Fanfic: O amor e um anjo ~
Por toda a tarde, Ablon percorreu a planície em revista as tropas. Continuamente aclamado por todos os celestes, não encontrou tempo para conversar com cada soldado, mas entrevistou os generais, recolheu informações e se preparou para formular a tática final de batalha. Esteve com Varna, e reencontrou o inesquecível Baturiel.
Como muitos combatentes ali espalhados, Baturiel, o honrado, fora subordinado ao Primeiro General antes do expurgo e chegara a revê-lo no monte das Oliveiras, quando Gabriel ordenara que defendesse o morro contra qualquer invasão. Os dois quase se meteram em combate, mas a chegada de Varna, e depois do Mestre do fogo, interrompera o confronto. Na ocasião, o Anjo Renegado julgara-o mal, acreditando que estivesse do lado ruim, e por isso logo se justificou pelo engano.
Baturiel: Eu teria feito o mesmo - confortou o amigo. Trajava uma uma couraça dourada, comum aos oficiais, estampada com a antiga heráldica da Legião das Espada -
Depois, o próprio Baturiel o conduziu ao ishim Elohai, o Ferreiro, famoso por forjar as mais resistentes armaduras do céu. O celestial tomou as medidas de Ablon e prometeu que ao fim do dia ele teria a melhor placa já feita.
Quando o dia já ia findando, o querubim subiu o rochedo e voltou a presença de Gabriel, que montara sua tenda no topo do monte, de onde vigiava toda a extensão do deserto e as montanhas ao redor de Sion. Solitário, o arcanjo satisfazia-se apenas com a companhia de Varna, a fria querubim que vivia a escoltá-lo, em cega obediência a seu líder rebelde.
Dali, sobre um relevo no cume do morro, o Mestre do fogo vislumbrava o maravilhoso exército dourado, que por longos séculos aprimorara, no transcurso da guerra civil. Sua face era tenra como a planta do lótus, cuja raiz toca a profusão fecunda da terra e cujas pétalas saltam para o vazio do céu.
Seus movimentos serenos respeitavam o fluxo do cosmo e acompanhavam a palpitação do infinito. Assaltado de repente pela radiação do universo, Ablon sentiu-se pequeno diante da enormidade das legiões e da massa gigante que completava o exército imbatível.
Lamentou por sua delonga ausência e por sua incapacidade de tê-los liderado anteriormente em revolução produtiva. Gabriel apreciou o calor do Sol que se deitava no oeste, dourando com seus raios a esplanada de guerra. Agachou-se de pernas cruzadas, para louvar o astro de fogo.
Gabriel: Assisto hoje ao ultimo pôr do Sol, com o mesmo fascínio com que contemplei o primeiro - confessou, melancólico - Sou um vigilante do mundo, general, lanceado pela saudade e castigado pela lembrança. Posso sentir a passagem das eras e tocar as marcas do tempo, como as pegadas na areia, que vão sumindo a cada lambida do mar.
Ablon: Eu entendo sua amargura. É o revés da imortalidade. É o difícil fardo dos invencíveis. Também tenho o espirito ferido, mas sou jovem, apesar da idade. Sofro pelas ações que deixei de fazer e pelas batalhas que deixei de lutar. Queria ter sido mais competente na defesa da criação e livrado os homens da decadência.
Gabriel: Todos nós aspiramos ao inalcançável, e essa angustia é a centelha que acende o calor da existência. Quando todas as questões são respondidas, perde-se também o estímulo da vida. - O general acedeu e virou-se para encarar o arcanjo. -
Ablon: Conte-me o que aconteceu, Gabriel. O que aconteceu depois que a irmandade foi renegada ? Há uma sensação de deficiência em meu coração, que me aflige pelos anos perdidos.- O Mestre do Fogo exalou um suspiro e envolveu os ombros com a dobra das asas. -
Gabriel: O paraíso nunca mais foi o mesmo. A expulsão dos renegados veio pôr a unidade dos arcanjos, já desgastada pela maledicência. Depois da conjuração, muitos celestiais, incluindo o próprio Lúcifer, começaram a acreditar que a revolução seria possível, e então os oportunistas apareceram para corromper os desesperados.
Ablon: Quando deixei os escombros da cidade amaldiçoada de Enoque, soube que o Arcanjo sombrio havia arquitetado sua própria revolta e atraído um terço dos anjos a sua causa, enlaçada por mentiras e promessas vazias.
Gabriel: Sim, Lúcifer, o Filho do Alvorecer. Ele e seus conselheiros distorceram os ideias da irmandade. Juraram livrar os celestes da tirania, mas na beleza de seus discursos o diabo ocultava seu verdadeiro objetivo, que era assumir o lugar do Príncipe Angélico. Infelizmente, os descontentes cresciam, e esses desgostosos, fracos de caráter, foram ludibriados por sua fascinante retórica, como frequentemente acontece nos períodos de crise.
Ablon: E como foi essa guerra ?
Gabriel: Sangrenta, voraz e terrível. Muitos bons espíritos foram perdidos, em meio ao caos da batalha. No campo de guerra, enquanto as espadas acendiam relâmpagos no céu, Lúcifer e Miguel se evitavam, tomando seus tronos nos limites opostos do firmamento. E assim prosseguiu a matança, até que o sangue dos anjos fecundou Canaã, e a Estrela da Manhã rendeu-se em humilhante derrota. Como sentença, os perdedores foram isolados e condenados ao exílio na escuridão do Sheol.
Ablon: O Sheol. É curioso que Miguel não tenha imposto aos caídos uma punição mais severa.
Gabriel: Antes da chegada do Arcanjo sombrio ao inferno, Sheol era tão somente uma dimensão-cemitério, um lugar de absoluta negritude e desolação, para onde Yahweh enviara os restos mortais de Tehom e dos deuses das trevas, destruídos nas Batalhas Primevas. O Abismo de Nimbye, nos Campos da Morte, representaria o suposto ventre de Tehom, uma passagem para o limbo, cheio de horror, agonia e desesperança.
Ablon: O Portador da Luz... - murmurou, desvendando a chave para um dos muitos títulos atribuídos a Lúcifer. Ablon fincou a espada no chão endurecido, como as vezes costumava fazer, porque não tinha bainha para carregá-la. A lamina endireitou-se sobre uma pedra vermelha. - Por que você acha que Miguel capturou Vick ? O anjo que a levou disse que ela ficaria bem se eu não me juntasse ao Diabo. Supostamente queria impedir minha aliança com Lúcifer. - Gabriel ergueu-se em postura esticada e desceu da pedra em direção a ravina. -
Gabriel: É um blefe, uma distração para desviá-lo do percurso central. Miguel conhece sua índole, seu passado, e sabe que jamais firmaria acordo com um traidor. Ademais, os soldados do inferno nunca teriam capacidade para invadir Sion. As hostes diabólicas são numerosas, mas fracas. A maioria das unidades satânicas é composta por espíritos-escravos, que tombam ao primeiro golpe de espada. Só os caídos são realmente ferozes, mas não somam um contingente temível. Se o Príncipe dos Anjos esperava por uma ofensiva militar, deveria impedir que você se unisse a nós – apontou para suas linhas voadoras, treinando em perfeita disciplina, e para as tropas no chão, espetando o ar como se fosse o inimigo – Nosso exército sim tem o vigor e o treinamento necessários para derrubar as defesas da torre, mesmo em desvantagem numérica.
Ablon: Então Miguel podia estar querendo justamente me atrair para a fortaleza ?
Gabriel: Eu não disse isso. Não é fácil compreender as ambições de meu irmão, nem seus delírios de majestade. Seus anseios são um enigma até para mim, que por tanto tempo compartilhei de seu egoismo colérico.
Ablon: Mas por que ele raptaria a humana ? Não vejo sentido algum para um sequestro tão inusitado. Como uma mortal poderia ser útil ao seu projeto insano, seja ele qual for ? - Gabriel achegou-se a ponta do precipício. -
Gabriel: É possível que ele esteja tentando usá-la para alguma finalidade macabra – arriscou, sem mais opções - Eu não duvidaria de que Miguel tenha descoberto um jeito de usar a alma da mulher para ascender a divindade. Para tal, ele necessitaria de um espirito humano, agraciado com a dádiva da livre vontade. - Ablon coçou o queixo, pensativo e angustiado. -
Ablon: Foi exatamente o que Lúcifer me disse, quando fui encontrá-lo no vale dos Condenados. Segundo ele, Miguel pretende atingir a majestade do Criador com a conclusão do Apocalipse. Mas com isso ele se esquece do elemento fundamental, que encerrará o Armagedon: o despertar do Altíssimo. - O Mensageiro inclinou o olhar, tristonho, e tornou a mirada ao carmesim do horizonte. -
Gabriel: Yahweh não adormeceu, general - anunciou, em surpreendente revelação - Ele dissipou sua essência no cosmo, ao fim do sexto dia da criação. - O Anjo Renegado maneou levemente a cabeça, em assustada reação negativa. -
Ablon: ISSO NÃO PODE SER ! - protestou - Então o reluzente está morto ?
Gabriel: Não, meu amigo – tranquilizou - Deus nunca esteve vivo. Por bilhões de anos, o Senhor moldou o universo, e um dia seu trabalho acabou. Orgulhoso por sua obra, o Altíssimo desejou a onipresença. Queria estar em todos os lugares, ver todas as coisas e provar as belezas do mundo. De seus frutos mais estimados, adorava a raça humana, uma espécie selvagem que vivia na podridão das cavernas. Cansado de admirar e criar, Yahweh queria tocá-la, viver entre ela, amá-la. Assim, dispersou seu espirito, e dessa energia divina nasceu a alma humana, abençoada com o livre-arbítrio e agraciada pela seiva do amor. Com isso, a energia do Criador prosperou, sobreviveu e se multiplicou sobre a superfície da terra. Pois saiba, ó valoroso guerreiro, que em cada coração mortal bate a potencia do Pai, e essa graça é infinita, indestrutível e imortal.
O Primeiro General respondeu ao baque com uma prolongado silencio, durante o qual rememorou sua trajetória de vida, sua jornada celeste e terrena, atentando aos indícios sutis que explicitavam a ausência do Altíssimo.
Ablon: De alguma forma, acho que sempre suspeitei da verdade. Como poucos, preferi viver meu próprio caminho, mas a busca pelo Onipotente se tornou um motivo, um propósito. Mas e quanto a você, Mestre do Fogo ? Por que não compartilhou seu conhecimento com os alados nem alertou os homens para sua capacidade celeste ? - O gigante voltou a sorrir, mas havia também frustração em seu rosto. -
Gabriel: Assim eu tentei, mas ninguém quis escutar. A existência palpável de Deus é um alimento para homens e anjos. Muitos Dele dependem para justificar seus fracassos, suplicar perdão, ou para animar uma vida miserável. E não os condeno. Não é fácil admitir que estamos sozinhos, que nosso sucesso depende apenas de nossos próprios esforços e de ninguém mais. Entenda agora, general, a obviedade do paraíso. O poder de Deus reside no amor incondicional. Quando amamos verdadeiramente, alcançamos o divino. Estar próximos a elas nos transporta a Presença Sublime, aquele que nos deu a vida e nos amou intensamente. Foi o amor por Shamira que o livrou da maldade e o amor maior por Vick que o fez querer desistir de seus ideais. Foi o amor dela que deteve sua espada. Também o Salvador trouxe ao mundo a mensagem do amor e discorreu seguidamente sobre a natureza do Pai. Mas nem todos tem a capacidade de enxergar o que perpassa a realidade, o solucionável segredo da existência, que está além de ícones, rituais e orações. Para mim, confesso, é duro pensar que nem mesmo Uziel, nosso irmão caçula, soube contemplar a verdade. Nem mesmo ele, que era um arcanjo viu a dispersão do Altíssimo, soube aceitar sua escolha. Como muitos anjos, Uziel cultivou, por anos, a ilusão de que Yahweh estava dormindo em Tsafon, até o dia em que subiu ao monte e foi morto por Miguel. Mas talvez tenha vivido melhor assim, na ignorância, já Rafael, sempre lúcido, engoliu a ausência com amargura, e em determinado momento desistiu de tudo, optando pelo exílio.
A realidade, definida pelo Mensageiro, era absolutamente clara e singela. Deus é a totalidade do universo, e a compreensão do infinito. Ele é a pura bondade, o amor irrestrito e a aceitação do desigual. Na ciranda dos sentimentos, tais como a paixão, a amizade e o respeito.
Assim, Ablon entendeu finalmente a razão da empatia que o ligava a humana. Ele era um anjo, nascido para servir ao Divino, e sempre estaria atrelado a energia suprema, o poder criador que a mulher carregava na alma fervente. No mesmo instante, o Mestre do Fogo retirou sua espada mistica do cinto e a ergueu contra o halo solar.
Gabriel: Está é a Flagelo de Fogo – divagou - a mais temida das armas celestes. Com ela derrubei os deuses das trevas e venci os caídos. As chamas que crepitam em sua folha não se apagarão enquanto houver um herói para empunhá-la. Eu, que por tantas vezes a carreguei, agora a entrego a você, formidável guerreiro, que me superou em pureza e sabedoria. Use-a hoje, com retidão e destreza, para desbancar as forças do mal - presenteou, estendendo ao punho da espada. Mesmo lisonjeado, o renegado não podia aceitar. -
Ablon: Agradeço sua oferta, Gabriel, mas não devo tomar sua arma. Sou um querubim e tenho minha própria espada, a Vingadora Sagrada – ele puxou a ponta de aço, até então encravada no solo -
Diante da negativa, nada disse o Mensageiro. Em vez disso, agiu como estouro de tempestade, brandindo a espada sobre a cabeça, em extravagante atitude. Atônito, o general defendeu-se em reflexo, e a Flagelo de Fogo desceu com um ruido de incêndio, para rasgá-lo ao meio.
Por sorte, a Vingadora Sagrada bloqueou o avanço da folha mortal, e ali ficaram os dois duelistas, estáticos, de armas cruzadas, enquanto o sabre ardente do arcanjo derretia a lamina gelada do renegado.
Ablon: POR QUE ESTÁ FAZENDO ISSO, GABRIEL ? - gritou, resistindo a pressão da investida – POR QUE ESTÁ ME ATACANDO ?
Inabalável, o gigante aplicou ao golpe força tremenda, até que a Vingadora começou a ceder. O metal entortou, e as extremidades racharam. Em segundos, a empunhadura fervia, e Ablon foi obrigado a soltá-la, ou teria a palma inflamada pela terrível superioridade do instrumento oponente.
Esperto, saltou para o lado, antes que a Flagelo o tocasse, mas o Anjo da Revelação interrompeu o ataque e recolheu o sabre a bainha. A espada do general desfez-se em pedaços, e seus fragmentos abrasados se reduziram a pó, após resfriados pela brisa da tarde.
Gabriel: Perceba – retomou, aos ofegos ruidosos do admirado guerreiro - A Vingadora Sagrada não resistiria ao confronto com a Chama da Morte, a lamina mistica do arcanjo Miguel - esclareceu, entregando sua espada flamejante ao querubim - Mas não se entristeça por isso. É um soldado e sabe que a Vingadora o trouxe de volta, reacendeu em você o vigor da batalha e cumpriu o propósito pelo qual foi construída. Assim como ela, também terminei minhas demanda.
Ablon: Suas palavras são confusas, arcanjo.
Gabriel: Organizei este exército para você e o preparei para o maior dos embates. Agora cabe ao Primeiro General a tarefa de guiar as legiões ao conflito. Queria poder ajudá-lo, meu honrado comandante, mas não posso. Esta guerra nunca foi minha, apenas a tomei emprestada. Miguel ainda é meu irmão, e não poderia enfrentá-lo, muito menos matá-lo.
Ablon: Seja então nosso parceiro na paz – Ablon não queria perdê-lo - Precisamos de você para levantar o planeta dos escombros da guerra.
Gabriel: O universo estreitou-se aos meus sentidos, general. Estou velho, letárgico e cansado. Já vi muito, e de tudo provei. Agora, é meu dever seguir os passos do Pai, dissipar minha essência e retornar a escuridão.
E assim, subitamente um barulho estridente rematou o diálogo. No campo e na fortaleza, atacantes e defensores se retraíram ao ecoar do ruido. Era o sinal da Quinta Trombeta. Seu som, embora perturbador, era filtrado pelo tecido, tornando-se assim bem mais tolerável ali, nas profundezas do etéreo.
Gabriel: Só faltam mais duas para o Juízo Final – observou - O Armagedon se anuncia. Retiro meu espirito da esfera vivente e o entrego a eternidade, mas deixo-lhe um legado. Em suas mãos repousam o destino do mundo e a obra da reconstrução. Quando desanimado e aflito, puxe a Flagelo de Fogo e escute minha voz. Lembre-se das coisas que lhe falei. Enquanto houver um só homem no mundo, há esperança, porque os mortais carregam no peito o brio de Deus.
Emudecido, mas inchado de grandeza e louvor, Ablon viu o arcanjo subir aos céus, trespassar o branco das nuvens e se desfazer como uma estrela radiante no anil do crepúsculo. Sua aura sumiu, e a consciência se apagou. Gabriel alcançara o infinito e ascendera ao estágio final. Estava vivo, mais do que nunca !
Sua energia era agora o continuo do cosmo. E, nas mãos do general, a Flagelo de Fogo continuava ardendo.
Quase no mesmo instante em que Gabriel ascendeu, três anjos chegaram voando ao rochedo. Um deles, Elohai, o Ferreiro, trazia uma placa dourada, adornada com o simbolo da Legião das Espadas.
Estava acompanhado por Baturiel, o Honrado, e Aziel, a Chama Sagrada.
XXX: Trouxemos sua armadura - disse Elohai, pousando a couraça no chão -
Ablon notou que a placa era idêntica a sua antiga. Podia ser aberta do lado, para depois se fechar contra o peito. Nas costas, duas frinchas paralelas deixavam espaço para as asas de anjo, facilitando as manobras de voo.
Era hora de o querubim despir as vestes mundanas. Tirou a camisa e, pela primeira vez desde...
Flash Back
Vick: Posso te pedir uma coisa ? Quer dizer, lembro que Hazai me disse que isso era extremamente doloroso.
Ablon: O que ?
Vick: Eu queria ham... ver suas asas.
Ablon: É doloroso sim, por causa do avatar, avatar é como chamamos o nosso corpo humano.
Vick: Entendi. - Suspirou -
Ablon: Se quer ver, posso te mostrar, só não quero que corra de novo.
Vick: Sabe que só “corri” porque estava surpresa demais, agora já estou preparada, mas se dói, não quero que sofra.
Ablon: Tudo bem, já passei por coisas piores.
Levantei tirando a camisa, ela suspirou. A olhei esperando uma resposta e ela assentiu, assim que o fez, comecei a fazer força como da outra vez, e logo elas surgiram gradualmente. Ela se aproximou de minhas costas para tocá-las, elas roçaram seus dedos.
Vick: Você é tão... lindo - sussurrou contra meu peito - quero dizer, sempre foi mas isso...
Ablon: Não assusto você ? - também sussurrei -
Vick: Não.
Ablon: Quero que se sinta segura comigo - a puxei para mim - É muita coisa para você assimilar -
Apoiou uma mão contra meu peito e ergueu a cabeça me encarando nos olhos enquanto se aproximava abrindo a boca.
Correspondi imediatamente, de inicio calmo e gentil -
Vick: Eu o amo, estarei contigo até quando eu puder - sussurrou entre meus lábios -
Ablon: Será para sempre meu amor - a beijei novamente, agora com uma mistura de saudade, angústia e desejo -
Fim do Flash Back
Libertou as asas rajadas de sangue. Encaixou a couraça no tronco e fixou a bainha no cinto. Motivado pela recente lembrança, no parlatório, retirou do couro a Flagelo de Fogo e a apontou para o céu.
Como um desafio ao bastião inimigo, encravado além das montanhas. Já era quase noite, e a Lua se esgueirava no leste.
Na planície, o exército rebelde enxergou o general no topo do morro, com a armadura de ouro, que reluzia ao brilho da lamina ardente. Os combatentes avistaram sua penas marcadas, que eram o simbolo e o orgulho dos renegados, e reiteraram seu amor pela justiça.
Na Fortaleza de Sion, o arcanjo Miguel e o Anjo Negro divisaram, ao longe, o fulgor da espada, e souberam quem a empunhava.
XXX: Amaldiçoado seja Gabriel ! - bradou o Príncipe Angélico - ele passou ao expurgado a Flagelo de Fogo.
No alto do monte, Ablon recolheu sua arma e se preparou para descer a ravina. Mas Varna continuava a seu lado, tal qual estivera desde o principio da tarde, e se aproximou do comandante rebelde, com o fascínio a lhe esquentar o frio semblante.
Varna: General ! - chamou - É um privilegio estar sob seu comando – rendeu-se, reconhecendo finalmente o encanto do líder -
No campo, ao centro de um circulo de tendas, havia uma mesa de pedra, sobre a qual os generais pousaram um mapa em pergaminho, que delineavam todo o deserto. O planisfério mostrava a planície, as cordilheiras ao redor de Sion, o rio Styx, e mais adiante o monte Megiddo.
Outros documentos, enrolados em couro e papiro, descansavam ao pé do encosto, com diagramas, plantas e informações acerca dos fortes, das táticas e dos capitães inimigos. A Lua já tinha subido quando os comandantes se reuniram para ouvir a estratégia final.
Entre os dez generais, veteranos de várias campanhas, estavam querubins poderosos, muitos dos quais haviam servido na Legião das Espadas, antes da expulsão da irmandade. Varna e Baturiel figuravam como os mais louvados e juntos formavam uma dupla excelente, cada qual com sua arma de ataque.
Próximo ao grupo, Aziel acompanhava o concilio. A Chama Sagrada e seus ishins da Cidadela do fogo teriam participação decisiva na batalha, segundo a tática imaginada por Ablon.
Sobre eles, um pelotão voava em espiral, subindo e descendo em vigília. O Primeiro General tocou um ponto no mapa, indicando o baluarte inimigo.
Ablon: Quantos anjos você calcula que estejam defendendo Sion ? - perguntou a Varna -
Varna: Cem milhões, só do lado de fora - ela respondeu lacônica, tinha os números na ponta da língua -
XXX: Pelo menos cinco mil legiões a protegem pelo interior, conforme reportam os espiões – acrescentou Baturiel -
XXX: É três vezes o contingente rebelde - constatou Aziel, coberto por vestes brancas de seda e cinto dourado, em traje tipicamente angélico -
Ablon: Cada um dos nossos podem abater cinco deles – garantiu - A lógica nos põe em vantagem, mas a prática nos esmaga. Eles estão bem alinhados, arranjados, e guardarão posições. Temos que desfazer suas linhas, antes de nos atirar ao choque de armas.
XXX: E qual seria a estratégia ? - indagou Eblis, a segunda mulher-anjo no conselho dos chefes. Era magra e esguia, mas portava uma maça, arma de impacto mais apreciada pelos brutamontes -
Ablon elevou o olhar ao acampamento e percebeu quão dispostos estavam seus lutadores, sempre alertas, sempre treinando, excitados pela batalha e sedentos para brandir sua laminas. A frente de cada destacamento, subia um estandarte bordado com a insígnia das tropas rebeldes, em preto e vermelho.
Ablon: Eu avançarei primeiro, ao comando de um grupo tático de elite, para quebrar o cinturão de defesa que cerca o perímetro e desorganizar os esquadrões. Preciso de mil voluntários, prontos a lutar até a ultima gota de sangue.
XXX: Essa parte é fácil – garantiu Varna, conhecendo o ânimo dos combatentes -
Ablon: Enquanto lutamos, o regimento das arqueiras deve percorrer o deserto em rasante e subir as montanhas que cercam a torre - e mostrou o desenho da cordilheira no mapa - ali ficarão escondidas, até o inicio da ofensiva. Em certo momento, deixarei a vanguarda e me infiltrarei em Sion, para salvar minha, ham... Para salvar a humana Victória e confrontar o arcanjo Miguel.
XXX: E quanto as legiões no interior da fortaleza ? - lembrou Shenial, um celeste que liderava a defesa da Cidade Sagrada de Jerusalém, na noite da execução do Iluminando - Elas perceberão seu assalto.
Ablon: A prática da vida na terra me ensinou a suprimir as emanações de minha aura pulsante e assim escapar de meus caçadores. Voarei pelas sombras e usarei de furtividade para me esgueirar pelos corredores do forte e encontrar o Príncipe dos Anjos.
Shenial: A Fortaleza de Sion é um labirinto de salões, câmaras e tuneis vazios – insistiu Shenial, que era conhecido pela cautela- Poderia explorá-la por anos e nem assim alcançaria os aposentos de Miguel.
O Anjo Renegado recordou-se, no ato, das remotas campanhas das Guerras Etéreas, quando sua legião chegou primeiro ao castelo do deus Rahab, o Príncipe dos Mares, e venceu as divindades que ali viviam, destruindo o palácio e queimando suas sacadas. Mais tarde, naquele mesmo lugar, seria erguida a Torre das Mil Janelas, um marco da vitória dos alados sobre as entidades pagãs.
Ablon: Vi Sion ser construída e participei de sua arquitetura. Eu estava lá quando Miguel fincou no topo a roda do Tempo, roubando-a dos malakins no Sexto Céu. Não será a primeira vez que cruzarei suas defesas de espada na mão, para desafiar os sitiados.
XXX: E quando devemos lançar o ataque ? -indagou Ebriel, um dos generais armados de lança em vez de espada-
Ablon: Ao soar da Sexta Trombeta, as arqueiras dispararão suas setas contra os soldados destacados da torre, desorganizados pela ação do grupo de elite. A seguir, todas as unidades arrancarão para o calor do combate – abriu um segundo pergaminho, que mostrava em detalhes o forte inimigo e seus arredores- Nosso objetivo central é concentrar a ofensiva em um único ponto e abrir uma ponta de lança, para que os ishins penetrem na torre e incendeiem a fortaleza por dentro.
XXX: Mais de cinco mil metros separam as montanhas do bastião - alertou Eblis - A distancia pode ser uma adversária para as flechas.
XXX: Isso é queima-roupa para minhas arqueiras - rebateu Varna, precisa -
XXX: E se você não retornar ? - Quis saber Aziel, visivelmente preocupado com o destino do amigo – Devemos queimar a bastilha mesmo assim ?
Ablon: Se até então eu não tiver regressado, saberão que estou morto. Varna assume o comando em minha ausência, seguida por Baturiel e Shenial. Aconteça o que acontecer, não se esqueçam de que o tecido da realidade terá caído ao fim da batalha, e os dois mundos serão unos. Caso eu não resista, agrupem os sobreviventes e prossigam com os valores da irmandade, preservando os homens que escaparem a guerra do mundo mortal. Ajudem-nos e glorifiquem-nos, mas não esqueçam quem são. Foram o ciume e o egoismo que nos trouxeram a isso – e recolheu os mapas- Varna, recrute os melhores alados para o batalhão de vanguarda. - Ela ajustou a cota de malha e voltou os olhos verdes ao lutador. -
Varna: Terá os soldados em uma hora, general.
O concilio se dispensou.Enquanto as tropas se preparavam, Ablon refugiou-se sozinho no topo do morro, próximo a pedra de onde Gabriel subira aos céus.
Ali ficou, parado, concentrando-se para a batalha final. Viu as flâmulas esvoaçantes, os guerreiros em suas armaduras e o grupo misto de anjos, composto por mulheres e homens alados, conforme concebidos por Deus.
Com olhos de águia, observou ao longe a Fortaleza de Sion e mirou o pináculo, obstruído por uma redoma de anjos que o defendiam em esfera, impedindo assim que qualquer um enxergasse o terraço.
Sentou-se em um pedregulho e buscou no chão seu antigo sobretudo. Vasculhou os bolsos e deles recuperou dois objetos de especial importância. Um era a chave do inferno, que supostamente abriria, na Sala dos Portais de Sion, a passagem para Sheol.
O outro objeto era a pena alva de Apollyon, enegrecida pelo tempo. Ao reaver a pluma, Ablon meditou sobre como encontraria o Exterminador, uma vez que desconhecia a vinda dos infernais ao etéreo.
Resolveu que terminaria, antes, sua contenda com o arcanjo Miguel, para só depois procurar um meio de caçar o assassino. Com isso vingaria não só os espectros do deserto, mas também seus amigos renegados.
Ablon prendeu firme a pena ao cinto, com um fio entrelaçado de seda, e tateou mais uma vez a superfície de barro da chave, uma relíquia estranha, de aparência rústica, menor do que a palma da mão, e em forma de anel recortado em cruz. Aziel, a Chama Sagrada, aterrissou no parlatório e desceu para falar com o amigo. Mas, quando viu o general, absorto em devaneios, adiou o assunto central.
Aziel: A chave do inferno – comentou, lembrando-se da primeira vez em que vira a relíquia -
Ablon: A participação de Lúcifer nesta guerra ainda continua velada – desabafou, correndo o olhar pelo objeto - Ele se conformou muito rapidamente com minha recusa em aderir a seu plano, mas estava determinado a entrar na batalha.
Aziel: O Arcanjo Sombrio está de mãos atadas -sustentou- Suas hostes não são páreo para nenhum dos dois exércitos celestes. Provavelmente tomará a trilha mais curta e aguardará o fim do combate, para só depois tentar um acordo com os vencedores. Quem, mais do que ele, apreciaria ver os partidos angélicos se matarem em batalha ? - Ablon maneou a cabeça em sinal negativo. -
Ablon: Então por que ele teria me dado esta chave ? Seria uma manobra para despistar minha mente, ou há realmente uma intenção oculta, previamente acertada ? - Aziel guardou silencio, porque também não fazia ideia das aspirações do Filho do Alvorecer. Ficou quieto enquanto assistia ao general amassar com a mão o artefato sagrado. - Não acho que isso vá fazer muita diferença, mas é melhor que seja destruída de vez – ele apertou o punho, e a chave se reduziu a farelo. Sua energia mistica sucumbiu a pressão e se dispersou no espaço – Que Lúcifer afundado no Poço Sem Fundo.
Esticou os dedos, e os restos de argila se precipitaram para o chão da montanha. Os flocos mais finos foram carregados pelo vento noturno.
Aziel: O grupo de elite está pronto – anunciou finalmente, depois que a poeira sumiu-
Esfregando as mãos, o renegado subiu novamente a rocha no topo do morro, para seu ultimo e definitivo discurso. Assim tinha inicio o Armagedon.
Do parlatório sobre a montanha, Ablon enxergou a planície. Já era noite, e uma sombra estranha cobria o Sion, como uma nuvem negra de tempestade.
O deserto era pequeno para tantos rebeldes, e muitos alados adejavam, pairavam no ar e se alinhavam para a batalha que começaria em breve. O general subiu a rocha e puxou a espada de fogo, então todos pararam para observar o seu líder.
No campo, mil anjos guerreiros, vestidos com armaduras de prata e elmos brilhosos, compunham a força de elite, o grupo que acompanharia o renegado no primeiro assalto a torre inimiga.
Ablon: ATENÇÃO ! - Bradou, e sua voz poderosa alcançou o infinito. Ao longe, Baturiel apertou sua lança, Varna recolheu seu arco e Nathanael levitou para o topo de Horeb – CHEGOU O DIA DO JUÍZO FINAL, O TEMPO DO AJUSTE DE CONTAS. DE TODAS AS GUERRAS, CELESTIAIS OU TERRENAS, ESTA É A MAIOR, A DISPUTA QUE ENCERRARÁ A DIREÇÃO DO UNIVERSO. AS LÁGRIMAS QUE VERTEMOS POR NOSSOS IRMÃOS RENEGADOS AGORA COBRAREMOS COM O FIO DA ESPADA. SOMOS O INSTRUMENTO DE DEUS, A MÃO DA JUSTIÇA, A HERANÇA DO PAI CRIADOR. HOJE NOS LANÇAREMOS AO COMBATE EM HONRA DO ALTÍSSIMO E EM DEFESA DA HUMANIDADE. QUEIMEM SUAS AURAS E INCENDEIEM SEUS CORAÇÕES, PORQUE ESTÁ É A BATALHA DO ARMAGEDON, E NINGUÉM SAIRÁ IMPUNE. SANGUE SERÁ DERRAMADO ATÉ ENGOLIR AS FUNDAÇÕES DO MUNDO, E OS JUSTOS ALCANÇARÃO O TRIUNFO. AOS PROBOS, OS LOUROS; AOS PERVERSOS, A MORTE – concluiu, e os soldados responderam com um clamor estrondoso, que ecoou pelo espaço infindável e ficou gravado na fluência do cosmo-
Sob fervorosa consagração, Ablon desfraldou as asas rajadas e desceu voando ao campo para encontrar seu batalhão de vanguarda. De espada em punho, os querubins o saudaram, hasteando laminas e estandartes e provando a enormidade de sua presença. Depois, o Anjo Renegado e seus guerreiros prateados decolaram e juntos se lançaram rumo a Sion.
Na Torre das Mil Janelas, mesmo sem poder avistar a paisagem, interrompida pela redoma de anjos, Vick escutou o bramido dos combatentes rebeldes e avisou aos celestes que a cercavam.
Vick: O Primeiro General está vindo me buscar. Ai daqueles que estiverem em seu caminho - profetizou e fez fraquejar o moral dos injustos -
Autor(a): Fraanh
Este autor(a) escreve mais 2 Fanfics, você gostaria de conhecê-las?
+ Fanfics do autor(a)Prévia do próximo capítulo
No campo rebelde, o honrado Baturiel esperava. Sua principal arma era a lança, mas carregava também uma espada, como todos os querubins. Até as arqueiras portavam lâminas na cinta, embora curtas, para o caso de combate fechado. O Honrado traçou um golpe no vazio do ar, só pra testar a eficiênci ...
Capítulo Anterior | Próximo Capítulo
Comentários do Capítulo:
Comentários da Fanfic 1
Para comentar, você deve estar logado no site.
-
fraanh Postado em 16/10/2014 - 20:18:52
Por mais que eu esteja postando a primeira temporada rapidamente só para continuar a segunda (já que tive que sair do orkut), eu devo, com toda a educação do mundo, dar as boas vindas as leitoras que não me acompanharam antes, então, sejam bem vinda meninas, espero que estejam gostando, comentem por favor, eu não mordo não *-*