Fanfics Brasil - Capítulo 38 O amor e um anjo ~

Fanfic: O amor e um anjo ~


Capítulo: Capítulo 38

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 Ablon narrando


 Estava deitado com ela tentando dormir mas, não conseguia, minha mente estava cheia demais. 


Levantei com cuidado para não acordá-la e fui até ao escritório pegar alguns pergaminhos antigos, voltei e me sentei na poltrona que tinha ali, comecei a ler apenas com a luz de um abajur.


 Depois de um longo tempo senti uma sensação estranha e meus sentidos se aguçaram, deixei os pergaminhos de lado me aproximando da janela, a chuva estava forte e na janela haviam vários caminhos de água. 


 


Vick narrando


Acordei e ainda chovia, Ablon estava em pé, em silencio, colado na janela, examinando com o olhar a quietude da rua, os postes de luz, o telhado dos prédios. 


Estava com uma expressão afiada, de águia no ninho e de repente eu temi o pior. 


Vick: O que houve ? - perguntei em um sussurro - 


Ablon: Shhhhhh... - sinalizou, indicando que eu não fizesse barulho - 


Meu sangue gelou ante a suposta ameaça.


 Passaram-se três minutos, até que Ablon relaxou a postura, afastando-se da vidraça. 


Agia como se estivesse captado um falso alarme.


A tensão se dissolveu e eu perguntei novamente. 


Vick: O que aconteceu ? 


Ablon: Nada. Está tudo bem. Eu só tive a impressão de que.. Só achei que...


 Vick: O que ? - o cortei -


 Ablon: Nada. Não há nada. Volte a dormir. 


Insisti mais um pouco.


 Vick: Talvez um anjo caçador ou um demônio vingativo ? - usei um tom descontraído para esconder de mim mesma o nervosismo - 


Ablon: Não. Se alguma entidade estivesse por perto, eu já teria percebido as vibrações de sua aura. 


Minhas pálpebras pesavam, se não estivesse tão cansada, teria voltado ao assunto. 


Vick: Venha se deitar comigo então - disse sonolenta -


 Ele olhou mais uma vez para a janela e se aproximou da cama, deitando e me puxando para o seu peito. 


O letargo me dominou, então dormi tranquilamente e não voltei a acordar.


 


O ritual de proteção 


Shamira passou toda a manha lançando encantos invisíveis e executando pequenos rituais no interior do apartamento de Ablon. O objetivo era converter o comodo que ela escolhera, em um santuário. 


Um santuário, pelo o que eles me explicaram, é por definição, uma área delimitada no plano físico onde o tecido da realidade é muito fino, quase nulo. A suavidade da membrana, em um santuário, permite que ela rasgue mais facilmente, e o resultado prático disso é que os efeitos sobrenaturais, no ponto afetado, são produzidos com muito mais eficácia.


 Há muitas maneiras de criar um santuário. Cada tradição mágica, seita ou religião tem os próprios métodos para isso. A trilha da necromancia, em particular, vale-se de objetos místicos e fórmulas mágicas para remodelar o tecido. Os encantamentos preliminares estavam contidos em um livro muito antigo, com capa de couro e folhas de papiro, denominado Grimório de Nappur.Um preparado lodoso, especial, é usado para delimitar a câmara escolhida – que ali se estendia da porta a janela. 


A intenção de Shamira ao criar ali um santuário visava preparar o comodo para a realização de um ritual realmente poderoso. Teria que ser forte o bastante para proteger Ablon no inferno, pois os demônios raramente são enganados por truques baratos. A execução a deixaria exausta e incapaz de usar suas habilidades misticas por um dia inteiro, mas seria por uma boa causa. A Feiticeira concluiu as preparações no fim da tarde. 


Descansou um pouco e se satisfez com a comida chinesa que pedira. Enquanto isso, eu comia apenas um miojo que tinha feito, Ablon a acompanhava comendo aquela comida na caixinha, argh.


Os dois começaram a conversar sobre muitas coisas, inclusive sobre suas viagens ao Oriente, e Shamira disse que lembrava o sabor da autentica comida chinesa, da época dos mandarins, muito diferente do macarrão oleoso que comia agora. 


Vick: Quando vão começar a cerimonia ? - perguntei enquanto recolhia os restos do jantar - 


Shamira: Vamos esperar pela noite. É nessas horas que o mundo espiritual está mais acessível. E ainda preciso terminar os detalhes.


 Depois que Ablon levou o lixo para fora, os dois afastaram a escrivaninha e as estantes maiores, criando uma área limpa, um grande espaço vazio. Shamira desenhou um pentagrama, uma estrela de cinco pontas, usando um barro avermelhado antiquíssimo, como ela dissera, cuja terra pertencera ao solo de Enoque. A argila, somente, já era carregada de misticismo, em virtude de sua origem lendária. O pentagrama foi rodeado por inscrições. 


Em quatro das cinco pontas, ela posicionou recipientes de cerâmica contendo porções intimas dos elementos naturais um deles estava cheio de terra, o segundo continha água, do terceiro emanava fogo, e o quarto deixava escapar uma fumaça branca. Na quinta ponta, a superior, ela fixou um punhal, dissera que era sua adaga especial de encantamento.


O palco estava pronto. O Sol havia morrido, obscurecendo as ruas. O céu estava limpo, sem nuvens, e agora era o brilho da Lua cheia, que tingia a vidraça, desenhando formas prateadas no chão.


 Shamira: Estamos com sorte – avisou - É uma noite agitada no mundo espiritual. Acho que vamos conseguir completar o ritual com sucesso. Está preparado ? - se dirigiu a Ablon - 


Ablon: Sem problema – replicou - 


Ela pôs de lado suas roupas modernas e vestiu uma túnica simples, de um só corte. Era feita de algodão cru e tinha aparência antiga, mas estava conservada. Em um dos braços apoiava o grimório, e com a outra mão gesticulava os dedos. 


Shamira: O que vamos fazer aqui é tentar invocar dois espíritos maiores. O poder dessas entidades é grande, comparável mesmo a potencia dos celestiais. Uma vez invocados, teremos que barganhar um pouco da essência deles, e com ela energizarei o punhal – e apontou para a faca deitada no pavimento - Só então poderei completar o feitiço.


 Vick: Você acha que vai ser fácil convencê-los a entregar sua essência ? - quis saber, já que depois disso, permaneceria em silencio -


Shamira: Nunca é fácil. Esses espíritos são muito antigos e com o tempo vão ficando mais arrogantes. Mas já tenho alguma experiencia com eles. 


Ablon: Você é modesta - comentou – O que devo fazer ? 


Shamira: Nada, pelo menos até que eu diga o contrário. Por enquanto, observe, apenas. 


Ablon acedeu com a cabeça e a feiticeira começou a lançar um feitiço. 


Repetiu, em voz alta, a série de runas misticas contidas no livro. 


ShamiraMer Sidi ! Mer Kurra ! Mer Urulu ! Mer Martu ! Zi Dingir  Anna Kanpa !


A entonação era estranha e não se assemelhava a nenhuma linguagem conhecida pela humanidade. Só podia fazer parte de um código mágico, um idioma oculto pronunciado apenas pelos feiticeiros.


Sai do comodo e deixei com que eles fizessem o que tinham que fazer, fui para o quarto de Ablon e fiquei lá, deitada, encarando o teto e esperando. 


 


Ablon narrando 


A medida que a canção prosseguia, Shamira começou a suar. Foi então que algo estranho aconteceu. 


O brilho da Lua, que cortava a janela, foi sumindo aos poucos, até tudo lá fora ser dominado pela mais completa escuridão, um breu terrível, comparável a negritude cósmica.


 Ablon: O que está acontecendo ? 


Shamira: Uma transferência momentânea para o plano etéreo. Eu estou abrindo a passagem pelos quaro portões. Nós, justamente com este comodo, estamos agora atravessando a fronteira da realidade. 


Um frio fantasmagórico inundou o apartamento. Não se via mais nada através da vidraça: os prédios, a lua, os postes de iluminação de calçada... nada, apenas trevas. Era como se o salão tivesse sido atirado aos confins do espaço, inóspito e longínquo. 


Agora, a única fonte de claridade provinha da tigela com fogo, que ardia numa das pontas do desenho em estrela. Parou o recital, descansou a cabeça e deitou o pesado tomo de lado, sobe uma caixa comum. 


O silencio era absoluto, mas não durou muito tempo. Escutei um barulho de madeira quebrando. De repente, as tabuas do chão se arquearam para fora. 


Uma criatura de odor repugnante forçava o chão para sair, destruindo o assoalho dentro da área demarcada pelo pentagrama. 


Se não fosse já tão experta, tão acostumada ao universo bizarro, Shamira teria ficado nauseada pela aparição.


A entidade que emergia das tábuas eram um ser monstruoso e disforme. Lembrava uma massa de carne, ora negra, ora esverdeada, com centenas de pequenos olhos espalhados pela superfície do corpo e dezenas de bocas que mordiam o ar. Movimentava-se com lentidão, por meio de pseudópodes gosmentos. O cheiro insuportável vinha da secreção que expelia pela carne, ponteada de poros abertos, cheios de pus.


 Destemida, Shamira caminhou ao circulo mágico, sem avançar para dentro. Encarou a criatura com autoridade. Seu olhar era duro e austero, e a face nada indefesa. 


Shamira: Bacarata! - assim ela chamou o monstro, em uma linguagem obscura, normalmente usada pelos espíritos corrompidos que vagueiam na fundura do etéreo - 


Os múltiplos olhos se fixaram nela, e as bocas se abriram, dantescas. 


Bacarata: Feiticeira de En-Dor, mestre da arte da necromancia, conjuradora de muitos espíritos. Bacarata escuta. 


Os lábios copiosos se articulavam todos ao mesmo tempo, produzindo uma voz estridente. 


Shamira: Bacarata, príncipe da matéria. Venho implorar um côndice da sua essência para a realização do feitiço da proteção.


 O côndice é um tipo de unidade mistica usada para medir a energia espiritual. 


A criatura se moveu, cuspindo o odor insalubre. 


Bacarata: E quem receberá o encantamento ? - intimou o monstrengo -


 Shamira: Ablon, o Anjo Renegado, expulso do céu antes mesmo da queda de Lúcifer. O querubim que desafiou a tirania do arcanjo Miguel após a destruição de Sodoma. 


Quieto, um pouco recuado, tive a impressão de que alguns olhos de Bacarata me observavam, analisando-me dos pés a cabeça. Minhas asas estavam recolhidas, como sempre, fundidas as costas, imperceptíveis. Mesmo assim, minha sombra na parede mostrava o contorno das asas abertas.


 Há uma confraria de feiticeiros, os Magos Negros, que busca a energia para seus feitiços na escuridão. 


Eles costumam dizer que a sombra sempre revela nossa verdadeira natureza. 


Bacarata: A aura dele é poderosa - divagou a entidade, e depois soltou um grunhido ridículo, seguido por um silvo - 


Ablon: Eu acho - sussurrei no ouvido dela - que não vamos conseguir nada desta figura asquerosa-  Eu já começa a ficar impaciente -


Os querubins são combatentes e pouco acostumados a diplomacia. 


Shamira: Paciência - sugeriu - a barganha ainda nem começou. 


A entidade voltou a rugir, deslizando no pentagrama.


 Sua palavras eram pouco compreensíveis, muito arranhadas. 


Bacarata: Aura poderosa... Bacarata quer essência do anjo. Essência por essência, essa é a troca.


Shamira: Mas essa não é uma troca, Bacarata - desafiou Shamira, lançando um olhar perigoso -


 Imediatamente, o espirito emitiu um berro agudo, de ódio, e reconheceu o ardil. 


O excesso de secreção que saía de seu corpo indicava um estado de raiva, e a criatura avançou em fúria contra a necromante.


 Mas estacou ao alcançar as bordas do circulo, como se algum muro invisível o prendesse lá dentro.


 Em um ato reflexo, avancei, dando um passo a frente para proteger minha amiga, mas ela me deteve, indicando que não corria perigo. 


Shamira: Você está preso no pentagrama de Bethor, Bacarata, caso ainda não tenha percebido. 


Vulnerável e incapaz de ultrapassar a área demarcada, a entidade se contorceu e do corpo jorrou mais um litro de gosma.


 Cuspiu uma torrente de barulhos infames, amaldiçoando a feiticeira. 


Bacarata: Feiticeira... você queimará no fogo de Xahra quando eu me libertar. 


Ela sorriu, maliciosa. 


Shamira: Não pragueje, "príncipe”. Posso resolver deixá-lo aí para sempre - ameaçou e depois retomou a barganha - Estou apenas procurando uma solução bilateral – e fez uma pausa para que o espirito se acalmasse - Você seria capaz de esquecer esse ódio se eu lhe desse uma gota de sangue do renegado ?


 Bacarata: Sangue... é só matéria - rosnou a criatura - 


Shamira: Você é o mestre da matéria. Tenho certeza que vai encontrar uma utilidade preciosa para o fluido vital. O que eu estou pedindo é um côndice de sua essência. Em troca eu lhe ofereço a liberdade, e mais o plasma fervente do general fugitivo. 


Bacarata não tinha saída. Fora encurralado, trapaceado, enganado por uma feiticeira. 


Um tipo de situação bastante humilhante para um espirito tão influente. 


Mas, apesar das circunstancias desfavoráveis, chegou a conclusão de que não perderia tanto ao aceitar a oferta.


Pelos resmungos e movimentos irregulares dos pseudópodes e pela agitação das bocas minusculas, Shamira entendeu que ele aceitara a permuta, mesmo a contragosto. E que outra opção ele tinha ?


Shamira: Ablon, faça um furo superficial no seu dedo e deixe que uma gota de sangue caia no pentagrama – indicou, me estendendo uma agulha enfeitiçada - Mas não pise dentro do circulo, ou o selo de proteção será quebrado.


 Eu fitei a entidade, intrigado, e hesitei em entregar-lhe meu sangue, mas Shamira me confortou.


 Shamira: Não se preocupe. Ele não tem poder efetivo sobre seu avatar. 


Conformado, pressionei a ponta da agulha e lancei um pingo vermelho ao chão, perto do monstro.


 Bacarata se retorceu e proferiu um gemido profano, de prazer diabólico, quando provou com a pele o precisos fluido celeste.


Quando, enfim, nada mais lhe restava para sugar, o monstrengo escorregou de volta ao buraco, e as tábuas saltadas se endireitaram, como se nunca tivessem sido quebradas. 


O punhal acima do pentagrama irrompeu em chamas, mas não derreteu.


 O fogo era de cor violeta, diferente da ardência normal, e basicamente espiritual. 


A faca estava energizada, enfim, com a essência da criatura, mas um côndice só ainda não era suficiente. 


Shamira: Preciso aproveitar que o tecido ainda está flexível para chamar a próxima entidade - ela avisou, endireitando a túnica -


Sem perder muito tempo, a feiticeira caminhou a valise e sacou lá de dentro um pergaminho gravado com formulas mágicas. 


Eram inscrições tão poderosas quanto aquelas do velho grimório, mas o desenho era bem diferente, provavelmente desenvolvido por alguma cultura europeia. 


Os contornos das letras não eram tão retilíneos, e sim mais circulares. 


Todos os caracteres estavam ligados por curvas, dando a impressão de formarem um único pictograma. 


A necromante analisou o documento com cuidado e iniciou a leitura. O espirito demorou a aparecer, e eu cheguei a pensar que ele não mais viria. 


Quanto mais evoluído é um ser etéreo, mais distante ele está do universo carnal portanto menos acessível. 


As entidades corrompidas são muito dependentes da energia dos seres humanos, por isso é mais fácil encontrá-las vagando, perdidas além do tecido, do que fixadas em seus domínios singulares. 


O convidado seguinte, no entanto, era justamento o oposto.


 Para atrair a próxima criatura, Shamira precisou recitar o feitiço árias vezes.


Quando já estava exaurida, quase sem forças, uma luminosidade dourada apareceu adiante, flutuando um metro acima do circulo. 


O espirito veio sob a forma de um belíssimo espectro de luz, que refulgia em tons acobreados. Ao observá-lo, distingui braços e pernas e também a cabeça, mas o rosto estava ofuscado, invisível na claridade. 


A feiticeira largou o pergaminho, fatigada, e quase caiu de joelhos, mas a amparei. O esforço exagerado roubara-lhe todo o vigor, e ela precisava respirar, antes de tudo. Enquanto Shamira se recompunha, a entidade falou. 


Sua voz era feminina, suave e musical, como a melodia adorável do reino das fadas.


 XXX: O que você me traz, feiticeira ? - sibilou a imagem - Um celestial... posso sentir sua aura pulsando. Um querubim... Sexto ciclo. Anjos como ele não costumam visitar o plano físico. O que faz aqui, arauto ? 


 Abri a boca para responder, mas antes que dissesse qualquer palavra a criatura já replicava:


  XXX: Você é um anjo renegado, e está preso ao seu avatar. 


 Ablon: Se ela já sabia, então por que perguntou ? - cochichei à Shamira - 


 Shamira: Ela não sabia, até ler seus pensamentos. Captou a respostas na ponta da língua, assim que você a formulou em sua mente. Seu nome é Korrigan, deusa celta de grande sabedoria. 


 O espirito retomou seu discurso. Já entendera, por seus poderes divinatórios, tudo o que Shamira desejava e o objetivo real daquele ritual.


  Korrigan: Os celestiais estão em guerra - começou a divindade, profética - O Armagedon, como os anjos o chamam, está muito próximo agora. Nós, os espíritos, não queremos a devastação do planeta. É por isso que o mundo espiritual está tão agitado. A minha essência, conforme necessitam, já está no punhal. 


 


 Shamira narrando 


 E o que mais ?, pensei, certa de que Korrigan poderia me escutar. Você não me ajudaria de graça... Nem os espíritos evoluídos nem os deuses etéreos são tão altruístas.  O que quer como barganha ? 


 


 Ablon narrando 


 Korrigan: Tudo o que quero é a preservação dos dois mundos - manobrou a imagem - O general renegado... É ele que tem na palma da mão a opção do futuro, a chave para trancar a ganancia celeste. Ele impedirá que o Armagedon se complete - determinou -. 


 Ablon: Mas esta não é e nunca foi minha intenção – interpelei - quando o Apocalipse terminar, a membrana estará desfiada, e então subirei até as nuvens, para desafiar o tirano Miguel. Deus, em seguida, acordará e punirá os perversos. Mesmo que eu morra em batalha, o Príncipe dos Anjos será condenado por ter instaurado o horror e desrespeitado a vontade do Pai. O Armagedon é, para mim, a redenção final.


 Korrigan: E como você pode ter tanta certeza de que Yahweh despertará realmente ? - propôs a entidade - 


 Ablon: Assim está escrito no Livro da Vida - rebati, automático -.


  Korrigan: E alguma vez você já viu esse livro ? - instigou, e eu ponderei - 


 O livro da Vida era um tomo mistico, dado a Miguel pelo Criador, e que registrava a história do mundo. Ali estaria contida toda a sequencia do Sétimo Dia, da feitura do homem ao Juizo Final. Mas só os arcanjos o acessavam. 


 O espirito flutuou a borda do pentagrama. Korrigan podia rastrear pensamentos, lembranças e emoções e interpretar seus valores.


  Korrigan: Nem todas as coisas acontecem como projetamos, guerreiro. Agora, neste exato momento, um exercito de anjos está deixando o Quinto Céu e se deslocando para a Fortaleza de Sion, no plano etéreo, onde o arcanjo Miguel aguarda o inicio da grande batalha. Se o Príncipe Celestial vai ser de fato punido pelo Reluzente, não lhe parece estranho que esteja esperando tão ansiosamente pela conclusão desta guerra ? Qual seria o interesse dele em promover o Armagedon ?


  Engoli meu protesto e fiquei em silencio, preocupado. 


 A divindade celta propusera uma questão complicada e extremamente relevante. 


 Como eu fui cego por, durante séculos, nunca ter raciocinado sobre isso! 


 E o que mais você vê, espirito ?, pensei. O que mais pode nos revelar sobre os planos além ?


 Korrigan: Tudo o que vejo é o crepúsculo dos tempos, uma terra arrasada, destruída por humanos e anjos. Vejo um impasse, o mais fundamental dos dilemas. Quando muitos já tiverem morrido, e só as cinzas cobrirem a face da terra, você terá que resolver a crise e escolher entre a divindade e a humanidade. 


 Ablon: Não sei se compreendo. Por que a minha escolha é tão importante ?


  Korrigan: Não saberia dizê-lo, nem acho que deveria. A sua natureza é reta, mas haverá um dia em que você decidirá pelo mundo. É tudo o que sei.


  Ablon: Eu não esperava por tanta responsabilidade. 


 Korrigan: Você é um rebelde - afirmou a entidade - mas viver a margem do mundo é muito mais fácil do que governá-lo. Seu tempo de andarilho findou. Cedo ou tarde, terá de regressar a batalha, aparecer aos inimigos e assumir seu posto. O Apocalipse já começou. O ultimo sinal, o Sétimo Selo, acaba de ser aberto. Agora, apenas as Sete Trombetas nos separam da destruição terminal.


 Poucas vezes, mesmo no paraíso, fui iluminado por tanta argúcia. 


 Agora, estranhamente, o universo ao redor parecia fazer mais sentido, e sua perspectiva sobe muitas coisas começou a mudar.


  Eu não tinha a capacidade de, sozinho, sem o recurso da mágica, penetrar no plano etéreo, e não tinha a menos ideia do que lá acontecia. Mas o espirito trouxera informações preciosas sobre o movimento das tropas celestes. 


 O som musical terminou e, abruptamente, a luz sobrenatural apagou. O corpo etéreo de Korrigan se desfez, sumindo do pentagrama. 


 Durante algum tempo, Shamira e eu ficamos quietos, estupefatos, ainda não percebendo a importância de tudo o que tinha escutado. 


 A janela do apartamento acendeu, refletindo a luminosidade mundana dos postes elétricos e trazendo-nos de volta a realidade comum. O contorno dos prédios se destacou na paisagem, e uma sirene ao longe confirmou o regresso. 


 Ablon: Estamos de volta ? 


 Shamira: Ao plano material ? Sim. 


 Ablon: E o encantamento ? Foi concluído ? 


 Shamira: Não. Ainda não. Usarei o punhal energizado para lançar o feitiço. 


 Dali em diante, a feiticeira sabia o que fazer. 


 A parte difícil já fora. 


 É verdade que nunca tinha testado antes esse ritual, mas a maioria dos encantamentos complexos é efetuada poucas vezes, especialmente nos dias de hoje, em que há tão poucos feiticeiros no mundo. 


 Shamira busco o punhal, na ponta superior do selo, e o tomou entre os dedos. 


 Depois, rodou nos calcanhares e voltou a minha presença. 


 Shamira: Estenda o braço. Isso vai doer um pouco. 


 Estiquei o braço direito. 


 Compenetrada, ela usou a adaga para marcar uma runa na parte inferior do antebraço. A lamina queimou ao toque da pele, deixando escapar uma fumaça escura e produzindo uma cicatriz pequenina, que delineava a inscrição. 


 Ablon: Isso dói mais do que um ferimento normal - constatei, enquanto provava a aflição da furada -


 Shamira: A adaga está encantada. O corte está atingindo não só sua carcaça física, mas também seu corpo espiritual. Carne e espirito estão sendo afetados – e afastou a lamina - Agora, mostre-me o outro braço.


 Estendi o antebraço esquerdo, e Shamira inscreveu nele uma segunda runa, diferente da primeira, mas seguindo padrões iconográficos semelhantes. Certamente pertenciam ao mesmo código mágico. Há centenas deles. Praticamente cada cultura humana com tradições misticas tem seu alfabeto oculto. Ela terminou de marcar a ultima runa e respirou fundo, esgotada. 


 Largou a faca, e a arma perdeu o brilho. A energia dos espíritos fora consumida, e o feitiço, fechado. 


 Os elementos naturais dentro dos potes de cerâmica não mais existiam, levados pela força da bruxaria. 


 O barro vermelho secou, e todas as formulas mágicas desenhadas no circulo estavam, agora, borradas ou ilegíveis.


  Shamira: O feitiço está completo - anunciou, ofegante - Alguns rituais demandam energia demais, e esse estava no topo da lista. 


 Olhei para as queimaduras em ambos os braços. 


 Sentia na própria pele o poder das inscrições, mas não compreendia sua utilidade. 


 Shamira: Esses ferimentos serão cicatrizados no mesmo ritmo dos de um humano normal -avisou- infelizmente, você não poderá utilizar seus poderes angélicos para regenerá-los. Depois disso, restará apenas uma marca escura, como uma tatuagem, que permanecerá gravada em seu corpo até que a runa entre em ação.


 Ablon: E qual é o poder desas runas ?


  Shamira: Cada uma delas tem sua função. A primeira, gravada no braço direito, é a runa do corpo. Ela irá poupá-lo de um ferimento mortal. 


 Ablon: Se eu for morto, ela me trará de volta ? 


 Shamira: Sim, mas só funcionará uma vez. Depois disso a runa desaparecerá e você estará novamente vulnerável. De forma semelhante funciona a segunda runa, marcada no braço esquerdo: a runa da mente. Ela preservará sua mente contra qualquer investida psíquica, como esquecimento, tentativa de dominação e leitura de pensamentos. Não importa quão forte seja o poder de seu atacante, a magia o protegerá.


 Sorri, ficara satisfeito com o resultado do ritual, mas minha principal alegria era ver como minha amiga evoluíra, aprendera e se especializara durantes todos esses anos. 


 Ablon: Acho que estou bem protegido. Esse ritual é muito mais eficiente do que supunha. 


 Shamira: Sim... Mas não se esqueça, cada runa age apenas uma vez, e não mais. 


 A mágica é mais complexa de todas as atividades do mundo, a mais estimulante e compensadora. 


 Todavia, anjos e demônios não podem usá-la, portanto nunca a compreenderão realmente. 


 Um raio dourado entrou pela janela. 


 Um novo dia estava nascendo. 


 Ablon: Já é dia ? - estranhei - pensei que... 


 Shamira: O tempo passa mais depressa no plano etéreo - lembrou a necromante -


  Ablon: Ah, sim, claro – recordei - Há muito tempo que eu não deixo a Haled. Os assuntos etéreos me fogem. - Shamira estava arrasada. - Vou ver Vick. 


 Ela assentiu e me acompanhou. 


 Entrei no quarto e ela dormia tranquilamente com um livro nas mãos, tirei o livro e a cobri. 


 Shamira: Agora preciso descansar e dormir. Acho que não vou despertar antes do por do sol - ela cambaleava - Acha que ela se importaria se eu deitasse aqui ? 


 Ablon: Tenho certeza que não.


  Shamira: O que acha que Korrigan quis dizer quando falou que o Sétimo Selo já foi aberto ? - disse sonolenta antes de apagar finalmente-


  Minha atenção estava perdida no céu nublado, através da vidraça, e eu respondi enquanto acariciava os cabelos de Vick.


  Ablon: Ela quis dizer que a guerra começa hoje.


 



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Autor(a): Fraanh

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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 1



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  • fraanh Postado em 16/10/2014 - 20:18:52

    Por mais que eu esteja postando a primeira temporada rapidamente só para continuar a segunda (já que tive que sair do orkut), eu devo, com toda a educação do mundo, dar as boas vindas as leitoras que não me acompanharam antes, então, sejam bem vinda meninas, espero que estejam gostando, comentem por favor, eu não mordo não *-*


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