Fanfic: Trezentos e Sessenta e Cinco Dias (FINALIZADA) | Tema: Vondy

Fiquei calada. Aquelas palavras entraram como facadas dentro do meu peito. Queria dizer muitas coisas, mas eu não sabia exatamente o quê e nem como dizer. Christopher tinha razão sobre como eu estava sendo egoísta. As pontadas que senti em cada palavra não foram exatamente por elas terem sido ditas, e sim por saber que ele tinha razão. Pablo sabia exatamente quando me deixar sozinha. Ele sabia me dar espaço. Mas Christopher, ele esteve comigo quando eu não tinha mais ninguém. Quando eu era praticamente uma estranha. Anahí, mesmo com a maneira fria que a tratei no primeiro dia de aula, ela não me repreendeu, não teve raiva de mim. E o meu pai. O que dizer? Depois de tantos insultos, tantos gritos, tantas acusações falsas, ele não deixou de me amar. Até o fato de ele ter deixado eu crescer em uma “mentira” foi um ato de amor. Como teria sido minha vida se eu tivesse crescido ali e longe de minha mãe. Os pais dele teriam me dado paz algum momento da minha vida? E se ele não tivesse ido me buscar em Nova York? Onde eu estaria agora? Em um orfanato com pessoas totalmente desconhecidas? Senti os braços de Christopher me sentar na cama e me envolver.

O pior de tudo, é que eu não consigo ter raiva de você. Eu apenas quero cuidar. - ele sussurrou.

Me perdoa. - Soltei um soluço alto e dolorido enquanto escondia meu rosto com as mãos. Eu não o merecia. Ele merecia alguém que o fizesse feliz. Alguém que não estivesse chorando 60% das vezes. Alguém que não fosse tão egoísta.

Está tudo bem. - Ele beijou minha bochecha. - Você precisa descansar.

Eu não sei o que está acontecendo comigo. Eu não sou assim Chris. - Disse com a voz falha e abafada.

Não? - ele tirou minha mão do rosto e me olhou.

Não. Eu estou assim há alguns meses, mas eu não sou assim.

Há quanto tempo está assim? - Ele enxugou meu rosto.

Desde o dia que minha avó... - suspirei. Não gosto de pronunciar essa palavra, principalmente quando é relacionado à minha avó e minha mãe.

Você está traumatizada ainda Dulce. É normal. Eu sei que foi tudo muito rápido, mas você precisa tentar se suprerar. A vida não para.

Talvez, eu só... - Parei minha frase. Isso não. - Deixa pra lá.

O que foi? Pode falar. Eu estou todo a ouvidos.

Talvêz eu só esteja querendo evitar mais sofrimento, entende? - Abaixei a cabeça.

Como assim? - Não respondi, mas ele entendeu. - Não Dulce. Você não tem que afastar as pessoas de você. A morte. - Ele molhou os lábios com a língua. - ela é dura, ela é triste, mas ela faz parte do ciclo da vida. Todo mundo vai partir um dia independente da maneira que isso ocorra. Seja como uma doença, um acidente, ou uma morte natural.

Mas... eu não não quero que mais ninguém morra. Eu não quero que nada aconteça ao meu pai, a você ou qualquer outra pessoa que eu ame. - O olhei. Eu disse que o amava? Indiretamente, é claro. Desviei o olhar e ele sorriu disfarçadamente. Senti minhas bochechas corarem. - Digo... - Me arrumei na cama. - As pessoas que me fazem bem. Eu não quero perder mais ninguém, não serei capaz de suportar.

Você não tem que pensar nisso. Você está se assombrando com o fantasma da morte Dulce. Olha pra mim, olha para o seu pai, seus amigos. Estamos todos bem. Se isso tiver que acontecer a algum de nós, irá acontecer. Você se afastar ou não, se você realmente as ama não irá diminuir o sentimento que você tem por elas e nem irá impedir que algo ruim aconteça.

A vida é cruel. - Me encolhi.

A vida é a vida Dulce. Ela é assim desde o princípio. Pessoas nascem, pessoas vivem, pessoas morrem.

Você não vai morrer. Eu não vou deixar. - Levantei meu olhar que se encontrou com o dele.

Não?

Não. Não enquanto eu estiver viva. Eu preciso de você para me manter de pé.

Eu estarei aqui. - Ele beijou minha testa. - E vou te manter com os pés no chão. - Ele encostou a testa na minha enquanto segurava meu rosto com suas duas mãos. - O que acontece, se eu disser que estou...

Christopher. - O interrompi colocando meus dedos sob seus lábios e fechei meus olhos. Não queria ouvir o que ele ia dizer. Ou queria. Não sei!

O que você sente por mim Dulce?

Eu não sei. - Suspirei. - Eu queria saber exatamente o que sinto. - ele se manteve calado. Abri meus olhos e topei com os dele. - Não sei se sou capaz de corresponder aos seus sentimentos da mesma forma Chris.

Tudo bem. Eu só peço que. - Ele suspirou. - Peço que nunca minta sobre o que sente. Se não quiser mais ficar comigo, me fale. Eu não quero me machucar.

Eu prometo, que quando descobrir o que realmente sinto, vou lhe dizer. - Mordi meu lábio inferior. Eu sabia que o amava, mas não sabia se era o suficiente. Eu ainda precisava mudar muito para ter o direito de amá-lo. Christopher merecia alguém melhor. Alguém que ele não precisasse cuidar o tempo todo. E se eu não for capaz de me tornar esse alguém, consequentemente não mereço amá-lo e muito menos receber o seu amor.

Silencio. É tudo que nos restou. Deitamo-nos abraçados. Christopher ecariciava meu rosto e meu cabelo enquanto eu me concentrava em ouvir as batidas de seu coração.

Chris. - Ergui minha cabeça e o olhei.

O que foi?

Estou com fome. - Mordi o lábio inferior.

Quer ir lá em baixo comer?

Não. - Suspirei. - Quero ficar aqui com você.

Não deve ficar presa no quarto Dulce.

Você disse que tenho que descansar. - Mordi o queixo dele.

Sim. Eu disse. Mas te conheço o suficiente pra saber porque não quer sair.

Não quero vê-lo. - Escondi meu rosto em seu pescoço. Que cheirinho bom. - Não sei como encará-lo depois do que eu falei. Ele está bravo comigo.

Peça perdão.

Não sei fazer isso.

Não é tão difícil. Você me pediu perdão há alguns minutos. Não te arrancou nenhum dedo, nem um fio de cabelo.

É diferente Chris. O que falei pra ele foi muito feio.

E o que você disse pra ele.

Não quero repetir. Foi realmente feio e duro de mais.

Dulce. - Ele me afastou um pouco e me encarou. - Eu sei que foi uma coisa ruim, até porque ninguém magoa seu pai tão facilmente. Entao, seja lá o que você disse, é melhor conversar com ele e pedir perdão, antes que ele fique chateado o suficiente para não querer falar mais com você.

Não quero que ele pare de falar comigo.

Então você já sabe o que fazer.

Não sei como fazer.

Você vai saber na hora. - Ele me abraçou.

Eu não quero fazer mais exames Chris.

Por que Dulce?

Eu não sei. Não quero.

Você está com medo do resultado. - Ele me encarou. - Não precisa ter medo.

Não é tão simples assim. Queria ver se estivesse no meu lugar. Ter que passar por todos aqueles exames. Agulhas, máquinas. Aquilo tudo me amedronta. Eu quase entrei em pânico quando me enfiaram dentro daquela máquina.

Ei baixinha, isso vai passar logo. Você vai ver. Não vai dar nada errado.

É fácil falar. Não é você que está prestes a descobrir se está condenado à morte ou não. - Cruzei meus braços.

Não gosto quando você fala assim. Eu não vou deixar nada te fazer mal algum. - ele me envolveu em seus braços novamente. - Nem que eu tenha que dar minha vida por isto. - Senti os lábios quentes dele apertarem contra minha bochecha.

Promete? - Apartei-me o olhando.

Prometo. - Ele deu um sorriso sincero.

O que você sente por mim. - Molhei os lábios com a língua. - É muito forte, não é? - Ele desviou o olhar. - Sei que há alguns minutos eu disse que não sei o que sinto por você, mas agora eu gostaria de saber o que você sente por mim.

Sim Dulce. Eu sinto algo muito forte por você. - Ele suspirou. - É como o primeiro amor sabe?! - Ele coçou atrás da orelha.

Em nenhum outro momento você se interessou por outra garota? - Mordi levemente meu lábio inferior.

Não. Eu sempre tive esperanças de um dia te encontrar de novo. Mesmo que eu tivesse que juntar o meu pouco dinheiro e ir até Nova York encontrar você.

Isso não tem lógica alguma. Como você se apaixonou por mim sendo que nem sabia o que era isso? Quantos anos você tinha mesmo? 6? 7? Nessa idade eu nem sabia que beijo envolvia línguas. - Ele deu uma risada gostosa.

Eu apenas me recusei a esquecer de você. De como você corria pela casa enquanto brincávamos. Ver você ir embora foi uma das piores coisas que já aconteceu na minha vida. Você não queria sair sem mim e meu irmão, e eu não queria deixar você ir. Sabia que você não iria voltar, mas você era tão pequenininha, bom, ainda é mas agora não é mais ingênua. - O fitei com os olhos e ele riu. - Eu cheguei a ficar internado umas duas semanas. - Arregalei meus olhos. - Não queria comer, nem fazer nada. Foi muito traumatizante para mim.

Nossa Chris. Eu não acho justo você se lembrar de tanta coisa e eu não me lembrar de nada. Se você chegasse em Nova York eu nem iria me tocar. E não acho que você se atreveria a deixar a vida que tanto ama aqui na fazenda pra viver na cidade grande.

Por você? - Ele riu sem jeito. - Algum dia eu teria que tomar um rumo na vida não é mesmo? Fazer uma faculdade, ter minha própria casa.

E porque ainda não faz?

Primeiro porque não tenho dinheiro e segundo que não posso simplesmente deixar a cidade sem ter onde morar. E terceiro que ainda não decidi o que quero fazer.

Você é bom nos estudos?

Mais ou menos. - Ele olhou para o chão.

Isso me soou um pouco modesto. Você me parece um garoto muito inteligente.

Em que matérias você se dá melhor?

Filosofia, Sociologia, Biologia.

Ui, tudo com IA. - Fiz uma careta.

Gosta de ler?

Depende do assunto.

Você daria um bom psicologo.

Acha? - Assenti. - O jeito com que você fala comigo quando estou pra baixo.

Não exagera.

Não estou exagerando. É sério.

Não sei se sou capaz de ajudar pessoas a superarem seus problemas se não posso superar um problema meu.

Um problema seu?

Sim, mas não quero falar nisso.

Tudo bem. - Suspirei. Algo a ver com o Rodrigo. Tenho certeza, mas não quero insistir. - Você poderia cursar para Veterinário também, já que ama os animais.

Ai, eu até gosto deles, mas não é minha praia. E não viage tão longe, não tenho dinheiro para pagar uma Universidade e muito menos para sustentá-la.

Isso não é problema, você sabe disso. - Cruzei meus braços e ergui uma sobrancelha.