Fanfics Brasil - Capítulo 52 O amor e um anjo ~

Fanfic: O amor e um anjo ~


Capítulo: Capítulo 52

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Uma emanação mistica de indescritível potencia surgiu adiante, ao centro da caverna que se alargava com o fim da passagem. 


 Do lado de lá, através do portal, a gruta se expandiu em um amplo salão natural, tão escuro que seus nichos mais negros escapavam a percepção aguçada do general.  Um ponto de luz, ao norte, indicava a saída. 


 Os três anjos já não estavam mais na Haled. Acabavam de ingressar no etéreo, a camada espiritual mais profunda além do tecido.  Os celestiais se voltaram ao foco da vibração, a mesma energia suprema que dominava toda a galeria. 


 Sentada, uma figura de impenetrável tranquilidade meditava, e no peito residia o núcleo de sua força.  Trajava uma armadura completa, e carregava uma espada embainhada no colo. 


Os olhos fechados eram a imagem da perfeita harmonia, reunindo em si o cheio e o vazio, a lei e o caos, a luz e as trevas eternas.  O Anjo Renegado reconheceu a austeridade daquele magnifico semblante e logo identificou sua essência. 


 Ali, a distancia de um toque, descansava aquele que fora, antigamente, um de seus mais célebres adversários: Gabriel, o Mestre do Fogo.  Teria transmutado sua índole e passado de frio assassino a fiel defensor das causas humanas ? O que estimulara tão repentina transformação ?


 O nascimento da Criança Sagrada iluminara-o de fato, ou o arcanjo, a exemplo de Lúcifer, usava o ideal da liberdade para incitar uma rebelião egoísta ? Um fragor mudo no espaço, que ecoava e sacudia o espirito, imitou a explosão de um milhar de vulcões – Gabriel abria os olhos. 


 De repente, o universo pareceu ter ficado menor, tamanhas eram a presença e a sabedoria daquele gigante e a majestade que transmitia.  Varna ergueu a mão em aceno.  Ela e Aziel deixaram a caverna. 


 Gabriel: Sieme não regressou – reparou - Há um desequilíbrio na fluência do cosmo. 


 Ablon: Sieme está morta – anunciou - Decidiu ficar em Jerusalém e defender sua causa. 


 Gabriel: É a mesma causa que nos une, general, que nos completa e nos fortalece - aproveitou, enxergando o relâmpago das eras - Eis que agora um ciclo se cumpre. Encontro-me de novo contigo, antes do fim e na véspera do crepúsculo dos tempos. 


 Ablon: O crepúsculo dos tempos... - refletiu o querubim, recordando as palavras de Korrigan - Foi esse o motivo de ter me poupado ? Tinha previsto meu retorno as legiões que viria a treinar ? 


 O Mensageiro descruzou as pernas e levantou-se do chão. Sua bela armadura era uma relíquia incrível, e também sua arma, a perigosa Flagelo de Fogo. 


 Gabriel: Ao longo da história, previ muitas coisas – explicou - Sou o anjo da Revelação e ganhei de meu Pai o dom da visão. No inicio, achei que minha consciência estivesse a altura de Deus, mas o livre-arbítrio dos homens me surpreendeu e ludibriou meus instintos. Certo dia, enfiado na depressão do infinito, percebi meu engano. Ninguém, nem mesmo o Altíssimo, pode prever o futuro. Tudo o que vislumbramos são caminhos, trajetórias abertas. Cabe a cada um, homem ou anjo, deus ou demônio, escolher seu destino – ele discursava como o maior sábio da terra - De minha parte, sempre guardei a esperança e cultuei seu regresso. A certeza não existe, nem a perfeita verdade. Mas sempre nos resta a fé, que nos faz confiar no impossível. E o impossível, com frequência, se torna concreto. 


 Absorto pela impressionante oração, Ablon queria, realmente, acreditar no arcanjo, mas ainda era forte o ressentimento.  Se Gabriel queria tanto tê-lo consigo, por que não o aceitara anteriormente ?  Milênios antes os dois haviam duelado, e durante o confronto o Mestre do Fogo nada falara sobre seu exército ou sobre sua intenção pura.  Preferira, em vez disso, manter segredo, expulsá-lo de Jerusalém e tirá-lo do rumo de sua missão.


Ablon: E por que não me incorporou as suas legiões quando me viu na Cidade Sagrada ? Como o único sobrevivente da conjuração, eu represento os renegados. Por que não me permitiu integrar suas tropas, se afirma que seu propósito é honrar os ideias da irmandade ? 


 O Mensageiro sorriu e o encarou como a uma criança.  Em ocasiões muito raras sorria, porque as emoções, boas ou ruins, abalam a harmonia do mundo.  Não há bem sem mal, amor sem ódio ou alegria sem tristeza. 


 Gabriel: Desde o dia em que foi expurgado, vi a vontade pulsante em seu coração. Sua missão derradeira e seu maior desejo são despojar o arcanjo Miguel. Mas o Príncipe dos Anjos nunca foi derrotado, nem pelos deuses das trevas que habitavam a sombra do espaço. Nenhum anjo está apto a derrubá-lo, talvez nem eu conseguisse vencê-lo. Aquele que me enfrentou na colina não era o Ablon de hoje. Era um general hábil, valoroso e justo, mas incapaz de derrotar um arcanjo. Agora, escute-me, celeste. Só o maior dos alados vencerá o tirano. Seus fracassos de outrora o transformaram em objeto de lendas. Suas batalhas comigo e com a Estrela da Manhã lhe deram a esperteza para desbancar o monarca. Se o tivesse aceitado em momento passado, sua força seria desperdiçada. E então não passaria de um ícone largado, desmistificado e inerte. 


 Ablon: Inerte ? 


 Gabriel: Por sua maldição, não poderia voltar ao paraíso e liderar a guerra civil. As portas do céu lhe foram fechadas, e nenhum portal o levaria a morada de Deus. Assumiria o posto de comandante no exílio, visitado por anjos, e por isso muito mais susceptível a ser encontrado por seus caçadores. Como tal, poderia ser achado, perseguido e morto. Mas, em vez disso, o que se sucedeu ? Continuou renegado, excluso, caminhando pela escuridão do planeta. Combateu contra os melhores e desenvolveu uma técnica única, quase secreta. E, agora, chega a mim em ocasião oportuna, quando os esquadrões o esperam para a maior das empreitadas. 


 Ablon: A Batalha do Armagedon. 


 Gabriel: Nosso efetivo é três vezes menor que o do inimigo. Nossos soldados são destros, mas a simples destreza não é suficiente para vencer esta guerra. 


 Ablon: E do que mais precisam, se já têm coragem ? 


 O Mestre do Fogo caminhou a volta da gruta.  Afagou o cabo da espada, com a lamina oculta por uma bainha de ouro.


Gabriel: A coragem deles converte em você, como o ultimo dos renegados. A irmandade é uma ideia, um conceito, um simbolo, e você carrega a marca desses heróis, a bravura perdida de uma era remota. -  Ablon encravou a Vingadora Sagrada no chão e sentou-se sobre uma pedra. - Quase posso ler seus pensamentos – continuou - No fundo, ainda odeia os arcanjos, todos eles, e compreendo sua cólera. Sofreu deveras com a perversidade de Miguel e com o cinismo de Lúcifer. E o que os motiva ? Ciúme, luxúria, ira e ganancia. Não foram essas as razões que me incitaram a revolta. 


 Ablon: O Salvador ! - exclamou - Miguel estava determinado a matar a Criança Sagrada, e você não aprovou o assassinato. Mas por quê, Gabriel ? Depois de todo o sangue que derramou, depois de tantos massacres que promoveu. Como um menino mortal pôde convertê-lo ao ideal de justiça ? 


 O arcanjo caminhou para um canto escuro e esquivou o olhar do ponto de luz, mas Ablon reparou em sua tristeza.  Entendeu, finalmente, que alguma dor perpétua o feria, uma cicatriz que não se fecharia jamais. 


 Gabriel: Por que você veio a batalha ? - desafiou - Há uma semana, repudiaria qualquer ação de campanha. Estava resolvido a ficar fora do teatro da guerra, até a Victória ser raptada – a expressão do Primeiro General endureceu ao se lembrar que Vick poderia estar sofrendo - Seu coração é sincero, mas não estaria aqui não fosse a captura da mortal. Na profundeza de seu espirito, é por ela que luta. É o seu amor que o impulsiona ao combate. Nesse ponto nós dois somos iguais. 


 Ablon: Nunca pensei que estivesse atrelado a tal sentimento. 


 Gabriel: Igualmente surpreso, descobri que não era imune ao ardor da matéria. Miguel sempre teve aversão a raça mortal, e, como mensageiro, era minha função executar, na Haled, suas tarefas macabras. Mas, ao formar um avatar, estava sujeito aos atributos da carne. 


 Ablon: A paixão. Também foi tocado por ela ? 


 Gabriel: Assim como você, certa vez conheci uma mulher, uma moça comum, humana, simples e pura como as gotas de orvalho. Até então, pensava ter visto de tudo e experimentado o êxtase que deriva da grandeza do cosmo. Vi a criação do universo, o principio da luz e a feitura do mundo. Lancei poeira estelar a negritude do abismo e presenciei a confecção do tecido. Antes do primeiro fulgor, lutei contra deuses das trevas e derrotei divindades tão antigas quanto meu Pai Reluzente. Mas, em sua sinceridade humana, a mulher me mostrou o significado das coisas pequenas, que eu não enxergava lá do alto do céu. Pôs-me em contato com a terra, levou-me para tomar banho de rio, mostrou-me o prazer de deitar sob as estrelas e de procurar o nascimento de vésper no leste. Em sua singela percepção, ela me aclarou a felicidade da vida. 


 Ablon sabia muito bem o que tudo aquilo significava, mesmo ele sendo o Primeiro General nos céus, ao lado de Vick, ele era apenas Ablon, um homem como os outros dominado pela paixão, cada toque, o perfume, as palavras, até mesmo ouvir os batimentos do coração dela o deixavam desnorteado e ao mesmo tempo completo, sim Vick o completava, e ele não poderia imaginar o resto de sua vida sem ter ela por perto nem que fosse apenas para admirá-la.  Ele amava aquela mulher, amava mais que tudo e todos mesmo tendo séculos de existência e milhões de coisas para comparar, nada, nada chegava a ser como ela.


Digerindo lentamente o longo discurso, o general foi assaltado por uma antiga lembrança.  Recordou-se de uma frase proferida por Gabriel, quando se encontraram no monte das Oliveiras “ Estamos resolvendo um problema de família aqui” 


 Ablon: Você concebeu o Iluminado ! - desvendou - É o verdadeiro pai da Criança Sagrada.


 Gabriel: Imagine a distinção desse ser – prosseguiu, e a emoção consumiu sua aura - Agraciado com o brio celestial e dotado do arbítrio dos homens. 


 E mais uma vez Ablon comparou a sua situação com a de Gabriel, Vick estava grávida, e seu filho também seria agraciado com o brio celestial e dotado do livre arbítrio.


 Ablon: Não podia deixar que Miguel o matasse - ele concluiu como uma resposta para os seus próprios pensamentos - 


 Gabriel: Por meio da mulher e do Menino, conheci o amor. Compreendi, finalmente, o que meu Pai sentia por mim, e toda a obscuridade se dissipou. Foi esse amor que me afastou da maldade e me fez reconhecer a humanidade como legado do Criador. 


 E então, sentado na rocha, o general encontrou, na euforia de imemoriais revelações, um autentico sentido para todas as coisas.  Se o Salvador era um legitimo descendente celeste, estavam certas as escrituras, que ilustram suas proezas divinas. 


 Da mãe, herdara a doçura da alma, a humildade e a bondade que não demarcava fronteiras.  Mas, a despeito de toda lisura, Ablon ainda não se entregara a candura do Mestre do fogo, e não se entregaria rapidamente. 


 Gabriel: A duvida coroa seu rosto – constatou - É natural a confusão. Como poderia me creditar, se nunca lhe dei provas de minha boa vontade ? Nunca fui seu amigo. Nunca lhe estendi a mão nos períodos de crise. Nunca o recebi em um abraço aprazível. Mas entre os que o aguardam há velhos parceiros, companheiros de eras, que não esquecem sua energia. É neles que deve confiar, porque a amizade é o suporte do mundo. 


 Nesse momento, uma luz maravilhosa quebrou o breu da caverna.  Mais parecia um astro dourado caído na terra, e seu clarão era intenso e delirante.  Uma aura de sublime beleza o rodeava, como uma explosão cósmica de extraordinário fulgor. 


 Quando avançou, suas feições se fizeram aparentes.  Era Nathanael, o Mais Puro, desde milênios sumido.


O anjo de cabelos de ouro e olhos de bronze trazia a esperança com seu brilho eviterno.  Nathanael era um ofanim, um anjo da guarda, leal e caridoso, agradável e belo, forte de espirito. Era também firme de caráter e determinado na defesa dos homens. 


 Na época do diluvio, seus preciosos esforços salvaram Noé e ajudaram na preservação da espécie humana.  Depois, o Mais Puro visitara o renegado nas montanhas da China e o convocara a proteção da Criança Sagrada. Mas, desde que Ablon perdera seu rastro, ao desfalecer no bosque, o ofanim desaparecera. 


 Nathanael: Paz, meu amigo adorado ! - tranquilizou o luminoso celeste - Suplico-lhe perdão, pela desilusão que causei. Sei que fui gélido e insensato, mas minha demanda acabou por tornar-se o mistério do mundo. 


 Ablon ainda se sentia triste pelo abandono do amigo: custava a acreditar em traição ou descaso, mas a prudencia era sua marca, e não se contentou com a rogativa. Seria aquele o verdadeiro Nathanael, emergindo da negritude, ou tudo não passava de um ardil arcanjo para confundir-lhe os sentidos ?


 Ablon: É você mesmo, ofanim, que se esconde por trás dessa máscara brilhosa ? - perguntou, desconfiado - Percorri meio mundo para honrar nosso acordo. Cruzei desertos e mares, venci bosques e rios, caminhei por planícies e escalei montanhas. E onde você estava, quando finalmente alcancei Judeia ?


 O Mais Puro inclinou a cabeça, em um lamento sincero. Em eras passadas, Nathanael fora um amigo leal, tão próximo do Primeiro General quanto Orion, Aziel e Ishtar. 


 Nathanael: Eu estava ali mesmo, na Cidade Sagrada. 


 Ablon: E por que não veio a minha presença ? 


 Nathanael: Eu continuava em missão – insistiu - Por tudo o que já havia feito pela raça mortal, fui designado pelo Mestre do fogo para, do astral, acompanhar cada passo do Salvador e salvaguardar sua vida. Antes de o Menino nascer, voei ao seu encontro no leste, para avisá-lo. Mas, na euforia de tê-lo conosco, fui tolo e imprudente e não consultei o Mensageiro. 


 Gabriel: E eu - interpelou, com sua voz sempre melódica - não permiti que você viesse a nós, pelos mesmos motivos pelos quais agora o trouxemos aqui. Nathanael foi imprudente ao procurá-lo sem me avisar, mas sua intenção era boa. Certamente ele confia em você, mas tomou uma atitude emocional, tipica dos ofanins. Se deseja julgar alguém, julgue a mim, general, que um dia o expulsei da Terra Santa e o lancei aos perigos terrenos.


 O Anjo Renegado encarou Gabriel com seus inesquecíveis olhos azuis, e neles não havia mais ira, dor ou desgosto.  Conhecia os próprios limites e imperfeições.  Não se considerava realmente um herói nem um comandante épico, muito menos um mártir.


Ablon: Não devo julgá-lo – acrescentou - Quem sou eu para fazê-lo ? Confiei na honestidade de Lúcifer, e em que resultou meu julgamento ? Depois, preferi lutar com você em vez de escutá-lo, repudiando suas boas palavras. Como celestes, não somos perfeitos. Não somos deuses e nunca seremos. Aqueles que buscar superar o Altíssimo cairão, e assim será com o arcanjo Miguel. Mas não serei eu a condená-lo. Como fugitivo, já estive a beira do ódio. Foi a amizade de Shamira e o amor de Vick que preservaram meus valores. Vick e eu encontramos o caminho, mas e quanto a ele ? E quanto a Miguel ? Não fosse nosso coração tocado pela ternura, talvez estivéssemos como ele, cheios de cólera e demência. É por isso que não o recrimino. Contudo, há coisas que precisam ser feitas. Não tenho o direito de julgá-lo, mas detenho a legitimidade para desafiá-lo. Sou um guerreiro. Essa é minha natureza. 


 Gabriel: Então conclua sua missão, general - incitou, em timbre suave - Chegou o Dia do Ajuste de Contas.


 E assim, sem que ninguém precisasse guiá-lo, o Anjo Renegado rumou ao ponto de luz, que indicava a saída da gruta. A passagem esticou-se em uma abertura, encravada perto do cume do morro.  Sob o despenhadeiro estendia-se uma vasta planície, que dominava todo o deserto. 


 Dali o general vislumbrou o acampamento rebelde, pontilhado por tendas brancas e negras que ocupavam a imensidão da esplanada. Milhões de celestiais, equipados com espadas, lanças e arcos, treinavam no solo e se exercitavam no ar, mergulhando e investindo, rapinando e esquivando, praticando manobras para o combate.


 Outros voavam em patrulha, vigiando o planalto, enquanto, em suas barracas, os comandantes traçavam planos e definiam táticas.  Ablon provou novamente o cheiro do metal, a excitação dos lutadores e o ardor que antecede o confronto.


 Ao todo, contou pouco mais de dez mil legiões, cada uma com cinco mil soldados alados.  Eram tão numerosos que lotavam o céu e a terra e superavam em milhões qualquer exército humano já registrado no decurso da história. 


 Ao longe, uns 350 quilômetros ao norte, a planície terminava em um circulo de montanhas de aspecto sombrio, que guardava no centro a sinistra Fortaleza de Sion.  A torre inimiga despontava além das cordilheiras, como uma lança fúnebre encravada no ventre do mundo. 


 Exaltado pela emoção, visualizando as legiões que cortavam a paisagem, Ablon entendeu que, antes do expurgo, era exatamente como aqueles celestes, cheios de esperança, força e vontade. Por um golpe do acaso, convertera-se em simbolo, elevado a alteza pelo ódio do próprio inimigo. 


 Agora não podia mais recuar.  O Príncipe dos Anjos havia capturado Vick, matado seus melhores amigos e fulminado cidades inteiras, aniquilando milhões de inocentes.


 Para aquelas pessoas, o general traria a vingança, mas por si buscaria a justiça.  Em pé, a sua esquerda, tinha o bondoso e luminescente Nathanael, que o incentivava a gentiliza, e, a sua direita, escoltava-o o dourado Mestre do Fogo, invencível em sua armadura sagrada. 


 Gabriel: Foram necessários mais de dois mil anos para que eu organizasse e treinasse esse exército - sussurrou, contemplando o cenário - São os mais valentes, e só se curvariam ao maior dos comandantes. Agora, essas legiões são suas. Lidere-as como quiser. Esses anjos nasceram de sua decência e por ela o seguirão. 


 Mas Ablon sabia que não fora o único a inspirar aqueles rebeldes.  Se ali estava, são e salvo, de espada na mão, era porque levava consigo a confiança de seus velhos amigos e a determinação da irmandade. 


 Ablon: REBELDES ! - gritou, tomando uma rocha como parlatório, no topo do morro - ESCUTEM-ME AGORA OS QUE TÊM BRAVURA NO CORAÇÃO E FIDELIDADE NO ESPÍRITO. ESCUTEM-ME OS QUE SÃO HONROSOS E SÁBIOS, E OS QUE ACREDITAM NO PODER DA JUSTIÇA – e com isso calaram-se as asas, os apitos e até o sopro do vento. Na Fortaleza de Sion, também o arcanjo Miguel escutou o clamor e, transtornado, correu a sacada para ouvir o espetáculo - VOCÊS SÃO UM EXÉRCITO DO BEM, E TENHO O PRAZER EM LIDERÁ-LOS NA DERRADEIRA BATALHA. DAQUELES QUE AQUI ESTÃO, SIGAM-ME SÓ OS QUE NÃO TEMEM A MORTE, OS GUERREIROS ARROJADOS, OS FORTES E OS TEMERÁRIOS. QUANDO A PELEJA ESTALAR E TODOS OS SEUS COMPANHEIROS TIVEREM TOMBADO, VENCERÁ O PERSISTENTE, O CORAJOSO, O QUE CARREGA A CAUSA MAIS GLORIOSA. QUE ME ACOMPANHEM OS QUE ADORAM O ALTÍSSIMO, OS QUE RESPEITAM A LEGALIDADE DE SUA OBRA E OS QUE ESTÃO CONTRA O ASSASSINATO DOS HOMENS. ESTA NOITE, LUTAREMOS ATÉ O ULTIMO SOLDADO ! 


 Tão maravilhoso foi o breve discurso, somado a prodigiosa e emblemática presença, que ao fim da oração os combatentes explodiram em vivas, e seus brados sacudiram desertos e montanhas, os perversos tremeram, assustados com a frenesi do exército que os atacaria ao cair do crepúsculo. A vitória estava nas mãos dos rebeldes.


Na Torre das Mil Janelas, cercada por uma multidão de soldados, o Príncipe dos Anjos subia as escadas, frenético.Com um pensamento agressivo, escancarou as seções metálicas da porta dupla e ingressou na Sala dos Portais, um aposento circular, orlado por duas dúzias de passagens lavradas. Ali, o Anjo Negro estacara, guardando a subida para o alçapão, que levava ao terraço da Roda do Tempo, onde Vick estava aprisionada.


 Miguel: O renegado está vivo ! - esbravejou, irado - Não é absolutamente possível que tenha escapado da Legião Formidável ! 


 Anjo Negro: Eu disse que seria inútil – retrucou – Euzin era um incompetente, e para nós é uma sorte que tenha falhado. Assim não nos levará a mais uma burrada. 


 Miguel arrancou da bainha a Chama da Morte, e a espada flamejante esquentou o ar frio.  Embora em câmara fechada, estavam a quase três mil metros de altitude, onde os ventos são fortes, e o clima, gelado.


 Miguel: E o reforço no terraço ? - mudou de assunto - 


 Anjo Negro: Ordenei que dez esquadrões criassem uma esfera vivente ao redor do pátio no pináculo da torre. Se Ablon vier até nós, terá que penetrar em Sion por outro caminho. 


 Então, ainda quieto, o Príncipe dos Anjos sacou o Livro da Vida, que escondia preso ao cinto, sob as asas enormes. Pôs a relíquia sobre o pedestal no centro da sala e começou a ler em voz baixa as ultimas páginas, impaciente como uma criança a procurar o fim de uma história.  Em certo ponto, quando alcançou o versículo desejado, acalmou-se e recuperou a presença arrogante. 


 Miguel: Vamos prosseguir com seu plano. Temos a isca e a armadilha. Então, que venha o maldito. Eu mesmo enterrarei o ideal da irmandade, enquanto nosso exército destrona os rebeldes. É o que farei – decidiu, fechando o tomo com uma violenta batida - Assim prescreveu o Altíssimo. 


 O Anjo Negro engrossou o semblante, na profundeza de seu elmo cerrado. O capacete ocultava-lhe a face, e nem o monarca Celestial conseguia penetrá-la. 


 Era o Anjo do Abismo Sem Fundo, aquele que abria todas as portas.  Era a luz e as trevas.  O começo e o fim. 


 Anjo Negro: A noite se aproxima. É o ultimo dia dos humanos na terra. Nenhum mortal jamais voltará a ver a luz do Sol.


No Sheol, o momento da decisão havia chegado.  No vale dos Condenados, as margens do Styx, milhões de demônios, de todas as castas e tamanhos, aglomeravam-se em turba desordenada, aguardando o comando de seus duques.


 Diferentemente dos anjos, nem todos voavam.  Suas hordas se agrupavam no chão, como formigas nervosas ao estourar do formigueiro. Outros, dotados de asas, enchiam o céu, babando em colérica agitação, com os tridentes em riste. 


 Alguns não passavam de diabretes, de aparência indefesa, mas havia também aqueles de enorme constituição, híbridos, de corpo animal, com chifres e cauda.  Diversos possuíam presas aguçadas, olhos de fogo, garras escuras e pele escamosa. 


 Um grupo cavalgava monstros alados, e outro montava cavalos esqueléticos, como terríveis cavaleiros do inferno. E existiam também os escravos, que mais pareciam bestas ferozes, fazendo lembrar leões e chacais, uivando em crueldade assombrosa. 


 No ancoradouro, os oito duques – a exceção de Apollyon, ausente havia dias- esperam pelas instruções de Samael, indignados e enfurecidos.  A frente deles, a odiada Serpente do Éden, anunciou aos nobres nefastos. 


 Samael: Reúnam suas hordas. Os navios não tardarão a chegar. 


 XXX: Navios ? - bufou Molloch - Nem um milhão de barcos transportaria toda esta multidão. O calor da caverna do Diabo estorricou sua razão, Satanás. 


 XXX: Essas foram as instruções de nosso líder ? - emendou Asmodeus -


 Samael: Quem duvida de mim desafia o meu mestre - ameaçou, no assoviar de sua língua pontuda. Incitava o error, pois sabia quão frágil era sua liderança - 


 Molloch parou, sem palavras para reagir, e foi amparado por Orion, enquanto os outros príncipes se contorciam de raiva. 


 XXX: Paciência, camaradas ! - tranquilizou o Rei Caído de Atlântida - Ainda é cedo, e a batalha no etéreo nem começou. Não creio que a Estrela da Manhã dispensaria nossos esforços. 


 Orion não costumava portar armaduras, mas para o embate final vestira uma exótica couraça prateada, antiga vestimenta dos guerreiros de Atlântida, adorada com o simbolo da Joia do Mar.  Não levava espada, só uma vara pontuda, mas suas garras eram tão letais quanto qualquer lamina. 


 XXX: Que se dane ! - rosnou Mammon – Não vou me curvar a um bajulador desprezível ! -gritou, e Alastor, Baalzebul e Molloch se juntaram a ele, levantando as armas-


Mas, quando os quatro se adiantaram para atacar Samael, as hordas em campo fizeram silencio, e do porto avistaram o que, para eles, era impossível.  Centenas de navios nasciam ao longe, onde brotava o Styx, na entrada do vale, e se aproximavam como gigantes, afundando o leito do rio e esgarçando suas bordas. 


 As águas rubras transbordavam ao fluxo das naus, afogando e atropelando os mais próximos a borda.  Não eram, de fato, navios comuns. 


 Longilíneos como flutuadores egípcios, somavam mil metros da proa a popa, e a sua passagem as margens do Styx se alongavam para suportar o trajeto e depois regressavam a dimensão original. 


 No passadiço, cada embarcação transportava três condutores de sinistra presença, cada qual com sua túnica negra.  Aqueles capitães eram os apavorantes barqueiros.  Sem vacilar, os duques recuaram ante a visão daqueles transportes incríveis. 


 Eram tão compridos, largos e altos que só um deles sustentaria, em seus cargueiros, aproximadamente quinhentos mil combatentes – e havia perto de dez centenas de barcos como esses navegando e correndo o cais. 


 XXX: Definitivamente, o filho do Alvorecer não olvidou seu exército – murmurou Bael - 


 XXX: São leviatãs, os navios gigantes – Orion recordou-se. Já ouvira lendas sobre eles, mas nunca as tomara a sério - 


 XXX: Então vamos a guerra - concordou Mammon, desistindo de agredir Samael - Escapou desta vez, sua cobra nojenta. 


 XXX: E contra quem lutamos, afinal ? - pressionou Mephistopheles – Qual dos dois partidos angélicos será nosso alvo ? 


 Samael: Saberão a seu tempo, agora, acompanhem-me a bordo – convidou-os, arrastando-se para dentro quando a ponte baixou-


 XXX: Ainda me intriga toda essa história – sussurrou Asmodeus para Orion – Qual será a verdadeira intenção do Arcanjo Sombrio ?


 Orion: Ainda hoje saberemos - retrucou, marchando para a plataforma -



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Autor(a): Fraanh

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Comentários da Fanfic 1



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  • fraanh Postado em 16/10/2014 - 20:18:52

    Por mais que eu esteja postando a primeira temporada rapidamente só para continuar a segunda (já que tive que sair do orkut), eu devo, com toda a educação do mundo, dar as boas vindas as leitoras que não me acompanharam antes, então, sejam bem vinda meninas, espero que estejam gostando, comentem por favor, eu não mordo não *-*


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