Fanfics Brasil - Dona Any e Seus Dois Maridos - Adaptada

Fanfic: Dona Any e Seus Dois Maridos - Adaptada


Capítulo: 29? Capítulo

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Tocava dona Marichelo os cimos do poder, sentia o gosto sem igual da fama; Poncho tocava os seios rijos de Any no escuro da escada, sentia o gosto sem igual da boca medrosa e sedenta da moça, mordia-lhe os lábios. Revelava-lhe um mundo apenas suspeitado de prazeres proibidos, ganhando a cada noite de namoro uma parcela de sua resistência e de seu corpo, de seu pudor, de sua oculta emoção. O desejo a consumia numa fogueira de altas labaredas, ardiam brasas em seu ventre, mas Any buscava conter-se e coibir-se. Sentindo-se, entretanto, dia a dia menos senhora de sua própria vontade, de recusa frágil, de relutância débil, submissa escrava do rapaz audacioso, que já se apoderara de quase todo o seu corpo queimado de uma febre sem remédio, ai, sem remédio. Insolente Poncho! Não lhe declarara amor, não fizera praça de sentimentos apaixonados, não lhe pedira sequer autorização para namorá-la. Em vez de frases poéticas, de termos alambicados, ela ouvia


duvidosos conceitos, insinuações mal-intencionadas.  


 


Subindo a Ladeira do Alvo, na pista de Any (cujo retorno da casa de tia Lita, no Rio Vermelho, dera-se dias após a festa de Pergentino), o petulante, ao ler o anúncio da Escola de Culinária, murmurou-lhe ao ouvido, num sussurro romântico de quem lhe fizesse inocente galanteio:


 


- Escola de Culinária Sabor e Arte . . . - repetiu - Sabor e Arte . . . - baixou a voz, o bigodinho roçando a orelha da moça: Ah! Quero saborearte . . . - não apenas um trocadilho de mau gosto mas também franco aviso de suas intenções, deslavada plataforma, claro programa de namôro.


 


Any nunca tivera um namorado assim, tão diferente dos outros, nem imaginara namorar daquele jeito. Como não o mandou imediatamente embora? Não era Any uma dessas debochadas janeleiras, de idílio escandaloso nos cantos de rua, nos pés de escada, no esconso das portas. Jamais gaiato algum fora além de tímido beijo, Pedro Borges apenas aflorou-lhe a face, ela não admitia intimidades. Bastava o atrevido estender a mão na ousadia de tocá-la, e Any enchia-se de indignação e o expulsava, como a guardar-se por inteiro para aquele a quem realmente amasse. A esse, sim, nada recusaria, e esse era Poncho: eis porque não o despachou como aos outros, sem grosseria nem escandalo mas firme e inflexível.


 


Não o repeliu sequer da primeira vez e, no entanto, conheciam-se apenas a algumas horas, pois foi no domingo do Bando Anunciador, no dia seguinte ao da festa em casa do Major Tiririca. Em companhia de amigas, viera Any apreciar os blocos, Poncho apareceu e encostou. As outras afastaram-se, entre risinhos, certamente chegara a hora da indispensável


declaração (declaração mais ou menos veemente e florida conforme o temperamento e a veia do pretendente; alguns mais timoratos preferiam fazê-la em carta, utilizando, quando necessário, a ajuda do "Secretário dos Amantes"). Elas vinham mesmo comentando o chamego do rapaz: não largara Any sozinha na festa, seu par constante. Ia agora declarar-se, era um momento grave: cabia à moça logo conceder o sim ou pedir tempo para melhor reflexão, em geral vinte e quatro horas. Any anunciara às amigas seu propósito de deixar Poncho padecer uns dias mas as outras duvidaram, teria ela coragem para tanto? Não abriu ele a boca para fazer declaração alguma, a conversa girou divertida em torno de motivos diversos, um doudivanas esse Poncho!


 


Dois animados blocos carnavalescos, em desafio, juntos se encontraram no oitão da Igreja de Sant`Ana e, aproveitando-se do atropêlo estabelecido quando o povo acorreu e ali se comprimiu, Poncho a apertou contra si, abraçando-a por detrás, cobrindo-lhe os seios com as mãos, beijando-lhe sofrego o cangote. Ela estremeceu apenas, semicerrou os olhos, deixou-o fazer, quase morta de medo e de alegria.


 


Os dias iniciais desse namoro sem declaração formal e sem formal consentimento, foram inesquecíveis. Todos os anos no verão, na oportunidade das festas do bairro, costumava Any passar uns tempos com os tios, aos quais era muito afeiçoada. No mês de fevereiro a Escola de Culinária não funcionava. Vinha para a procissão do presente a Yemanjá, a dois de fevereiro, quando os saveiros cortam as ondas carregados de flores e dádivas para dona Janaína, mãe das águas, da tempestade, da pesca, da vida e da morte no mar. Ofertava-lhe um pente, um frasco de perfume, um anel de fantasia. Yemanjá habita no Rio Vermelho, seu peji ergue-se numa ponta de terra sobre o oceano.


 


Em companhia das moças do bairro, divertia-se em intenso e festivo programa: pela manhã banho de mar; passeios à tarde no Farol da Barra e em Amaralina, por vêzes iam até a Pituba; a organização e os ensaios da prancha de carnaval - alegre trabalheira; piqueniques em Itapoã, em casa do doutor Natal, médico amigo de tio Pôrto, ou na Lagoa do Abaeté, com violas e cantigas; batalhas de confete. A noite circulavam no Largo de Sant`Ana ou na Mariquita, por entre as barracas coloridas, quando não havia dança programada em residência de farttília amiga ou elas próprias não invadiam e ocupavam uma sala de visitas, improvisando um assustado.


 


A casa de Porto, florida de trepadeiras e acácias, ficava na Ladeira do Papagáio, e aos domingos, invariável, o tio saía com outro amante da pintura, residente no Largo, um senhor sergipano, acanhado como ele só, um certo José de Dome; saíam a desenhar casarios e


paisagens. Uns dois anos antes, quando da partida de Rosália e Antônio Morais para o Rio, Any, sozinha e triste, chegara a sentir uma vaga inclinação pelo pintor, já homem maduro, de seus quarenta anos se bem aparentasse menos, caboclo rijo e seco. Propusera-lhe ele um dia, vencendo a extrema timidez, pintar-lhe o retrato e o iniciara, numa tela de ocres e amarelos lancinantes onde a cor mate de Any ressaltava transfigurada. "Negócio de maluco, um disparate, aliás esse fulano é leso", definiu dona Marichelo, que em matéria de arte não ia além do cromo das folhinhas, ao ver aquela explosão de tinta e luz. Nunca chegaria José de Dome a concluir o retrato, no entanto. Não houvera tempo, Any retornara à Ladeira do Alvo, e, se bem prometesse vir pousar aos domingos, jamais o fez; tampouco ela entendia a pintura do sergipano. Simpatizava, sim, com seu sorriso e sua solidão. Mas aquele sentimento nem chegara a ser namoro, pois não se pode chamar namoro aos longos silêncios e aos breves sorrisos das horas de pose. Não passara de efêmera inclinação a durar apenas os dias de veraneio, incapaz sequer de romper o acanhamento do artista.


 


Ao voltar ao Rio Vermelho, Any reencontrou o amigo do tio com a mesma cordialidade, mas fora quebrado o encanto daquelas férias anteriores, era como se nada houvesse acontecido entre eles. Quanto ao retrato por acabar está até hoje na parede do atelier do pintor, no terceiro andar, de um velho sobradão, na esquina do Largo de Sant`Ana; quem quiser pode ve-lo, é só tomar coragem e subir as carunchosas escadas.


 


Tão diferente com Poncho . . . Como se irrefreável avalanche a arrastasse, ele a dominou e decidiu de seu destino. Any compreendeu, ao fim daqueles perfeitos e rápidos dias do Rio Vermelho, não lhe ser mais possível viver sem a graça, a alegria, a louca presença do rapaz. Fez quanto ele lhe pediu: nas festinhas não dançou com nenhum outro, de mãos dadas com ele por entre a quermesse do Largo, desceu à praia escura para no negrume da noite melhor se beijarem, como ele sugeriu; sentindo num arrepio a mão de carícias a subir por baixo de seu vestido, acendendo-lhe as coxas e as ancas. Dona Marichelo, quem jamais poderia imaginá-la assim democrática, de tamanha liberalidade? Fechava os olhos aos evidentes abusos daquele namoro tão sem controle e desassuntado, a ponto de tia Lita, pouco afeita a carrancismos, no entanto estranhar e advertir:


 


- Você não acha, Marichelo, que Any está dando corda demais a esse moço? Saem juntos por toda a parte como se fossem noivos, nem parece que se conheceram noutro dia . . .


 


Dona Marichelo reagia brava, em tom de briga:


 


- Não sei que diabo você e o seu marido têm contra Poncho . . . Só porque o rapaz é rico e ocupa posição de destaque, é um zunzunzum contra ele, não sei porque vocês tomaram esse abuso dele . . . Com a porcaria desse pobretão metido a pintor vocês ficaram influídos até demais, se dependesse de vocês faziam o casamento na hora, como se eu fosse dar minha filha a esse vira-bosta. Com Poncho vocês só pensam- maldade. Não vejo nada demais que ele namore com Any, ela já está em tempo de casar, e quando o Senhor do Bonfim, ouvindo minhas preces, envia um partido como esse, você e Pôrto  fazem uma zoada medonha, a achar isso e aquilo . . . Me deixe, mulher, se assunte . . .


 


- Eu não acho nada, minha santa, se assunte você. Estava só falando . . . Porque você é toda cheia de melindres, toda não-me-toques. Basta ver qualquer moça passeando sozinha com um rapaz e logo diz que é uma perdida . . . E agora mudou da água pro fogo, largou a menina de mão . .


 


- Tu acha ela uma perdida? É isso que tu acha? Diga logo . . .


 


- Se assunte, Maichelo, tu sabe que eu não disse isso . . .


 


Dona Marichelo encerrava a discussão:


 


- Eu sei o que estou fazendo, a filha é minha e, assim Deus ajude, ainda este ano eles se casam . . .


 


- Possa ser, queira Deus . . .


 


- Possa ser? Vai ser e com certeza . . . Não me venha com cantiga de sotaque, vocês têm é má vontade com Poncho. . .


 


Não, ninguém demonstrava má vontade com Poncho, ele a todos seduziu com sua lábia e sua fantasia, primeiro aos conhecidos do Rio Vermelho, depois aos da Ladeira do Alvo. Dona Lita e Pôrto já lhe haviam tomado amizade e bem o desejavam para marido de Any. Quanto a dona Marichelo, parecia viver exclusivamente para satisfazer-lhe as vontades, adivinhar-lhe os caprichos. Capricho mesmo, ele tinha apenas um: estar a sós com Any, tomá-la nos braços, vencer sua resistência e pudicícia, ir-se apossando dela pouco a pouco, a cada encontro. Amarrando-a nas cordas do desejo mas amarrando-se ele também, preso a esses olhos de azaite e espanto, a esse corpo fremente e arisco, ávido de vontade, contido de pudor. Prêso sobretudo à mansidão de Any, à atmosfera doméstica, ao ambiente de lar próprio da graça simples da moça, de sua quieta beleza, atmosfera a exercer poderoso fascínio sobre Poncho.


 


Jamais vivera ele vida de família, não chegara a conhecer a mãe morta de parto, e o pai cedo desaparecera de sua existência. Produto de ocasional ligação entre o primogênito de pequenos burgueses remediados e a copeira da casa, dele ocupara-se o pai, o tal parente longe dos Herrera, enquanto solteiro. Mas, ao fazer um casamento afortunado, tratou de livrar-se do bastardo a quem sua esposa, devota ignorante, consagrava um santo horror-"filho do pecado!" Internou-o num colégio de padres onde, aos trancos e barrancos, Poncho chegou ao último ano do curso secundário, não o tendo concluído por haver-se apaixonado, num domingo de visitas, pela mãe de um colega, distinta quarentona, mulher de comerciante da Cidade Baixa, considerada naquele tempo a mais fácil puta da alta sociedade da capital - paixão devóradora e correspondida. Paixão romântica, também. A preclara punha-lhe olhos langorosos, suspirava, Poncho a rondá-la no pátio das visitas do colégio, triste como uma prisão, lúgubre prisão de meninos. Ela lhe dava chocolates e biscoitos, do embrulho trazido para o filho. Poncho ofertou-lhe uma orquídea às escondidas, roubada à estufa do jardim dos padres.


 


Num dia de saída (o primeiro domingo do mes e Poncho jamais saía, ninguém o vinha buscar, não tinha para onde ir) ela levou-o a almoçar em sua casa, palacete no Largo da Graça, apresentando-o ao marido:


 


- Colega de Zezito, órfão, não tem família . . .


 


Zezito era meio debilóide, criava preás e nos domingos de saída todo seu tempo era pouco para atender, no porão da casa, aos pequenos roedores. O comerciante a roncar a sesta, Poncho viu-se arrastado a um quarto de costura, envolto em beijos e carinhos, possuído. "Meu menino, meu colegial, meu aluno, sou tua professora, ai, meu donzelo" e, consciente de sua condição de mestra, ela lhe ensinava - e, como ensinava! Cresceu a paixão, insaciável e brutal. Ela desfeita em ais e juras - nunca amara ninguém, repetia-lhe cínica e tranqüila, Poncho era seu primeiro amante, e nada no mundo almejava senão partir com ele para viverem os dois aquele grande amor, ocultos num recanto qualquer. Pena estar ele interno num colégio . . .


 


- Se eu saisse do colégio voce vinha mesmo viver comigo?


 


Fugiu do colégio, apareceu no princípio da noite para busca-la, para libertá-la do "bestial burguês" que tanto a fazia sofrer e a humilhava possuindo-a. Obtivera mísero quarto numa pensão de última ordem, comprara pão, mortadela (adorava mortadela), uma zurrapa vendida como vinho e um buquê de flores. Ainda lhe sobraram alguns mil-réis, os colegas mais íntimos, a par do caso solidários, haviam-se reunido para financiar-lhe a fuga e o amor. Para eles, Poncho era um retado.


 


A prezada senhora quase morre de susto quando ele lhe invadiu o lar onde o marido na outra sala palitava os dentes e lia jornais. Poncho endoidara com certeza-disse ela, indignada. Não era uma aventureira para largar casa, espôso e filho, seu confôrto e seu conceito na sociedade, para ir viver amásia de uma criança, na miséria e na desonra. Poncho não tinha juízo, voltasse para o colégio, talvez nem se houvessem dado conta de sua escapula, e no próximo domingo de visitas, ah! ela lhe prometia...


 


Não quis Poncho ouvir a promessa, estava possesso de ira e de vexame, fora ludibriado. Sem levar em conta a proximidade dos cornos do comerciante, agarrou a madame pelos cabelos longos e oxigenados, aplicou-lhe uns tabefes na cara, gritou-lhe nomes, num esbregue de tamanhas proporções a ponto de reunir, em animada assistencia, não apenas o espôso e os criados, mas também os vizinhos do elegante Largo da Graça. Segundo o testemunho ulterior de Poncho, naquele dia se fizera homem, e homem para sempre escarmentado. Pela mão desse escândalo penetrou Poncho na vida noturna da cidade, rapazola de dezessete anos, ao qual se afeiçoara Anacreon, batoteiro afamado, carteador de fino estilo. Ninguém melhor para revelar ao moço inexperiente as sutilezas e as finuras da ronda, do vinte-e-um, do bacará, do póquer, para introduzi-lo na dialética das mesas de roleta e na mística dos dados, pois Anacreon não era apenas competente, era também um coração leal, de frente para a vida, um tanto quixotesco.


 


Com o pai teve Poncho breve encontro no qual se recusou a volver ao internato, recusando-lhe em troca o salafrário Herrera a benção e qualquer ajuda financeira, "não tinha recursos para sustentar desordeiros". Com a riqueza da mulher ficara somítico e moralista. Aliás, nessa altura da vida, quando seu nome era citado nas colunas sociais, passara a conceber sérias dúvidas a respeito da paternidade de Poncho. Seria mesmo seu filho? A falecida Valdete acusava-o, entre beijos, de te-la deflorado e engravidado. Mas será documento a merecer crédito a palavra de uma doméstica? Jamais conhecera outro homem, além dele, segundo depunham suas amigas chorosas, junto ao corpo. Mas a palavra dessas outras amas, sem eira nem beira, pode constituir prova seja lá do que for? Tudo aquilo sucedera há tanto tempo, confusas memórias da juventude, numa adolescencia falta de responsabilidade, insensata. Talvez fosse seu filho, talvez não o fosse, quem podia vir de público prová-lo, onde estava a certeza? Certeza mesmo era ser Poncho filho-da-puta e um filho-da-puta dos piores: ainda menino e querendo "estuprar honesta senhora, bondosa mãe de um colega, em cujo lar fera recebido como filho . . ." Esse pai de Poncho era um Herrera da "banda podre", como o classificara Chimbo, não lhe coubera o ímpeto e agenerosidade da família.


 


Desde então não mais provara Poncho o perfume de um sentimento familiar, não mais tivera um interesse complexo e profundo. Sua vida sentimental, numerosa e diversa, pois as múltiplas amantes variavam na idade, na posição social e na cor, decorrera em grande parte nos castelos e cabarés, em xodós com raparigas, amigações, além de umas  poucas aventuras com mulheres casadas; sem que nenhum desses laços tivesse a força do amor. Nunca um enrabichamento o fez sentir a vida plena e luminosa, jamais uma ausencia feminina, uma briga, o término de um caso, o tornou gris, vazio e suicida. Partia para outro corpo de mulher como mudava de mesa na sala de jogo quando o dezessete, seu número, fazia-lhe falseta.


 


O encontro com Any, na festa do Major, veio reacender-lhe de súbito aquela necessidade antiga de lar, de vida de família, mesa posta, cama de lençóis limpos. Ele não tinha sequer endereço estável, mudando de pensão barata a cada mes por falta de pagamento. Como esbanjar dinheiro em aluguel quando sobrava tão pouco para o jogo? Any trazia um novo sabor à sua vida, uma quietude, uma placidez, um gosto de ternuras familiares:


 


- Gosto de você porque você é mansa como um bichinho, meu bem...


 


De tal forma seduzido por ela, a ponto de suportar-lhe a mãe, velha mais terrível e paulificante, ridícula e desfrutável. Amava a singeleza da moça, sua mansidão, sua alegria sossegada, e sua composturá. Lutando diariamente para derrubar-lhe a resistência e romper-lhe a castidade, sentia-se, no entanto contente e orgulhoso com ela ser assim recatada e séria. Porque só a ele competia domar esse recato, reduzir a prazer aquela pudicícia. Os amigos de Poncho descobriam um brilho em seus olhos, acontecendo-lhe ficar parado ante a roleta, esquecido de depositar a ficha, sonhador.


 


E os íntimos, como Mirandão, já não se surpreenderam quando, pelo carnaval, o viram integrando a prancha dos "Alegres Gazeteiros", prancha organizada pelas famílias do Rio Vermelho, decoração do tio Pôrto, moças e rapazes fantasiados de vendedores de jornal, mercando o "Diário da Bahia" e "A Tarde", o "Diário de Notícias" e "O Imparcial". Um carnaval de confete e mamãe-sacode, de serpentina e canções, onde lança-perfume era para consumir nas namoradas e não para aspirar-se, um carnaval sem cachaça. O oposto dos carnavais de Poncho que emendavam do sábado à têrça-feira num porre só. Integrando blocos de mascarados, às voltas com as raparigas, a sambar no meio da rua, a bebida a la vontê. Caindo de bêbedo nos fins das noites num fovôco qualquer da zona; assim nos quatro dias. "Olhe quem vai ali, naquela prancha, de pandeiro na mão, é Poncho saindo em prancha, quem diria!", admiravam-se passantes habituados a vê-lo em deboche completo na folia do carnaval. Lá estava Poncho, ao lado de Any, a cobri-la de confetes e ternura.


 


Nada disso o impedia, no entanto, de chafurdar na mais baixa gandaia, de ingerir uma cachaça absurda, após ter-se despedido de Any, à meia-noite. Saía direto para o Tabaris, o Meia-Luz, o Flozô. Na segunda-feira pretextou trabalho urgente em Palácio, foi-se às dez da noite, não podia chegar tarde ao grande baile da Gafieira do Pinguelo onde Andreza e outras reais crioulas fantasiavam-se de damas da côrte de Maria Antonieta, gastando cetins e veludos, alvas cabeleiras de algodão. Nem mesmo no momento de paixão mais alta, de maior doçura familiar, de pensamentos mais domésticos, Poncho imaginou sequer mudar sua vida, modificá-la, adquirir novos hábitos, regenerar-se. Mirandão ameaçava fazê-lo, de quando em vez:


 


 


- Seu mano, vou me regenerar . . . De amanhã em diante . . .


 


Poncho jamais falou nisso. Apaixonado por Any, projetando casar-se com ela, mas nem assim disposto a fugir a seus solenes compromissos, a seu quotidiano de jogo e malandragem, de bebedeiras e arruaças, de cassinos e castelos.


 



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Autor(a): Bela

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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 6



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  • bela Postado em 08/09/2009 - 11:57:21

    Postei em Dona Any e Seus Dois Maridos ....
    comentem por favor sim....
    bjinhoss

  • anacarolinaa Postado em 30/08/2009 - 20:53:01

    oii! será que você pode conferir minha mini web De Repente ?
    Ah! Adorei sua web!
    Obg!
    Bjooo

  • millarbd Postado em 26/08/2009 - 20:26:27

    ADOREIIIIIIIIIIIIII... POSTA MAIS...., PLIS....

  • marcos00 Postado em 26/08/2009 - 20:24:41

    2 leitorr

    kkk

  • bela Postado em 26/08/2009 - 19:54:13

    eba !!!! primera leitora... q bom q gostou ... espere q goste do resto...rsrsrs

  • millarbd Postado em 26/08/2009 - 17:00:25

    1 leitora... ja gostei.. posta logo!


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