noite - aBRIL"

A convivência se tornou estranha a partir do momento em que aquele vizinho estranho e extremamente reservado passou a ouvir a minha música. E isso se tornou constante há uns quatro anos atrás. De início não notei, não dei bola, até porque eu já conhecia a música e conhecia seu compositor. Velho – e bêbado – amigo de bar. Mas, era curioso o fato de ele sempre ouvir com a versão alternativa.

Podia não ser motivo suficiente para que eu ficasse horas em claro durante as noites, sozinha, pensando o motivo para o qual aquele vizinho insistia em ouvir aquela música. Justamente a minha música. Era estranho. Eu fumava longos cigarros e tomava amargos cafés. Mas, de qualquer forma, nem as duas coisas que eu costumava usar como coringas nas horas de dúvida estavam me acalmando.

Eu jamais havia me preocupado tanto assim com alguém. Era uma sensação nova, e eu já não estava gostando nada daquilo. Afinal, quem era eu naquele momento? Eu não reconhecia a mim mesma com todos aqueles pensamentos que invadiam minha cabeça. E era tão fraco. Era apenas uma música, música que qualquer pessoa podia conhecer e gostar. Mas, justamente um cara estranho que mora do outro lado da parede do meu quarto? Certamente uma coincidência bem engraçada, mas que já estava me fazendo ter vontade de bater à sua porta e perguntar se conhecia quem a cantava.

Na verdade, o que me intrigava não era simplesmente o fato desse vizinho estranho ouvir a música. O estranho era sua fixação – assim como a minha – de ouvir com aquela versão. Embora costumasse ouvi-la nos bares e pubs que costumava ir, ultimamente, a música tocava demais no apartamento ao lado. Sei lá qual seu nome, mas esse cara ouvia a música, no mínimo, umas 18 vezes por dia. E sempre em horários em que eu me sentava na sacada para fumar ou quando ligava o chuveiro para tomar banho. Poucas foram as vezes que o flagrei ouvindo a música ao chegar em casa

Parecia que me esperava chegar. Era perturbador achar que ele parecia querer, mesmo, causar alguma reação em mim. Mas também tinha medo de parecer invasiva ou até mesmo psicótica ao ir até sua porta e lhe falar sobre os diversos pensamentos que tive durante esses quatro anos em que tenho percebido sua presença. O estranho mesmo era imaginar que ele poderia estar ali há anos. Poderia ter vivido sua vida inteira trancado naquele apartamento, e sua presença só foi notada por mim há míseros quatro anos. Embora minha mudança para o 222 já completasse seus cinco anos. Durante um ano havia ficado ali, escondido, imóvel.