Fanfics Brasil - Capítulo O5 Entre o Agora e o Nunca - AyA

Fanfic: Entre o Agora e o Nunca - AyA | Tema: Anahí e Alfonso - Ponny


Capítulo: Capítulo O5

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Poncho chegou \o/




 


dia em que tudo mudou foi ontem. Aquele formigamento no cérebro me forçou a me levantar. E eu me levantei. Mandou que eu calçasse os sapatos, arrumasse uma pequena mala esportiva com o indispensável e pegasse a minha bolsa. E eu fiz tudo isso. Não havia lógica nem senso de propósito algum, a não ser saber que eu precisava fazer alguma coisa diferente do que estava fazendo, ou não conseguiria sobreviver. Ou acabaria como meus pais. Sempre achei que a depressão fosse algo supervalorizado, pelo modo como as pessoas usam essa palavra a toda hora (como aquele palavrão que começa com A que eu nunca mais vou dizer pra nenhum cara enquanto eu viver). Quando eu estava no colégio, as meninas muitas vezes comentavam que estavam “deprimidas” e que a mãe as levava para um analista para tomar remédios, e aí elas se reuniam para experimentar os comprimidos umas das outras. Depressão, para mim, significava três palavras: tristeza, tristeza e tristeza. Eu via aqueles comerciais idiotas com figuras de desenho animado se arrastando com uma nuvenzinha preta sempre chovendo na cabeça e pensava como as pessoas exageravam com esse lance de depressão. Eu sinto pena das pessoas. Sempre senti. Jamais gostei de ver alguém sofrendo, mas admito que quando alguém falava em depressão, eu revirava os olhos e ia cuidar da minha vida. Mal sabia eu que a depressão é uma doença grave. Aquelas garotas na escola não faziam ideia do que realmente significa estar deprimida.


Não é só questão de tristeza. Na verdade, a tristeza tem bem pouco a ver. Depressão é dor em sua forma mais pura, e eu faria qualquer coisa para conseguir sentir alguma emoção de novo. Qualquer emoção. A dor machuca, mas com uma dor tão poderosa que você não consegue sentir mais nada, é aí que você começa a achar que está enlouquecendo. Me incomoda imensamente perceber que a última vez que chorei de verdade foi naquele dia na escola, quando fiquei sabendo que Ian tinha morrido no acidente. Foi nos braços de Christopher que chorei. Christopher, logo ele. Mas aquela foi a última vez que derramei uma lágrima, e foi há pouco mais de um ano. Depois disso, simplesmente não consegui mais. Nem com o divórcio dos meus pais, nem quando Cole foi condenado, nem quando Christopher mostrou sua verdadeira face, nem quando Dulce me apunhalou pelas costas. Fico pensando que qualquer dia desses vou desabar e chorar até encharcar o meu travesseiro. Eu deveria estar vomitando de tanto chorar. Mas esse dia nunca chega e eu continuo sem sentir nada. A não ser essa vontade de me libertar de tudo. Esse formigamento que, embora vago e fraco, me impele a obedecer. Não sei por que, não sei explicar, mas ele está lá e não consigo deixar de dar ouvidos a ele. Passei a maior parte da noite na rodoviária, sentada ali, esperando que o formigamento me dissesse o que fazer. E então fui até a bilheteria.


— Pois não? — a mulher perguntou com voz neutra.


Pensei por um segundo e falei:


— Tô indo ver minha irmã em Idaho, porque ela acaba de ter um bebê.


Ela olhou para mim, meio sem jeito, e admito que também fiquei sem jeito. Não tenho irmã e nunca estive em Idaho, mas foi a primeira mentira que me veio à mente. E ela estava comendo uma batata assada. A batata estava lá, atrás do balcão, num pratinho engordurado e cheio de molho tártaro. Portanto, naturalmente, Idaho, a famosa terra das batatas, foi o primeiro estado em que pensei. Tanto faz aonde eu decida ir, na verdade, porque simplesmente não me importa.


Pensei: quando eu chegar em Idaho, vou comprar outra passagem pra algum outro lugar. Talvez eu vá pra Califórnia. Ou Washington. Ou talvez eu vá pro sul ver como é o Texas. Sempre imaginei o Texas como uma imensa paisagem de poeira, bares de beira da estrada e chapéus de caubói. E as pessoas no Texas são supostamente meio fodonas ou algo do tipo. Talvez me pisoteiem com suas botas de caubói. Eu nem vou sentir. Não sinto mais nada, lembra? Isso tudo foi ontem, quando decidi simplesmente levantar e sair andando, me libertar de tudo. Sempre quis fazer isso, me libertar, mas nunca imaginei que aconteceria assim. Ian e eu, antes que ele morresse, planejamos nossa vida de forma fora do convencional. Queríamos passar longe de qualquer caminho previsível, qualquer rota que nos transformasse nos mesmos robôs da sociedade que acordam na mesma hora toda manhã e repetem o dia de ontem. Queríamos viajar como mochileiros pelo mundo — por isso falei dessa ideia com Dulce naquele dia no café. Talvez parte de mim esperasse que ela tivesse a mesma paixão que Ian e eu tínhamos, e aí ela iria comigo, mas como tudo o mais na minha vida, as coisas não aconteceram exatamente como eu esperava.


 — Posso sentar aqui? — uma senhora pergunta, de pé no corredor do ônibus, com uma bolsa verde-limão apertada contra o peito.


 — Claro, à vontade — respondo, sorrindo fracamente. Não estou com vontade nenhuma de sorrir, mas a última coisa que quero é lhe dar um motivo para achar que sou uma jovem alma perturbada precisando de uma boa dose de conselhos de velhinha.


 Ela se espreme na poltrona ao lado da minha, depois de guardar sua mala de viagem no compartimento superior. É meio gordinha, mas não é desajeitada. E cheira bem.


 — Você parece jovem — ela diz. — Pra onde tá indo?


 — Idaho.


 — É mesmo? — Ela sorri para mim, revelando rugas profundas em volta da boca. — Deve ser pra visitar parentes, acho que ninguém vai passar férias lá. 


— É. Vou visitar minha irmã.


Ela meio que faz um bico, balançando a cabeça, como se estivesse arquivando minhas respostas. Então começa a procurar alguma coisa na bolsa.


Olho pela janela alta de acrílico ao meu lado e vejo os passageiros entrando e saindo dos outros ônibus. É meio-dia, e estou em Memphis no momento. Dormi a maior parte do caminho à noite — bem, tentei dormir, mas só conseguia tirar umas sonecas até que uma lombada ou a dor no pescoço e nas costas me acordassem do sono cheio de cãibras. Nunca estive em Memphis, mas devo dizer que esta rodoviária me deixa nervosa. Vi umas pessoas bem mal-encaradas andando por aí.


— Bem, eu tô indo pra Montana — a mulher diz, pondo um comprimidinho branco na boca. — Normalmente vou de trem, mas decidi mudar o caminho desta vez. Ver umas paisagens novas.


— A senhora deve viajar bastante — comento, olhando para ela.


— Não muito — ela responde. — Só uma vez por ano pra visitar minha mãe. Ela tem 98 anos.


— Uau.


— É, a mulher é teimosa feito um touro. Já teve câncer cinco vezes e continua viva. Ganha dele toda vez.


Sorrio para ela com simpatia.


— Mas, se você não se incomodar — ela muda de assunto, afundando na poltrona e encostando a cabeça —, preciso tirar uma soneca bem demorada. Não preguei o olho no último ônibus, o motorista ficava costurando na estrada. — Ela aponta para cima. — Toma cuidado nesses ônibus. Você encontra tudo quanto é tipo de gente esquisita, e os motoristas normalmente estão com o sono atrasado. Precisa ficar de olho, ajudá-los a não pegar no sono conversando com eles, senão você pode ir parar na beira da estrada, de cabeça pra baixo num monte de ferragens.


Por que ela tinha que dizer isso? 


Empurro para trás a lembrança do acidente de Ian, estranhamente parecido com as palavras dela, e apenas balanço a cabeça.


Ela fecha os olhos, mas aí volta a abrir e me olha mais uma vez.


— Mas na verdade é com as pessoas que você precisa tomar cuidado. Nunca sabe quem vai encontrar ou o que o velho sr. Destino preparou pra você.      


— Vou me lembrar disso — garanto. — Obrigada.


O Tennessee passa pela minha janela num borrão. A noite cai e acabo pegando no sono também. Não tenho nenhum sonho; não sonho mais desde que Ian morreu, mas provavelmente é melhor assim. Os sonhos poderiam me causar alguma emoção, e eu parei com a emoção. Estou começando a me acostumar com essa sensação de não ligar para coisa alguma. À parte alguns habitantes mal-encarados de rodoviária, não tenho mais medo de praticamente nada. Acho que quando você não está nem aí pra nada, o medo meio que perde as porras das garras. Eu também não costumava falar tanto palavrão antes.


A velhinha e eu nos separamos em St. Louis e sigo viagem até o Kansas com as duas poltronas só para mim, finalmente conseguindo deitar atravessada nas duas, em vez de sentada, com a cara amassada na janela. Tudo é muito igual. De casa até o Missouri, parece que as únicas coisas que mudam são as placas dos carros e as placas dando boas-vindas aos viajantes a cada estado, mas depois que você passa por elas, é só mais árvores e mais estrada. Em cada estado, sempre tem um carro enguiçado no acostamento. Sempre tem alguém pedindo carona e um cara de regata carregando um galão de gasolina da sua picape até a saída mais próxima, onde todos os postos de combustível e lanchonetes se aglomeram. E sempre, sempre tem um sapato solitário no acostamento em algum lugar. Não sei como é que esses sapatos vão parar na estrada. Você nunca vê uma calça ou uma camisa, e só de vez em quando alguma coisa como um chapéu ou um par de óculos. Só os sapatos solitários. Qual é a desses sapatos?


Uma viagem de ônibus é como estar em outro mundo. Todo mundo sabe, quando embarca, que vai passar um bom tempo ali. Bastante tempo. O ônibus é apertado. Normalmente, as pessoas estão tão amontoadas que você consegue sentir todas as colônias e desodorantes e os vários tipos de sabão em pó e amaciante que as pessoas usam. E, infelizmente, também consegue sentir o cheiro das pessoas que não usam nenhuma colônia ou desodorante, e cujas roupas já estão precisando de uma lavagem há vários dias. Até agora, a viagem não tem sido tão ruim. Só me incomodo quando preciso compartilhar o espaço com alguém. Há uma espera de duas horas pelo meu próximo ônibus, por isso abro caminho pela rodoviária semilotada no Kansas, procurando um lugar para sentar não muito perto de ninguém. Todas as rodoviárias têm o mesmo cheiro, sobretudo de combustível, que está começando a me deixar um pouco enjoada. Eu me mexo no assento de plástico duro, tentando ficar confortável, mas é impossível. Há alguns telefones públicos ali perto e eu penso por um momento em como os telefones públicos ficaram obsoletos hoje em dia.Instintivamente, procuro meu celular dentro da bolsa, só para me certificar de que está ali.


As duas horas se arrastam interminavelmente, e quando meu próximo ônibus afinal encosta na rodoviária, estou no primeiro grupinho de pessoas que se levantam e formam fila. Pelo menos as poltronas do ônibus são estofadas e vou poder ter um pouco de conforto de novo.   O motorista, vestido de azul-marinho e cinza-escuro do pescoço para baixo, pega minha passagem e rasga o canhoto, me devolvendo a outra parte. Eu a guardo bem dentro da mala e subo no ônibus, procurando dos dois lados para achar a poltrona que parece a certa. Escolho uma na janelinha, perto dos fundos, e instantaneamente me sinto melhor quando meu corpo se acomoda no conforto do estofamento. Suspiro e seguro a mala perto da barriga, cruzando os braços sobre ela. Mais ou menos dez minutos depois, o motorista decide que todos os passageiros daquele trecho já embarcaram. Desta vez são poucas pessoas e, graças a Deus, nada de crianças gritando ou casais sem noção que não entendem como aquele rala-rala de línguas é nojento para os outros. Nada errado em se beijar em público — Ian e eu fazíamos isso sempre —, mas quando a coisa está perto de virar um filme pornô, aí é um pouco demais.


O motorista começa a fechar as portas, mas aí puxa a alavanca de volta e elas rangem, se abrindo novamente. Um cara entra carregando uma mochila preta no ombro. Alto, cabelo castanho curto e estiloso, usando uma camiseta azul-marinho colada ao corpo e um sorriso meio torto que pode ser genuinamente gentil ou só de autoconfiança.


— Obrigado — ele diz para o motorista, daquele jeito tranquilo.


Embora haja muitos lugares vazios para ele escolher, faço questão de deixar minha mala na poltrona ao lado da minha, só para o caso de ele decidir que aquela é a certa para ele. Não é muito provável, eu sei, mas sou uma garota precavida. As portas rangem se fechando de novo enquanto o cara anda pelo corredor e se aproxima de mim. Olho para a revista que encontrei na rodoviária e começo a ler uma matéria sobre Brad e Angelina. Suspiro aliviada quando ele passa reto e ocupa o par de poltronas vazias atrás de mim. Até que enfim, um ônibus meio vazio onde talvez eu possa dormir profundamente. Isso é tudo o que eu quero. Quanto mais tempo fico acordada, mais penso em todas as coisas nas quais não quero pensar. Não sei o que estou fazendo ou aonde estou indo, mas sei que quero fazer seja lá o que for de verdade, e quero chegar logo. Pego no sono depois de uma hora olhando pela janela. A música abafada vindo de fones de ouvido no último volume atrás de mim me acorda, depois que já escureceu. Primeiro fico parada ali, esperando que talvez ele veja o alto da minha cabeça completamente acordada por cima do encosto da poltrona e decida abaixar o volume.


 


Mas ele não faz isso. Eu me curvo para a frente, esfregando um músculo do pescoço, dolorido por ter dormido em cima do braço, e então me viro para olhar para o cara. Ele está dormindo? Como alguém pode dormir com música tão alta nos ouvidos? O ônibus está um breu, exceto pelos poucos fachos das luzes de leitura acima das poltronas, iluminando livros e revistas, e as luzinhas verdes e azuis lá na frente, no painel do motorista. O sujeito sentado atrás de mim está mergulhado na escuridão, mas consigo ver um lado do rosto dele à luz do luar. Fico olhando para ele por um segundo, e então me ajoelho na poltrona e me debruço por cima do encosto, esticando o braço e batendo na perna dele. Ele não se mexe. Bato mais forte.  Ele se espreguiça e abre lentamente os olhos, me vendo com a barriga apoiada no encosto da poltrona. Ele tira os fones dos ouvidos, deixando a música fluir dos pequenos alto-falantes.


— Dá pra abaixar isso um pouco?


— Você tava ouvindo? — ele pergunta.


Levanto uma sobrancelha e digo:


— Hãã, sim, tá alto pra caramba.


Ele dá de ombros, mexe no botão do volume do MP3 e a música desaparece.


— Obrigada — digo, e deslizo de volta para a minha poltrona.


Não me deito de lado nas poltronas em posição fetal desta vez, mas encosto na lateral do ônibus e apoio a cabeça na janela. Cruzo os braços e fecho os olhos.


— Ei.


Abro os olhos, mas não mexo a cabeça.


— Você já tá dormindo?


Desencosto a cabeça da janela e vejo que o sujeito está debruçado em cima de mim.


— Eu literalmente acabei de fechar os olhos — comento. — Como poderia já estar dormindo?


— Bom, sei lá — ele cochicha. — Meu avô conseguia dormir dois segundos depois que fechava os olhos.


— Seu avô era narcoléptico?


Uma pausa.


— Que eu saiba, não.


Uau, que saia justa.


— O que é que você quer? — pergunto, falando baixinho como ele.


— Nada — ele diz, sorrindo. — Só queria saber se você já tava dormindo.


— Pra quê?


— Pra poder aumentar o volume de novo.


Penso nisso por um segundo, descruzo os braços e me endireito na poltrona, me virando para olhá-lo.


— Você quer esperar que eu durma pra poder aumentar o volume e me acordar outra vez? — Estou achando difícil de entender. 


Ele abre um sorriso torto.


— Você dormiu três horas assim e não acordou — ele explica. — Então acho que não foi a música que te acordou, deve ter sido outra coisa.


Minhas sobrancelhas se juntam.


— Não, hãã, tenho certeza absoluta que foi a música.


— Tá — ele concorda, escorregando na poltrona e sumindo de vista.


Espero alguns segundos antes de fechar os olhos para ver se mais alguma coisa esquisita vai acontecer, e quando nada acontece, volto a afundar na Terra sem Sonhos.



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Autor(a): AvrilPuente

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Comentários do Capítulo:

Comentários da Fanfic 1



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  • _cpaes Postado em 29/09/2014 - 18:13:16

    ADOREEEI, QUERO MAISSS... Se der dá uma passada na minha: http://fanfics.com.br/fanfic/32512/te-quedaras-vondy-vondy-rebelde-rbd Beijooos e continua...


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